Dois Quartos de Vinho escrita por Ninguém


Capítulo 16
A primeira coisa


Notas iniciais do capítulo

Olá, querido leitor. Seja bem vindo! Puxe uma cadeira ou deite no sofá, tome um chá ou coma uma pipoca. Enfim, sinta-se a vontade e tenha uma ótima leitura.



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A primeira coisa que Lia fez logo depois que acordou foi conferir as fotos do Improvável da noite anterior, dando uma atenção maior às poses de Elídio, e só depois de curti-las em todas as redes sociais, ela se levantou e foi para a cozinha onde encontrou Aline com uma cara nada boa.

— Que cara de quem comeu e não gostou.

— Eu tô com uma puta ressaca.

— Quem mandou se embriagar com os vizinhos?- Ela se aproximou para cumprimentar a amiga. - Seu cabelo tá fedendo a maconha - Concluiu com uma expressão nada animadora.

— Foi aquele cara de touca azul, ele tava fumando antes de você chegar. - Disse revirando os olhos.

— Hum, ótimas companhias essas do Rafael.

— Falando nele, vocês fecharam a noite com chave de ouro, hein?! - Ela sorria maliciosamente.

— Só por que a gente se beijou?

— Não, na verdade vocês tem química, deveriam namorar.

— Até parece! Meu amor, nós não temos química nenhuma, o que temos não passa de física, puros desejos errados.

— Filosofando logo pela manhã, uau! Você deveria chamar ele pra vir aqui num dia desses.

— Pra ele transformar o meu apartamento em uma boca de fumo? Não obrigada. - Tinha acabado de preparar um lanche e se sentou à mesa, junto da amiga.

— Todos nós temos fraquezas, Lia, e o Rafa é a sua. Você pode namorar 1001 caras ou até mesmo casar, mas ele sempre vai conseguir mexer contigo.

— A noite de ontem deve ter afetado o seu cérebro, melhor eu tomar meu banho e ir trabalhar, tenho medo que isso seja contagioso. - Ela falou se levantando e levando o lanche mordido consigo.

Quando as portas do elevador se abriram, Lia deu de cara com Rafael que abriu um sorriso imediato assim que ela entrou.

— Bom dia. - Ela estava olhando para o teto do local.

— Ótimo dia! A noite de ontem então, foi melhor ainda.

— O que teve de mais ontem?

— A sua visitinha ao meu sofá. - Seu sorriso malicioso tomava conta do local.

— Você tá falando do beijo? - Ela disse como desprezo.

— Não significou nada pra você?

— Francamente, você está parecendo um garotinho de 12 anos. - Ela começou a rir da situação.

— Qual é gata para de se fazer de difícil, você sabe que gostou. Eu poderia te beijar aqui mesmo que sei que você não resistiria.

— Se eu quisesse, te beijaria agora.

— Mesmo?

Sorrindo ele se aproximou, segurou-a pelos braços pressionando ela contra a fria parede do elevador. Ele olhava fixamente para seus grandes olhos castanhos, ela respondeu o segurando pela nuca e puxando para mais perto, ficou na ponta dos pés até alcançar sua orelha e sussurrou enquanto as portas se abriam:

— Sim, mas não quero. - Ela riu da expressão confusa de Rafael ao deixá-lo ali, sozinho e sem conseguir o que tanto queria.

...

Quando saiu do escritório, Lia pegou um ônibus que não costumava pegar, para ir a um lugar que não costumava ir e ver pessoas que há tempos não via.

Assim que desceu do coletivo, deu menos que cem passos até chegar onde pretendia. Diante dela se erguia gentilmente uma casa pintada de um azul quase imperceptível, rodeada de um extenso e verde jardim. Logo na entrada via-se algumas senhoras conversando e dois senhores jogando cartas, erguendo um pouco a cabeça lia-se em letras cor-de-rosa "Asilo Nosso Lar".

Ela atravessou os portões que já estavam abertos e adentrou a casa, se deparando com um largo e comprido corredor cheio de quartos de ambos os lados. Seguiu em linha reta, sorrindo e cumprimentando quem cruzava seu caminho até que, enfim, passou a porta que levava à parte de trás do jardim.

Com exceção de uma pequena horta localizada em um canto do terreno, tudo estava exatamente como ela se lembrava, mesmo já se passando 6 meses de sua última visita. Foi caminhando sem um destino determinado até que ouviu alguém chama-la.

— Lia?- Os olhos dela dançaram pelo jardim até encontrar de onde vinha o som

— Ei, aqui ó. - Lua balançava o braço freneticamente enquanto sorria.

— Eu disse que teríamos mais tempo pra conversar. - Lia disse abraçando a amiga.

— RICO OLHA QUEM TÁ AQUI!- Lia viu um homem alto e magro se virar ao seu encontro e abrir um enorme sorriso com os olhos arregalados.

— Lia?! O que você tá faze... vem cá me dá um abraço. - Ele abriu os braços e ela correu ao seu encontro.

Ele a pegou no colo e rodaram três vezes, finalizaram o reencontro com dezenas de beijos depositados em diversas partes do rosto. Ainda estavam abraçados quando ela falou enquanto brincava com os cabelos dele:

— Rico, os anos passam e você fica cada vez mais lindo!

Frederico, conhecido apenas como Rico, tinha 32 anos, graças a constante exposição ao sol as rugas precoces já moravam em seu rosto, mas incrivelmente isso fazia dele ainda mais bonito. Seu sorriso espontâneo combinado com seus louros cabelos compridos e sua barba cuidadosamente escovada, foi o que conquistaram Lia na primeira vez que o viu. Eles se conheceram no acampamento, ele como mentor, ela como aprendiz fascinada, até que depois de um tempo quebraram as fronteiras de tal formalidade.

— Posso dizer o mesmo de você, pequena, cada dia mais radiante. - Ele sorriu abraçando-a novamente.

— Vamos sentar com os nossos velhinhos preferidos, eles vão adorar te conhecer. - Lua disse conduzindo Lia até uma parte do jardim onde alguns senhores conversavam.

— Amores, essa aqui é a Lia, é uma amiga de muito tempo e veio nos fazer uma visita.

Qualquer um que visse os dois hippies ali, trabalhando como cuidadores em um asilo jamais imaginariam que juntos somavam 6 graduações em ótimas universidades federais. Poderiam escolher as melhores formações que tinham e hoje desfrutar de uma evidente vida fácil, mas tanto Lua quanto Frederico acreditavam que viver uma vida plena sem exageros e sempre presente para ajudar o próximo valia mais que qualquer salário.

Lia ouviu inúmeros elogios e comparações do tipo "Você parece com minha neta" ou "Uau como lembra a minha sobrinha", típicos de adoráveis senhoras de idade, e foi se sentar com elas para conversar. O grupo mais ria do que conversava e foi assim por mais de 40 minutos até que chegou a hora do café da tarde e todos os velhinhos foram para o refeitório, deixando Rico, Lua e Lia sozinhos no jardim.

— Você deveria aparecer aqui mais vezes.- Rico comentou enquanto a colega de trabalho balançava a cabeça em sinal afirmativo.

— É, eu deveria...

— Tá tudo bem, flor? - Lua via os olhos da amiga navegarem em um mar de fantasias distante.

— Vocês já se apaixonaram quantas vezes?

— Incontáveis vezes. - Frederico respondeu rindo e mais uma vez Lua concordou.

— E como vocês sabiam que era paixão? Como diferenciam o amor da paixão ou até mesmo de um simples desejo? Como sabem que o sentimento é reciproco? O que vocês pensam ao se jogarem tão cegamente em direção ao incerto?

— Sexta, no Globo Repórter.

— Para de ser besta Frederico. - Lia tentou ficar séria mas não resistiu a piadinha do amigo.

— Eu respondo a sua pergunta. A paixão é quando você não consegue raciocinar direito, quando só quer fazer coisas que agradem ao outro sem se preocupar em recebe-las em troca. É entrar em desespero cada vez que pensa em perder a pessoa amada. O desejo tem o mesmo princípio: a falta de raciocínio, é ele que nos faz lembrar que somos animais que tem vontades que vão além do nosso controle, desejo é instintivo.

— Tá, mas e o amor?

— O Amor...- Frederico foi interrompido pelo toque de uma campainha - Temos que voltar ao trabalho.- Ele disse se levantando e indo em direção a porta da casa, Lua o acompanhava.

— Espera, me diga o que é o amor.

— Um dia você descobre sozinha Lia, nenhum de nós, meros mortais, está imune ao sentimento mais puro que a vida tem a oferecer. - E os dois sumiram porta a dentro, deixando a jovem sem resposta e sem companhia.


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Notas finais do capítulo

Até o próximo capitulo,
Abraços.



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