O Inferno de Lizzie Horn escrita por Ramone


Capítulo 11
Capítulo 10




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A idéia de que havia matado Lucy dominara Lizzie completamente. “Não posso voltar à casa de Martin. Não posso olhar pra cara dele sem pensar que matei sua filha” – pensava. E foi exatamente esse tipo de pensamento que fez com que Lizzie tomasse uma atitude mais radical; Correu até a casa de Martin, tirou as roupas que usava de Lucy e colocou o vestido preto que levava na mochila, que jogou nas costas antes de trancar a porta da casa, guardando a chave consigo. Não sabia bem porque simplesmente não passou a chave por debaixo da porta. Talvez tivesse agido por instinto caso precisasse voltar, poderia fazer isso numa hora que ninguém estivesse em casa, e infelizmente, aquele era o único lugar que ela conhecia de verdade e tinha acesso.

Em uma das mãos, Lizzie segurava o papel com a relação dos Raul’s que havia tomado conhecimento no dia que fez a busca com Zack. Mais do que nunca ela precisava encontrar aquela pessoa, e por um momento antes do acontecimento daquela manhã, Lizzie tinha esquecido o motivo que a levara em Trenton. Agora, isso não poderia acontecer mais! Ela tinha que encontrar o homem que Fabrizzia disse que a ajudaria, para então ela sumir definitivamente daquela cidade antes que mais problemas acontecessem. Nem se quer parou pra pensar em como seria estranhou ou suspeito o desaparecimento dela em atual situação, e de certa forma, no fundo, Lizzie imaginava que nem sentiriam sua falta. O que ela era naquela família? Uma simples estranha. “Nem notarão minha ausência!” – acreditava.

Consultou o relógio de pulso; Ainda eram 10 horas da manhã. Imaginou o hospital ligando naquele momento para Martin avisando o falecimento de sua filha. Lizzie ainda tremia, seu coração pulsava forte e sua respiração estava apressada. As cenas do que acontecera no quarto do hospital não saiam de sua cabeça. 

Avaliou a lista no papel, e decidiu não seguir nenhuma ordem, iria apenas bater na porta da primeira casa que que visse na Hamilton Ave que constava na relação. Infelizmente, a Hamilton Ave era uma avenida enorme, e cruzá-la de ponta a ponta, poderia levar mais quase 3 horas caminhando, e isso se ela fizesse o trajeto sem interrupções, mas Lizzie tinha conseguido cerca de 9 números de casas de possíveis moradores chamados Raul. Seria um dia longo, e nem queria imaginar o que faria quando sentisse fome ou sede agora que não pretendia retornar à casa de Martin.

Evitou virar para o lado direito da Hamilton Ave que começava com o hospital. Infelizmente, o lado esquerdo da avenida era justamente o centro comercial mais próximo da entrada de Trenton. Havia muitos restaurantes, lojas de conveniência, farmácia, tabacaria e até estúdio de tatuagem. Ela precisou caminhar um bocado até chegar à primeira casa anotada naquela área. Atravessou a Anderson St.  e visualizou a casa n° 479 logo após um banco chamado “Roma Bank”. De acordo com a informação que recebera, naquela casa morava um Raul que era um ex professor universitário.

Lizzie entrou no pequeno quintal de frente, subiu as escadas que davam à varanda e apertou a campainha. Era uma bela casa vitoriana branca de três andares com o telhado e arremates em cor cinza. Muitas janelas e um jardim bem cuidado completavam a produção da propriedade. Aliás, a maioria das residências em Trenton seguia aquele mesmo padrão de construção, como um grande condomínio vitoriano.

Ainda não tinha pensado o que e como iria falar, mas no fim das contas, decidiu que ia ser curta e direta sem parecer insana. Não ia querer que chamassem psiquiatras para internarem uma garota louca que diz ver espíritos e ter habilidades sobrenaturais.

Ela precisou apertar a campainha mais umas três vezes antes de alguém atendê-la, quando finalmente, um senhor de meia idade abriu a porta. Ele usava óculos de armação quadrada e um conjunto de moletom marrom; Ele tinha grandes olheiras que deixavam os olhos azuis passarem despercebidos e cabelos grisalhos bem armados num tipo de topete que confessava o possível uso abusivo de gel. 

— Posso ajudá-la? – perguntou gentilmente, avaliando Lizzie parada à sua porta.

— Você é o Raul?

— Sim... E você seria? – arqueou a sobrancelha.

— Eu estou procurando uma pessoa... Um Raul que vive aqui em Trenton, mas eu não o conheço exatamente. Espero que esse Raul possa me ajudar com uma coisa – respondeu mordendo os lábios.

— E o que esse Raul faz pra que você espere que ele te ajude? Eu sou apenas um ex professor... Se o que você precisa são aulas particulares, infelizmente, não posso mais ajudá-la – o homem tinha uma feição dócil que contrastava com um olhar analista.

— Não, não são aulas particulares. Além de professor, o senhor já exerceu alguma outra atividade ou profissão na vida? – perguntou receosa, percebendo que o homem franzia o cenho já estranhando a conversa. Ser interrogado por uma menina esquisita que bate à sua porta sem mais nem menos não é algo que mereça muita confiança, ainda mais para uma pessoa já ‘vivida’, mas Lizzie precisava arriscar.

— O que você procura exatamente, moçinha?

— Er... Procuro um Raul, como posso dizer... Médium, sensitivo... Alguma coisa desse tipo – respondeu sem jeito. O homem arregalou os olhos, mas depois deu uma risada. 

— Ah, sinto muito... Então eu não posso ajudá-la. Este não sou eu.

Lizzie suspirou desanimada, mas não esperava encontrar o maldito homem logo de primeira.

— Seria possível o senhor ter conhecido algum? – perguntou num tom brincalhão, mas esperançoso.

— Não, não... O máximo que eu conheci foi uma tia espírita, mas ela não mora aqui.

— Tudo bem então, muito obrigada e desculpe-me o incômodo.

— Boa sorte em sua busca! – exclamou antes de fechar a porta. Lizzie desceu as escadinhas e saiu da propriedade, excluindo a casa 479 de sua lista.

Contando com aquele senhor, outros 3 Raul’s foram descartados e o último que morava daquele lado da Hamilton Ave não estava em casa. Foram mais de 2 horas de caminhada, apertos em campainha, respostas negativas e decepção. Lizzie estava faminta, cansada e morrendo de sede, sem falar em suada. Mesmo o céu nublado e as pequenas ventanias não pouparam a garota de sentir calor.

Lizzie realmente esperava que o real Raul soubesse de cara de sua situação e confessasse que era ele quem ela procurava, por isso, a hipótese deque algum daqueles homens que procurou ter mentido nem passou pela sua cabeça. Aliás, todos pareciam bem normais ou formais e não tinham a aparência que ela esperava de uma pessoa que pudesse compreender a existência de um universo sobrenatural. O mais estranho dos quatro Raul’s que havia conhecido foi um homem de aparentes 30 anos que surgiu na porta usando salto alto e batom vermelho, mas certamente ele não era nenhum paranormal sensitivo. Claro, fazendo um julgamento superficial levando como idéia base que alguém do tipo fosse mais misterioso, cauteloso e com cara de homem sábio, pois era exatamente desta forma que Lizzie esperava que ele fosse.

No caminho de volta, o que lhe rendeu mais meia hora de caminhada, Lizzie já sentia os pés criarem calos. Pior que a dor dos calos, foi o cheiro de comida que invadiu suas narinas quando a garota passou em frente a  pizzaria Mannino’s , um estabelecimento humilde e aconchegante que ficava bem próximo à esquina da Hamilton Ave com a Chambers Street, rua em que Martin morava. O aroma de pizza recém saída do forno causou involuntária inquietação no estômago de Lizzie, que se lamentou não ter nenhum dinheiro na mochila.  Por um momento cogitou usar outra de suas habilidades, mas depois do incidente com Lucy, ela não tinha mais qualquer segurança e não queria mais ferir ninguém. Lizzie não sabia exatamente quais efeitos colaterais graves a manipulação de mente poderia deixar na pessoa, mas não tinha curiosidade pra descobrir.

O minuto de transe com o cheiro de pizza foi quebrado, enfim, quando uma voz chamando pelo seu nome quebrou o silencio em sua mente. Virou-se e viu Zack dentro de sua Hyundai. O coração de Lizzie acelerou no mesmo instante, e seu corpo ficou estático. Não esboçou qualquer sorriso ou cumprimento para Zack, que por sua vez, estava com uma expressão extremamente alegre.

— Aonde você estava Lizzie? Te procurei igual doido! Vamos, entra logo! Lucy acordou! Vem! – exclamou eufórico fazendo sinal para que a garota entrasse no carro. As palavras do rapaz não foram totalmente digeridas pela garota na hora. “Como assim Lucy acordou?” - pensou, sentindo um misto de conforto e desconfiança.  Mas não teve muito tempo para pensar, pois Zack inquieto continuou berrando para que ela entrasse logo no veículo. Em 1 minuto chegaram ao hospital a poucos metros à frente, e como sempre, Zack estacionou o carro como se pilotasse um carro de corrida. Saíram apressados do carro e entraram no hospital correndo, o que causou um esporro da recepcionista.

Subiram até o andar que Lucy estava internada e encontraram Martin sentado no assento ao lado da porta. As mãos entrelaçadas apoiadas ao rosto indicavam que o homem orava. Percebendo a presença dos jovens ali, Martin interrompeu o que fazia e levantou a cabeça exibindo um sorriso que ia de orelha a orelha; Ele usava o uniforme de trabalho, assim como Zack usava o macacão manchado de graxa, o que dava a entender que ambos estavam no pedágio trabalhando antes de irem ao hospital.

— E aí, o que aconteceu Baby? – perguntou Zack ansioso, assim como Lizzie, que não sabia se preferia descobrir o que tinha acontecido ou não.

— Ela acordou! Simplesmente saiu do coma. Hoje cedo, o coração de Lucy, de repente, começou a acelerar, e ela teve um novo ataque... Ela chegou a ficar sem os batimentos e então, os médicos usaram o desfibrilador. Ela voltou ao estado anterior, mas abriu os olhos dez minutos antes de ligarem pra mim lá no trabalho – Martin falava sem pausas e aos prantos de felicidade.

Zack ficou boquiaberto de alegria e Lizzie de surpresa. Havia conseguido! No fim, ela não tinha matado Lucy como pensou, mas sim, salvado-a.

— E eu não contei ainda o mais... Mais assustador, mais emocionante, eu não sei como definir. O maior milagre, como os próprios médicos falaram – Martin deu uma pausa e inspirou profundamente – Quando acordou Lucy simplesmente retomou a visão! Ela não está mais cega! Oh meu deus, minha filha está enxergando! – exclamou.

Zack e Lizzie ficaram ainda mais incrédulos, e a menina foi invadida por uma sensação de satisfação e orgulho. Havia curado Lucy completamente!

Os três se abraçaram e os homens ficaram dando gritos de comemoração enquanto Lizzie, sorrindo, ainda não acreditando no que havia feito.


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