Música, Sangue e Eternidade escrita por Countess Dracula


Capítulo 5
Capítulo 5: Um pouco de música e sangue


Notas iniciais do capítulo

Enfim, estou apanhando de 10 X 0 para o novo editor do nyah!, então por enquanto fica assim, ok?=P



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/58753/chapter/5

Já passavam das duas da tarde e Charles Remarque ainda estava deitado em seu caixão. Tinha muito que pensar. Primeiro é claro, havia Goddard. Saiu-se muito melhor do que o esperado e sequer questionara o presente. Tolo! Se soubesse o que havia aceitado!

O rapaz nem sequer imaginava que aquele Stradivarius era enfeitiçado. Ele o encomendara pessoalmente a Antonio Stradivari, e através do hipnotismo fez com que ele utilizasse algo especial na preparação do instrumento: Uma resina feita com um pouco do pó de sua pedra de sangue*.

Agora Andrei estava tão subjugado a ele, Charles, quanto à sua criadora.

Mas nem tudo eram flores e havia também a questão dos descendentes de Caspar Levy. Será que o imbecil havia contado sua história e deixado instruções para vingar a perda de Marion? Com um sorriso cruel, decidiu que não importava. Marion era sua, deixara de bom grado o noivo e a família para trás há mais de cem anos. O máximo que Caspar conseguiria era entregar toda a sua família em suas mãos. Ou talvez não fosse nada mais que coincidência.

Acomodando-se de um jeito mais confortável sobre o sangue no caixão de madeira, voltou a adormecer.

_________________________________________________________

 

Exatamente às três da tarde, quando Andrei começou a treinar. Tocava seis horas por dia, e amava fazê-lo. Sentia a música como parte de si mesmo, como se ela corresse em suas veias. Como sangue.

Isso fez o vampiro lembrar-se de sua vítima, dos seus longos e cacheados cabelos castanhos claros esparramados sobre o travesseiro, de seu suspiro quando ele cravou os dentes em seu pescoço. A garota tinha uma pele perfumada, gostosa de sentir... Olhando para seu amado instrumento, batizou-o pela primeira vez: Edna.

Pensando em sua musa, começou a compor uma doce e suave melodia.

__________________________________________________________

Enquanto tornava-se a musa de um vampiro violinista, a garota tentava febrilmente concentrar-se nos hinos do coral da igreja, do qual fazia parte, mas não conseguia. Volta e meia a música hipnótica insinuava-se em sua mente, fazendo-a esquecer onde estava, seu coração batendo mais rápido. Como Edna desejava estar em outro local! Em companhia de seu misterioso visitante noturno, por exemplo. Sabia que não devia estar pensando nisso. Sua mãe se escandalizaria. Não era certo, não era decente. Mas ele nem ao menos existia, então que mal poderia fazer?

A cantilena desafinada que era a voz do padre e o cheiro sufocante das velas fez com que ela voltasse ao presente bem a tempo de descobrir que era o final do horário. Suspirando aliviada, voltou rapidamente para casa como se a fugir de si mesma.

________________________________________________________

 

A noite chegou de mansinho e com ela uma chuva fininha, calmante.

Depois de duas horas ouvindo Andrei tocar, Marion pôs-se a caçar, saindo antes dos homens. Não que não gostasse de escutá-lo ensaiar, pelo contrário. Mas depois de ouvir pela quinta vez O Danúbio Azul*, ela decidiu que já estava na hora de se alimentar. Havia certos rumores sobre um nascimento em uma família que morava relativamente perto da Mansão Remarque. Estava na hora de visitar a nova criança e ela estava mais do que ansiosa para isso.

A cidade estava terrivelmente escura e a vampira era apenas um vulto na noite. Com um giro em sua aliança, colocando a pedra de sangue virada para o lado de dentro de sua mão, fez as brumas inundarem o chão, tornando mais difícil ainda que a identificassem.

De repente a rua começou a se iluminar. Era um rapaz, segurando um lampião. O jovem era loiro, alto e desengonçado para seus 20 anos, rosto delicado. Seus olhos arregalaram-se ao vê-la. Espantou-se ao ver que os pés pequenos de Marion estavam descalços.

-Perdoe-me senhorita, mas estás bem?

- É senhora. E não estou bem. Poderia por favor, buscar-me um copo de água?

Diante da beleza jovem dela, Roderick esqueceu-se de que tinha saído para verificar se o celeiro estava fechado. Perdera-se ao olhar a pele alva da Sra. Remarque, destacada pelo vestido verde-escuro com decote levemente provocante.

- Claro, entre, por favor!

Era tudo o que Marion precisava.

________________________________________________________

 

Deitada em seu quarto, Edna ouvia a chuva caindo de mansinho no telhado, induzindo ao sono repousante. Ficara acordada até bem tarde, debatendo-se entre ir ou não confessar-se na manhã seguinte. Mas como conseguiria admitir em voz alta que sonhara com algum desconhecido? Certamente isso era obra do mal. De que adiantava guardar isso para si mesma – por mais que quisesse – se perderia sua alma imortal? Por fim, decidiu vencer a vergonha: o que era contado no confessionário, lá ficava.

Principalmente depois que percebeu que quanto mais a noite caia, mais nítida o rosto do homem se tornava. Atendendo ao apelo da chuva, adormeceu.

Lá fora, Andrei posicionou o violino e iniciou o Duplo Concerto Para Violino*.

Desmaterializando-se lentamente, adentrou o aposento. Olhou para o delicado rosto de Edna, para sua sobrancelha fina, seu nariz pequeno e arrebitado. Chegou seu rosto mais perto do dela, fazendo com que seus longos e lisos cabelos tocassem sua testa, arrancando-lhe um suspiro.

Ela remexeu-se, sem abrir os olhos. Virou o rosto para o lado esquerdo, dando-lhe uma melhor visão de seu pescoço. Mais devagar ainda, baixou sua boca até encostar-se a sua pele, mas não sem antes de abrir-lhe um pouco a austera camisola e afastar-lhe os cabelos ondulados. Sentiu seu cheiro antes de cravar-lhe os dentes.

A respiração dela foi ficando cada vez mais difícil, o coração batendo mais fraco e ele decidiu parar. Por aquela noite. Teve o cuidado de não deixar cair sequer uma gota –  fosse na camisola rosa da garota, ou em seus lençóis brancos.

Andando em direção à janela, recomeçou a tocar, sendo Second Waltz*, dessa vez. Virou-se apenas mais uma vez em direção à sua vítima, apenas para sussurrar com sua voz possante:

-Até o próximo encontro, minha cara. Enquanto isso tenha bons sonhos.

E desapareceu, desmaterializando-se aos poucos, executando a valsa de Shostakovich.

______________________________________________________

A casa para qual Marion fora convidada era madeira velha, desbotada e sem pintura. Quando Roderick empurrou a porta, ela raspou no chão de terra batida, as dobradiças enferrujadas fazendo um barulho desagradável. Lá dentro estava escuro e o cheiro que pairava no ar era enjoativo de comida rançosa.

- Me desculpe o mau jeito, mas minha mãe está doente, e meu pai foi à cidade vizinha chamar o médico.

- Jura? Estão desprotegidos aqui?

Antes que o rapaz pudesse responder, a vampira puxou-o pelo pescoço e sugou-o. Morreu sem entender o que lhe acontecia.

A casa era um único cômodo e ela perguntou-se como a mãe do rapaz não acordou com o barulho. “Crianças pequenas devem realmente cansar” – eis tudo o que ela pôde imaginar no momento. Como um felino, aproximou-se de onde estava a cama de casal, afastando com bastante calma os cabelos suados da mãe, também bebendo-lhe o sangue. Teve que segurá-la com força, pois no momento em que sentiu-se sufocar, a mulher tentou lutar, sem sucesso, pela vida.

No momento do último suspiro da mãe, o bebê acabou acordando aos berros, como que intuindo o destino que o aguardava. Limpando o sangue da boca, Marion foi até ele, pegando-o delicadamente no colo, como uma mãe prestimosa. Olhou para o contraste da manta verde-claro do bebê com o verde-escuro do seu vestido e cinicamente começou a cantar, ninando-o: “Alas my loue, ye do me wrong, to cast me off discurteously: And I haue loued you so long .Delighting in your companie. Greensleeues was all my ioy, Greensleeues was my delight:Greensleeues was my heart of gold, and who but Ladie Greensleeues.”**

Decidira levá-lo vivo a Charles. Um pequeno mimo ao marido ...

E que a cidade se desesperasse depois. Isso pouco lhe importava. De mais a mais, estava na hora de voltar a aterrorizá-los.

 

Continua...


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

*Pedra de sangue: A literatura fala sobre essa pedra de diversas formas: Alguns dizem que ela é um amuleto para o caçador de vampiros, outros que é um amuleto para o vampiro. Atribuem a pedra diversos poderes, mas farei a minha versão. Lógico que alguns dos poderes dela poderão vir das lendas, mas por enquanto, não. Um filme legal (e muuuuuuito trash) que também conta a sua versão para a pedra de sangue é o "Bloodlust - Subspecies", que infelizmente tem vários títulos em português. Eu o conheci por "Volúpia Sangrenta". Na verdade não é só um filme, e sim uma série de filmes. Acho bem legal, e é meio antiguinho...
* Danúbio Azul: Valsa de Johann Strauss II
*Duplo Concerto Para Violino ou Concerto Para Dois Violinos: Composição de Bach. Eu sei que o concerto é caracterizado pela relação entre os dois solistas de violino, mas me pediram para deixar o Andrei tocá-lo e eu deixei assim mesmo. Espero que não se importem.
*Second Waltz: Composição de Shostakovich.
* Marion canta Greensleeves, brincando com o título da canção e suas vestes. A letra está no inglês médio e não no atual. =)
 
;*