I Wanna be Yours escrita por Kisa


Capítulo 1
Único




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A pequena rua em frente a cafeteria possuía seu próprio charme romântico. Não no sentido amoroso da palavra. Nesse caso, vamos dizer que era o contraponto de uma visão austera e metódica.

O lugar era romântico.

O lugar era sublime.

Era possível alguém sentar ali, pedir um café e passar a tarde toda lendo algum dos poemas em prosa de Baudelaire enquanto saboreia a bebida forte. Sentir a alma rasgada pelas palavras, pela cafeína e pela vista dos antigos prédios, com portas de madeira antiga e colorida. As sacadas dos pequenos apartamentos defronte a cafeteria preenchida por diversos tipos de flores.

Calêndulas.

Amores perfeitos.

Orquídeas.

Rosas.

Ao gosto de quem se senta ali e para para apreciar a vista.

Mas quem quisesse também podia apreciar o momento da espera do café lendo outras coisas.

Carolina lia O Restaurante no Fim do Universo.

Ria de vez em quando.

Olhava para dentro – pois havia escolhido uma das mesas da calçada – em busca do atendente, se certificando de que seu pedido não demoraria a chegar.

— Está atrasada. — constatou, não erguendo os olhos para a pessoa que chegava.

— Eu sei. Sorry. — a voz se desculpou, arrastando uma das cadeiras e sentando-se, sem grandes cerimônias.

— O filme já começou há vinte minutos. — outra constatação fatídica. Carolina odiava ter que esperar por ela.

— Você já pediu algo pra gente? — arriscou, meio incerta.

— Fui obrigada, né. Pedi café pra mim. — mudou a página do livro. Página 34. Marvin conversava com Zaphod. Eles tinham se reencontrado após o avô de Zaphod ter feito com que a Nave de Improbabilidade Infinita não tivesse sido atacada por uma nave vogon. Carolina se atentou a fala de Marvin, o robô:

“Num momento eu estava sentado na sua nave me sentindo muito deprimido, e no momento seguinte estava aqui me sentindo totalmente infeliz.”

Carolina fechou o livro.

Esse era um daqueles momentos onde ficção e realidade se tornavam uma coisa só.

Resolveu dar atenção a realidade.

— Pedi um cappuccino pra você também, Amanda. — pousou o livro sobre a mesa, enquanto olhava para a mulher a sua frente. Desviou o olhar quando o garçom trouxe as bebidas.

— Eu sinto muito, muito mesmo. Não era minha intenção deixar você esperando.

— Nunca é. Mas eu sempre estou aqui, quieta, vazia, parada, ficando. — deu um gole no café. Forte e amargo. — Você nunca está aqui pra mim. — o tom era de derrota.

Amanda bebeu um gole do cappuccino como se bebesse um copo de pregos.

Era dura a realidade, mas era o que era real.

Era verdade: ela nunca estava para Carolina.

Sempre com uma desculpa conveniente.

Trabalho.

Faculdade.

Mudança para o apartamento novo.

Talvez Amanda nunca estivesse pronta para o que Carolina tinha a oferecer.

Mas ela não queria mais ficar à deriva. Demorou a cair a ficha, mas ela caiu.

Carolina era o porto onde ela queria ficar ancorada e por isso segurou a mão livre da amante. Os dedos estavam meio quentes devido ao calor da xícara e o calor era bom.

Lembrava as manhãs onde ela acordava sozinha, mas com um sorriso bobo de satisfação por saber que havia alguém esperando por ela.

Aquele tipo de alegria que somente pessoas ordinárias sentem. Uma alegria tão sem propósito que devia ser proibida de ser sentida, para resguardar o coração dos possíveis sofrimentos futuros.

— Me deixa ser sua xícara de café? — indagou com olhos esperançosos. Amanda queria ser a fonte de calor das mãos de Carolina.

— Deixo. — ouviu em resposta — Pode ser mais também. Pode ser aquilo que faz a mão suar ou o coração bater. Pode ser o toque morno numa noite fria ou pode ser o arrepio frio. Pode ficar à vontade, inclusive.

— Ficarei. — sorriu.

Ficaria, sim.

No sentido de permanecer.

No sentido de não mais fugir.

Ficaria, porque valia a pena correr o risco.


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Notas finais do capítulo

Oi de novo.

Obrigada por lerem as coisas que eu escrevo.