O Doador de Sonhos escrita por Emanuel Hallef


Capítulo 7
Ato VII - Sentia dentro de si um animal perfeito


Notas iniciais do capítulo

Esse capítulo mexeu muito comigo e foi muito, mas muuuuito bom escrevê-lo. Espero que o amem!

Ah e por favor adicionem essa história aos seus favoritos, isso me ajudará muito e me motivará a continuar :)



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Já estava anoitecendo e as crianças, agora, amontoavam os brinquedos e as filas começavam a se formar. Tudo aconteceu tão rápido e instantâneo, que Tom se perguntou de onde aquelas crianças surgiram, levando em consideração que estavam em um parque de diversões abandonado, aparentemente, e que não havia casas, aldeias ou se quer pessoas habitando aquela ilha. Mas, em contra partida, o menino estava fascinado com aqueles brinquedos a sua volta. Ficou, em pequenos intervalos de tempo, imaginando como seria sentir a sensação de experimentar cada brinquedo daquele parque, mas percebeu que Aurélio havia adiantado os passos, e Tom só ouvia as pessoas exclamarem, gritarem e berrarem à medida que Aurélio abria o caminho por elas.

— Já chegamos? — perguntou Tom finalmente, sendo erguido para galgar os degraus de pedra da roda-gigante.

— Sim, meu caro amigo Tom, já chegamos! Agora me diz... — o velho soltou a mão do garoto e se ajoelhou, sorrindo, com as expressões abertas, soltas, sem nenhuma falta de alacridade — Alguma vez você já viu um espetáculo de luzes?

O garoto, sem entender muito bem o que Aurélio queria dizer, apenas balançou a cabeça negativamente e esperou por alguma explicação, que não veio e que não viria, pois o velho se levantou, ainda sorrindo, se aproximou de uma máquina de caça níquel muito velha, tão velha que Tom se perguntou quantos anos aquele brinquedo poderia ter, e apertou um botão quadrado na parte esquerda da máquina e, imediatamente, na mesma velocidade que piscamos os olhos, o que era um espaço escuro, se tornou um show de luzes e fulgores que iam além de qualquer imaginação humana. A verdade era que nenhum parque de diversões no mundo poderia copiar aquele espetáculo.

O carrossel, que antes se limitava as suas próprias cores: vermelho-morango, roxo-uva e verde-limão, se acenderam como a luz de um farol, e Tom sentia-o como uma pessoa, sentia-a com a mesma agudeza que ele quando a noite caia e vagava por aquela areia molhada da praia, onde Aurélio o encontrou, e depois trilhando os encanecidos e abotoados cômodos vazios da cabana do velho senhor, sem que nem mesmo um único eco do passado — de Aurélio e até mesmo do pobre garoto — pudesse vencer a barreira do tempo, atravessando o espaço para lhe fazer companhia. E, com isso, lembrou-se dos seus pais e do quanto ficaria feliz se o tempo fosse estilhaçado e que eles pudessem retornar. Mas aquilo fazia parte de um desejo impossível, improvável e sem fundamentos, pois, agora, mais do que nunca, o menino teve a convicção que estava órfão. E que as chamas que reluzia em sua mente fazia parte do sacrifício do seu pai.

Atordoado e se sentindo triste, o menino virou o rosto para à esquerda, onde as luzes do carrossel se tornaram vultos para darem espaço aos fanais únicos da montanha-russa.

Tom teve a leve impressão de que a montanha-russa movimentava-se triste, meio demente de saudades. Parecia que carregava aquelas crianças por capricho e obrigação, e que, ao contrário do que transparecia, a ausência de sentimentos —, pois o menino também percebeu que via aqueles brinquedos como se fossem pessoas e que eles tivessem gênio e até coração — acabou por fazendo-a cair dentro da noite e daquelas luzes fantásticas e surreais, como um brinquedo qualquer e que não merecia ser usado — não por crianças. Parecia loucura ter aquelas impressões e Tom virou, novamente, seu rosto para à direita, onde o mágico fazia seus truques e arrancava risos das várias crianças que o observava. Pareciam felizes, algumas delas até pulavam e se atrepavam em bancos para ver o mágico melhor. Ele era um sucesso e Tom percebeu o porquê: Ele não fazia mágica barata, amadora, ele fazia mágica de verdade mesmo. Não retirava coelhos da cartola, como vemos em filmes e em desenhos, ele simplesmente erguia sua varinha de condão, atiçava-a no ar e, de repente, surgia borboletas diferentes das que estamos acostumados a ver no nosso mundo real. Ou, até mesmo, em séries e filmes americanos. Eram borboletas com grandes, imensas asas, quase transparentes, que evolviam com fios prateados o corpo do inseto, passando-se por vestido, como se estivesse indo para alguma noite de gala. Outra vez, o mágico balançou sua varinha e de lá saiu coelhos, sim, saiu coelhos e Tom deu alguns passos em direção do show. Estava sendo atraído, da mesma forma que abelhas são atraídas pelo mel, mas Aurélio segurou sua mão e o fez parar.

— Ele nunca se cansa de fazer isso! Amanhã eu prometo que te levo para ver seu show. Mas, agora, preciso que me ajude — disse o velho homem, levando Tom de volta aos degraus da roda-gigante — Está vendo que esse brinquedo é o único do parque inteiro que está velho e mal-acabado? Perceba que as crianças só querem os outros, enquanto esse, a grande e épica roda-gigante, fica de lado como se fosse restos e que não merecesse atenção. O que é mentira, todos sabemos que é mentira. Se quer saber, Tom, essa roda-gigante um dia foi o brinquedo mais usado do parque. As crianças não queriam saber dos outros, tampouco do show do mágico. Elas queriam mesmo era se aventurar nas cabines dessa roda-gigante e serem transportadas para mundos e universos completamente diferente do que estamos costumados a ver. Isso se chama fantasia e imaginação, coisas que só saem de uma criança. E você, Tom, é uma criança!

O menino pensou um pouco sobre aquilo, mas fora interrompido por um sentimento muito forte, que lembrou-lhe que devia ajudar seus pais...

Antes de continuar, leitores, deixem-me explicar algo. Percebam que no início Tom veio a roda-gigante com intuito de pegar as ervas medicinais que o curaram para levar aos seus pais, certo? Que ele tinha certeza e poderia jurar de pés juntos que seus pais estavam vivos. Mas, ainda pouco, quando olhou para os parques e sentiu vontade de se divertir, caiu a ficha e ele se conformou que seus pais haviam morrido e que ele precisava seguir em frente. Para, agora, ao ouvir o que Aurélio falou, voltar ao sofrimento e da necessidade de voltar e salvar seus pais. Isso será explicado ao decorrer da história, mas, adianto-lhes, não será agradável saber o por quê.

— Preciso das ervas para levar aos meus pais, eles precisam de mim, senhor...

— Tom, eu falei que ia ajudar seus pais, não falei? Peço que confie em mim. Se fizer isso, juro que ajudo seus pais.

Toda preocupação que antes o atormentava, pareceu sumir, mas dessa vez sumiu de verdade, sem deixar nenhum rastro — Sim, senhor, tudo bem, mas preciso que faça promessa de dedinho...

Aurélio gargalhou, ajoelhando-se e fitando o garoto de frente. Ergueu sua mão esquerda, mostrando-lhe seu dedo mindinho — Eu prometo! — e então a promessa se firmou com a inocência de um simples aperto de mindinhos — Agora, Tom, vamos?! Temos muito trabalho pela frente — Aurélio se levantou, começando a andar em direção a uma cabine com as portas quebras e uma delas solta — Temos um brinquedo para colorir.

Então Tom voltou a se preocupar, mas não com os pais, agora ele se perguntava como poderia reformar um brinquedo tão grande se ele não passava de uma criança — Senhor, não tenho tamanho para ajudá-lo. Tenho apenas sete anos de idade...

O velho parou, sorriu outra vez, ergueu uma sobrancelha e retornou onde Tom estava, ajoelhou-se de novo, segurou nas duas mãos do menino e sussurrou — Ai está o segredo, Tom, você é apenas uma criança...

Perceberam que Anne não apareceu, certo? Mas essa é a sensação que a própria menina sente. Ela vê tudo, ela ouve tudo, mas não pode tocar, não pode falar, é apenas uma plateia muda e invisível, que serve apenas para sentir tudo que o menino sente. Ela continua ao lado de Tom, mas você não pode vê-la...


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Notas finais do capítulo

Meu outro mundo paralelo: emanuelhallef.wordpress.com