O Inferno de Lizzie Horn escrita por Ramone


Capítulo 7
Capítulo 6




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Deixando de lado o comportamento estranho de Zack, Martin voltou à atenção para as palavras de Lizzie, que terminava de lhe explicar o que haviam feito.

— Eu só conheci um Raul a minha vida inteira, e foi no colégio – comentou em meio à conversa – Mas fique tranqüila, você vai conseguir achá-lo! Até lá, pode ficar aqui o tempo que for necessário.

— Eu nem sei como agradecer! – exclamou.

— AH, Liz, eu ia quase esquecendo de te avisar que hoje vamos ter uma pequena reunião aqui em casa, no começo da noite – Lucy falou animada retornando à sala segurando um pires com cookies nas mãos. Lizzie ainda não conseguira se acostumar com toda a fácil mobilidade da menina deficiente – O grupo da igreja vem aqui todas as quintas para fazermos uma pequena corrente de oração. Não é chato ou massivo, na verdade, é muito prazeroso e divertido. Sei que você não é religiosa, mas pode ficar a vontade pra participar!

Lizzie evitou torcer o nariz como gostaria de ter feito, mas Martin estava ali pra ver, e ele também parecia animado com o programa, mas a garota não tinha pretensão alguma de participar de um grupo de oração. A idéia não só lhe parecia chata, como não via motivos de interagir se não tinha fé.

— Ai, desculpa Lucy, mas não sei se minha presença seria boa. Sem falar que fiquei bastante cansada com essa caminhada e eu já estava pensando em dar uma cochilada... – respondeu um pouco sem graça.

— Sem problemas! – sorriu. Lucy realmente não pareceu se chatear com a negação.
Lizzie então ajudou a arrumar a mesa de lanche e subiu para o quarto no terceiro andar, deitando-se imediatamente. Não dormiu na hora, pois ficou pensando em todas as coisas que tinham acontecido naqueles últimos dois dias. Martin, Lucy, Zack... Imaginou o que aconteceria se descobrissem a verdade sobre ela, sobre a mentira que havia contado e sobre sua vida atormentada.

Pensou o que faria depois se encontrasse o tal Raul, afinal, ela não poderia ficar ali como hóspede pra sempre. Cedo ou tarde, ela ia ter que ir embora, e mesmo estando a tão pouco tempo naquele lugar, não tinha vontade alguma de se mudar. Lizzie nunca havia se sentido parte de alguma coisa, nem nunca se sentiu num lar de verdade, e pela primeira vez, estava provando destas sensações. Tinha medo de muitas coisas, e o futuro era um deles. Tudo era tão incerto e inseguro... 

Por algum motivo que desconhecia, Lizzie também pensou sobre Summer, a ‘amiga’ de Zack. Meninas como ela são sempre as que perseguem gente como Lizzie. Meninas populares, frescas, com seus cabelos bem tratado e roupas de grife. No fundo, Lizzie sentia inveja da vida despreocupada e divertida dessas garotas, e uma parte de si gostaria de ter os mesmos defeitos se fosse preciso para ter essa vida, mas assim como nos filmes e novelas, são justamente estas meninas que ficam com o final infeliz, e as esquisitas que sofrem buylling saem ganhando. É, na vida real tudo era diferente... As meninas ricas e populares compram sua felicidade, e meninas esquisitas morrem cortando os pulsos. É dramático, mas é a vida real. E a vida real de Lizzie ainda tinha o detalhe mórbido de ser “assombrada” por tudo aquilo que a maioria das pessoas temem mas não acreditam de verdade.

“Porque o Zack ficou tão nervoso depois que viu aquela garota?” – pensou, lembrando do comportamento repentino do menino.

Seus pensamentos foram interrompidos por alguns barulhos que vinham do primeiro andar. O som da campainha anunciava a possível chegada das visitas de Lucy. Seria uma noite de muito louvor lá embaixo e Lizzie não via à hora de dormir pra não escutar nada, mas estranhamente, mesmo cansada, não conseguia pregar os olhos. 
Como costumava deitar de barriga pra cima, Lizzie ficou contemplando a imagem do teto e das paredes por um tempo, enquanto voltava a pensar sobre infinitas coisas a fim de cair no sono sem perceber.  O som de vozes entusiasmadas cortava o ar, quebrando o silêncio do quarto. 

“Dorme Lizzie, dorme!” – falava mentalmente seguidas vezes.

O desespero pra dormir chegava a ser exagerado. Inquieta, ela mudava de posição várias vezes e fechava os olhos com força. À medida que o grupo no primeiro andar iniciava as orações, Lizzie ia se sentindo cada vez mais incomodada; Além disso, ela conseguia perceber que a presença de Tito se tornava cada vez mais negativamente notável, causando uma sensação de sufocamento. Palavras da bíblia eram gritadas e depois canções eram ouvidas, e Lizzie tentava controlar seu desconforto, diferente do clima tenso que vinha da figura negra de Tito no pé de sua cama, que só aumentava. Depois de crescida, Lizzie havia aprendido a ignorar a imagem de Tito de tal forma que quase nunca o percebia, mas naquele momento era impossível.  

Estranhamente, a garota começou a tossir insistentemente, como se um caroço estivesse entalado em sua garganta. Sentou-se na cama involuntariamente com a força da tosse, e a saliva que respigava de sua boca saia num tom avermelhado, como gostas de sangue. Quando a tosse ficou menos intensa, Lizzie voltou a pousar a cabeça no travesseiro, e ao olhar o teto, percebeu que estava tonta. Era como se a tivessem girado várias vezes rapidamente, deixando aquela sensação de que poderia cair a qualquer momento. Sua visão embaçava, seu corpo doía e podia jurar que sua temperatura aumentava gradualmente. 

Com tantas dores, Lizzie acabou desmaiando de sono, literalmente. Seus olhos fecharam e tudo apagou. A última coisa que viu antes da visão escurecer foi a imagem de Tito sumir de sua frente.

Acordo duas horas depois com alguém a chocalhando. Abriu os olhos assustada. Era Zack.

— Lizzie! Lizzie! Acorda! – berrava enquanto a balançava pelos ombros.

— Ah... Oi... O que houve? – perguntou com a voz rouca, ainda sonolenta e sem entender nada.

— Aconteceu um acidente! Vamos, acorda logo! – o rapaz estava histérico, com a voz trêmula.

— Acid-dente? Como assim? Com quem? – a palavra ‘acidente’ fez Lizzie despertar imediatamente. Ergueu-se, sentando na cama, e esfregou os olhos.

— Lucy! Baby a levou correndo no hospital e pediu para vir te avisar... Temos que ir pra lá também! – respondeu ficando de pé dando espaço para que ela também se levantasse, o que fez prontamente ao ouvir a noticia.

— Lucy sofreu um acidente? Como? – perguntou preocupada. Como não havia mudado a roupa antes de deitar pra cochilar, não precisou se trocar e ela também nem se importou em escovar os dentes. Desceram as escadas correndo.

— Eu não sei direito... O Baby me ligou agora a pouco e pediu pra te buscar, não me explicou o que houve exatamente. Mas ele estava chorando e muito nervoso – explicou enquanto trancavam a porta e entravam no carro. O mesmo carro que Zack usara para levar Lizzie na outra manhã à casa de Lucy.

 - Mas ele não falou nada sobre a gravidade do acidente ou se ela está bem ou muito mal?

— Só sei que foi muito feia a coisa... – disse antes de ligar o carro e pisar fundo no acelerador.
O hospital não era longe, pelo contrário, era praticamente no fim da avenida. Chegaram em 2 minutos. Zack estacionou o carro com pressa na primeira vaga que viu. Nem precisaram entrar no hospital para encontrar Martin; Ele estava do lado de fora, fumando um cigarro de uma forma que parecia que ia come-lo a qualquer minuto sem querer, com lágrimas caindo por todo o rosto. Era triste só de olhar aquela imagem. Um homem que Lizzie lembrava como um sorriso, estar com aquela aparência.

— O que aconteceu Baby, pelo amor de Deus, fala logo?! – pediu Zack já com os olhos marejados.

— Como pode uma garota feliz e cheia de vida ter um ataque cardíaco aos 25 anos de um minuto para o outro? Como Zack, diz pra mim!? – Martin falava tentando se manter forte, mas não conseguia segurar alguns soluços do choro que continuava caindo. Seus olhos estavam vermelhos e sua cara inchada. Sua expressão era de pura interrogação.
Zack ficou sem fala e Lizzie assustada. Já sabia que aquilo não havia sido atoa. Que Lucy não havia tido um ataque cardíaco por motivos de saúde ou algo similar. A culpa era dela. Da presença dela! Teve vontade de chorar de raiva, mas se segurou.

— Mas... Ela está viva, né? – perguntou com uma voz fraca. Tinha medo de ouvir a resposta, mas precisava saber.

Zack olhava fixamente em algum ponto do ar com a mão na boca, ainda não acreditando no que acontecera. Martin terminava o cigarro amassado, que fumou até passar da linha do filtro.

— Quando ela entrou no quarto, ainda est-tava tendo o ataque... Eu não s-sei... Eu eu não sei -  gaguejou, voltando a chorar desesperadamente. O coração de Lizzie apertou e, impulsivamente, abraçou Martin.

— Ela vai ficar bem! Eu sei disso – cochichou com a cabeça pousada sob o peito de Martin.


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