Dois Quartos de Vinho escrita por Ninguém


Capítulo 20
Estava saindo do elevador


Notas iniciais do capítulo

Olá, querido leitor. Seja bem vindo! Puxe uma cadeira ou deite no sofá, tome um chá ou coma uma pipoca. Enfim, sinta-se a vontade e tenha uma ótima leitura.



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Lia estava saindo do elevador, indo em direção ao seu apartamento, quando ouviu uma voz atrás de si.

— Voltando da religiosa caminhada?

Ela se virou e viu Rafael se levantando do chão, onde antes estava sentado, indo ao seu encontro sorrindo.

— Porra, Rafael, quer me fode me beija. Que susto!

— Aceito a proposta. - Ele respondeu rindo.

— Tava fazendo o que ai se esse nem é seu andar?

— Te esperando, é claro.

— E o que você deseja?

— Você. Tem como?

Ela revirou os olhos. Começou a se lembrar do porquê de odiar tanto aquele homem, mas, para seu próprio bem, resolveu esquecer um fato há anos enterrado.

Se aproximou mais da porta mas o rapaz a deteve.

— Desculpa, brincadeirinha matinal. Posso falar com você?- O silêncio da outra fez ele prosseguir - Preciso de um favor.

— Hum.

— Minha chave quebrou na fechadura e pra variar o porteiro não pode resolver, chamei um chaveiro só que o tempo de espera é de uma hora. Posso esperar no seu ap. enquanto isso?

— Vai pedir para os seus amiguinhos drogados.

— Lia, por favor, uma horinha que seja.

Lia revirou os olhos mais uma vez, queria deixar Rafael mofar do lado de fora, porém alguma coisa a fez ter compaixão pelo rapaz, talvez o bom humor resultado do dia anterior.

Quando seu chefe a chamou e lhe ofereceu uma folga, Lia ficou pensando o que faria em plena sexta-feira, não era de sair, pelo menos não de tarde, e iria ficar jogada em sua cama até a hora de ir para a Tropeços, se não fosse por um convite irrecusável de um certo humorista irresistível.

— Então?

A voz de Rafael a fez voltar a realidade. Percebeu que estava rindo sozinha e então franziu o cenho.

— Entra logo, vai.

Ela abriu a porta e assim que ele entrou já a trancou, ia colocar a chave em cima da mesa como de costume mas achou melhor ficar com ela na mão, precaução para algum blefe do outro.

Era a primeira vez que o jovem entrava no apartamento de Lia, era parecido com o seu só que mais mobilhado e arrumado. Uma pequena cozinha a sua esquerda com azulejos portugueses e uma mesa redonda para quatro pessoas, do outro lado a sala de estar, com dois sofás pequenos, uma TV suspensa por um painel e as paredes pintadas de um tom coral, ao fundo as portas dos prováveis quartos, banheiro e lavanderia.

Lia apontou para um dos sofá, para que ele se senta-se e enquanto ele o fazia ficou observando-o, apoiada no outro sofá. Assim que ele a olhou, com um sorriso amarelo, ela cruzou os braços e voltou a fechar a cara.

— É... sobre a gente...

— Ai Rafael, por favor foi só um beijo será que dá pra esquecer isso? - Sua voz estava exaltada.

— Não é isso Lia, eu tava falando da época que a gente...

— Por favor Rafael, não.

Ela o interrompeu mais uma vez. A ultima coisa que queria era que aquele assunto voltasse para lhe assombrar. Só queria esquecer, já havia esquecido e agora seguia sua vida normalmente, escondendo suas magoas do passado.

— Só queria dizer que você é incrível, Lia, e que eu sinto muito.

— É, eu também...

Ficaram em silêncio por um longo tempo, ela não queria conversa, só queria que o maldito chaveiro chegasse logo e que aquele desgraçado sumisse de seu apartamento.

O toque do celular da jovem foi quem quebrou o silêncio. Assim que Lia viu quem estava ligando mordeu o lábio tentando conter o sorriso, olhou rapidamente para seu hospede indesejado, que por sua vez desviou o olhar, se levantou e foi até a janela, só então atendeu.

— Alô? - Ela disse em seu tom mais simpático.

— Lia? É o Elídio.

— Olá Sanna, tudo bem?

— Isso é injusto, ainda não sei seu sobrenome, mas sim estou bem.

— E a que devo a honra de sua ligação? - Ela falava o mais baixo possível, não queria que Rafael escutasse a conversa, mas deixa-lo sozinho na sala estava fora de cogitação.

— Bom, se eu não ligar você também não liga.

— Quanto drama. - Ela disse fazendo-o rir.

— Liguei pra saber se você está bem e para perguntar se está livre na quinta a noite.

— Faculdade. - Ela cantarolou.

— Mas você já faltou tantas vezes, inclusive para sair com um completo desconhecido que poderia muito bem te sequestrar, o que custa faltar mais uma? -

Ela riu, mas assim que se lembrou de Rafael conteve-se.

— Custa meu diploma de direito. Desculpa Sanna, mas eu já faltei bastante nos últimos dias.

— Então como vou te ver?

— Hm... não vai?

— Garota, você é cruel demais.

— Eu sei. - Era difícil para ela conter um sorriso.

Lico a gente já sabe que você tá apaixonado, mas será que dá pra largar esse celular por um minuto e ajudar aqui?— A voz soou um pouco longe e apesar de ser masculina, Lia sabia que não era de Elídio, talvez de Anderson.

Lia ouviu algumas risadas ao fundo segundas de um "vai se foder, Anderson", de Elídio o que a fez rir ainda mais.

— É...

— Acho que fiquei um tanto quanto confusa com esse final.

— E eu fiquei um tanto quanto envergonhado. Como foi o ensaio ontem? - Ele perguntou rapidamente, mudando de assunto.

— Foi ótimo! Hoje mesmo vamos apresentar a peça para um diretor de teatro.

— Tomara que ele goste. E qualquer dia desses eu posso assistir um ensaio?

— É... não, quer dizer... ah Elídio você entende né, ninguém além desse diretor pode ver a peça, nem mesmo o ilustre humorista Elídio Sanna.

— Ah esse ilustre humorista não tá com nada mesmo, hein?! - Ele falou brincando.

 

Lia ia responder, porém ouviu um barulho na porta, se virou e percebeu que a amiga havia chegado. Sorriu para ela e suspirou de alivio.

— Espera ai, você tá me ligando do Paraná?

— Sim.

— Por que?

— Saudades, talvez? - A jovem sorriu, ainda era difícil acreditar em tudo aquilo - Vou ter que desligar que o pessoal aqui já está me ameaçando de morte.

— Não tem problema, tenho que me arrumar pra ir pro teatro.

— Depois a gente se fala e boa sorte na peça. Quero ir na estreia, viu?!

— Pode deixar que te dou um ingresso e obrigada.

Ela desligou e se voltou para Aline.

— Ainda bem que você chegou. Cuida desse encosto ai que eu preciso sair.

— Oi?

— Pede pra donzela explicar tudo, oferece um copo d'água ou sei lá um pedaço de bolo. - Ela completou a frase e foi para o banheiro tomar banho.

 

— Boa sorte lá. - Aline disse quando a amiga já estava se preparando para sair.

— Obrigada!

— É Lia, boa sorte.

— Vai se ferrar, Rafael. - Falou batendo a porta.

— Queria saber porque ela te odeia tanto. - A loira disse se dirigindo ao jovem.

— Nem queira Line, nem queira...

...

Quando chegou a Tropeços todos já estavam presentes, com exceção do tal diretor de teatro que, até então, ela não sabia quem era.

O palco estava um caos, todo mundo corria de um lado para o outro tentando fazer diversas coisas ao mesmo tempo, arrumando o cenário, varrendo o chão, limpando as cortinas, testando a sonoplastia e fazendo treinamento vocal - mesmo sabendo que não participavam da peça - enquanto Faletti esbravejava ordens aparentemente estressado.

Lia caminhou lentamente até o canto esquerdo do palco, onde Pedro estava repassando o texto, parou ao seu lado e deu uma risada contida.

— Que confusão! - Falou o mais baixo possível.

 

— Faletti meu querido amigo, como vai?

— O diretor. - Pedro sussurrou para ela assim que o homem apareceu.

— José Henrique, seja bem vindo a minha humilde escola. Pronto para ver a peça que mudará sua vida? - Aquele homem podia ter vários defeitos, mas todos assumiam que era um bom ator, segundos atrás sua cabeça fervilhava de ódio e agora parecia tão sereno quando um bebê.

— Pois bem, então que comecem. - O outro respondeu se sentando em uma poltrona da primeira fila.

Assim que a apresentação chegou ao fim, as cortinas se fecharam e Pedro e Lia saíram do palco.

— E ai? Você acha que ele se interessou pela peça?

— Sei lá, mal consegui pensar nisso.

— Você não pensa em sair daqui, né Lia?

— Já pensei Pedro e já decidi, assim que essa peça acabar eu saio da Tropeços.

— Não Lia, você não pode. Vai me deixar?

— Não posso te arrastar comigo como se você fosse uma criança. E outra Pê, já passou da hora de eu procurar algo que me dê futuro realmente e se depender daquele idiota eu vou mofar aqui. - Disse referindo-se ao diretor da cia.

— Gente, você estão sendo chamados lá na plateia. - Marissol disse e os acompanhou até onde os dois diretores e alguns professores estavam.

— Bem, eu achei tudo muito bom e acredito que o Teatro Municipal de São Bernardo lhes receberá com o maior prazer. - José Henrique disse, fazendo todos comemorarem dando pulinhos de alegria.

Lia sorriu para o amigo e pulou em seu pescoço, o abraçando o mais forte que conseguia.

— Conseguimos Pê, nós conseguimos!

Ela não conseguia e nem queria conter a euforia, pela primeira vez seria a protagonista de uma peça junto de seu amigo que se formou junto dela, seria remunerada por seu trabalho e logo depois se desprenderia da cia e caminharia com suas próprias pernas.

Todos, com exceção dos diretores, deram um abraço em grupo, se cumprimentando e parabenizando cada um pelo incrível trabalho que exerceram.

— Minha ultima peça com vocês meus amores, será a melhor de todas! - Lia disse assim que o abraço se desfez.

— Como? - Faletti perguntou indignado.

— Ora, você está saindo da Tropeços? Por que não disse antes? Assim que o contrato chegar ao fim eu mesmo farei questão de lhe indicar para alguns conhecidos. - Henrique disse para a moça.

— Tá brincando? - A expressão de surpresa era nítida no rosto da jovem.

— De maneira nenhuma. - Ele respondeu - Aqui, pegue meu cartão e depois tratamos disso. Agora, Faletti, vamos acertar as condições do contrato?

— Sim, sim José, é claro. Estão todos dispensados, vejo vocês segunda. - Ele não se conteve em lançar um olhar intimidador para Lia, que como resposta sorriu amargamente.

— Vamos sair pra comemorar? - Pedro perguntou quando já estavam na rua.

— Pode ser amanhã?

— Por que não hoje?

— Posso ir para casa descansar?

— Parece que vai chover, não é?

— Qual a raiz quadrada de pi?

— É... hã...

Bééé. Perdeu.

— Assim não vale. - Pedro respondeu fazendo a jovem rir. - Até amanhã Julieta.

— Até, Romeu.


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Notas finais do capítulo

Até o próximo capítulo,
Abraços!



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