Once In a Lifetime escrita por selinakyles


Capítulo 28
Maybe there's no good guys.


Notas iniciais do capítulo

Alo alooooô galerooooooooooooooo!
Essa é a alegria que todo Bellarke shipper deve expressar depois do episódio dessa semana. E justamente por causa dele, dos feels, que lhes trago a atualização de hoje.

Rapido uh? Pois é, os comentários lindos ajudaram.
Capítulo betadíssimo pela Kida, maravilhosa!
Divirtam-se, meus padawans. E segurem o tchan porque o tombo é daora!



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Chapter twenty eight –

 

You're here like a silhouette
When the darkness rules, you're the brightest moon
And I am safe.

 

O barulho parecia estar distante conforme Clarke era sugada por sua própria consciência, presa no limbo que suas emoções criaram. O ar se estancou em seus pulmões, seus olhos e sua garganta ardiam, suas mãos tremiam.

E, se conhecendo como ela se conhecia, não tinha como errar o palpite sobre o que viria a seguir.

‘Clarke?’

‘Meu Deus, ela aceitou! Será que eles estão gravando a cena de algum filme?’

‘Claro que não, não seja cética! Ainda existe amor nesse mundo, Alissa.’

‘Clarke!’

As vozes eram como ruídos em seus tímpanos, incapazes de salvá-la do transe que aquele momento a prendeu. Seus sentidos conseguiam distinguir o timbre consternado de Niylah, e ainda assim, não era o suficiente para que seus olhos se desviassem daquela cena.

A mulher sorria, doce e um pouco tímida ao assistir Bellamy se levantar para colocar o anel em seu dedo. Seu vestido impecável deixava claro que também estavam ali para comemorar algo, a mais genuína felicidade emanando deles.

Ele a beijou com a ternura de um homem apaixonado, completamente preso no sorriso que a sua acompanhante ostentava. Seu olhar encabulado vagou pelo salão do restaurante, fitando diretamente cada uma daquelas pessoas – um brilho apologético acentuando o castanho de suas íris.

Clarke cerrou os punhos, assistindo os olhos escuros se estalarem ao se fixarem nos seus. Seu nome escapou por aqueles lábios rosados como um segredo, uma confissão mútua que apenas eles eram capazes de compreender, de decifrar.

“Clarke! Clarke?” Seu olhar voltou para a mulher aflita ao seu lado, o ar se engasgando em sua garganta. “O que houve? Clarke? Você está bem? Precisa se sentar. Sente-se!”

Levou alguns segundos para que a loira pudesse reconhecer suas palavras, entender verdadeiramente o que elas significavam. As mãos de Niylah seguraram seu braço, ressentimento transparecendo nos pigmentos esverdeados de seus olhos castanhos claros ao vê-la desvencilhar bruscamente de seu toque.

“Eu... Eu vou...” Clarke levou uma das mãos trêmulas até a cabeça na tentativa de estruturar melhor seus pensamentos. “Eu preciso tomar um ar. Eu... já volto, Niylah.”

“Clarke!” A voz de Niylah lhe chamou já ao longe conforme ela contornava as mesas em direção ao banheiro.

Dentro de si a confusão se aumentava, desnorteando-a. Clarke perdeu naquele instante a noção de onde estava, para onde estava indo, de quem ela era. A ansiedade comichava em seu estômago, e sua visão já se embaçava gradativamente – e ela sequer conseguia distinguir se por culpa das lágrimas ou da adrenalina.

Seu andar desajeitado provocou uma colisão de leve em uma das cadeiras, um resmungo irritadiço a fez olhar para trás por um instante, a neblina agoniante cobrindo seus olhos e a impedindo de enxergar aquele rosto assim como todos os outros que passavam por ela como borrões.

“Desculpe.” Balbuciou, seguindo seu caminho em direção ao banheiro feminino.

Ela era incapaz de controlar sua respiração ou então os tremores que percorriam seu corpo, e com aquilo, todo seu esforço e perseverança escorriam pelo ralo, junto dos discursos motivadores de Luna e suas incontáveis sessões de terapia.

Seu amor era sua ruína, e por essa razão, só sobraram resquícios do que ela jurou ser algum progresso. Clarke não estava imune a ele, nunca esteve, nem com o passar do tempo. Bastava um olhar, um reencontro, e todo seu esforço se ruía como o bendito muro de Berlim.

E para ela sobravam os destroços.

Sua mão empurrou a porta do banheiro sem dar muita atenção para a funcionária que a encarou surpresa, a grande parede de espelho que havia ao lado dos lavatórios refletia um rascunho do que ela deveria ser. Uma bagunça andante, fraca demais para manter suas emoções nas rédeas, o completo oposto da garota forte e cheia de si que foi um dia.

Uma brecha de distância considerável entre a parede e a última cabine a levou a acreditar que seria ali o refúgio perfeito para que se acalmasse. Os saltos por pouco não lhe causando uma torção. Clarke puxou a barra de seu vestido preto, tornando-o ainda mais longo antes de se escorar na parede e deslizar até o calor de suas pernas se incomodarem com o chão gélido.

"Você é odioso. Odioso! Eu odeio você, Bellamy Blake. Odeio!"

"Diga algo que eu não sei."

A adrenalina circulava por suas veias como veneno, criando os malditos espasmos que faziam seu tórax mover em um ritmo inconstante na busca por ar. As gotículas salgadas morriam em seus lábios sem que ela pudesse percebê-las, marcando seu rosto e desmanchando a maquiagem que fez com tanto esmero.

"O coração quer o que ele quer, não é mesmo? Eu nunca fui capaz de deixar de te amar, e acho que nunca serei..."

Sua pressão arterial aumentou e trouxe em seu peito a agonia que fazia jus a mais uma crise de ansiedade, das mesmas que haviam cessado há alguns meses e que agora voltavam com força total. Seu corpo tremia e as batidas instáveis de seu coração latejavam dolorosamente em seu ouvido.

"Você realmente acha que um sentimento como esse destrói?"

Não havia espaço na sua mente para raciocinar. Todos os cantos - até mesmo os mais obscuros - foram tomados pelo torpor. As pupilas usurpando brevemente o azul de suas íris conforme dilatavam.

“Oh Princesa, não sabia que nessa sua cabecinha mirabolante poderia existir a possibilidade de ser a matriarca dos Blakes um dia."

Aquela voz ecoava em sua cabeça, os pulmões oscilavam da forma mais agoniante, falhando em manter o ar que ela inalava com dificuldade. Era como se uma âncora estivesse presa em seus pés, puxando-a para as profundezas de um mar que insistia em afoga-la enquanto cada pedacinho do seu ser luta para voltar à superfície.

Um timbre grave e familiar ressoou pelo banheiro, imperativo.

‘O senhor não pode entrar aqui, é o banheiro feminino!’

‘Eu não me importo! Eu preciso conversar com alguém que está aí!’

‘Converse quando ela sair, eu não posso permitir sua entrada, senhor!’

‘Eu vou entrar e assim que eu passar por essa porta, você vai dizer que o banheiro está interditado. ’

‘Novamente...’

‘FBI! Vai me deixar passar ou vou ter que te prender por obstrução de justiça?’

Clarke meneou a cabeça freneticamente, um esforço falho em tirar de sua cabeça aquelas alucinações. Mais uma vez ela se engasgava ao sugar o ar como se sua vida dependesse disso, escutando a porta do banheiro se fechar ao longe.

Um vulto apareceu diante de si, seu corpo em reflexo se encolhendo ainda mais contra a parede.

“Ela está hiperventilando.” Bellamy se agachou até a altura dela, os olhos atônitos vasculhando pelo rosto agoniado da loira.

Ele nunca havia presenciado algo como aquilo antes. As safiras azuladas permaneciam encarando o nada, petrificadas conforme as lágrimas continuavam escapando sem que ela ao menos sentisse.

Já havia acontecido uma vez, quando Jake morreu. Clarke entrou em um estado de calamidade que a fazia parecer ainda menor, completamente vulnerável e indefesa enquanto suas emoções governavam seu corpo.

Naquele dia ele a colocou em seu colo e a segurou em seus braços como uma criança. As mãos grandes envolviam as delas, pequenas e delicadas. Seu tom de pele dourado se contrastando com o dela, marfim. Ele cantou alguns versos de Johnny Cash em seu ouvido e o sono fez o resto do trabalho.

Mas não poderia ser comparado com o que tinha diante de seus olhos. O que ele passou com ela após o enterro de Jake não era sequer a ponta daquele iceberg.

“Clarke.” Ele rogou ao segurar o rosto sem vida entre suas mãos um tanto calejadas, seus polegares limpando as gotículas que escorriam perversas.

“Tente conversar com ela, senhor.” Uma voz atrás dele sugeriu. “Minha irmã também tem isso, se chama crise de ansiedade. Precisa tocá-la e distraí-la para que ela se acalme.”

Os olhos escuros de Bellamy vacilaram, aflitos.

“Eu não posso fazer isso, não sou nada dela. Eu...” Ele voltou sua atenção para o rosto da Griffin, assistindo-a levar uma das mãos até o peito que se contraía dolorido.

“Precisa arrumar uma forma de controlar a respiração dela. Ela está nos ouvindo, mas não consegue se acalmar sozinha, seu cérebro está lutando contra o pânico.”

Bellamy a encarou por mais alguns instantes, se perguntando como as coisas chegaram naquele ponto. Nunca havia se sentido tão desarmado diante de uma situação difícil em todos seus trinta anos de vida. Normalmente, ele conseguia agir da forma correta, consertar o que quer que fosse que exigisse conserto.

Mas era Clarke diante dele, não um incidente qualquer que precisava ser resolvido. Era a garota que ele viu crescer e que aflorou nele os mais diversos tipos de sentimentos, a mesma que seu coração jamais seria capaz de esquecer, e ela precisava dele.

Depois de todos esses anos, ela precisava dele. E Bellamy não tinha a mínima noção do que fazer para ajudá-la.

“Procure a acompanhante dela. Uma moça loira de trança, usando um vestido vinho, elas estavam sentadas em uma das mesas próximas da janela.” Ele a instruiu, o olhar fixo nas feições da Griffin.

“Tente fazer com que ela controle a respiração. Foque na respiração, senhor.” Ele assentiu antes que a moça passasse pela porta, pronta para cumprir seu pedido.

“Clarke. Clarke foque na minha voz. Você está bem, está tudo bem. Pare de respirar por um instante, prenda sua respiração.”

Se suas palavras fizeram algo, isso foi apenas aumentar a busca frenética que ela tinha por ar. Os olhos de Bellamy se fecharam com força, em sua mente mil e uma soluções inúteis se criavam, frustrando-o.

“Você vai ficar bem, eu estou aqui, Clarke. Eu estou aqui, está me ouvindo? Não vou sair daqui.”

E em um desatino, ele pousou seus lábios nos dela. Um gesto que refletia seu absoluto desespero, as mãos quentes se revestindo com a umidade daquelas lágrimas, seu toque formigando sob suas digitais.

Não era de forma alguma o que ele imaginava que aconteceria ao reencontrar Clarke Griffin. Bellamy jamais cogitou a hipótese de sentir novamente aqueles lábios nos seus, nem mesmo na mais desesperadora das circunstâncias. Nos sonhos acolhedores que ele guardava consigo mesmo, talvez.

Contudo, no final das contas, seus sentimentos contraditórios não importavam nem um pouco se aquilo tivesse algum efeito e a fizesse voltar ao normal. Ele ficaria feliz em lidar com a bagunça do seu passado depois que o azul daqueles olhos voltasse a ter luz, a resplandecer vida.

Clarke paralisou, piscando seus longos cílios repetidamente para que a névoa se esvaísse e seus olhos pudessem focar o que tanto se esforçavam em enxergar. Cada músculo de seu corpo se travou no momento em que o ar se estagnou em seus pulmões, a boca dele bloqueava a intensa necessidade de respirar.

O que parecia ser uma eternidade se passou como uma fração de segundos e logo Bellamy se distanciou.

O castanho de seus olhos era como uma imensidão de sentimentos revoltos, galáxias poderiam se esconder ali, na escuridão capaz de perfurar sua alma com o mais simplório dos gestos. Eram quentes, mesmo com toda a confusão que expressavam.

Ele estava tão atordoado quanto ela. As mãos molhadas pelas lágrimas ainda segurando as maçãs de seu rosto como se ela fosse um objeto frágil, quebradiço. Como se sua presença estivesse ali para mantê-la sã.

E era exatamente para isso que ele permaneceu, para trazê-la de volta do mar de medos e inseguranças que ela se afogou ao vê-lo novamente. Para atribuir paz na guerra que seu corpo e suas emoções travaram.

Bellamy se desvencilhou daquele toque como alguém que acaba de se queimar, bruscamente. Niylah passou pela entrada do banheiro como um tornado, a funcionária que até então os ajudava estava ao seu encalço.

“Meu Deus, Clarke!” A mulher se abaixou até a altura de Clarke, o vazio de seu rosto manchado pelas lágrimas deixando-a ainda mais perturbada. “Eu liguei para Wells, ele está vindo. Vai ficar tudo bem, você precisa voltar para casa.”

Seu olhar se voltou para o homem que permaneceu estático observando tudo.

“Muito obrigada...”

“Bellamy.” Completou, a mão passando pelos fios negros do cabelo antes penteado para trás impecavelmente. Um fio rebelde caía em sua testa, sua linguagem corporal denunciando o quão perturbado ele estava com tudo aquilo.

O nome fez com que Niylah hesitasse. Um relance de dúvida cintilando no castanho esverdeado de seus olhos. A sensação de que já havia ouvido aquele nome antes lhe trouxe certo incômodo, o mesmo que ela deixou de lado para envolver as mãos trépidas de Clarke.

Ele apenas assentiu e então seguiu seu caminho de volta para o salão, onde sua noiva o aguardava, ansiosa.

Niylah acariciou o rosto de Clarke, que ainda parecia desorientada demais para compreender qualquer coisa.

Aquela noite era tudo o que ela poderia chamar de desastre.

 

***

 

Gina encarou o relógio em seu pulso pela milésima vez naquela manhã, a ansiedade e o nervosismo fazendo com que sua perna manifestasse um de seus tiques, um tremelique irritante e frenético.

Nada conseguia ocupar permanentemente seus pensamentos além da possiblidade de tudo dar certo. Seu pensamento positivo faria com que ela conseguisse aquele emprego, e claro, isso também envolvia suas habilidades como recém-formada no renomado curso de Direito da Universidade de Washington. 

Ocupar aquela vaga como assistente jurídico não era exatamente a fonte de seu nervosismo, afinal, ela confiava bastante em seu potencial. Foram muitos anos sendo lapidada como a profissional perfeita enquanto trabalhava para um dos poderosos chefões da Polícia Federal, cuidando com maestria das burocracias que o trabalho demandava.

O que fazia seu estômago revirar inquieto dentro de seu abdômen era o fato de que em poucos minutos ela estaria diante de um dos advogados mais renomados de todo o país, sendo premiada com alguns minutos de seu tempo.

Para Gina era como se tudo o que fez e sacrificou em todos aqueles anos de trabalho árduo e estudo contínuo, estivessem fazendo sentido agora. Era o momento em que ela seria recompensada, e caramba, como aquilo lhe fazia sentir bem.

Ela com certeza poderia se acostumar com o gosto do sucesso.

“Senhorita Martin, o Sr. Kane está pronto para recebê-la.” Disse a secretária, sorrindo para ela como se estivesse sentindo o cheiro de toda sua apreensão.

Gina se levantou, empertigando-se e ajustando a saia de seu tailleur elegante antes de seguir pelo caminho que a moça indicava, passando pela grande porta de vidro com sua pasta de documentos debaixo do braço.

Marcus Kane tinha seus olhos escuros focados no papel que possuía em uma das mãos, a outra segurava seu queixo e reforçava sua posição compenetrada, demonstrando um requinte que apenas um homem tão intelectual como ele era capaz de exprimir.

Seu olhar se direcionou a ela por trás das lentes grossas de seus óculos de leitura, recompondo sua postura para recebê-la.

“Você deve ser Gina Martin.” Marcus se levantou, estendendo sua mão para cumprimenta-la.

Gina vasculhou por sua mente as palavras certas para respondê-lo, porém nada plausível surgiu. Os olhos amendoados expressavam sua surpresa diante do esquecimento momentâneo, se contentando em retribuir o cumprimento com toda a confiança que lhe restava.

Ela era como a garotinha que encontrava seu ídolo pela primeira vez. Essa definição lhe cabia como uma luva, isso era indiscutível.

“Sim senhor, muito prazer.”

“Sente-se, Gina. É um imenso prazer conhecer pessoalmente a protegida de Charles.” Seus lábios se curvaram em uma linha fina, indicando a cadeira para que ela se sentasse. “É um currículo e tanto o que você tem aqui.”

A morena sentiu o rubor pinicar suas bochechas, não desviando por um instante sequer o contato ocular.

“Sim, Sr. Pike foi um grande amigo e mentor. Foi ele quem me impulsionou a seguir meus sonhos e a lutar pelo que é certo.” Um sorriso se criou em seus lábios assim que ela cruzou as pernas, as mãos se apoiando no gabinete impecável.

“Charles inspirou seu amor pela justiça?” Kane ajeitou a armação de seus óculos com o dedo indicador, estudando-a minunciosamente.

“Vamos dizer que eu tive boas referências. Acompanho seu trabalho desde sua vitória no caso dos magnatas do petróleo, e devo acrescentar que lhe tenho como um dos meus maiores exemplos. Se é que não estou soando como uma maluca agora. Peço perdão se for o caso.”

O homem coçou a barba perfeitamente aparada, sua boca se alargando e exibindo os dentes perfeitos conforme a satisfação reluzia no escuro de seus olhos – e esses lhe pareciam ainda mais familiares do que Gina imaginava.

“Veio muito bem recomendada. Um currículo impecável.” Ele atestou. O olhar vasculhando o pedaço de papel em suas mãos. “Tenho algum motivo para não contratá-la?”

As íris castanhas a fitavam diretamente, estimulando-a a falar com sinceridade o que precisava ser dito. A atenção de Kane vacilou para suas mãos, tomando conhecimento do anel que ornava seu dedo delicado.

Esmeraldas. Não qualquer pedra preciosa lapidada para dar vida ao pequeno adorno, mas sim as esmeraldas que ele escolheu e ordenou que fossem talhadas para aquele objeto único.

O anel de sua amada. O símbolo raro e inigualável do sentimento que lhe deu vida, que lhe trouxe propósito. O verde tão semelhante aos olhos intensos e ardentes daquela que ele carregava consigo em suas mais belas lembranças, que amaria para sempre com toda a existência de seu ser.

Seu olhar alarmado se ergueu novamente até o rosto de Gina, assistindo-a lhe avaliar sem realmente entender o que se expressava em suas feições.

“Esse anel...” Começou ele, fazendo com que a mulher levantasse a mão até seus olhos e admirasse a pequena peça em seu anelar antes de voltar a encará-lo.

“É uma herança de família.” A dona das madeixas cacheadas replicou acanhada. “Meu noivo me pediu em casamento ontem, este é meu anel de noivado.”

“Seu... noivo?”

“Sim, Bellamy Blake, meu noivo.” Ela explicou. A mão percorrendo os cachos. Seu olhar vagava por qualquer parte daquele cômodo, menos o rosto daquele homem.

Marcus permaneceu em silêncio, o cenho se franzindo na medida em que ele se mantinha absorto demais em seus pensamentos. Ele voltou a encara-la de súbito, fixando os olhos frustrados nos dela.

“Você está contratada, Srta. Martin. Converse com minha secretária na saída, ela lhe auxiliará com toda a burocracia da contratação.” Ele se levantou, abotoando seu terno impecável com destreza antes de lhe direcionar um sorriso repleto de empatia. “Seja bem vinda a Kane & Associados.”

Ele apertou sua mão novamente ao selar o acordo verbal que haviam feito. Ela assistiu Marcus pegar sua maleta e logo em seguida passar pela porta em direção ao elevador com urgência.

E se Gina Martin pudesse escolher qual foi o dia mais feliz de sua vida até aquele momento, aquele estaria sempre em primeiro lugar.

 

***

 

Apenas uma vez em seus quase vinte e sete anos, Clarke desejou estar errada com todas as forças de seu ser. Pediu a uma divindade superior que a noite anterior não fosse o motivo que sua mãe a convocou até a mansão dos Kane, em Long Island.

Seria demais ter passado as últimas horas dirigindo para ter como presente uma bela dor de cabeça seguida de milhares de sermões preocupados e olhares carregados de culpa.

Ela não estava com humor para aquilo, por mais que a saudade de sua mãe tenha sido uma das coisas que mais tinham aumentado nos últimos dias. Não estava pronta para enfrentar mais uma pessoa importante em sua vida lhe dizendo o que fazer – para isso já bastava Wells, muito obrigada.

Alguns instantes foram o suficiente para que Clarke imaginasse como seria se sua mãe tivesse decidido simplesmente permanecer em Arkville, ajudando o pai de Monty com sua candidatura como prefeito, cuidando de seu lar com todo o esmero de sempre.

Obviamente não seria o suficiente para ela. Abby Griffin não servia como protótipo perfeito de dona de casa, e também, Marcus tinha que voltar para a filial de Nova York e manter os negócios da família em ordem.

Nada disso a impedira de lotar sua secretária eletrônica de recados ou então seu celular com milhares de chamadas perdidas. Sua mãe era uma mulher determinada, e por saber disso, Clarke decidiu simplesmente aguentar o baque.

Seria como puxar um band-aid. Rápido e indolor.

“Clarke! Meu Deus, Clarke. O que houve?” Abby se apressou em sua direção assim que ela entregou seu casaco para a nova empregada, segurando seu rosto em suas mãos trêmulas para que seus olhos pudessem avalia-la melhor. “Wells me contou tudo. Como isso aconteceu?”

Os olhos se fecharam e seus cílios longos repousaram em suas bochechas por alguns segundos para que ela pudesse inalar uma lufada de ar, como se aquilo fosse lhe trazer um pouco mais de força e confiança para entrar no assunto que ela tanto insistia em fugir.

Tanto esforço para nada.

“Mãe, está tudo bem. Eu estou bem agora, foi só um... susto.” Sua voz soou mais fraca do que deveria, perdendo a intensidade. “Não vai acontecer novamente.”

Sua mãe ainda lhe estudava de perto, a afeição que brilhava em suas íris trazia a ela a vontade súbita de chorar. Da mesma forma que ela fazia quando era criança e voltava para casa triste pelas piadas maldosas de seus companheiros de classe sobre seu porte físico.

Abby a puxou pelo braço, arrastando-a escada acima até que chegassem a sua suíte extravagante, fechando a porta atrás de si assim que Clarke se sentou na beirada de sua cama.

As mãos quentes de sua mãe envolveram as suas assim que ela se acomodou ao seu lado.

“Meu bem, você tem se saído tão bem.” Começou a Griffin mais velha, os castanhos de seus olhos se derretendo em puro carinho e admiração. “Eu tenho tanto orgulho de você, Clarke. E tenho a mais absoluta certeza que Jake também teria...”

“Mãe...”

“Não, me deixe terminar. Eu sei que você não quer mais ouvir sermões, eu tenho certeza que Wells deve ter feito a parte dele. Eu só preciso que me ouça, ok? Me ouça porque eu acho que chegou o momento de conversar sobre isso.”

Clarke assentiu, o olhar vacilando conforme ela reunia dentro de si qualquer coisa que a impedisse de chorar.

Já havia ultrapassado sua cota de lágrimas nessas últimas semanas.

“Você tem vinte e sete anos agora, Clarke. Já viajou pelo mundo salvando vidas e está a ponto de se tornar tudo o que você almejou, com um hospital para dirigir e uma fortuna que não é para qualquer um. Sabe que pode respirar agora, não sabe minha garotinha?”

Ela engoliu a seco, o nó se raspando em sua garganta. Os olhos claros se ergueram até o rosto de sua progenitora, novamente, contemplativos.

Sim, ela sabia. Entretanto, respirar ainda era uma tarefa árdua para alguém que sente como se estivesse se afogando frequentemente.

“Minha única certeza é que não vou viver para sempre, e não existe nada nesse mundo que eu não daria para ver você abrir um sorriso sincero novamente, um daqueles que você direcionava ao seu pai sempre que ele fazia piadas com um de seus amigos. Você tem tudo o que queria Clarke, então por que não é feliz?”

“Eu sou feliz, mãe. Eu sou.”

Abby levou uma das mãos até o rosto de sua filha, assistindo-a se aconchegar no calor de seu toque.

“Não, você não é feliz há algum tempo.” Seus olhos se esconderam por trás de suas pálpebras por alguns instantes, manifestando seu pesar ao atestar aquela constatação. “Essas crises de ansiedade acontecem para te lembrar de que ninguém é capaz de ser forte o tempo inteiro. Você não precisa carregar o peso do mundo nas suas costas, filha. Não sozinha.”

“Eu sei mãe. Eu estou tentando. Eu juro que estou tentando ser a mocinha, estou tentando não cometer mais erros dos quais eu sei que eu vou me arrepender, mas é tão difícil. Essa culpa... ela me corrói todos os dias. Tudo isso é minha culpa, como eu posso não ser forte o suficiente para aceitar as consequências?”

A mais velha a estudou por alguns instantes, o azul daqueles olhos – os mesmos tão expressivos quanto os de seu falecido marido – eram sólidos, tristes. E ela desejou mais do que tudo no mundo poder sugar toda aquela dor para si, livrar de sua garotinha toda aquela bagagem desprezível que insistia em apagar seu brilho.

Não era para ser assim. As coisas deveriam ser diferentes.

“Talvez não exista mocinhos, Clarke.”

Sua atenção desceu para suas mãos, respirando fundo antes de voltar a fitar o olhar apreensivo de sua mãe.

“Ele estava lá, mãe. No mesmo restaurante, na mesma noite, apenas algumas mesas de distância.” Suas lembranças criavam vida diante de seus olhos, o canto de seus lábios se curvando debilmente. “O cabelo está mais curto, mas é o mesmo. O sorriso que ele estava direcionando para aquela mulher, aquilo me lembrou de que poderia ser para mim. Aquele era meu sorriso, entende? E eu estraguei tudo. Ele nunca vai me perdoar quando souber mãe. Nunca.”

“Clarke, olhe para mim.” Abby segurou seu queixo, forçando-a a encara-la. “Não foi sua culpa, não foi. O que aconteceu foi algo trágico, poderia ter acontecido com qualquer pessoa.”

“Mas aconteceu comigo, mãe. Aconteceu comigo e ele sequer sabe que...”

“Então conte para ele!” A voz levemente exasperada subiu algumas notas, se acalmando assim que notou o quanto ela parecia desorientada. “Não precisa ser um segredo só seu, ele também tem direito de saber. Então conte! E se não te perdoar, talvez seja porque ele realmente não te merecia em primeiro lugar.”

Clarke ponderou por alguns segundos, as gotículas ardendo em seus olhos como fogo.

Era incrível como ela era capaz de vestir a culpa e o luto como uma armadura, permitindo que eles a destruíssem de dentro para fora se aquilo impedisse as pessoas que ela amava de enxergarem o que realmente se passava dentro de seu coração.

“Se passaram cinco anos, Clarke. As pessoas mudam, elas evoluem. Se continuar se sentindo dessa forma, deixando que essa culpa continue te consumindo, não vai jamais ser capaz de superar tudo isso. Como eu vou poder viver em paz sabendo que você está tão infeliz? O que acha que Jake te diria agora?”

A mais nova hesitou, as safiras azuladas se suavizando conforme a voz de seu pai emergia em sua mente, trazendo ao seu coração um pouco do conforto que só ele era capaz de lhe oferecer.

“Ele diria para eu ser sincera comigo mesma e ouvir meu coração.”

Abby sorriu, puxando-a para seus braços como costumava fazer sempre que ela tinha um sonho ruim. Ela beijou os fios dourados de seus cabelos, inalando o aroma floral que eles emanavam.

“E então?”

Clarke escutou o coração de sua mãe batendo contra seu ouvido, sentindo a paz saciar seu ser como não acontecia há tempos.

“Eu vou procurar Bellamy e contar para ele tudo o que ele precisa saber.” Ela se afastou para encarar sua mãe diretamente, o vislumbre de determinação se refletindo no rosto de Abby em forma de sorriso.

“Muito bem.” Seus lábios beijaram brevemente a testa de Clarke, antes que ela se levantasse, recompondo-se.

Depois de todas aquelas palavras, o desconhecido não parecia tão assustador.

Uma única esperança se alimentava dentro de si, e essa seria de que Bellamy Blake estivesse disposto a ouvi-la.

O resto a vida daria conta de resolver.

 

 


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Notas finais do capítulo

"If I'm on that list, you're on that list. Write it down or I will." BAMMMMMMMMMM. MIC DROP!
Bellarke, meus padawans. Bellarke em todo canto! Que semana linda pra estar viva!

Sabe quando você guarda as coisas com você por muito tempo? MUITAS COISAS. Tipo, uma bagagem gigantesca dos mais variados sentimentos. Você vai passar a ficar sobrecarregada, não? Em algum momento seu corpo vai agir, e é justamente isso o que aconteceu com nossa princesa. Cara, que foda foi escrever essa cena. E eu sei que esse capítulo foi BEM dramático e esse final bem misterioso, mas olha, os dias desses dois adjetivos estão contados. Esperem por essa conversa, as coisas vão melhorar. O que vocês acham que Clarke tem pra falar com o Bell? Acham que só sentimento retraído todos esses anos ou algo a mais aconteceu? Hmmmmmmm. Quero ver o que vocês tem em mente!
E KANE? QUE COINCIDÊNCIA FOI ESSA????? E agora gente? Será que ele também vai surtar? Eu particularmente AMEI essa parte do capítulo, julguem. A Gina super inocente nessa confusão toda, tá igual pinto no lixo coitada, hahahaha. Muitos tiros estão próximos, segurem a marimba monamus! Fala épica da nossa mama Griffin na série, digna de ser encaixada nessa conversa maravilhosa das duas. Evoluíram tanto!

O trecho da música lá no início é Lionheart, da Demi Lovato. MUITO BELLARKE ESSA MÚSICA, GENTE AMO.

E então, o que me dizem? Dúvidas? Sugestões? Xingos? TEORIAS? Tô esperando vocês nos comentários, uh? Cada um que eu recebo é um tombo que eu levo de puro amoooooooooor. Não sabem como me deixam feliz com o feedback de vocês!

#HailBellarke! Bejim bejim, tchau tchau! Que a Força esteja com vocês sempre.