Tempestuoso escrita por babsi


Capítulo 14
Capítulo 14: Todos pecadores


Notas iniciais do capítulo

Um capítulo calmo para nos dar fôlego para o que pode estar por vir...



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Capítulo anterior: "Caio de joelhos no chão, soluços saindo de meu peito, assim como um peso de meus ombros. Enfim havia acabado. Terminus queimou."

THEA POV:

Finalmente eu choro.

Não eram lágrimas rasas, de tristeza branda e raiva profunda. Eram lágrimas de alívio, saudade.

Fortes, pesadas, descendo quentes em meu rosto, como navalhas.

Choro por Red, por Amber, Alex e Mary. Choro por Gareth.

Sinto saudades de antes, mas também choro de alívio pelo depois. Um depois sem Terminus, sem mortes em minhas costas.

Enfim o Santuário havia queimado.

As lágrimas quentes e grossas lembrando que não foi por mera vingança. Gareth me pertencia pois ele só tinha a mim.

Não era somente uma reivindicação insignificante. Era reivindicar para mim a responsabilidade. Era reivindicar para mim o acerto de contas.

Gareth pagou pelo que fez. Eu fui sua juíza e fui seu carrasco. Sangue do seu sangue. Só eu tinha o direito de fazê-lo pagar.

As penas nesse mundo não consistiam mais em julgar, aprisionar. Já estávamos todos aprisionados em um mundo em que não havia saída. A única coisa que nos dava controle sobre quem éramos, sobre nossas vidas, era o poder sobre vida e a morte. A morte eterna.

Talvez, mais do que um castigo, morrer fosse um modo de perdoar. Livrar a pessoa do sofrimento que é viver no meio de toda a dor, de toda a perda.

Morte pelas mãos e pelos dentes. Morte por armas e por facas.

Sinto uma mão quente em meu ombro, um choro baixo em meu ouvido.

– Terminou. - Michonne me abraça, as palavras saindo com dificuldade.

Gareth havia nos separado e nos unido.

– Está tudo bem, Thea. Acabou. - ela afaga meus cabelos, me apertando mais em seu abraço.

Choro por Andre. Choro por Mike. Choro por Mich e todas suas perdas.

Choro por Sasha e por Bob.

E depois as lágrimas parecem secar.

"Talvez você já tenho chorado todo seu estoque, querida", minha mente dá de ombros.

Suspiro. Havia terminado.

Levantar a cabeça e seguir em frente, continuar a ter esperança. Era tudo que nos restava, era tudo que nos tornava diferente dos errantes.

Ty passa por mim, o corpo de Sasha em seus braços. Ele me olha sereno.

Talvez pensasse o mesmo que eu. Talvez também acreditasse que Sasha estava em paz, junto de Bob em algum lugar melhor, ou talvez só em algum vazio, dormindo para sempre.

Dormir é sempre bom.

Olho para o corpo de Gareth a meus pés. Um saco de carne, assim como todos nós.

– Tenho que enterrá-lo. - digo para Michonne. - Esse é só Gareth, meu primo. Não é mais todo aquele ódio e crueldade. É só o corpo de alguém corrompido. O Gareth de antes merece essa dignidade.

Ela concorda, se levantando. Faço o mesmo, vendo Rick se aproximar.

– Tyreese vai enterrar Sasha atrás da igreja. Vou ajudá-lo.

Ele coloca uma mão em meu ombro, um aperto de solidariedade. Reviro os olhos, abraçando-o com vontade. Ele parece se assustar um pouco, mas acaba por aceitar o abraço, me envolvendo como antes meu pai fazia.

– Obrigada, Rick.

– Obrigado, Thea. - responde, me afastando com gentileza, indo atrás de Ty.

Não precisávamos dizer o porquê de estarmos agradecendo. Só o fato de estarmos vivos já bastava.

Padre Gabriel aparece, saindo do quarto a passos trôpegos. Ele arregala os olhos ao ver o massacre em sua igreja. Pisca várias vezes, como se não acreditasse no que via.

– Isso... Isso... O que vocês fizeram... - se assusta, sem palavras - Essa é a casa do Senhor!

– Não, Padre. Isso aqui é apenas um lugar com quatro paredes e um teto. - Maggie diz, de forma categórica.

O homem de Deus continua ali, assustado demais para se mover.

(...)

A noite dava sinais de que estava em seu fim. Sento na escada, minhas roupas cheia de sangue seco e terra. O vento gelado do outono sopra forte entre as árvores, nos lembrando que o inverno chegaria em pouco tempo e nós agora estávamos de volta a estrada.

Pelo menos dava para tirar algo bom disso tudo: eu não passaria esse inverno sozinha.

Ouço as escadas rangerem com o peso de alguém, viro minha cabeça só o suficiente para ver quem era.

Daryl não me sorri, nem mesmo uma repuxada de lábios. Se senta a meu lado sem muito enrolar, o rosto fechado e a expressão cansada. Ele cavara covas a noite toda, devia estar só o trapo.

– Você parece estar uma merda. - digo simplesmente, olhando para o monte de mato a minha frente.

O mundo era só mato mesmo.

– Você não está muito melhor. - retruca, com seu modo grosseiro característico.

Reviro os olhos, jogando o cabelo cheio de terra para trás.

– Daryl, eu sou uma lady, eu sempre estou melhor que qualquer pessoa.

– Não foi uma boa ideia deixar você com uma pá. - ele diz, me ignorando, tirando algo que parecia uma raiz de meu cabelo.

– Inveja sua. Eu sou uma exímia cavadora de covas. - digo, sem muito me importar com o que mais havia em meu cabelo. Não era como se um cabelo arrumadinho fosse necessário no fim do mundo.

Daryl não me responde, só me olha com os olhos azuis em fendas. Não era sua cara de psicopata, mas eu também gostava dessa.

– Está tudo bem? - pergunta, após me olhar em silêncio por um longo minuto.

Sorrio, pensando seriamente em beijá-lo.

– Sim, Daryl. - é só o que consigo dizer.

Ele assente, sem sorrir nem nada. Continua sentado, olhando para o mato a nossa frente.

– Está aí, todo preocupado comigo... Eu acho mesmo é que está apaixonado por mim, Daryl Dixon. - provoco, sentindo o prazer de vê-lo se irritar.

– Cala boca, Thea. Só abre a boca para falar um monte de porcarias.

Sorrio, empurrando-o com o ombro. Daryl me manda um olhar de repreensão, como o bom troglodita que é. Ignoro, deitando a cabeça em seu ombro. Daryl não se afasta.

Ficamos ali em silêncio, observando o mato a nossa frente tremular conforme o vento. Não nos movemos, nem precisamos falar. Só estávamos absorvendo tudo que havia acontecido. Era um bom momento para ficar quieta, e era melhor ainda dividir esse momento com Daryl Dixon.

Penso em Tyreese, ainda ao lado da cova de Sasha, atrás da igreja. Sorrio para Daryl, que não se move e ainda não sorri. Seus olhos me seguem até eu sair de sua vista.

– Ty? - chamo, vendo o homem fincar uma cruz de gravetos sobre a cova de Sasha.

Ele me olha, triste e sereno, um sorriso saudoso em seus lábios, como se lembrasse de algo. Caminho até ele, que continua com o que estava fazendo.

– Eu acho que ela iria gostar disso. - ele diz, batendo as mãos na calças. - Ser enterrada ao lado de Bob... É uma coisa que ela iria querer.

Assinto, olhando para as duas covas recentes.

– Eu não a conhecia muito bem, mas tenho certeza que sim. - sorrio, recebendo seu sorriso de volta.

Logo as pessoas começam a chegar para uma espécie de velório conjunto de Sasha e Bob.

Tyreese tira a touca, diz umas palavras bonitas para a irmã e o cunhado e não derrama uma lágrima.

Padre Gabriel aparece, ainda chocado demais com os acontecimentos, diz algumas palavras sobre o amor de Bob e Sasha, cita um trecho da bíblia e conduz uma reza, sendo seguido nesta por poucos.

O mundo lá fora abala a fé em Deus.

Saio de fininho, dando um último adeus para Bob e Sasha silenciosamente.

Eu tinha um enterro para coordenar.

A cova de Gareth não estava atrás da igreja, não seria justo enterrá-lo lá ao lado de Sasha e Bob, duas pessoas boas, que esse mundo não tinha corrompido.

Me afasto da igreja, adentrando um pouco o mato. Gareth não estava no que o Padre Gabriel chamava de "território sagrado" e isso não fazia diferença nenhuma para mim.

A cova de meu primo não tinha uma cruz de graveto improvisada, nem pessoas para chorar por ele, e eu não podia pedir que elas o fizessem.

Existem dores que as pessoas devem chorar sozinhas. A morte de Gareth era uma delas.

Sento no chão em frente ao amontoado de terra. Com um graveto girando eu meus dedos, eu penso em quando nós éramos crianças. Todas as brincadeiras, todas as vezes que ele, Alex e Red se juntaram para deixar eu e Amber loucas, todos os segredos que dividimos, todas as dores, a morte de meu pai, a morte de seu pai... Ele sempre esteve lá para mim, até o momento em que não esteve mais.

Esse mundo tinha o poder de fazer isso, de deixar as pessoas loucas. Quem poderia apontar o dedo para ele, no final das contas?

Talvez Amber, que manteve suas mãos limpas...

Suspiro, vendo mais um dia amanhecer. O primeiro dia sem a carcaça de Terminus nos seguindo.

Ia ser um dia bom.

– Nós temos que ir, Thea. - a voz de Beth se faz presente.

Me levanto, sorrindo para a mulher a minha frente.

Olho uma última vez para a cova de Gareth. Agora sim, um adeus.

(...)

– Só vou perguntar mais essa vez: vai conosco ou vai ficar, Padre? - Rick pergunta, impaciente.

Estávamos prontos para partir, e Padre Gabriel ainda se recusava a nos seguir, mas não queria que o deixássemos.

– Vocês são pecadores! Defloraram a casa do Senhor! Como pretendem que eu os siga?

Meus olhos se estreitam, sem mais aguentar aquele discurso vazio de quem queria se mostrar como algo que não era.

– Qual o seu pecado, Padre Gabriel? - me faço presente. Seus olhos se arregalam, e ele começa a suar na careca.

– Meu... Meu pecado? Sou um homem de Deus, meus pecados eu deixo na mão do Senhor.

– Então por que ainda se corroê por conta eles? O que te faz tão arrependido, Padre?

Ele não responde, somente olha para trás, para porta da igreja. Rick caminha até lá, vendo o olhar do homem segui-lo de modo aflito.

– Arranhões. - diz, sem muito entender. - Podem ser de errantes, não significam nada.

Daryl caminha até o local, examinando as paredes ao lado.

– Você vai queimar por isso. - diz simplesmente, como se lesse algo.

Nos aproximamos, vendo as palavras gravadas na madeira branca.

– Pelo que você irá queimar, Padre? - a voz de Rick indaga.

Padre Gabriel não responde, somente se deixa entregar por um choro copioso.

– Eu pequei. - diz, entre o choro.

Reviro os olhos. Quem não havia pecado?

– ... Eu não tinha como mantê-los.

– Eles quem, Padre? - Beth pergunta, com a voz suave, porém, impaciente.

– Meu rebanho. - diz, entre soluços. - Quando o surto começou eles me procuraram para se abrigar. Eu não pude... Eu não... Tranquei as portas e janelas da igreja e rezei enquanto ouvia meus fiéis sendo dilacerados pelos carniceiros.

Ficamos em silêncio, sem saber muito o que dizer.

Eu sabia que ele não era confiável, sem falar que aquele relato não ajudava muito com a imagem que eu tinha dos homens de Deus.

– Temos que ir. - Carl diz para o pai, aflito.

Os tiros da noite anterior com certeza chamaram errantes e nós tínhamos que ir antes que a horda que nos atacou em Terminus e na base militar nos encurralasse.

– Ou você vai ou você fica, Gabriel. - Daryl diz, pondo um ponto final no assunto.

Começamos a caminhar, o Padre ficando para trás, ainda envolvido num choro cheio de soluços e tremedeiras.

Reviro os olhos, sem conseguir das as costas para o homem. Ele não tinha culpa de ser um covarde.

– Estamos quites agora, Padre. Descobrimos que somos todos pecadores, então vamos logo embora antes que viremos pecadores e comida. - dou enfase no "e comida", vendo-o arregalar os olhos e limpar o suor da careca com um lencinho.

Ele me segue e vejo Daryl me olhar com os olhos estreitos. Aperto o passo em sua direção, caminhando ao seu lado.

Estávamos todos de volta a estrada agora.


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Notas finais do capítulo

Um capítulo curtinho e levinho, marcando o fim da primeira fase da fic.

Agora eles estão na estrada, winter is coming e os white walkers... Não... Ué

beijos de luz

(vamos terminar essa fase de Tempestuoso com muitos comentários, recomendações e favoritos? plooox!)

(#vooooltaaaaaGOT)



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