Your Selection - Fanfic Interativa escrita por Soo Na Rae


Capítulo 26
Marie Mimeuix


Notas iniciais do capítulo

Boa leitura :3



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/593724/chapter/26

Capítulo 25

Marie

“A paciência é a riqueza dos infelizes” – Camilo C. Branco

Adele – Skyfall

Esperou por vinte e dois minutos, antes que alguém abrisse a porta do orfanato, pela primeira vez. Era apenas um bebê, envolto de um pano sujo e maltrapilho, chorando enquanto a chuva abafava sua voz fina e irritante. Esperou quarenta e três minutos até que seu nome fosse chamado na lista dos órfãos. As tranças louras pendiam de ambos os lados dos ombros, quatro lindas madeixas, uma linda menina. Filha de uma prostituta morta e de um aristocrata qualquer. Ou seria uma prostituta qualquer e um aristocrata morto? As especulações. Não sabia em qual acreditar. Esperou cinco anos, até que chegasse a idade suficiente para ser considerada um estorvo. “Ninguém adota uma criança de doze anos”. Mas sorria, acenava e via seus amigos irem embora. Enquanto se tornava a mais alta entre eles, novos chegavam ao lugar dos antigos, e a cada ano se despedia de mais. Esperou duas horas para a primeira entrevista de emprego, naquela lanchonete barata. As baratas andavam pelas paredes, e o chão cheirava a urina e cuspe. Os pratos outrora brancos estavam amarelados e ela não ousaria nunca beber algo nos copos da despensa. Esperou. Sua vida foi uma eterna espera. E não podia concordar em esperar mais. Por sorte, toda essa espera lhe deu tempo para pensar, tempo para arquitetar. Era óbvio que teria dezoito anos quando a Seleção começasse, e então se inscreveria. Porque não nasceu para aquilo. Não nasceu para apodrecer em um apartamento de dois cômodos, não nasceu para ser rejeitada por todos os casais que passavam pelo orfanato. Ela não nasceu para aquela merda. “Marie”, do francês “Senhora Soberana”. “Aquela que ocupa um elevado lugar”. “Primeira realeza”.

– Sabe, Abby, eu sou uma pessoa que... Tem uma grande paciência. Para esperar... Qualquer coisa. Desde que venha. – sorriu, gentilmente. Como sempre fizera. “Apenas sorria. Não importa. Sorria”. – Mas você me enganou. Você me fez esperar algo que não veio. E isso me deixa triste.

– Eu posso explicar, Marie. – Abigail, como sempre, sobrancelhas abaixadas, lábios em uma linha. Intacta. “Ela não sabe atuar”. Odiava-a. Odiava todo o seu direito de viver. Odiava seus cabelos. Odiava sua pele. Odiava sua família. Odiava seu dinheiro. “Sempre teve tudo. Ela não sabe o que é esperar por algo que nunca vem”. Sorriu.

– Eu tenho certeza que pode explicar, Abby. E você é minha melhor amiga. Por isso eu posso ouvir. Mas eu não quero ouvir. – segurou as mãos dela. – Eu quero que você me ouça. Tudo bem?

– Claro. – a resposta curta era comum. Já havia se acostumado com aquilo. Uma frieza agradável. Odiava seu carisma.

– Ótimo. Quando eu tinha... Bem, alguns dias de vida, ou algumas horas, fui abandonada diante da porta de um orfanato. Eu quase morri de frio, mas graças a Deus a mulher que cuidava do orfanato me encontrou. Pode parecer um pouco “normal” a história de que uma criança foi abandonada na frente do orfanato, mas... Não é. Crianças abandonadas não são amadas. É uma lei que eu aprendi. Muito provavelmente, minha mãe trabalhava em um bordel, e morreu. Meu pai era alguém que freqüentava o lugar, e provavelmente não sabe que eu existo. Tecnicamente, eu fui deixada a minha própria sorte. – sorriu, intensificando a sua voz suave. – Eu vi muitas outras crianças vindo. Órfãos, na maioria das vezes. Perderam os pais em incêndios, acidentes de carro, uma lista infinita de possibilidades. Mas... – riu – Ninguém nunca foi abandonado. Você sabe o que é ser a criança que tem, na ficha do seu nome, escrito: Abandonada? Isso assustava qualquer pessoa que ia adotar. “Por que ela foi abandonada? Será tão terrível? Provavelmente uma má influência”. – observou o olhar morto de Abigail. – E quando viam que minha mãe era uma prostituta... Bem, eu nunca fui adotada. Eu vi todos, indo embora. Alguns ficavam três meses, outros dois anos. Mas nunca ficavam tempo demais. Eu passei minha vida lá. Vendo-os ir embora. Recebendo os novos órfãos. Você sabe o que é ser a mais alta? O que é olhar para todos ao seu redor, chorando, implorando por suas mães e pais que estão mortos? Mas ninguém sabia se meus pais estavam mortos. Apenas que não me queriam.

– Eu...

– Cale a boca. Uma vez na vida, cale a boca, Abigail. – resmungou, enquanto encarava-a. – Então você cresce. Porque o tempo não para. E de repente você tem doze anos, e todos sabem que é impossível uma garota de doze anos ser adotada. Eu implorei para ficar no orfanato. Eu poderia ir para uma fábrica qualquer, trabalhar. Poderia ser abandonada na rua, para pedir esmola. Ou poderia ir para um bordel, como minha mãe fez. Porém a mulher que me trouxe para dentro do orfanato aquele dia de chuva, a mulher que me viu crescer, se apiedou, e me deixou ficar no orfanato. Então, ele fechou. As dívidas eram altas demais, as crianças não estavam mais sendo adotadas como antes, e mais órfãos vinham. A Guerra piorava tudo. Alguns pesos mortos devem ser cortados. O governo não iria mais conseguir bancar o orfanato e as crianças iriam para... Algum lugar. Mas eu tinha quinze anos. Eu nunca mais vi a mulher que me amava, por mais que não fosse minha mãe. Nunca mais vi os órfãos. Comecei a trabalhar em uma lanchonete que cheirava a mofo. Meu salário era de trinta euros por semana. Eu comia lá, mas a comida sempre me dava dor de barriga. Eu dormia em um apartamento de dois cômodos, infestado de ratos, dividindo-o com um rapaz que também trabalhava na lanchonete. Pagávamos o aluguel juntos. E na maioria das vezes ele era legal. Então ele disse “Você paga muito pouco pelo apartamento. Eu tenho de arcar com a eletricidade e a água. Está na hora de você pagar um pouco disso”. Mas é claro que eu não tinha dinheiro para pagar. – observou Abigail por alguns segundos – Você quer saber o que ele me pediu?

– Não.

– Bom. Eu me recusei, claro. Ainda não tinha chego ao meu limite. Como eu disse, tenho uma paciência invejável. Então eu me mudei para um quarto na lanchonete, que os funcionários usavam como despensa. Dormia no chão, com uma jaqueta, botas e um cachecol. Ah, claro, não esqueçamos as baratas, o mofo e todos aqueles copos, pratos, latas de farinha e óleo. Tudo vencido. Não sei como a lanchonete ainda não tinha sido fechada. As condições de higiene eram péssimas. – sorriu. – Então... Minha colega de emprego recebeu a carta para a Seleção. Mas eu não existia para o governo, eu não tinha um endereço. Jamais receberia a carta. – respirou fundo – Então eu roubei a carta dela, preenchi com o meu nome, e me inscrevi. De repente existe uma menina chamada Marie Mimeuix na França, que quer disputar o coração de algum príncipe. É claro que eu inventei um sobrenome qualquer, e expliquei que era órfã. Então eu esperei uma semana. Uma semana para saber se minha vida iria mudar, ou se eu continuaria ali, convivendo com as ratazanas, e com as insinuações maliciosas de meu chefe. Mas o que era uma semana, para uma garota que esperou dezoito anos para ser adotada? Para ser amada? Para receber o mínimo de... Calor? Uma semana, para mim, era como piscar os olhos. Mas aquela semana, foi a pior de todas. Os dias pareciam milênios. Eu queria saber se tinha sido escolhida, eu precisava saber por mais quanto tempo agüentaria. Por mais quanto tempo eu esperaria. Então eu vim para a Rússia. E conheci você. E eu odeio você, Abigail. Porque você é o total oposto. Você tinha uma família. Você tinha pessoas que te amavam o suficiente para preferirem morrer a ver você chorar por elas. Tinha dinheiro. Fama. Irmãos. Beleza. E mesmo assim, você escolheu fugir do amor. Decidiu se esquecer deste sentimento. Enquanto eu procurava por ele, enquanto eu queria se amada, você se escondia. E eu não posso admitir isso. Não posso admitir que alguém que teve tudo o que eu não tive, recue diante de algo que vale... Que vale a vida.

– Então não é mais minha amiga?

– Eu nunca fui sua amiga. – agora não estava mais sendo gentil. Não sorria. Não agia como se nada no mundo importasse, porque importava. “Eu nunca quis ser sua amiga. Eu só queria ele.” – Eu só te usei, para me aproximar do Nikolai. Aquele acordo, foi parte do meu plano. – sorriu – Algumas pessoas me chamariam de inteligente, outras de astuta. Eu prefiro pensar que sou... Estrategista. Mas você jogou todo o meu plano em um grande buraco. E agora, eu tenho de fazer tudo de novo. Você me fez perder um tempo valioso, Abigail. Um tempo em que eu tive de esperar. E por mais que eu seja paciente, tudo tem um limite, certo?

– Então não é mais minha amiga? – ela repetiu, encarando-a. Abigail... Pobre Abigail.

– Agora, eu sou sua melhor amiga. – Marie sorriu, pela primeira vez, de verdade. – Agora você não tem mais nada do que eu queira. Você... É como eu, certo? Digamos que... Eu te perdôo por me trair hoje. E por me trair amanhã. E por me trair pelo resto da minha vida. Eu te perdôo. Mas eu não vou aceitar, como venho aceitando todos estes anos. Quieta. De cabeça baixa. Você ainda não tem ele, e eu ainda posso tê-lo. Então seremos rivais.

– Tudo bem. Rivais. – Abigail olhou para as próprias mãos. – E eu parei de fugir do amor.

– Muito bom. – sorriu, sentindo o gatinho se aninhar em seu peito. Marie o abraçou, e então abraçou sua amiga. – Isso é muito bom, Abby. Porque você, pela primeira vez, não está mentindo.

– Você também não está mentindo agora.

– Sim. Sim...

Deitou-se. O gato ainda em seus braços.

– Vamos dormir. Ainda falta muito para o café da manhã. – disse, e Abigail se deitou também. Puxou as cobertas para cima, e permitiu que Abigail a usasse também. O gato adormeceu primeiro, e pela respiração de ambas, nenhuma dormiria muito cedo. Marie ainda encarava as camas ao lado. Onde outras meninas dormiam. Meninas que também lutavam pelo príncipe, por qualquer um deles. Desde que os conseguissem.

Respirou fundo. Tinha de arranjar uma nova estratégia. “Uma nova estratégia, para a minha vida já feita”. Marie tinha tudo planejado. Passava horas pensando nas palavras que diria. Inclusive nesta conversa. Falar a Abigail como se sentia, e que elas poderiam ser amigas mesmo com todo o resto. “Por que todos vêem meu rosto e pensam que podem abusar de minha boa vontade?”, sorriu. Ela parecia tão boazinha assim? Apenas sorria, Marie, sorria e você conseguirá tudo o que quer. Nasceu para aquilo. Nasceu para ganhar. Logo faria parte da realeza. E toda a sua vida na sarjeta seria esquecida, enquanto ela vestia um lindo conjunto costurado a mão, com um colar de pedras preciosas, filhos correndo pelos corredores do castelo, um rei para amar na cama e tudo o que quisesse, estalando os dedos. Uma Rainha. Era o que seria. Algumas pessoas nascem na realeza. Outras nascem para a realeza. Não era coincidência. Ela não tinha dezoito anos à toa. Conseguia sentir isso. Não morreria em uma rua, não morreria pedindo esmola, infectada pela Praga.

Lembrou-se dos olhos de Ameillie, a senhora que a trouxe para o orfanato. Uma velha doce, gentil. Que havia dado a Marie todo o amor que ela já recebera na vida. Ameillie revirando os olhos, os cabelos brancos caindo, deixando exposta a sua cabeça rosada. Os lábios salivando, enquanto as pupilas se dilatavam. A dor consumindo suas veias, seu sangue se tornando negro. A alma ardendo, enquanto corroia. Ácido. Era ácido. Os ossos se tornavam pó, esfarelando-se dentro da pele. Amarrada a cama, ela morria, lentamente, gemendo. Delirando. Chamando pelos nomes de órfãos que ela já havia criado, que ela havia cuidado até que fossem adotados. “Mas ela nunca chamou meu nome”. Aquela maldita velha se lembrava de todos, então porquê não se lembrava da menina que encontrou na chuva, a menina que ela cuidou até ter quinze anos, até se tornar uma mulher? A única pessoa que vinha visitá-la no hospital.

“É isso o que eu recebo, me importando com você?”. Marie sorriu. Se importar com as outras pessoas... Para quê? O mundo era egoísta. E num mundo egoísta, os egoístas se dão bem.

Yvette Mimeuix


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado da Marie, eu gostei u.u Ela é aquela vadea que põe fogo no circo, hahahahaha. A foto não é dela, realmente, mas de uma atriz muito famosa nos tempos passados. Enfim. Promoção!
#Nikail
#Nikarie
#Mikhail (Mikhail + Abigail)
#Mikharie
#Mikhalia (Mikhail + Natalia)
#Adanique
#Adash (Adam + Ashley)
#Adole (Adam + Nicole)
#Adamber (Adam + Amber)
#Isette
#Isarina
#Lotsuko (Louis + Mitsuko)
#Lonny (Louis + Anny)
#Lottie (Louis + Charlotte)
Escolham. O casal mais votado (apenas um casal por voto), ganhará capítulo especial. Caso empate, eu decidirei. u.u Beijos.



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Your Selection - Fanfic Interativa" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.