O Inferno de Lizzie Horn escrita por Ramone


Capítulo 1
Prólogo


Notas iniciais do capítulo

Gente, desculpe decepcionar vocês, mas eu resolvi postar a história novamente, pois ela desandou um pouco nessa, então vou reiniciar tudo!



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Dizem que os filhos não devem pagar pelos erros dos pais... Mas este conceito não vale no mundo sobrenatural. Se você não paga sua dívida, eles vão cobrar do seu primogênito, ainda que ele não tenha nem noção do que se trata e de qual é o preço.

No início, começa com alguns sustos, algumas perturbações. Como barulhos no teto, ruídos no porão, objetos mudando de lugar.. Até que um dia você vê o primeiro vulto, a primeira imagem... Uma imagem contorcida, mas que a princípio, você sente medo somente pela energia.

A maioria das crianças se protege embaixo do cobertor ou correm para a cama da mãe, mas eu ficava ali estática, encarando a figura negra que me vigiava todas as noites, esperando alguma coisa que eu não sabia o que era.

Das vezes que arrisquei conversar sobre estes acontecimentos com a minha mãe, ela apenas dizia "Seja indiferente, não tenha medo e nada acontecerá”, e eu confiava na informação. De começo eu fingia que era coisa da minha cabeça, e com o tempo me acostumei com a 'coisa'. Eu não tinha medo realmente, e a falta de contato social me levou ainda mais ao extremo: Eu conversava com a coisa. Compartilhava segredos, confissões, sentimentos... Não havia resposta, não havia abraços de consolação... Era apenas eu, uma criança de 12 anos conversando com alguma coisa intocável que me visitava às noites.

Se eu fosse mais nova, poderiam achar que era um destes amigos imaginários, mas ninguém estranharia meu comportamento, pois não tinha ninguém por perto pra fazer isso.
Era apenas eu e minha mãe morando numa cabana de campo à quilômetros de distância da urbanização. Meu único momento de inclusão social era na escola, onde eu era tão ignorada quanto em casa. Eu não arriscava falar nada sobre o que acontecia para as professoras, pois sabia que a reputação de minha mãe não era a das melhores. "Aquela mulher é louca! Totalmente insana" Era o que achavam. E não estavam totalmente errados.. Minha mãe perdera o real juízo a muitos anos. Para evitar ser levada à orfanatos ou coisas do tipo, eu apenas me excluía dos grupos da escola afim de não falar nada que levasse à um mal entendido.

Obviamente, esse comportamento e minhas notas baixas faziam com que os professores ficassem preocupados, e seria inevitável a presença da minha mãe na reunião de pais. Passou à primeira, a segunda e terceira reunião e nada dela aparecer.. Isso não agradou a escola, e fez com que a coordenadora fosse até nossa casa conversar com ela pessoalmente. Como ninguém sabia como chegar lá, ela me solicitou que eu a levasse, e eu fiz. Não deveria ter feito, mas fiz com medo de gerar ainda mais suspeitas.

A coordenadora ao chegar a nossa casa não gostou nada do que viu. Um ambiente sujo, desleixado... Nada apropriado para uma criança. Imagens e quadros bizarros espalhados pelas paredes, tinta descascada, móveis empoeirados. Pior do que a casa era a aparência de minha mãe. Uma mulher que aparentava ser mais velha do que realmente era, cabelos ressecados, pele pálida, roupa com traças e grandes olheiras. Seus olhos arregalaram-se ainda mais ao ver a coordenadora se aproximando de nossa varanda. Corri para dentro de casa, subindo para meu quarto no segundo andar onde fiquei observando pela janela. Atrás de mim, eu pude sentir a figura negra também olhando a cena abaixo.

A conversa da coordenadora com a minha mãe não durou mais de 20 minutos. Num instante, eu vi a Sra. James entrar no meu quarto dizendo que eu seria levada ao conselho tutelar e que alguém estaria chegando ainda aquele dia para me levar pra um "lugar melhor". Fiquei assustada a princípio, mas no fundo, aliviada. Nenhuma criança de 12 anos gostaria de viver totalmente isolada daquela forma.. Mas eu sabia também que nada seria assim tão simples como Sra. James achava.

Enquanto ela se despedia sumindo pela pequena estrada de barro que levava à cidade, eu pude ver os olhos de minha mãe ardendo em chamas e seus lábios contorcidos de ódio.

Quando o sol começou a se por, Sra. James e outra mulher bateram em nossa porta. Ninguém atendeu. E isso se repetiu por mais 10 minutos, o que fez com que as duas empurrassem a porta e fizessem uma busca por mim dentro da casa. Acharam-me no porão, deitada sobre uma cama, pulsos e tornozelos amarrados, e minha mãe sobre mim com um punhal erguido em direção ao meu peito. "Vocês podem levar o corpo dela, mas a alma não a pertence!" gritou histérica antes de apunhalar a si própria na barriga, caindo no chão desacordada.

Eu não chorei, não gritei, não esbocei nenhuma expressão ou sentimento naquele momento, muito menos depois que fui levada pelo carro da polícia para o orfanato da cidade vizinha. Apenas observei a imagem da casa do campo se distanciando e a figura de minha mãe parada na frente da porta, com mancha de sangue em suas roupas e me acenando com um sorriso mórbido.

Fui recebida no orfanato com carinho pelas assistentes que lá trabalhavam. Tentaram me oferecer tudo o que eu nunca tive de verdade, principalmente, carinho e atenção. Diferente das outras crianças, que estranhavam minha aparência e personalidade. Uma garota com cabelos negros escorridos pelo rosto, pele muito branca e olhos expressivos... Uma menina de 12 anos que preferia ficar sozinha do que brincando com os demais; Conversando com um amigo imaginário do que com as outras garotas. Eu era o motivo de piada e gozação entre as crianças do orfanato, o que me tornara ainda mais introvertida.

Alguns jovens casais em busca de uma criança até simpatizaram com o meu jeito disciplinado e tímido e minha aparência exótica, mas a maioria buscava bebês ou crianças mais novas, então eu não havia conquistado ninguém a ponto de ser adotada. E mesmo sem uma nova mãe, a minha morta as vezes me visitava em sonhos e aparições noturnas. As vezes ela surgia no banheiro quando eu me levantava de madrugada, e dizia que eu jamais teria um novo lar! Outras vezes, principalmente em dias nublados, eu a via no jardim com seu pijama ensangüentado acenando pra mim como fizera no que dia que parti.

Tentei contar para a psicóloga do orfanato sobre as aparições dela e da imagem negra que insistia em me visitar na hora de dormir e logicamente ela achou que tudo era efeito dos traumas que eu havia sofrido. A única pessoa que parecia acreditar na possibilidade de um mundo sobrenatural era a faxineira, Fabrizzia, uma senhora italiana com quem eu conversava aos sábados, dia em que ela ia limpar os quartos e aproveitava para papear comigo. Eu não entendia perfeitamente bem o que ela dizia naquele sotaque carregado, mas ela sempre contava histórias bizarras sobre acontecimentos estranhos em sua cidade natal.

Fabrizzia era a única pessoa com quem eu realmente me sentia confortável! E nem mesmo a minha aura negra (como ela dizia) a espantava. "Você carrega um fardo pesado.. uma dívida extensa e maligna. Eu não sei o que é e porquê, mas sinto esse peso.. eu vejo essa luz negra em torno de você!"- confessou ela em uma de nossas primeiras conversas.
Quando eu completei 15 anos, Fabrizzia disse que havia conhecido alguém que poderia me ajudar a entender 'tudo' e que me livraria daquele mal que me seguia. Eu fiquei confusa, mas ansiosa para conhecer essa tal pessoa que ela adiantou somente o nome, Raul, e que o havia encontrado à conselho de uma amiga da paróquia que costumava visitar. Fabrizzia falou que pedira permissão à superiora do orfanato para me levar na paróquia no fim daquele dia, o que esperei inquieta.
Infelizmente, a visita não aconteceu.

No fim da tarde encontrei Fabrizzia ao fim do corredor do segundo andar, paralisada de pé, olhando para a porta de um dos quartos, o que eu dormia por sinal. Aproximei-me e perguntei o que havia acontecido. "Tenho que ir fazer uma coisa.." – sussurrou antes de se virar e simplesmente ir embora, sem olhar pra mim, sem se despedir de alguém ou dizer alguma outra palavra.
No outro dia ouvi comentários entre as assistentes de que Fabrizzia havia cometido suicídio na noite passada. Cortara seus pulsos com um pedaço de vidro da janela que quebrara com a própria cabeça.

Foi a primeira vez em que eu chorei na vida. Um choro de uma lágrima só, que simplesmente despencou de meu olho direito quando pousei a cabeça para dormir. Ao sonhar, me vi sentada com Fabrizzia num jardim de rosas vermelhas. Os olhos verdes dela só não brilhavam mais que o sangue sob seus pulsos, que sujavam meu rosto enquanto ela acariciava-o de leve. "Sinto muito tesoro.. Não pude te ajudar.. Fui impedida! Fique com Dio" – ela falava num tom triste e carinhoso. Depois disso, as feridas de seus pulsos simplesmente começaram a abrir, como se uma força invisível repuxasse sua pele, retirando-a até que todo o seu braço ficasse com os músculos à vista. De repente Fabrizzia sumiu e todo o jardim começou a ressecar e então eu acordei num ato espontâneo.

O quarto escuro iluminado apenas por um feixe da luz do luar que invadia a janela, e pude visualizar a figura negra parada no pé da cama, como de costume. Naquele dia eu já não me sentia mais a vontade com aquela presença.. Fazia meses que eu não conversava mais com ela como um amigo imaginário.. Eu havia me acostumado à ignorar realmente, ou tentar.. Mas sempre que fazia isso, barulhos e coisas estranhas não perturbavam só a mim, mas como todo o orfanato, e logo, várias crianças começaram a comentar sobre isso com a psicóloga, que achou um pouco incomum que todo mundo passasse a ver e ouvir ruídos e objetos se mexendo.
O termo "orfanato assombrado" não demorou a surgir e a única que não sentia medo disso era eu.

Fiquei por lá cerca de 5 anos, e quanto mais velha fui ficando, mais eu era indiferente aos acontecimentos sobrenaturais do orfanato. Alguns, sem motivos paupáveis, me culpavam por aquilo. Confesso que minha aparência não ajudava muito, pois as roupas pretas e nada sensuais só reforçavam a palavra "estranha" na minha cara.

Aos 18 anos com a maioridade, porém, eu pude dar adeus à tudo e todos do orfanato. Mesmo sem ter com quem morar, ou aonde morar exatamente, preferi usufruir a liberdade que eu tinha por direito e tomei meu rumo, e os rumores de que a minha presença era o motivo da tormenta do lugar só ficou ainda mais forte, pois assim que fui embora, todas as coisas estranhas simplesmente pararam de acontecer. Felizmente, eu não estava lá pra ouvir mais nenhuma brincadeira ou insulto.

Antes de cair na estrada numa vida nômade, fui até a antiga casa de Fabrizzia. Como ela morava sozinha, o lugar estava abandonado, o que facilitou minha entrada. Eu sabia o que buscava, e fui encontrar dentro da bolsa que ela costumava usar quando ia ao orfanato. Uma pequena agenda com uma folha marcada; O nome 'Raul' e um endereço "Hamilton Ave, Trenton, New Jersey" estavam escritos. Eis o meu destino! Arranquei o papel e enfiei no bolso do jeans, deixando a casa de Fabrizzia e sua cidade para trás com todas as memórias tristes que dalí eu havia guardado. Eu estava decidida à encontrar o tal homem que ela disse poder me ajudar, ou qualquer um que pudesse fazer isso.. E começaria por aquela cidade, Trenton.


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Notas finais do capítulo

Espero que me compreendam!



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