– Nico já acordou. - O médico anunciou. Todos se levantaram.

– Posso ser a primeira a falar com ele? - Thalia perguntou baixo e envergonhada.

– Não... - Clarisse começou, irritada, mas foi interrompida.

– Pode. - Percy respondeu. Clarisse olhou incrédula para o garoto, que não se abalou. - Thalia é, provavelmente, a primeira pessoa que Nico quer ver agora. Mesmo que fossemos antes, ele não nos daria atenção.

– Mas ela é a causadora disso tudo! - Clarisse retrucou. Chris colocou a mão no ombro dela.

– Clary, não importa. - O garoto disse calmo. - Não para Nico.

Clarisse suspirou, derrotada. Thalia acompanhou o médico sem pronunciar mais nenhuma palavra. O doutor indicou a porta do quarto de Nico e saiu. A garota hesitou antes de abrir a porta. Nico estava encostado em dois grandes travesseiros e sorriu fraco ao vê-la, mas logo depois seu sorriso se desfez.

– Onde você estava? - Perguntou. Não estava bravo, seu tom mostrava preocupação. - Eu fiquei preocupado. E me senti culpado, te deixei lá sem nenhum jeito de voltar para casa. Me desculpe, eu não deveria ter feito aquilo.

Thalia estava segurando as lágrimas. Como, depois de tudo o que ela tinha feito, ele poderia estar sendo tão atencioso? Ela não olhou para ele, encarava seus próprios pés.

– Diga alguma coisa. - Ele pediu. - Por favor, Thalia.

Thalia levantou o rosto, olhando para o garoto. Nico se surpreendeu, ela estava chorando.

– O que foi? - Perguntou mais preocupado ainda. - Olha, eu sei que eu...

– Vim aqui desfazer o trato. - Ela pronunciou interrompendo-o. - Você não precisa mais cuidar de mim.

– Mas Thalia... - Ele começou, mas era tarde. Thalia já se virara e andava até a porta. Olhou para ele mais uma vez antes de fechar a porta.

Ela voltou para a sala de espera e olhou para aqueles que estavam ali.

– Annie, me empresta seu carro? - Perguntou com a voz rouca por causa do choro. A loira foi até ela e a abraçou, mas Thalia não se mexeu.

– O que aconteceu, Thals? - Annabeth perguntou. Thalia soluçou.

– Só me empreste seu carro. - A morena pediu. - Eu juro que te devolvo amanhã.

Annabeth a entregou a chave do carro, ainda confusa. Thalia saiu dali sem falar nada para ninguém.

Os presentes ali na sala decidiram que Mary, Clarisse e Percy seriam os próximos a ver Nico. Andaram até o quarto e encontraram Nico tentando se levantar a qualquer custo, mas ele estava tonto e quase caiu. Percy correu para ajudá-lo.

– Deita ai. - O de olhos verdes mandou colocando o amigo de volta na cama.

– Mas eu preciso ir atrás dela, Percy! - Nico olhou para o amigo com desespero nos olhos. Um desespero que os três que estava ali não viam há muito tempo.

– O que aconteceu? - Clarisse perguntou. Ela controlou seu impulso de querer matar Thalia, no momento queria, mais do que tudo, ajudar Nico.

– Eu acho que ela terminou comigo. - Respondeu balançando a cabeça confuso. Clarisse puxou a manga do casaco, escondendo suas mãos. Tinha essa mania. - Eu preciso ir atrás dela, ela não tem para onde ir!

Mary fez um pequeno som abafado e Clarisse molhou os lábios. Estava completamente dividida internamente. Fechou os olhos e suspirou, sabendo que poderia se arrepender de sua próxima frase.

– Eu vou atrás dela. - Decidiu abrindo os olhos. Todos a olharam surpresos e Clarisse se sentiu mais nervosa ainda. - Eu sei que é importante para você que ela não vá embora.

Percy deu um pequeno sorriso para a garota e Nico a olhou com tanto carinho que ela se sentiu como quando o conheceu, quando era apenas uma garotinha abandonada. Ela devolveu o olhar para o amigo.

– Obrigada. - Ele sussurrou tão baixo que ela quase não ouviu.

Clarisse se virou e andou até a porta. Só algumas pessoas sabiam o quanto aquele gesto significava vindo dela, incluindo Nico. Ela foi até a sala de espera e todos a olharam ansiosos.

– Ele está bem. - Disse, então olhou para seu namorado. - Chris, você pode me ajudar? Eu... eu preciso fazer algo.

– É claro. - Ele andou até ela, tirou uma de suas mãos de dentro da manga do agasalho e a entrelaçou em sua própria mão. A garota andou até a saída e ele a acompanhou sem fazer nenhuma pergunta. Ela entrou no carro e ele foi para o banco do passageiro. Ficaram em silêncio por algum tempo, enquanto ela dirigia, até que em alguma hora, Chris resolveu se pronunciar:

– Onde estamos indo, Clary? - Ele perguntou calmo.

– Para o apartamento de Nico. - Respondeu sem desviar o olho da estrada. - Preciso falar com Thalia.

– Clary... - Chris começou em tom de reprovação. Clarisse olhou para ele.

– Não é para o que você está pensando. - Ela interrompeu com um sorriso bobo, pensando em como ele a conhecia. - Vou conversar com ela no lugar do Nico, para entender o que aconteceu.

"Eu quero que você venha comigo caso eu não me segure. Meu objetivo não é espantá-la."

Chris a olhou orgulhoso, com um sorriso. Devolveu o sorriso um pouco sem graça. Mesmo depois de dois anos de namoro ela ainda não estava acostumada com aquelas demonstrações de carinho como sorriso, mãos entrelaçadas e beijos roubados, ainda mais quando elas eram em público.

Finalmente chegaram ao prédio onde Nico morava. Ambos subiram até o andar que o apartamento ficava, mas Clarisse pediu para que Chris ficasse na sala.

A garota bateu na porta duas vezes antes de abri-la. Sabia que Thalia estava ali por causa do carro de Annabeth no estacionamento. Ela andou até o quarto da garota, e como imaginou encontrou-a chorando e arrumando algumas coisas numa pequena mochila.

– Se você pretende sair daqui, recomendo levar mais coisas. - Ela sugeriu, dando um pequeno susto em Thalia. - Posso entrar?

A outra garota assentiu, ainda surpresa. Clarisse andou até a cama e se sentou.

– Se você está aqui para jogar na minha cara que eu sou a culpada por tudo o que está acontecendo, não precisa, eu já sei. - Thalia disse rispidamente. Clarisse suspirou.

– Eu estou aqui por causa de Nico. - Ela explicou calma. - Não vim brigar com você. Olhe, eu sei que você está se sentindo culpada, e que grande parte disso é culpa minha, me desculpa, eu estava nervosa, Nico é um dos meus únicos amigos de verdade, eu estava assustada com a possibilidade de perdê-lo.

– Não se desculpe, você estava certa. - Thalia afirmou. - Toda vez que Nico tenta me ajudar eu só trago problemas para ele, por isso quero me distanciar.

– Eu já me senti assim, sabia? - Clarisse contou. - Não só com Nico, mas com Percy e com Chris também. E, por muito tempo, eu tentei magoá-los para o próprio bem deles, mas isso nunca funcionou. Uma vez que você entra na vida de alguém e ela se importa com você, é como se fosse um bumerangue, mesmo se você sair de perto, essas pessoas vão voltar. Eu aprendi isso da maneira mais difícil.

"Todos esses anos convivendo com Nico me fizeram conhecê-lo quase como a mim mesma. Eu tenho certeza que tem algo a mais além de seu namoro, mas não quero saber o que é, se ele quiser, ele me conta. E tenho certeza que ele se importa com você, muito. Eu poderia contar no dedo quais são as pessoas que Nico sofreria um acidente e mesmo assim iria estar preocupado mais com a pessoa causadora do que com si mesmo. E você é uma delas."

Thalia ouvia tudo atentamente, enquanto soluçava e lágrimas caiam.

– Ele não quer que você vá. - Clarisse continuou. - Por isso, mesmo que você decida sair para sempre da vida de Nico, converse com ele antes. Se você não der certeza de que ficará melhor sem ele, Nico nunca te deixará em paz. Eu sei disso melhor do que ninguém.

"Sabe, eu fui a primeira amiga de Nico. Eu não sei o porquê, mas ele resolveu que queria se aproximar da garota sem amigos e assustadora do primário. Aquele chato me atormentou por semanas seguidas, sem se importar quando eu batia nele com meu lápis, ou quando eu o xingava. Ele resolveu que queria ser meu amigo, e nada no mundo o fez mudar de ideia com relação a aquilo."

Incrivelmente, Clarisse chorava.

– Eu nunca tive uma vida fácil, tive milhares de problemas com a minha família, e eu não queria que Nico fizesse parte daquilo. - Ela continuou, secando as lágrimas na manga da blusa. - Mas mesmo assim ele fez, porque ele é teimoso. Muitas e muitas vezes eu o magoei com palavras, mas ele sempre estava ali quando eu precisava, mesmo quando eu não falava para ele.

"Por isso, Thalia, eu estou aqui, falando tudo isso para você. Porque Nico sempre me ajudou, e eu quero retribuir isso, mesmo que minimamente."

Thalia, que antes olhava para a bolsa que tinha nas mãos, olhou para Clarisse.

– Obrigada. - Ela agradeceu. - Eu vou tentar conversar com ele.

Clarisse sorriu para ela.

– Ele vai ter alta amanhã de manhã. - Ela explicou. - Se quiser eu fico aqui com você até ele chegar. Você precisa distrair a cabeça.

– Eu prefiro. - Thalia admitiu. - Tenho certeza que se eu ficar sozinha vou acabar mudando de ideia.

– Então vou falar para o Chris que ele pode ir embora. - Clarisse se levantou. - Pedi para que ele viesse, para o caso de eu querer tirar sua cabeça de seu pescoço.

Thalia deu uma risada. A outra andou até a sala, onde Chris assistia televisão. Ele a olhou.

– Tudo bem, eu a fiz ficar até Nico voltar para casa. - Ela respondeu a pergunta silenciosa do garoto, que sorriu. - Eu vou ficar aqui, tudo bem?

– É claro. - Ele se levantou e deu um longo selinho nela. - Vou voltar para o hospital, Nico pode querer saber dessa notícia.

– Vá com meu carro. - Clarisse entregou a chave do carro para ele. - Amanhã eu pego a moto de Nico emprestada.

~^~

Nico estava ansioso para chegar em casa logo. Chris tinha dito para ele que Clarisse ia passar a noite lá, com Thalia, e que ambas estavam mais calmas, mas Nico só conseguia pensar no pior, ou seja, Thalia espancada e Clarisse sumida.

Mary tentou acalmá-lo o caminho inteiro, mas ele estava inquieto.

Para sua surpresa, as duas dormiam no sofá, com a televisão ligada. Ele sorriu com a cena e pediu que Mary as acordasse, enquanto ia tomar um banho.

Quando voltou para a sala, Clarisse já tinha ido embora (e com a moto dele), e Thalia estava sentada no sofá. Os dois se encararam por um momento, ambos sem saber o que falar.

– Me desculpa. - Thalia pediu. - Por ter falado aquelas coisas para você, por ter deixado você preocupado e pelo seu acidente.

– Está tudo bem, Thalia. - Ele disse. - Me desculpe por ter deixado você lá.

– Eu te considero um amigo, Nico. - Ela continuou. - Um grande amigo. E eu me senti tão idiota por ter dito aquilo! E você parecia tão magoado, por isso que eu quero ir embora, eu não quero te magoar mais.

– Se eu ganhasse uma moedinha a cada vez que alguém me magoa com palavras, eu estaria rico. - Nico riu. - Estou bem, na realidade. Eu falei com Annabeth depois da briga que tivemos, ela me disse que você geralmente fala coisas da boca para fora quando está brava.

– Obrigada por tudo o que você tem feito, Nico. - Ela agradeceu. Nico a abraçou.