Para Sempre escrita por Queen Of Darkness


Capítulo 19
Chove Lá Fora




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Arlen despertou dois dias depois da visita de sua mãe. Ele abriu os olhos lentamente e percebeu Gina adormecida, com a cabeça repousando em sua cama, a mão dela segurando a sua. Já era tarde da noite e decidiu não acordá-la. O elfo estava triste. Tinha consciência do que deveria fazer. O encontro com Ithriel tinha sido curto, mas esclarecedor. Não deveria mais deixar de lado os sábios conselhos da senhora da Floresta Escura. Ele, Arlen, vinha agindo cegamente, insistindo em ocupar um espaço que nunca esteve vago. Pensou em Harry. Era um rapaz corajoso, forte, poderoso, justo, amigo. No começo, gostara dele, embora desconfiasse que o bruxo não fora com a sua cara. Havia algo nele que vibrava fortemente. E Arlen não tivera capacidade de descobrir o que era até a noite em que se tornara mortal. Ali sentira o tormento de Gina, a angústia desde o momento em que o jovem surgira na Toca. A alma da garota estava tão agitada que parecia um mar encapelado. Sua postura e atitudes, no entanto, davam a impressão de uma certa altivez. Mas, graças à sensibilidade de elfo, podia notar que aquilo era só fachada. Por dentro, Gina estava perturbada.

No início, aquilo o assustou. Arlen chegou a imaginar que a jovem estivesse assim exclusivamente por se sentir pressionada devido à abdicação da imortalidade. Sim, havia a pressão. Mas não era só isso. Por um momento, viu que Gina dirigira um olhar furtivo para uma das mesas onde estavam seus irmãos. E nesse instante captou um sinal agudo de tristeza. Como se fosse o lamento de um soldado que recebe o golpe derradeiro. Antes que pudesse fazer qualquer coisa, os Weasley pediram que tocassem sua flauta. Tentou recusar ou adiar a performance, só que os convidados insistiram. Naquele instante, sua mãe se comunicara com ele, pedindo que lhe desse a liberdade de chamar Gina para uma conversa. Então, Arlen concordou em tocar. E disse a Gina para levar Ithriel até a sala. Não viu mais nada até o retorno de sua mãe, que fôra avisá-lo do desmaio de sua noiva.

Antes de subir ao quarto de Gina, o elfo se encontrara com a senhora Weasley, que lhe contou tudo o que acontecera. De repente, viu Harry descer as escadas apressadamente e pegar a namorada pela mão, afastando-se. Captou do rapaz um sentimento raivoso e angustiado. Sua passagem foi tão rápida que não pode depreender mais nada. Ao entrar no aposento da jovem, finalmente Arlen compreendeu. Gina emanava a mesma tristeza aguda que revelara ao olhar para a mesa de seus irmãos. O elfo lembrava perfeitamente que Harry estivera sentado lá com Claire. Era isso. Harry. Era por ele que a noiva se desesperava. Era a lembrança dele que Gina carregava no coração quando se conheceram. A moça sempre lhe falara do bruxo com entusiasmo, porém jamais havia demonstrado grandes emoções. Tinha disfarçado bem o sentimento por Harry. Mas isso deveria ter sido possível porque eles não se viam fazia muito tempo. Quando Arlen a pedira em casamento, Harry tinha retornado ao cotidiano de Gina. E retomara o espaço que era seu desde a infância da garota. O mistério estava resolvido. Diante dessa descoberta, o elfo se dera conta de que deveria liberá-la para que ela decidisse o que fazer. Nobre como era, não poderia agir de modo diferente. Desejava ardentemente que Gina o escolhesse. Afinal, era ele, Arlen, quem a amava. E não Harry, que tinha outra mulher. Entregou seu destino às mãos da garota. E em seguida explodira de alegria com o anúcio da jovem de que era ele, Arlen, o escolhido. Naquela noite, quando seus corpos se fundiram, o elfo imaginou que não poderia haver felicidade maior. Pensava que Gina, finalmente, seria dele. Mas estava enganado.

O dia amanhecia. E os raios do sol entravam pela janela aberta. A ruiva mexeu a cabeça, pronta para despertar. Arlen afagou os cabelos vermelhos que tanto amava. Gina abriu os olhos e ficou quieta, recebendo a carícia do elfo. Ainda sem dizer nada, trouxe a mão dele junto aos lábios e a beijou com carinho. Sentia-se calma naquele instante. Só não tinha idéia do que aconteceria em seguida. Foi Arlen quem começou.

- Gina, eu daria a minha vida para todas as manhãs te encontrar ao meu lado, para te ver assim repousando junto a mim.

- Não fale em “dar a vida”. Não depois de tudo que aconteceu. Fiquei com muito medo de perder você.

- Sei disso. Pude sentir sua presença dia e noite. Sua aflição. Mas eu não conseguia sair de onde estava. Foi minha mãe que me mostrou o caminho.

- Ela me explicou.

- Minha mãe é uma mulher de visão. Não se deveria nunca duvidar de seus conselhos. Eu fui tolo o suficiente para duvidar. Reconheço que ela queria me ajudar, mas eu também não queria deixar de tentar. Tentei, perdi.

- Eu também tentei. Quis fazer o que me parecia certo. Mas tudo saiu errado. Não queria te magoar. E magoei. O que eu quis que acontecesse, não aconteceu. O que eu não queria que acontecesse, aconteceu. Sinto muito.

- O que você queria que não acontecesse era voltar a se apaixonar pelo Harry?

Ela enrubesceu. A garota se endireitou e puxou os cabelos para trás da orelha. Arlen ainda estava pálido, mas suas feições demonstravam uma certa tranquilidade. Os olhos azuis estavam tão límpidos que Gina se sentia como se estivesse encarando o céu sem nuvens. Isso a encorajou a abrir o coração.

- Sim. Pena que querer não é poder. Gosto dele há muito tempo, desde que eu era criança. Como ele nunca se interessou por mim, me acostumei a esconder e controlar o meu sentimento. Até achei que tinha esquecido dele. Mas não esqueci. E a coisa ficou pior. Agora não consigo tirá-lo da cabeça. Péssimo, né?!

- Péssimo para mim. Ele vai ficar muito feliz de se saber tão amado - respondeu com a voz rouca, num claro esforço para manter o tom sereno na voz.

- Arlen, ouvi tudo o que sua mãe disse. E eu estou confessando tudo o que sinto. Mas quero deixar bem claro que eu gosto muito de você. Muito mesmo. Tenho certeza de que a gente pode ser feliz.

- Mesmo com você pensando em outro?

- Com o tempo e a distância, isso vai passar. Ao seu lado, sei que sempre terei um companheiro que me respeita e me ama. É mais do que muita gente tem.

- Não me tente, Gina Weasley. Sei que está dizendo isso para me confortar. Eu poderia ser bem egoísta e aceitar a sua proposta de... sacrifício. No fundo é isso. Mas não posso. Existe um ponto em que a dignidade fala mais alto. Tenho de ser digno. Como elfo e como alguém que admira os seres humanos. Eu te respeito tanto e a amo tanto que não posso forçá-la a se sacrificar só para me fazer feliz. O que, de fato, não aconteceria. Eu nunca poderia ser feliz sabendo que você ama outra pessoa e que permaneceu ao meu lado apenas por causa do que fiz.

- Você abriu mão de algo tão sagrado - gemeu com os olhos rasos d’água.

- E isso parece ser mais sagrado para você do que para mim. Não se torture por isso. Eu não ligo. Mas eu ligo para o que você sente. Por isso, me diga com toda a sinceridade de sua alma: você acha que um dia poderá me amar como ama o Harry?

- Acho que ele está longe de me amar como você me ama. Bem longe, até...

- Não foi essa a pergunta. Vou fazê-la de outra forma: você acredita realmente que conseguirá deixar de amá-lo? - perguntou Arlen, desviando o olhar para fora e notando que nuvens escuras se formavam no céu.

- Se eu me afastar de tudo que me prende a ele, acredito que sim.

- E se eu te disser que o que te prende a ele é o seu destino?

- Você me ensinou uma vez que o destino pode ser transformado.

- Muitas forças têm de agir em conjunto para isso.

- Eu sou uma força. Você, outra.

- E Harry Potter, outra. Ainda mais poderosa. Ele te atrai de um modo que eu não posso derrotar. Vocês são como complemento um do outro, como uma energia que alimenta a outra num processo recíproco. Se eu insistir em te levar comigo, você vai se enfraquecer. Mais ou menos como se fosse uma planta que necessita de luz solar diariamente e que subitamente é colocada na sombra. Ela não consegue crescer, nem frutificar.

- Parece que você está me empurrando para ele. Não te dói isso? Elfos estão imunes a esse tipo de sentimento? Acho que eu morreria se estivesse abrindo mão de alguém que amo, se estivesse falando metade disso para... Ah, eu não sou tão nobre!

- Quem quer ser nobre? - replicou Arlen, com os olhos marejados e as mãos tremendo. - Um elfo quando está triste faz uma canção e se isola na floresta. Quando chora, o faz num dia de chuva, comungando seu estado de espírito com a natureza. Eu não posso fazer nada disso enquanto estiver aqui. Preciso te libertar e me libertar. Só assim poderei voltar à floresta e cumprir o meu destino.

- E qual é esse destino? Você não pode mais ser um senhor élfico - chorou Gina.

- Também não me importo com isso. Meu destino é ficar na floresta e cuidar de tudo o que me é caro. Cuide-se, Gina, porque com você eu me importo. E se um dia quiser voltar à terra dos elfos, volte, mas tenha a bondade de me avisar para que eu possa fazer um retiro e me resguardar. Jamais a esquecerei e peço que não se esqueça de mim. Isso me basta.

A voz de Arlen estava embargada. De longe, soou um trovão. Ele se levantou da cama e caminhou até a janela, onde permaneceu de costas para Gina. Durante alguns minutos, ficaram em silêncio. Nessa posição, era impossível que ela descobrisse como ele estava. Não se notavam mais tremores. A jovem foi até o elfo. E se abraçou às suas costas. Ele ergueu a cabeça para o alto, retesou o corpo, aspirou o ar. Aos poucos, o soltou em lento suspiro.

- Agora, vá. Aqui nos despedimos - disse, ainda de costas, olhando para o lado de fora da janela, de onde se podia apreciar um pequeno jardim.

- A gente ainda vai se ver?

- Melhor não.

- Nunca mais?

- Não vamos pensar nisso.

- Então, não podemos ser... amigos?

- Tenha em mim um amigo eterno, mas creio que para o bem da minha sanidade, terei de me afastar por um bom tempo. Se precisar do povo élfico, procure minha mãe. Bem, está na hora de fazer o certo e concluir minha parte na sua história. Adeus, Gina.

Gina se sentia desolada pela maneira como sua relação com Arlen chegava ao fim. Mas reconhecia que era o melhor para os dois. Estava abalada e tinha as pernas trêmulas. Deu-lhe um beijo nas costas e recostou a cabeça nos ombros dele para dizer adeus.

- Quero que saiba que, se já não amasse alguém, você teria sido o dono do meu coração. Essa é a pura verdade - e se retirou do quarto em seguida.

A chuva caiu com força total, cobrindo St Mungus como se fosse uma cascata. Os poucos visitantes que estavam no pequeno jardim do hospital correram para se abrigar. Protegidos do aguaceiro sob uma marquise, os bruxos perguntavam se alguém tinha visto sinal de um pássaro canoro por ali. Estavam ouvindo uma melodia muito triste. Só podia ser uma fênix. Procuraram por todos os lados e só notaram uma sombra numa janela. Era Arlen, que não se preocupara em fechá-la, recebendo a torrente de frente. Suas roupas já estavam encharcadas. Seu rosto, banhado. Mas ele se manteve firme, olhando para longe.

 


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Notas finais do capítulo

Aee, pessoal ta perto mesmo muito perto do fim x.x
(Esse é o Penultimo capitulo)
x.x