Um divã para dois escrita por Tulipa


Capítulo 1
Um


Notas iniciais do capítulo

Prazer, Tulipa. (caso tenham esquecido) Esses dias entrei aqui pra responder um comentário recente numa história bem antiga. E no final dele a leitora pediu "Não para de escrever", mal sabia ela que o bichinho da vontade de escrever já tinha me mordido novamente.Conversando com uma amiga, dessas que fiz aqui, sobre a série Agent Carter ela disse "Podia ter uma série Pepperony, né? Contando tudo desde o começo"Eu respondi "Só se for fanfiction". E foi dessa conversa que o enredo da história nasceu. Boa leitura ♥



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*Pepper*





Terceira Sessão









Eu tinha 22 anos, e há quase um buscava colocação numa empresa que garantisse o meu sustento, não exercer a carreira na qual eu me formaria estava fora de questão, voltar pra casa dos meus pais também, não por ser a casa dos meus pais, mas por causa da cidade. Portland era a maior cidade do Maine, e ainda assim me sufocava. Prestei vestibular pra três universidades, Columbia, Brown e UCLA, passei nas três. Mas Los Angeles era tão mais interessante pra uma garota de 17 anos.





—Sem dúvida.— homem grisalho diante de mim manifestou-se com um sorriso tímido, concordando comigo depois ficar muitos minutos me ouvindo.

Sorrio fraco e mais uma vez volto meus olhos para a porta do consultório, para o lugar vazio ao meu lado e depois para o relógio em meu pulso. 15 minutos do início da consulta, ele não vem. De novo. Volto para o meu monólogo de “Como o conheci e porque vim parar aqui”.

No último ano da universidade consegui um estágio não remunerado numa empresa grande, mas depois das horas de estágio obrigatórias eu decidi não ficar lá, o ambiente era pesado e o salário baixo. Se fosse pra continuar ganhando uma miséria era melhor continuar no meu emprego, pelo menos era mais animado.

—Onde você trabalhava antes?

—Eu trabalhava num bar, servia uns mesas, às vezes cantava.— meu terapeuta me olha sobre o aro grosso de seus óculos e arqueia as sobrancelhas —Clichê, eu sei. — encolho os ombros —Mas era isso que eu fazia.

—E como você foi parar na Stark, como virou assistente pessoal dele?

—Bem, o primeiro cargo na empresa consegui como a maioria das pessoas conseguem, deixei o currículo numa agência e semanas depois fui chamada pra entrevista. Departamento financeiro.

—Financeiro?

—Recém-formada em Administração e Marketing, boa em contas, fui convencida pelo salário, era acima da média.— justifico —Eu já estava há mais de seis meses na empresa quando me mandaram uns relatórios pra revisar, as contas estranhamente não batiam com as do mês anterior. Relatei o erro pro meu chefe. Mais três meses e as contas continuavam a não bater, novamente recorri ao meu chefe, e ao chefe dele, insisti, algo precisava ser feito.

—Tomaram alguma providência? — Dr Hayden mostrou-se curioso.

—Claro que sim, quando o rombo nas contas ficou grande demais me demitiram.




Era uma quarta-feira, véspera do Dia de Ação de Graças e eu estava com passagem comprada pra passar o final de semana em Portland, sempre visitava meus pais nessas datas, estava com saudade deles e, estranhamente, da cidade também, das poucas amigas que deixei lá e até do ex-namorado. Não era fácil não ter ninguém numa cidade que era completamente diferente da que eu cresci. Contei as horas pra que o dia acabasse, só que não acabaria como eu esperava, meu chefe pediu pra que eu ficasse até depois do horário, e eu fiquei. Passava das oito quando meu chefe me chamou na sala dele, o Diretor Executivo da empresa, Obadiah Stane, havia acabado de sair de lá, eu o conhecia só por nome, embora já o tivesse visto pelos corredores, e no elevador algumas vezes. Achava que enfim alguém havia prestado atenção nas contas, mas não. Segundo o meu chefe, estava sendo dispensada porque eu era bisbilhoteira demais. Dá pra acreditar? Eu estava sendo demitida por fazer o trabalho que fui contratada pra fazer. Pisar em Portland logo após ser demitida seria um pesadelo. Senti o gosto amargo na boca e lágrimas teimosas queimavam meus olhos mesmo que eu soubesse que estava sendo vítima de uma injustiça. Mas a quem eu recorreria? Apenas duas pessoas estavam saindo perdendo com isso tudo, eu e Anthony Stark, só que pra ele perder alguns milhões não era nada.

—É você quem está desviando o dinheiro, não é?— perguntei pro meu chefe.

—Eu o quê?

—É claro que é.— eu o enfrentei —Aposto que você nem mostrou os relatórios— acusei —Ele está nisso também?— me referia a Obadiah —Não me surpreenderia se ele estiver metido nisso também.

—Você é maluca, saia da minha sala ou reverto as coisas e te demito por justa causa. De onde você tiraria dois milhões pra repor o desfalque que você deu, hein?

—Eu dei? — pergunto incrédula —Há meses venho tentando falar com alguém sobre a planilha de orçamentos, e...

—Srta Potts os seus serviços não são mais necessários, se dependesse de mim você sairia daqui com uma mão na frente e outra atrás, mas Obadiah tem coração mole e não quer destruir a sua nem tão promissora carreia que está apenas no começo.— ele me sorri, Peter, era bem bonito cabelos e olhos castanho-claros, mas, pelo visto seu caráter era péssimo. Talvez ele estivesse desviando o dinheiro, mas como eu poderia provar?

Com receio preferi não me indispor, a única a perder com tudo aquilo, na verdade, seria só eu. O que eram dois milhões pra uma companhia que faturava bilhões por mês? Depois de nove meses estava prestes a voltar pra vida de garçonete e viver de gorjetas até surgir algo novo. Meu agora ex-chefe tira uma caixa de papelão de baixo de sua mesa e me entrega. Saio da sala volto pra minha mesa e junto as minhas coisas, ainda bem que o departamento está vazio. No hall, aciono o elevador, mas ele parece congelado no 21º andar, andar da presidência, estou no 15º e nem por um segundo penso em descer de escadas. Demora, mas, enfim, o elevador se movimenta. Quando as portas se abrem eu vejo um rapaz, moreno, não tão alto, barba por fazer, tênis, jeans, camiseta, jaqueta de couro, nunca vi ninguém vestido assim por aqui.

—Vai entrar ou não, ruiva?— ele pergunta ao segurar as portas antes que se fechem.

—Vou.— respondo —Obrigada.— entro e me encosto à parede oposta ao lado em que ele está.

—Você é nova por aqui?— ele assunta.

—Quase 10 meses.

—10 meses, como eu nunca te vi?— ele caminha e para encostado ao meu lado.

—Não sei.— respondo —E de hoje em diante a probabilidade de você me ver será ainda menor.— seu olhos imediatamente se voltam pra caixa de papelão nas minhas mãos.

—Chato.— ele sorri sem graça e coça atrás da cabeça. Sexy, ele é muito sexy e cheiroso —Porque?

—Não quero falar sobre isso, não posso fazer nada e nem você.— quando termino de responder o elevador finalmente chega ao estacionamento no subsolo —Boa noite.— eu me despeço.

Como sempre esqueci onde parei meu carro, vou apertando o botão no controle do alarme pra me direcionar pelo som, quando chego perto do meu surrado Honda Civic 95, ele parece ainda mais velho comparado ao carro de luxo ao seu lado. Abro meu carro e antes de dar a partida me lembro do carinha do elevador, nem seu nome eu perguntei, mas não faz diferença, não o verei mais. Ao dar partida ouço alguém bater no vidro, o estranho do elevador está ali fazendo sinal pra mim.

—Você foi mesmo demitida?— ele pergunta quando eu abro o vidro.

—De novo esse assunto?

—Você devia sair pra beber...— ele sugere —Se eu fosse demitido depois de 10 meses de trabalho eu iria querer sair pra beber.— ele diz.

—Obrigada pela sugestão.

—Você vai?

Penso um pouco, seria chato chegar em casa e não ter ninguém pra conversar, a única amiga que fiz está no trabalho, e eu fatalmente choraria por horas se ficasse sozinha.

—Vou.— respondo.

—Comigo.— ele sorri. Onde esse cara esteve nos últimos meses?

—Ok.— concordo.

—Rola carona?— suspiro, reviro os olhos e aceno positivamente, logo ele está dentro do meu carro jogando a caixa com os meus pertences para o banco de trás.

—Você não me disse seu nome...

—Tony...

—De Anthony? Como o dono disso tudo?

—lsso mesmo — ele ri —Você não o conhece, né?

—Nunca vi mais gordo, eu sei que essa gente importante vive na TV e nas revistas, mas não tenho tempo pra acompanhar futilidades, tenho outras prioridades. Faculdade, estágio, emprego que pague as contas, sabe como é?

—Uma garota que não lê revistas? De que planeta você veio?— ele caçoa.

—Portland, Maine.

—Você é uma garota diferente, Srtª...

—Virginia... Potts

—Então, Virginia, você escolhe aonde vamos, vou aonde você for, mesmo que seja um desses lugares ruins com música ao vivo.

—Nem todos os lugares com música ao vivo são ruins.— contraponho.

—Se você conhece algum bom me leve lá.

—Ok.— eu digo ao dar partida.

Depois de alguns minutos de tensão, afinal eu estava saindo com um cara que eu nunca tinha visto na vida e ele poderia ser um maníaco, abusar de mim, me matar, colocar meu corpo na mala do carro e jogá-lo no mar, chegamos ao Ted’s, local onde trabalhei nos últimos anos e Jess, a minha melhor e talvez a única amiga que fiz aqui, está no palco cantando Train in Vain do The Clash. Sentada num banco alto ela bate a mão esquerda em sua coxa acompanhando o compasso da canção enquanto segura o pedestal do microfone com a outra mão, Travis, o namorado e barman, a acompanha no violão, e outras meninas fazem vocalize. —E então?

—Lugar legal.— ele diz. Nós seguimos para o balcão, durante as apresentações o melhor lugar para sentar é lá. Ted, o dono do bar, nunca abandona o balcão, e quem senta lá nunca fica com o copo vazio.

—Eis que a filha pródiga retorna. — Ted me diz sorrindo —Achei que nunca mais fosse te ver.

—Quem é viva sempre aparece, ainda tem lugar pra mim aqui? Talvez eu precise voltar.— respondo.

—Sempre, mas não com essas roupas.— ele me diz e vai atender outro cliente.

—Você trabalhava aqui?— meu novo amigo pergunta, confirmo —Você devia fazer muito sucesso é a mais diferente.

—Diferente?

—Uma ruiva, usando essas roupas.— ele apontou pra uma garçonete que passava, nosso uniforme era um jeans escuro, quase preto, justo, regata preta, com o nome do bar escrito em vermelho estampado no peito. Meus cabelos estavam sempre soltos. É talvez eu chamasse mesmo mais atenção que as outras, a única ruiva no meio de morenas com cabelos em variados tons de castanho, mas nunca tinha pensado nisso. Ted volta e nós pedimos a nossa bebida, algumas garotas saem do palco, mas Jess continua lá, a canção da vez é Satisfaction do Rolling Stones, ela ama os Stones —Queria te ver trabalhando aqui.— ele diz depois de algum tempo.

—Volta depois do feriado.

—Você tá pensando mesmo em voltar pra cá?

—Falta um semestre pra terminar a faculdade, as minhas opções são voltar pra cá ou pra casa dos meus pais.— dou um gole no meu cosmopolitan —Por mais que eu tenha guardado um bom dinheiro, tudo o que sobrava depois de pagar as contas nos últimos meses, não posso me dar ao luxo de esperar outro bom emprego. Além do mais...deixa pra lá, não vou ficar falando da minha vida e dos meus planos pra você, eu nem te conheço.

—Você sabe onde eu trabalho.— ele diz —E meu nome.

—Tony. De Anthony, como o dono da empresa.— ele assenti —Nunca vi ninguém vestido como você lá, você é tipo um office-boy?

—Quase isso.— ele me responde, e vira o restante da sua cerveja.

—E você, era de qual departamento?

—Financeiro.

—Soube que estão passando um pente fino no financeiro, há alguém superfaturando orçamentos, era você?— ele provoca —Por isso te demitiram?

—Como você sabe disso? Há meses eu tô tentando falar com alguém influente sobre isso, eu falei com o meu chefe, mas aquele idiota não fez nada, quer dizer, a única coisa que consegui foi perder o emprego.

—Você alertou seu chefe e em vez de apurar a sua denuncia ele te demitiu?— assenti

—Se ele fez isso é porque o errado na historia provavelmente é ele, não acha?

—Com certeza!— ele se levanta pega a carteira no bolso interno da jaqueta e coloca algumas notas sobre o balcão —Eu adoraria ver você aqui de novo, usando esse uniforme sexy, ainda mais se você estiver cantando, mas com certeza você não pode perder o seu emprego assim.

—Já perdi.

—Não, não perdeu.— ele acaricia a minha mão sobre o balcão e me abandona no bar.

Não sei se devia ter nutrido alguma esperança sobre conseguir meu emprego de volta, mas ela se esvaiu quando no dia seguinte recebi um telefonema do RH pedindo pra que eu fosse assinar uns papéis.






—Mas você foi readmitida, certo?— o terapeuta consegue me resgatar das minhas lembranças.

—Sim, fui, só que eu não fiquei.— olho para a ampulheta sobre a mesa entre o Dr. Hayden e eu, ela marca o tempo da consulta, e o meu tempo acabou —Mas acho que isso fica pra outra sessão, não é?— ele assenti.

—Talvez, seu marido possa continuar a história na próxima sessão.

—Duvido que ele venha.— digo ao me levantar.

Ao sair do prédio na Park Avenue o vento gelado do final do inverno me envolve, caminho por um quarteirão até encontrar um táxi vazio que me leve pra casa. Achei que vir pra Nova York seria bom pra nós, cinco meses, o trabalho dele, o meu trabalho, e a distância entre nós só faz aumentar. E eu, idiota, indo a sessões de terapia para casais, sozinha. E sozinha eu fico até quase onze da noite, quando ele chega. Estou na cama, finjo dormir, enquanto ele vai pro banho, veste o pijama e deita ao meu lado.

—Você foi?— ele pergunta, sabendo que eu não estou dormindo, murmuro uma afirmação —Desculpa ter te deixado ir sozinha, de novo, é que...

—Deixa pra lá, Tony, está tarde.— eu digo e tento não chorar, mais uma vez.

—Tudo bem, boa noite.— ele me diz, sem um beijo ou um afago nos cabelos, e vira de costas pra mim.

—Boa noite.— respondo, fecho os olhos, e me lembro da nossa conversa de semanas atrás quando finalmente ele concordou com a terapia “Nós precisamos disso mesmo?”, está mais do que claro que precisamos. Mesmo que não resolva, mesmo que seja o fim. No fim, voltaremos a pensar no começo.


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Notas finais do capítulo

Vai ter drama, sim. E vai ter muito Pepperony tbm. Espero vê-las sempre.Beijos, Tulipa.



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