Inserção escrita por Yennefer de V


Capítulo 5
Tiago e Lily




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Uma atmosfera de inquietude tomou Zion nos próximos dias. Os adultos responsáveis por Hogwarts, pelas navegações e do Conselho eram vistos falando baixinho entre si, se reunindo mais que o normal e com olhares preocupados. Trinity tentou convencer as filhas de que tudo estava bem. Não foi muito bem sucedida.

Lily e Luna se enclausuravam com mais frequência em sua moradia.

– Existem coisas que não vemos em Zion. – comentou Luna sonhadora. – Como toda aquela massa fofa que The Kid chamou de neve.

Lily estava curiosa a contragosto porque não se lembrava muito bem de Matrix.

– Como é que funciona a atualização? – perguntou Lily tentando não aparentar ansiedade.

– Hogwarts? – falou Luna em resposta. – Você tem que ver com seus próprios olhos. Tiago está lá como um holograma. E você também. Seus cabelos são lindos, pequena Lily.

– E como é que me enfiaram novamente em Matrix? – perguntou Lily insultada. – Eu estou aqui! – terminou ela se beliscando.

– É de mentira. – respondeu Luna.

– E como é que viver cercada de mentira parece uma vida melhor?

Luna arqueou a sobrancelha.

– Niobe diz que a comida tem gosto melhor. Que o som é mais alto. Que o cheiro das coisas é mais aguçado. E que podemos fazer o que quisermos se soubermos que é de mentira. Como papai que vive entrando lá e libertando as pessoas mesmo que tenha que lutar.

– Mas é um mundo inteiro de mentira! – Lily bateu o pé no chão como se o fato verdadeiro encerrasse a questão.

– Existe equilíbrio entre a verdade e a mentira! – rebateu uma Luna feroz num daqueles momentos que não lembrava uma criança.

– Que quer dizer? – perguntou Lily.

– Que não precisamos acreditar na verdade alheia! É como quando sonhamos! Estamos lá e vivemos, não é?

– E acordamos depois porque é mentira. – Lily revirou os olhos.

– E se você nunca acordar?

– Então não estava sonhando! – resmungou Lily.

– Exatamente! Matrix é um sonho eterno. – explicou uma Luna triunfante e Lily percebeu aonde ela queria chegar.

– Você quer dizer que entraria em Hogwarts pra sempre? – perguntou abismada.

– Sim. – assentiu Luna sem temor na voz.

– E viveria pra sempre na mentira?

– Não, Lily! Viveria pra sempre na minha verdade.

Lily a fuzilou com o olhar. Luna continuou:

– E se Matrix for real para mim? – perguntou em tom simples.

– Quer dizer... como Zion?

– Mais que Zion. Matrix é colorida e cheia de vida. Há vida de verdade. Há risos e lágrimas também. Zion é cinza... Nossa maior preocupação é tirarmos as pessoas de Matrix sem entender porque elas estão felizes lá. Pregando feito bobos que somos felizes porque estamos livres ... oras, Lily, você se sente livre? E se eu quiser ser uma heroína em Matrix?

Lily tinha uma resposta rápida para a questão.

– Sempre me senti livre em Zion. E como é que você se tornaria uma heroína? Não há problemas de verdade em Matrix.

– Claro que há. A nova atualização está com problemas. Papai precisa de heróis corajosos. Eu estaria ao lado dele. Porque nem sempre a mesma existência faz todo mundo feliz. – concluiu Luna.

Lily se levantou irritadiça. Entendeu o ponto de vista da irmã. Mas de qualquer forma, o seu mundo era Zion e simplesmente Zion. Libertariam as pessoas de Matrix e seguiriam em frente. Era o mundo como conhecia e amava.

Alguém bateu na porta de metal das duas. Lily se sobressaltou. Luna ainda a encarava triunfante. Estavam em duas espécies de redes que dormiam. No chão firme havia resquícios da terra lá de fora. Havia balcões primitivos com brinquedos, desenhos, frutas e vasos de flores. As duas estavam, como sempre, descalças.

Lily andou graciosamente até a porta e a abriu. Trinity e Neo estavam em outra ala ao extremo de Zion (Neo discutindo febrilmente com os operadores sobre o destino de Hogwarts).

Tiago estava na porta. Um garoto magro, de óculos, cabelos negros e espetados, nascido em Zion e filho de The Kid. Também estava descalço.

– O que foi? – inquiriu Lily mal humorada.

– Eu ouvi falar que Luna... – começou ele, olhando por cima dos ombros de Lily - Que ela me viu em Matrix. – deu de ombros. – Meu pai não quer falar sobre isso.

Luna ficou de pé em prontidão e chegou até a porta. Os três saíram e a fecharam com um barulho chato, sentando na beirada de Zion como as duas irmãs gostavam. Àquela hora do dia muitas pessoas passavam pelo corredor às suas costas, de modo que elas ficaram muito desconfortáveis. De qualquer forma não podiam convidar um garoto para adentrar seu quarto.

– Estávamos falando sobre Matrix. – anunciou Lily a contragosto. – Você fica feliz em ser um holograma?

Luna torceu o nariz.

– Você é Tiago?

O garoto de olhos óculos assentiu com a cabeça. Luna se sentou em uma ponta, Lily colocada no meio dos dois balançando os pés para o abismo. Tiago se sentou ao seu lado ficando um pouco corado.

– Eu estava lá? O que eu fazia? – perguntou Tiago por cima de Lily.

– Você e Lily terão uma história curta que darão início à verdadeira ilusão de Hogwarts. – respondeu Luna. - O resto da história são memórias implatadas.

Tiago sorriu.

– Serei importante? Farei algo grandioso?

Luna alisou os cabelos loiros.

– Não sei. Mas tenho a impressão de que seus hologramas não viverão muito.

Lily a interrompeu.

– Você viveria em Matrix por heroísmo? Para salvar as pessoas da ilusão? – perguntou girando a cabeça para Tiago como se o julgasse.

Tiago abriu um sorriso sem jeito.

– Provavelmente sim.

– Luna quer viver em Matrix. – soltou Lily como se não pudesse mais guardar aquilo só para si.

Tiago não fez nenhuma expressão de choque.

– Você veio de lá. – disse para Lily com convicção.

Lily prendeu a respiração antes de perguntar:

– Isso faz diferença?

Ele piscou.

– Não. Nenhuma diferença. Te torna especial. Viveu em duas realidades. Se libertou.

Lily o interrompeu.

– Luna não acha isto. – Lily fez muxoxo.

– Tenho orgulho de você. – disparou Luna em um sussurro.

– Como pode ter orgulho de mim por ter me libertado e querer entrar lá para nunca mais voltar?

Tiago que respondeu:

– Vocês são diferentes. Ninguém pode sonhar o sonho de outra pessoa. Nem conquistar.

– A única coisa triste é que ao conquistar uma coisa nós perdemos outra. – completou Luna.

Lily não queria mais falar. Seus olhos estavam cheios de lágrimas. Tiago a aconchegou em seus braços. Lily se desvencilhou e levantou. Ela os acompanhou concordando e se sentiu sufocar.

– Você concorda com ela! – disse para Tiago e apontou feroz para a irmã, os cabelos ruivos ficando na frente dos olhos lacrimosos. – Gostaria de bancar o herói, gostaria de matar as pessoas da ilusão como meu pai fazia na época da guerra contra as máquinas... – acusou ela sem raciocinar.

– Não! - Tiago exasperou-se.

No segundo seguinte, em passos firmes, Lily estava batendo a porta de sua moradia.

– O que...? – perguntou Tiago sem entender.

– Ela não quer me perder. – constatou uma Luna baixando os ombros. – Vou até lá.

Tiago ficou observando ela entrar até que Luna tornou a virar para ele:

– Tiago?

– Oi Luna. – perguntou Tiago desarrumando os próprios cabelos e infeliz por ter magoado Lily.

– Você libertaria alguém de viver seus sonhos para que a pessoa seguisse seu próprio caminho mesmo que te doesse?

Tiago quase engasgou com a pergunta filosófica.

– Eu...

– Apenas pense. – Luna deu de ombros.

***

As duas se colocaram nas redes de descanso. Luna pegou o caderno e carvão para desenhar. Colocou um jarro de agua nas mãos tremeluzentes da irmã.

– Luna? Se você for para Matrix vai sentir minha falta?

Luna a fitou com certa tristeza.

– Claro que vou. E de mamãe e papai...

– Como é que você pode sentir falta de algo que nunca conheceu? – perguntou Lily com urgência na voz. – Porque você vai achar que não existimos ...

Luna ficou espantada.

– Você já sentiu, não sentiu? Saudades de algo que nunca foi seu, que nunca viveu... Saudades por querer alguma coisa?

Lily pensou e assentiu um minuto depois.

– É o tipo de saudades que eu vou sentir.

– Quer dizer que sinto falta de uma existência além dessa aqui e de Matrix? – perguntou Lily encucada.

– Quer dizer que muita coisa nos pertence e uma única realidade é pouca para nos oferecer. Precisamos de muitas realidades. Precisamos escolher e acreditar nelas. Precisamos pertencer. Quando entendermos que nem sempre podemos ficar num mesmo lugar para sempre é que seremos felizes. Quando entendermos que não precisamos viver pelas regras dos outros muito menos pela vontade. – respondeu Luna enigmaticamente.

– Luna?

– Oi? – perguntou a irmã focada no desenho.

– É isto que está fazendo? Indo embora contra as regras do papai e contra minha vontade porque não pertence à Zion?

Luna elevou o olhar e sorriu.

– Sim.

– Papai vai consultar o Oraculo. Ele não faz isso desde que venceu as máquinas.

– Você acha que ele deixaria eu viver em Matrix? – perguntou Luna abrindo os grandes olhos azuis.

– Acho que você está certa. Temos pouco tempo para viver na realidade que nãos achamos correta. Acho que você deve ir. Acredite Luna. E será verdade.


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