A campanhia está tocando e eu não estou com nenhuma vontade de atender... Mas não tem ninguém pra fazer isso por mim.

Ahhhh! Que droga!

Me levanto com preguiça e me dirijo até a porta.

— É...

— Lua! — Prolonga a última vogal causando um som estranho.

— Nicole, o que está fazendo aqui?

— Vamos pro shopping? — Ela pergunta, eufórica, me fazendo rir.

— Ah, não! Hoje não! Estou fazendo algo muito importante! — Respondo.

— Dormindo?

— Seria uma boa ideia, mas não. Estou escrevendo o livro que você deveria estar me ajudando...

— Podemos fazer isso qualquer hora! Já o shopping, não! Só temos essa chance.

Rio.

Só uma chance? Nós vamos pra lá toda hora! E é isso que eu respondo a ela.

— Mas hoje é diferente! Compraremos roupas pra você.

— Pra mim? E por que isso?

Meu estoque de roupas não é muito grande e eu nem espero aumentá-lo

— Depois eu explico isso! Vamos, bora! Bota uma roupa aí!

— Arghhh! — Fecho a porta na sua cara, troco de roupa, pego uma bolsa com dinheiro e volto pra fora.

— Dessa vez vamos passar na livraria, pelo menos. Sentir o cheirinho dos mais lindos e preciosos objetos do mundo, livros. — Falo, sorrindo.

[...]

— Essa?

— Qual é o tamanho?

— PP.

— Não.

— E essa?

Toco o tecido.

— Também não.

— E essa daqui? Visto a roupa com o maior sacrifício da minha vida.

— Deus me livre! Essa com certeza, não!

— Ai, Lua! Você não gosta de nada!

— É claro! Você só me mostra coisa desconfortável! — Digo sincera.

— Vai andar pelada! — Ela emburra.

— Pelo menos assim não vou apertar minha bunda e meus peitos.

— Mas é tão bonito!

— Nicole, entenda! Eu sou cega, não vou saber se fica bonito ou não.

Ela ri.

— OK, entendi.

E vai atrás de algo melhor pra mim. Sigo o som de seus passos.

Do nada escuto um grito:

— Ai meu Deus, achei! Achei o vestido mais lindo do mundo, ele é lindo demais, Lua! Você vai adorar!

— Ta, né.

— Vai, se troca! Vê se fica legal! — Ela me empurra para o vestiário e joga a roupa pra cima de mim.

Visto um vestido um pouco curto, leve e com um tecido bem fino, era de alça e preso com um cinto na cintura. É confortável e eu esto me sentindo bem com ele.

— Gostei. — Digo à Nicole.

— Não acredito! Sério? Ai, aleluia, senhor! Até que enfim! — Ela diz, segurando minha mão e me levando para algum lugar.

— Só isso mesmo? — Uma mulher desconhecida fala.

— É, só isso. Minha amiga aqui é uma chata, não gosta de nada.

A moça riu.

— Crédito ou débito?
— Você vai pagar pra mim, Nicole? — Pergunto, virando minha amiga na minha direção.

— É claro, meu amor! Isso é presente!

— Nem pensar, eu não vou deixar você fazer isso! Vou pegar meu dinheiro... Pera aí... — Procuro dentro da minha bolsa, tateando os objetos dentro dela. — Hum... — Não estou achando — Estou quase lá...

— Já paguei, meu doce. — Ela aperta minhas bochechas.

— Não acredito que você fez isso! Deve ter sido uma nota!

— Que nada, já falei, é presente!

— Argh! Você e seus presentes! — Ri e pergunta:

— Sorvete de baunilha?

— Você e sua cisma com sorvetes de baunilha. Quero um de chocolate.

— Ok, às ordens. Vamos!

[...]

— Você ainda não me disse o por quê estamos comprando roupa pra mim, Nicole! Porque é que estamos fazendo isso?

— Ah, ué...

— Ai caramba, o que você aprontou, Nicole?

— Ah, hum... É... Nada...

— Desembucha logo, vamos! Já estou nervosa. — E pior que eu estou mesmo, não paro de roer minhas unhas.

— É que... É que eu marquei um encontro.

— Que? Encontro? E o que eu tenho a ver com isso? — Pergunto, já temendo a resposta.

— É um encontro duplo, eu, você, um gato pra mim, um gato pra ti.

— O quê? — Pulo da cadeira — Não acredito que você marcou outro encontro pra mim, Nicole! Eu já tinha te dito que não queria mais que você fizesse isso!

Nicole é mestra em marcar encontros furados, quero dizer, marcar encontros furados pra mim. Ela sempre diz a mesma coisa: "Ah, ele é um amor, Lua! Você vai amar! E ele é um gato, além de educado, divertido, bem humorado, você vai ver." E sempre dá errado, o garoto é o oposto disso, ele nem vai ou ele desiste quando percebe que sou cega ou até mesmo por outro motivo.

Eu, definitivamente, não gosto de encontros.

— Não exagera, Lua! E você não precisa fazer nem falar nada demais, é só me fazer companhia. — Ela foi falando — É que o Lucas, o meu gato, me chamou pra sair e na hora eu aceitei, porque né? Aquele corpinho... Mas enfim, ele disse que ia ter que levar o irmão dele e na hora broxou tudo. Fiquei bem irritada! Pô! Vai levar o irmão pra ficar de babá, olhando a gente? Mas aí ele disse que foi obrigado a isso e que se eu quisesse podia levar alguém e tem você, minha linda, maravilhosa, perfeita amiga...

— Sô sabe puxar o saco — Emburrei.

— Por favor, Luazinha! Eu faço tudo o que você quiser, prometo! Por favor!

— Tá, né? O que eu não faço por você?

— Ahhhh, te amo! Você vai ver, vai ser bem legal, juro!

— Encontro, tsc. — Resmungo — Que saco!