O Inferno de Lizzie Horn escrita por Ramone


Capítulo 10
Capítulo 9




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A casa estava escura, em silêncio... O rangido da madeira nas escadas soava mais alto que o comum quando Lizzie subiu para o terceiro andar. Estava com sono, irritada, e queria dormir cedo.

Abriu a porta e se deparou em um ambiente totalmente diferente do habitual quarto.  As paredes eram brancas, assim como o chão e o teto. A janela única que dava visão para a rua não existia, e em vez de um cômodo pequeno com alguns móveis de madeira, havia um grande salão iluminado por uma intensa luz branca, e no fim do quarto a garota viu a si mesma nua de pé, inclinada sobre alguma coisa deitada numa maca. O chão abaixo da maca estava encharcado do sangue que escorria daquilo que a outra Lizzie futucava. Ela se aproximou para tentar examinar melhor o que estava acontecendo e chegando ao seu lado, pode ver que em cima da maca estava o que tinha restado do corpo de Summer: A outra Lizzie havia simplesmente retirado toda sua pele, deixando o corpo de Summer como se fosse um animal abatido, pronto para vender sua carne. A Lizzie sorria, macabra, assistindo os músculos expostos da garota loira morta.

Ergueu sua pele, que parecia uma fantasia fedorenta e gosmenta, e contemplou-a por alguns segundos antes de colocar por cima de seu próprio corpo, tentando vesti-lo como se veste uma roupa. Era algo simplesmente impossível de ser feito, mas ela havia realizado. Tinha retirado toda a superfície do corpo de Summer e havia o vestido como um macacão com capuz. Dava gargalhadas, satisfeita, e só depois virou o rosto para olhar a Lizzie perplexa ao seu lado, olhando tudo incrédula.

“Agora estamos perfeita, vê?!” – exclamou com a voz abafada por baixo da pele de Summer.

Lizzie acordou com náuseas. Incrivelmente, já era de manhã e estava deitada na cama do quarto do terceiro andar. Demorou a se lembrar que havia subido pra lá na noite passada após a visita de Zack e Summer.  Só teve tempo de tirar a roupa de Lucy e escovar os dentes antes de cair na cama e dormir rapidamente.

Preparou uma vitamina de banana e tomou banho. Reutilizou a roupa que havia escolhido na noite anterior e foi andando até o hospital. Iria passar a manhã com Lucy como havia combinado com Martin. Teve sorte de acordar cedo sozinha, pois tinha se esquecido de preparar o despertador por precaução.

Ao chegar, se deparou com Martin cochilando na poltrona ao lado da cama que Lucy dormia. Acordou-o sem jeito.

— Bom dia! – falou baixo com uma voz gentil e um pequeno sorriso. Martin despertou com um susto.

— Ah, bom dia Lizzie! Que bom que chegou. Tenho que ir pro trabalho... Mas não se preocupe, voltarei mais cedo hoje! – avisou – Fique com ela só um pouco, não precisa passar o dia inteiro!

— Sem problemas - Lizzie sentou-se na poltrona quando Martin se levantou – Martin! Você conhece o Zack a muito tempo? – perguntou antes que ele deixasse o quarto.

— Não muito, na verdade. Ele começou a trabalhar comigo no inicio do ano.

— Mas você tem contato com a família dele ou algo do tipo?

— Bem, eu conheci a mãe dele uma vez, mas porque essas perguntas querida? – arqueou a sobrancelha.

— Por nada... É que vocês parecem ter uma grande conexão ou que se conhecem a muito tempo, sei lá – mentiu. Lizzie queria arrancar alguma informação sobre Zack através de Martin, pois ainda não tinha se esquecido das insinuações de Summer.

— Zack sempre foi um bom rapaz e faz um excelente serviço. No começo era bastante desengonçado e ainda é um pouco misterioso, mas acredito que seja um menino decente.

— Entendo... – suspirou desanimada.

— Estou indo agora Lizzie, se cuida. Até mais tarde! – exclamou antes de fechar a porta deixando-a sozinha com Lucy.

Logo em seguida, a enfermeira entrou no quarto. Sorriu para Lizzie e se aproximou de Lucy pelo outro lado da cama. Verificou os aparelhos e fez algumas anotações na prancheta. Virou-se pra Lizzie e avisou que ela não poderia ficar dentro do quarto já que não era parente, e só poderia ficar ali em dias de visitação. Teve de consentir contra sua vontade e precisou ficar do lado de fora. Só poderia permanecer sentada no banco do lado de fora do quarto, na capela ou na cantina do hospital. A enfermeira avisou que retornaria ao quarto de Lucy em meia hora.

Lizzie já esperava um pouco de dificuldade, mas ainda assim, não era algo tão complicado. Tinha 30 minutos para tentar fazer o que pretendia.

Foi até o fim do corredor e espiou. Não tinha quase nenhum movimento naquele andar, especialmente no corredor do quarto de Lucy. Abriu a porta cuidadosamente e se aproximou da cama, ficando de pé ao lado do mesmo. Observou triste a imagem de Lucy ali adormecida e imóvel. Apenas o barulho repetitivo do aparelho que reproduzia os batimentos cardíacos de Lucy dava algum sinal de vida dentro do recinto.

Virou a cabeça e pode notar que Tito estava bem ao ali, estacionado próximo as duas, como sempre, observando. Lizzie sentia que sua energia estava inquieta, sabia que ele não estava de acordo com o que ela pretendia fazer já que ele havia causado aquela situação.

— Você não vai ganhar dessa vez... Eu não vou deixar – sussurrou para Tito. Tinha medo que ele interferisse, e sabia que isso era perfeitamente possível, mas no fundo, ela sentia que nada a atrapalharia. Iria se arriscar pra tentar salva-la. Fechou os olhos com força e fez o mesmo com os punhos. Canalizou toda a positividade que conseguia encontrar em si mesma. Tentou afastar todos os pensamentos negativos, todas as lembranças ruins e todos os sentimentos amargurados que possuía. Tentava controlar sua respiração ofegante e sua pulsação. Precisava ficar calma, em paz. Minutos depois nesse estado, finalmente sentiu-se flutuar... Seu corpo era leve e sua mente estava totalmente limpa. Soltou os punhos e levou as mãos sobre o peito de Lucy. Ainda com os olhos fechados, Lizzie tentou transmitir a sensação que transbordava em seu espírito para o corpo de Lucy. Era uma sensação eufórica e ao mesmo tempo plena. Ela criava uma ligação que ia além da física, que levava a energia criada em sua mente numa velocidade que passava a luz ou qualquer coisa do tipo. Lizzie conectava-se ao corpo de Lucy, e conseguia até compartilhar as dores internas da outra garota. Sentiu seu coração doente e todo o seu organismo instável.

Quando começou a repará-los, a energia de Lizzie simplesmente foi invadida por uma sensação que vinha de outra fonte, totalmente contrária ao que ela transmitia através de suas mãos. Não era algo positivo, bom ou prazeroso. Lizzie não conseguia abrir os olhos e nem afastar suas mãos. Seu corpo tornou-se pesado e sua mente foi invadida por todos os sentimentos negativos que minutos atrás expulsara. Brigava mentalmente para afastá-los novamente, e sentiu que sua conexão com o organismo de Lucy ficava turbulenta, causando-lhe tontura e cansaço. Conforme seus reflexos corporais voltavam, Lizzie começou a ouvir que um dos aparelhos de Lucy apitava freneticamente, avisando que os batimentos da paciente haviam se intensificado.  O medo de causar uma fatalidade só aumentava a força da energia negativa que lhe invadia involuntariamente, e o desespero por não conseguir soltar suas mãos do corpo de Lucy, idem.  Histérica, Lizzie finalmente abriu os olhos, deixando também cair algumas lágrimas, e gritou. Exatamente neste momento, Lizzie puxou suas mãos, que enfim se afastaram do peito avermelhado de Lucy; Um impacto invisível empurrou Lizzie para trás, fazendo-a quase cair.

— O que você está fazendo aqui?! – perguntou a enfermeira num tom bravo quando entrou apressada no quarto.

 Lizzie ainda gaguejou ao tentar dizer alguma coisa, mas recuou. Saindo trêmula do quarto, quase esbarrou no médico que entrou correndo no quarto junto de outra enfermeira. Assustada, a menina correu para o lado de fora do hospital e só foi parar quando chegou à rua. Levou as mãos à boca, olhos arregalados. Parecia que ainda conseguia escutar o coração de Lucy bater desenfreado, quase explodindo. “Eu a matei... Eu matei a Lucy” – repetia mentalmente pra si mesma certa de que havia falhado no processo de cura. A principio, não conseguia entender o que tinha dado errado. Tudo bem que ela sabia do risco: Era um quadro grave, ela jamais praticara o necessário pra chegar ao resultado esperado e se fizesse da forma errada como tinha acontecido, era fatal. Mas estava tudo correndo bem, ela quase sentiu Lucy despertar... Por um momento Lizzie teve certeza que tocara a alma de Lucy e havia a trago de volta, mas num milésimo de segundo, alguma coisa atrapalhou completamente sua conexão, invadindo sua mente com um soco de negatividade.

Girou nos pés para olhar o hospital, mais exatamente pra uma das janelas do quarto andar onde estava o quarto de Lucy. Rangeu os dentes quando viu a imagem negra e destorcida de Tito parado em frente de uma delas, e teve certeza do que tinha a atrapalhado.


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