“Quando todos os seus defeitos e todos os meus defeitos

Estiverem expostos um por um

Uma parte maravilhosa da bagunça que fizemos

Nós nos vemos arruinados

Todos os seus defeitos e todos os meus defeitos

Eles estão lá, lado a lado

Alguns nós herdamos, alguns aprendemos

Eles passam de homem para homem

Tem um buraco na minha alma

Eu não posso preenche-lo, não posso preenche-lo

Tem um buraco na minha alma

Você pode preenchê-lo?”

–Flaws (Bastille)

Ela assustou-se com a própria imagem refletida no espelho. Os cabelos castanhos agora caiam um pouco abaixo da cintura, com estranhas mechas mais douradas. Seus olhos não eram mais como antes, agora estavam em um tom de castanho claro ou mel. A menina riu secamente do que via e se afastou do reflexo. Aquele seria o seu primeiro dia inteiro com o novo prisioneiro. Loki. Ouvira que a rainha Frigga havia mandado alguma mobília para que ele ficasse mais "confortável", não que ele merecesse, mas ela entendia o lado da rainha.

A noite não lhe dera descanso, pois sua mente apenas pensava em como conseguiria se aproximar de Loki, mas em primeiro lugar, ela precisaria tentar gostar dele, ou ao menos aturá-lo, afinal, ele ficaria preso por muito tempo.

Rayon ficou presa em seus devaneios enquanto caminhava para seu posto matinal. O lugar estava calmo, os guardas ainda estavam em seus postos, mas pareciam extremamente entediados. Ela dispensou o guarda que ficara em seu posto na madrugada e ficou de pé ao lado da cela.

–Bom dia, Ray. -Disse uma voz alegremente.

Rayon se virou chocada por notar a bela situação em que a cela dele estava. Tinha algo como um divã, uma mesinha, que por sinal, estava com vários livros.

–Vejo que ainda não acredita que está tendo a honra de vigiar a mim. -Deduziu ele. Rayon olhou-o confusa.

–Engraçadinho, mas não, é só que... isso mal parece uma cela! Quem me dera ter tido esse tratamento aqui.. -Retrucou a menina. Loki andava de um lado para o outro, encarando-a entretido.

–Você já foi presa aqui? E agora está de guarda? -Ele riu alto e bateu palmas- Veja só a que ponto Asgard chegou.

Rayon sorriu, ela estava em uma terrível enrascada. O deus realmente era parecido com ela, ou seja, ela teria duas opções, ou os dois ficariam se provocando o dia inteiro, ou ela teria de tomar uma providencia.

–Rayon.

Ela encarou o deus, ele parecia extremamente incomodado.

–Faça o favor de pedir à minha mãe que...

–Espere, como sabe meu nome?

–O guarda anterior me disse, já disseram que seu nome parece masculino?

–Já disseram que eu não me importo?

Loki riu, o que era estranho, ele achava graça de quase tudo, o que fez Rayon se perguntar se aquilo era real ou só uma máscara.

–Então, Rayon, me permite chamá-la de Ray?

–Não.

–Ótimo, Ray, diga-me, por que ficou presa?

Ela poderia dizer que não era da conta dele, ela queria muito dizer, mas se lembrou de Frigga e respirou fundo.

–Eu explodi cinco casas e pendurei os donos delas de cabeça para baixo perto do penhasco. -Confessou a menina.

–E por que faria isso?

–Eles eram excessivamente irritantes, eu não estava com a intensão de matar ou algo assim, apenas dar um susto foi engraçado o suficiente.

Loki, que folheava o livro em suas mãos, deixou o objeto cair e encarou-a chocado, segundos depois começou a rir como se aquela houvesse sido a melhor piada do mundo, Rayon olhou-o confusa.

–Não sei se entendi o motivo de tanta risada...

Loki olhou-a seriamente por um segundo. As vezes, em raros momentos, ela imaginava ver algo real nele, algo além das brincadeiras e ilusões, mas o que quer que fosse, se esvaia rápido demais. O deus se aproximou dela e sentou-se. Agora, o que os separava era uma grade encantada.

–Quando eu tinha dez anos, quase acidentalmente, coloquei fogo na cortina da casa de Fragal.

A menina olhou-o intrigada. Lembrava-se da casa de Fragal, uma parte era antiga e a outra mais nova, ele nunca dissera o porque, mas agora ela entendia.

–Por que? -Perguntou ela. Ele revirou os olhos e sorriu.

–Ele se gabava da nova casa, dizendo que nem as piores tempestades colocariam-a ao chão, daí pensei, fogo faria isso e, bem, deu certo.

–O pai de todos o puniu? -Loki arregalou os olhos e olhou para ela, como se os dois fossem cúmplices e estivessem partilhando segredos mortais.

–Ele puniria... se descobrisse.

Rayon imaginou que Fragal deveria ter ficado furioso, ainda mais por não ter descoberto quem fizera tal dano. Era claro que Loki era melhor nisso do que ela.

–Mas um dos melhores certamente foi o cabelo de Sif.

Rayon riu com o comentário. Ela se lembrava bem de quando os longos cabelos de Sif eram dourados e perfeitos, mas Loki cortou-os, totalmente. Thor ameaçou contar a Odin, então ele pediu para que os Anões fizessem um novo cabelo para a garota, mas eles disseram que não poderiam fazer como era antes, assim, fizeram para a deusa da guerra madeixas negras feito a noite. Rayon preferia muito mais o cabelo negro de Sif do que o antigo, mas a deusa jamais perdoara Loki pelo ocorrido.

–Melhores? Ela quase te matou!

–As melhores travessuras são as que nos levam para perto da morte, não concorda?

–Ah, isso certamente é...

E assim se sucedeu. Uma tarde. Um dia. Uma semana. Loki e Rayon partilharam suas mais loucas travessuras. Ficavam horas a fio rindo e conversando e foi aí, em meio à essas horas, que ela o conheceu. Ela encontrou uma pessoa por trás do deus das travessuras. E ele encontrou alguém como ele, algo que achava impossível. Rayon ainda não gostava de Loki, mas deixara de odiá-lo, o que era bom, ela pensava.

–Como ele está? Digo, realmente... vou visitá-lo, mas não sei como ele se sente com... -Perguntou a rainha. Rayon sorriu ao ver a preocupação em seus olhos.

–Ele está bem, Majestade, só tente entender que deve ser difícil descobrir-se filho de um dos inimigos do homem que pensava ser seu pai. Ainda não sei qual é a posição dele sobre isso, mas imagino que...

–Obrigada. -Disse Frigga. Rayon não entendeu o porque a rainha dissera tal palavra.

–Obrigada?

–Eu conheci uma Rayon fria, talvez, mas agora vejo ainda mais em você, parece sorrir com mais facilidade agora, assim como Loki. Creio que apostei certo ao achar que vocês dois se dariam bem.

–Nos damos bem, na medida do possível, é claro. -Retrucou a menina.

–Senhorita Rayon, Loki pediu para chamá-la. -Falou um guarda, adentrando a sala. Rayon olhou para a rainha, que assentiu.

A menina correu em direção à prisão. Temendo que algo ruim houvesse acontecido.

–O que...

–Por que demorou tanto? -Reclamou o deus, não tirando o olhar de seu livro.

–Por que não para de reclamar? Mas diga, o que foi?

–Como pode ser possível que um garotinho...

–Espere! -Interrompeu a garota, notando a situação. Ela bufou de raiva e fitou o deus- Loki... diga para mim que não me chamou aqui para falar sobre o seu livro...

–Claro que não! A chamei porque quero retratar o quão ridículo pode ser um personagem. -Falou Loki. Ele parecia extremamente satisfeito com o seu motivo, Rayon não sabia se ficaria irritada ou riria do deus em sua frente.

–Achei que fosse algo importante.

–Veja, Rayon, minha cara, seu nível de importância não é importante, mas o meu sim.

–Loki, eu estava falando com sua mãe...

–E eu estou falando com você. E parece ser a única disposta a escutar, então sugiro que sinta-se honrada pois estou lhe expondo minha opinião.

Rayon riu e suspirou.

–Você sempre expõe sua opinião, Loki, mesmo quando ninguém quer saber qual é.

–Mas você quer saber qual é. -Disse ele, tentando intimidá-la- Ou não viria correndo até aqui.

Ela desejou ligar para Jane e dizer que ela mesma daria um tapa em Loki, mas não o fez. Apenas se aproximou da cela e encarou o deus.

–Diga-me sua opinião, Loki. -Disse a menina com cansaço em sua voz, enquanto o outro sorria vitorioso.

–Pois bem, como eu dizia, o garoto...