The Wild Youth escrita por moonshiner


Capítulo 6
Your eyes look like coming home


Notas iniciais do capítulo

EI, PIMPOLHOS! Tudo bem? Atrasada, eu sei.
Estou preparada para desviar das facas, não me matem.
Sabem o que é sentar e só conseguir escrever um parágrafo por causa do exaustão e do bloqueio criativo? Basicamente, foi isso.
Eu sinto muito muito mesmo e espero que vocês não tenham perdido o interesse. Eu AMEI escrever esse capítulo e o resultado ficou muito bom, ao meu ver.
A música é Everything Has Changed, da Taylor com o Ed, espero que gostem!



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Leo
"All i know is we said hello
your eyes look like coming home
all i know since yesterday
it's everything has changed"

Fazia um tempo que eu não conhecia uma pessoa daquele jeito. O tipo de pessoa com quem você parece conversar uma vida sendo que você só a conhece há uma madrugada.

Charlotte era de Westfield, mas foi morar com o pai aos seis anos de idade em L.A. Tinha a mesma idade que eu, e, por coicidência, sua mãe podia muito bem conhecer a minha. Era filha da xerife, tinha descoberto a pior ressaca da sua vida há menos de cinco horas e tinha sonhos bizarros; por esse último, eu senti que a conhecia há mais de um ano. De dois, de dez.

Quando o dia clareou, estávamos sóbrios. Sentados no mesmo lugar onde havíamos nos conhecido, compartilhando um sono que até então não havíamos percebido. Ela abriu a boca em um "O" quando percebeu a luz do Sol lá fora. Eu sorri.

– A gente não deve falar tanto assim... né?

– Sim, nós falamos.

Ela concordou com a cabeça e eu estendi minha mão para ajudá-la a levantar.
Nós nos entreolhamos rapidamente e rimos um pro outro. Era esquisito com a Charlotte. Conhecê-la há uma noite e conseguir conversar daquele jeito me fez repensar algumas coisas na minha vida. Conhecia Piper há oito anos, e ela nunca tornou nossa aproximação possível. Ou fácil.

Mordi o canto da boca e lembrei-me vagamente de vomitar em seus sapatos caros. Merda.

– Está tudo bem? - Charlotte perguntou.

Balancei a cabeça vaga e imperceptívelmente, buscando a porta a nossa frente.

Claro? Por que não estaria?

Ele deu de ombros e abriu a porta.

O cheiro que abrigava o corredor me fez sentir o estômago em imensuráveis cambalhotas. Fileiras de garrafas vazias e desoladas formavam um mutirão pelas paredes, pelos cantos da casa. Cigarros usados, substâncias peculiares e até mesmo perigosas, roupas íntimas... tudo servia como complemento para um cenário pós apocalíptico com cheiro de virgindade arrancada. Um desastre, uma blasfêmia, totalmente desnecessário.

Tivemos que pular mais alguns sutiãs, calcinhas, camisinhas usadas e não usadas, copos vazios, nos degraus das escadas.

Na sala de estar, a foto não mudava. Meus amigos estavam todos deitados uns por cima dos outros, estatelados pelo carpete e desfalecidos nas poltronas. Bianca repartia o sofá com Tyler, dormindo com a cabeça encaixada em seu pescoço (hm). Maggie dormia sozinha na poltrona e Nico estava de bruços no tapete. Nate não estava ali, e Sam, como conseguimos ver em seguida, estava agarrada a uma caneca de café puro.

Ela veio serpenteando com os olhos anuviados, os cabelos presos num rabo de cavalo decadente. Mal conseguia manter-se em pé.
Charlotte trocou olhares comigo novamente.

– Uau.

– Quer uma ajudinha aí? - Ofereci, pulando o último degrau e impedindo-a de cair quando segurei sua blusa pelo cotovelo.

Ela soltou uma risada meio rouca e se apoiou no meu ombro.

– Opa.

– Eles são sempre assim? - Charlotte perguntou, a voz ligeiramente mais aguda.

– Só das segundas ás outras segundas. - Respondi. Sam tentou fazer um movimento para atingir o meu rosto, mas isso fez com que ela quase derrubasse a caneca de café fumegante no próprio pé.

Eu segurei sua mão e coloquei a caneca num apoio perto da gente.

– Sem condições de se defender agora, Sammy.

Ela resmungou, massageando as próprias têmporas. Seus olhos estavam entreabertos, inchados e cheios de olheiras. Pobre Sam.

– Queria estar morta.

Ela sentou no pé da escada e foi abrindo os olhos gradativamente. Tentou buscar qualquer ponto da casa em que a luz não estivesse presente, mas acabou apenas topando com Charlotte. Sam franziu o cenho e semicerrou os olhos:

– Eu te conheço. - Falou.

– Acho que não. - Charlie respondeu.

– Não, não foi uma pergunta. Você estuda com a gente?

Charlotte mordeu o canto da boca e esticou os dedos longos e pálidos pela barra da saia.

– Tecnicamente, eu sou novata. - Explicou.

Sam entortou o nariz e deu de ombros.

– Ainda acho que te vi de algum lugar.

Nico levantou a cabeça sob os pés de Maggie. Novamente, seus olhos demoraram a se acostumar a claridade. Vagaram lentamente pelas coisas ao redor e acho que ele se surpreendeu ao se encontrar em um lugar conhecido. E por estar vestido.

– Eu acho tão irritante acordar de manhã e descobrir que ele ainda não morreu. - Comentou, roendo as unhas.

Nico se levantou do chão, caminhando até a gente. Seus pés tropeçaram, seu corpo não parecia orbitar no lugar certo. Seus cabelos negros só atrapalhavam sua visão e ele estava com o inconfundível cheiro de perfume feminino e vodka.

– Oi. - falou com a voz rouca. Pegou a caneca de café de Sam de cima do apoio e tomou um gole afobado. - Bom dia pra você e pra garota desconhecida, péssimo dia pra você. - Nessa última, ele se referia a Sam.

Ela revirou os olhos e fez um barulho esquisito com a garganta.
Ele se sentou ao lado dela no degrau e ambos dispuseram de um olhar significativo para Charlotte. Seja lá qual fosse a sensação de reconhecimento de um rosto desconhecido, eu parecia tê-la também.

Eles se olharam, nós nos olhamos, Charlotte encarou a janela e Sam e Nico se comunicaram aos sussurros.

– Sou o Nico. - Ele disse, por fim, com um leve maneio de cabeça.

– Sou a Charlotte. - Ela sorriu largamente. Ela também tinha aquela expressão de "eu já te vi em algum lugar?''.

Eu conhecia Nico suficientemente bem para saber que todas as coisas que deviam estar passando pela sua cabeça naquele momento tinham pura conotação sexual. Ele estava lutando contra os próprios instintos para saber o que tinha acontecido noite passada, mas até ele sabia que seria anti - ético perguntar sobre aquilo.

Eu e ela nos sentamos no chão, Sam se apoiando no ombro de Charlotte sem permissão.

– Você precisa de ajuda? - A novata perguntou. Ela bateu os cílicios várias vezes até Sam responder.

– Tem veneno de rato no armário da cozinha. Você pega e eu acabo com essa dor de cabeça terrível. - Debochou, fazendo Charlie sorrir.

– Divide comigo. - Nico pediu.

Sam franziu o nariz e afastou seu ombro, que estava quase roçando no dele.

– Até a morte é boa demais pra você.
Eu ri alto.

– Se quiserem, eu posso fazer um remédio caseiro da minha avó. Cura ressacas muito bem. - Charlie se ofereceu.

– Tipo aquela bebida do Barney Stinson? - Nico semicerrou os olhos, um sorriso brincalhão passando pelos lábios.

– É, tipo essa daí. - Charlie balançou a cabeça.

– Eu só quero guardar essa minha disposição de querer estar morta pras sessões de terapia segunda - feira. - Sam encostou a cabeça na parede e soltou um muxoxo de lamento. - Qualquer ajuda é bem vida.

Ao longo da manhã, o resto do pessoal foi acordando. Bianca caiu do colo do Tyler quando percebeu sua ereção matutina, e Maggie, a pobre Maggie, dizia não ter visto Nate. E alegava não se lembrar de nada da noite passada.

Antes do meio - dia, tomando a bebida agridoce e benéfica que Charlotte havia preparado, todos estavam um pouco mais recompostos. Ainda intrigados, encantados e gratos, mas sóbrios o suficiente para poder ajudar a limpar a bagunça da casa.

Eles faziam perguntas engraçadas pra novata. Insinuavam coisas que não deveriam insinuar para pessoas semi - desconhecidas. Charlie apenas concordava com a cabeça, abaixava o olhar pro chão e continuava limpando. As bochechas coradas, muitas das vezes aparentando vulnerabilidade.

Ela era diferente. Não era fraca, não era frágil. Era pura. Não parecia o tipo de garota que gostaria de partir corações por diversão, mesmo que quisesse. Ela era diferente da Piper.

A casa foi ficando pronta, com seus desleixos aqui e ali. Tentamos recuperar o estado anterior ao da festa, e conseguimos vagamente. Nate não deu sinal de vida, mesmo depois de Nico e Bianca ligarem loucamente. Ele não atendeu. Eu tinha visto sua conversa com a Piper de longe.

Apertei os olhos, cutucando com as unhas roídas a madeira lustrosa de mesa.
– Então, Charlotte - Bianca se sentou no mesmo pé de escada, que ficava de frente pro resto da cozinha. - De onde você é? - Perguntou.

– Daqui mesmo. - Charlie respondeu. - Eu nasci aqui, mas fui morar na Califórnia com seis anos.

Tyler franziu o cenho.

– Você morava na Califórnia e quis voltar pra cá? Por quê?
Ela fez uma careta. Parecia ter tomado um gole de água sanitária.

– Eu... queria ficar perto da minha mãe e essas coisas. - Disse.
Meus amigos pouco se convenceram.

– Ela é filha da xerife. - Acrescentei.

Ela sorriu sob alguns olhares admirados. A xerife Campbell era uma mulher poderosa, todo mundo gostava dela. Era respeitada, colocava medo nas pessoas sem precisar de muito. Esperava ver esse lado na Charlotte o quanto antes.
Tyler sorriu de um jeito prepotente demais pro meu gosto.

– Isso explica muita coisa. - Riu-se.

Ele foi o único.

Charlotte endireitou sua postura na cadeira e se inclinou um pouco sobre a mesa, como se pedisse para ele prosseguir. Seus olhos foram se tornando frestas bastante felinas.

– O que quer dizer, meu amor? - Perguntou. Sente a ironia.

Nico virou o rosto em outra direção, como se estivesse premeditando a merda. Tyler lambeu os lábios sob nossa expectativa.

– É que você é bem certinha, deve ter que ser a filha modelo, eu suponho. - Respondeu. - Isso explica vocês terem ficado a noite toda dentro de um quarto... conversando.

Ele prendeu o riso.

Charlotte virou o rosto e piscou seus longos cílios, várias e várias vezes, até responder.

– Eu sei que você deve ficar louco com qualquer par de seios que aparece na sua frente, mas por você ser um naufrágo desesperado por sexo, aparentemente, não significa que o amigo de vocês tenha que fazer o mesmo. - Ele tomou um gole de chá. - Sou uma garota, não o prêmio de consolação.

Foi a vez de Bianca e Sam se entreolharem. Antes, claro, do resto da cozinha que não estava recolhendo a dignidade do chão, explodir em risadas.

Coloquei minhas mãos atrás da cabeça e um sorriso debochado e orgulhoso se fez presente. Dei tapinhas nas costas de Charlotte, parabenizando-a.
Bianca sentou ao lado de Charlotte, abraçando-a de lado e mordendo sua bochecha carinhosamente. Era o jeito da menina di Angelo de avisar quando ela gostava de você. A novata não achou aquilo esquisito.

– É o jeito dela de causar boa impressão nas pessoas. - Nico avisou.
– Ela está conseguindo. - Ela riu, sem jeito.

Analisei Charlotte meticulosamente por alguns segundos. Sem malicia ou vontade de chamar atenção, só por olhar.

– Vamos ficar com a novata, crianças. - Anunciei.

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Eu saí de lá um pouco antes das duas da tarde, com um encontro. Tudo bem. Não era bem um encontro. Charlotte só queria alguém pra lhe mostrar a cidade, e eu me ofereci.

Fui pra casa de bike, pela estrada mais longa. Eu gostava de ficar bastante tempo debaixo do céu, imaginando o dia em que eu construíria um prédio que consiguiria tocá-lo. Senti o calor nas panturrilhas, por pedalar rápido demais. Gostava daquele calor em particular.

Vi as rosas do jardim da minha mãe marcando o verde ao longe. Diminuí a velocidade e comecei a preparar o meu psicológico. Não tinha avisado que não voltaria pra casa noite passada e não levei o meu telefone. Provavelmente, nem me liguei.

Joguei a bicicleta por cima de algumas flores e ainda sim tentei não pisar em algumas tulipas.

Parei em frente a porta e girei a maçaneta com cuidado, premeditando a merda. Das duas, uma: meu pai teria tido mas um dos seus ataques bipolares ou ele e a minha mãe teriam ficado acordados a noite toda me esperando voltar pra casa.

A casa estava vazia, tal como o primeiro andar inteiro. Fiz questão de me certificar. O primeiro sinal de que eles renegavam totalmente a minha atitude era não estarem em casa para me pegarem de surpresa uma outra hora. Já acontecera outras vezes.

Subi as escadas e vasculhei o corredor. Estava escuro, mas a porta do quarto deles estava entreaberta, deixando passar um filete de luz bem modesto e opaco. A madeira rangia sob os meus pés toda vez que eu dava um passo calmo e pensava ter visto alguma coisa. Uma sombra, por menor que fosse. Talvez fossem fadas.
As vozes baixas, alguns baques e minhas mãos ficando tensas. Meu pai tinha bipolaridade, suas mudanças de humor não eram novidade. Ás vezes, eram frequentes demais. Eu tinha medo de sair de casa desde aquela noite de 2007. Ele acabou com ela.

Afastei a porta do que deveria ser uma fresta e rezei tremulamente para que nunca tivesse feito. Foi horrível, repugnante, asqueroso e traumático.
Meus pais estavam transando.

Eu gritei e minha mãe caiu da cama. Eu soltei mais um grito agudo e bati a porta.
Ouvi a movimentação frenética de dentro do quarto. Meus pais resmungavam, discutiam entre si, tudo muito eufóricamente.

Tentei me acalmar.

Na vida, todos os seus traumas se categorizam em um post it colado na mesa do escritório de Deus. Tem pra todos os gostos: ouvir a Yoko fazendo um cover de Firework, pegar sua namoradaamorado transando com seu irmãoirmã, assistir um filme do Von Trier, etc. Essas coisas mudam gradativamente de efeito, mas o pior deles é um filho pegar os pais tendo relações. Puta que pariu, que nojo da porra.

Eu esfreguei os olhos, como se estivessem queimando, e de fato, estavam. Minha mãe tomou as rédeas da situação e colocou a cabeça para fora do quarto, os cabelos desgrenhados e a testa suada.

– Querido, vá para o seu quarto. Conversamos daqui a pouco.

– O que vocês pensam que estavam fazendo? Gente velha não transa!

– Velhos o seu cu, filho. - Meu pai protestou do lado de dentro do quarto.

– Você sumiu a noite toda, não está em condição de decidir a nossa vida sexual! - Minha mãe me deu um sermão dessa vez. - Aliás, transar é perfeitamente normal e aposto que você também...

– ESPERANZA. - Eu e meu pai dissemos em uníssono.

– Conversamos depois, mulher. - Coloquei a mão no peito dramaticamente. - Quando você estiver vestida.

Virei de costas e fui para o meu quarto, desfrutando do trauma que teria comigo pelo resto da vida.

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E eles não tinham feito nada. Acharam que ter visto eles transando já havia compensando o meu castigo. Estávamos reunidos na sala. Eu estava lendo um livro sobre um arquiteto brasileiro bastante renomado, enquanto meu pai assistia Doctor Who e minha mãe escrevia algum texto feminista pro seu blog.

– Eu conheci uma menina. Vamos sair hoje. - Falei.

Minha mãe levantou os olhos amendoados do notebook e meu pai parou de prestar atenção no espisódio de Doctor Who na tv.

– Eu achei ela muito legal. - Fechei o livro sobre o meu colo. - Voltou pra cidade ontem. Se chama Charlotte, filha da xerife.

– Charlotte! - Minha mãe falou. Pegou rapidamente uma caixinha envernizada em cima da mesa e começou a revirar tudo o que tinha lá. Fotos.

Gritou um euréca quando achou uma em especial e a estendeu para que pudessemos vê-la melhor. Marcava uma cabeça feminina.

A foto fora tirada na década de 90, a data estava bem acima. Quatro crianças, usando roupas de banho e paradas perto de uma piscina. Eu não lembrava daquela casa, muito menos daquele dia, mas eu me lembrava daquelas crianças. Tinha o Nico, com seu corpinho magricela e uma expressão zangada por estar tirando uma foto. Sam tinha uma barriguinha infantil bastante saliente e trancinhas no cabelo. Eu, ainda mais magro no passado do que seria hoje em dia, e uma outra menina. Ela era bem branquinha, tinha cabelos escuros e bastante lisos e seus olhos pareciam reluzir na foto.

Poderia ser Bianca, se não fosse aquela mancha de nascença bastante peculiar no quadril. Reconheci os olhinhos castanhos e brilhantes.

– Charlotte? - Perguntei, curioso.

Ela assentiu, sorridente.
– Pensei que ia se lembrar, vocês brincavam juntos o tempo todo quando crianças. - Ela estava feliz por Charlotte estar de volta.

Eu vasculhei minha mente. Procurei flashes e lacunas. Encontrei flashes e encontrei lacunas que poderiam ser preenchidas com eles facilmente. Eu me lembrava de parquinhos, casas de bonecas, jogos violentos. Me lembrava de rolar na areia e de uma menininha imponente vestida de branca de neve. Isso explicava o por quê dela ser tão familiar. Me perguntei mentalmente se ela sabia.
Meu pai lambeu os lábios e deixou-os entreabertos, como se quisesse fazer uma pergunta e repensasse no último segundo.

– Não é um encontro, se é só isso que está pensando. - Falei.

Minha mãe passou a ponta do dedo pela parte superior da minha orelha. Pontiaguda como a de um elfo.

– Como ela está? Perdi contato com a Aimee Campbell esses últimos anos.
– Bonita. Engraçada. - Respondi. - Quer ser cineasta e me aguentou falando a noite toda sobre uma menina que não dá bola pra mim. Eu diria que ela é e está ótima.

Ela e o meu pai se entreolharam.

– Espero que você largue dessa Piper. - Comentou Esperanza, como quem não queria nada.

– Ela quer ser cineasta, usa aquela camisinha que eu te dei. - Meu pai me recomendou.

Eu ri, meio incrédulo e minha mãe lhe deu um soco no braço.

– Espero que você largue daquela tal de Piper. - Continuou. - Nunca gostei dela.
E ela realmente não gostava. Desde o primário, quando ela não me chamou pra festa de aniversário super descolada dela. Ela achava Piper tão arrogante que a colocaria num reformatório se fosse possível.

– Onde vocês vão? - Ele perguntou.

Ele estava orgulhoso pelo meu encontro, agindo como se fosse um. Mais tarde, me daria uma camisinha e me diria para respeitá-la.

– Não sei ainda. - Disse. - Sugestões?

Ele coçou a barba. Não pensou muito. Estalou a língua entre os dentes e sorriu vitorioso.

– Tem um lugar. Ela gosta de cinema, não é?
Assenti.

– Peter Soneclair. O Fantasma da Sétima Arte. Ele é a resposta.
Arqueei as sobrancelhas.

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Eram um fim de tarde nublado. Eu estava parado em frente ao parque, as mãos congeladas enfiadas dentro do bolso do casaco. Dentro do casaco, uma folha de papél. Continha o endereço de Peter e tudo o que eu precisava saber. Meu disse que iria impressioná-la, só que eu não estava tentando fazer isso. Estava tentando fazer com que ela se sentisse em casa, mas ele negava a dinâmica. Me deu dinheiro para comprar flores e me deu uma camisinha. Escreveu num papél o seu famoso conselho e guardou-o na minha jaqueta.

Senti algo vibrando na minha mão e tirei o meu celular de lá. O rosto despreparado e semibêbado de Charlotte apareceu na tela.

– E aí?

– Oie.

– Onde você está? Estou te esperando há mil anos. - Mentira, eu só estava ali há dez minutos.

– Você está distraído. Se estivesse mesmo prestando atenção, já teria me visto. Olha pro fim da rua, bundão.

Ela desligou o telefone na minha cara e se fez vísivel numa árvore meio afastada de onde eu estava. Vinha caminhando com um sobretudo vermelho, os cabelos escondidos por uma touca de lã preta. Tinha um sorriso frouxo no rosto, que parecia que ia desabotoar e voar pra longe a qualquer momento.

Quando ela parou a minha frente, nos inclinamos para um abraço meio rápido e sem jeito.

– É bom te ver. - Ela mordeu os lábios e apertou a manga larga do casaco. Se balançou levemente de um lado para o outro, esperando que eu disesse alguma coisa.

Enrosquei seu braço no meu e fiz menção de começarmos a caminhar.

– Eu não posso contar. Mas talvez você goste.

– Isso não é justo! - Ela protestou, a voz ligeiramente mais infantil. - Tem a ver com cinema?

– Sim. - Uma velhinha passou pela gente e sorriu para os nossos braços entrelaçados. - Mas não é cinema.

Ela franziu o cenho e nos questionou em silêncio.

– Posso confiar num estranho que está me levando para terras desconhecidas?

– Indagou para o nada.

– Você acha que é louca o suficiente pra mim?

– Depende, qual seu nível de loucura?

– Quase esquizofrênico. E o seu?

– É psicótico!

– Então nós somos compatíveis.

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Ela foi tentando adivininhar o caminho. Tentando reconhecer as casas, bancar a maconheira que se orienta pelo Sol e pelas nuvens. Eu ria das suas tentativas. Frustradas, em grande maioria.

Eu fui reparando que a cada passo mais perto da casa, as coisas ao redor iam se apagando. Estávamos indo para o lado da cidade onde não deixavam passar nenhuma alma viva que ainda tivesse objetivos de vida. A casa de Peter Soneclair, era pra onde estávamos indo. O fantasma da sétima arte, seu nome átado eternamente as trepadeiras de uma casa que ninguém jamais teria coragem de visitar.

Acreditem se quiser, mas foi o lugar para qual meu pai levou a minha mãe no primeiro encontro deles. Só que eu não queria que ela pensasse que aquilo era um encontro. Era?

A casa ficava bem no fundo de Westfield, entranhada por passagens secretas. Paramos em frente a uma vizinhança fantasmagórica e vazia. Tudo ao redor condizia com o nome do dono. Era pra ser um ponto turístico; o cara havia praticamente trazido o cinema pra cidade. Mas ele foi esquecido. Era uma mansão, grande, colonial.

– O que é isso, Leo? - Charlotte perguntou, intrigada, mas não amendrontada.
Era um grande bloco de concreto que se estendia a nossa frente. Um grande bloco de concreto, cheio de empáfia, cheio de mofo, cheio de traças. Janelas estilhaçadas, coleções de clássicos provavelmente usurpadas. Aquilo me deixou deprimido.

– Você conhece Peter R. Soneclair? - Perguntei. Pus meu pé na varanda, ouvindo o ranger da madeira.

Ela hesitou. Inclinei a cabeça um pouco e abri os meus braços.

– Está com medo?

– Não tenho medo.

– Deve ter medo de fantasmas.

– Tenho medo de fantasmas que não falam. - Ela encerrou a discussão, pisando na varanda também.

– Resposta profunda. - Reparei. - Mas você sabe quem ele é, não sabe?
Ela assentiu. Ficaria surpreso se não soubesse.

As várias janelas estilhaças ainda transluziam os cartazes destruídos que eles penduravam por ali. "Fechado aos domingos" ou "proibida a entrada sem autorização."

Antigamente, quando eu era bem pequeno, eles passavam filmes na grande sala de cinema que existia na frente da casa. Cinema de rua. Parecia ter mais estrutura que o cinema propriamente dito da cidade, diga-se de passagem. Peter já estava morto, é claro.

– Vamos entrar ou não? - Chamou minha atenção. - Se é que podemos entrar aqui.
Suas mãos estavam tremendo dentro do bolso. Seu rosto ganhava um tom mais escarlate a cada segundo que as minhas mãos pareciam se aproximar daquela porta. E, por incrível que pareça, ela não estava trancada.

Eu entrei. Poeira voou de onde os meus pés haviam parado e a porta não parou de grunhir até tocar a parede uma última vez. Era gigante, e, diferente dos outros lares, encolhia em vez de acolher.

Duas escadas se estiravam de cada lado da sala de estar. Devia ter minha casa inteira lá dentro. Eram as duas em formato de caracol, em um branco envelhecido que mais parecia cinza. O carpete espesso, embulhado em poeira. A casa toda estava vazia, tirando alguns móveis aparentemente vandalizados, juntamente das paredes. O papel desgastado tinha sido rasgado, escrito com coisas ilegíveis.

– Não quero entrar aí. - A voz manhosa e definitiva de Charlotte falou. Ainda estava há alguns centímetros afastada da entrada, mas ainda podia ver um semblante claramente hesitante. Com uma espécie de remorso.

– Não existem fantasmas aqui. - Respondi. - Não está acostumada a burlar a lei, está? - Sorri.

Ela virou o rosto calmamente para a rua deserta e pareceu se questionar duas vezes se alguém estava vendo.

– Vamos lá, Novata. Eu não mordo, a casa não é assombrada.
Ela permaneceu impassível.

– Nunca fez isso antes, né? Burlar as regras.

Ela forçou uma risada. Sabia que nunca tinha feito nada do gênero.

– Claro que já! Eu tinha amigos que nem você na Califórnia. - Se colocou cheia de pesar dentro da casa, só para enfatizar a mentira de já ter sido fora da lei uma vez na vida.

– E o que vocês fizeram de tão errado? - Retorqui.

– Bem, roubamos alguns livros da biblioteca da escola porque não tínhamos dinheiro para comprar. - Falou tranquilamente. - Na verdade, só não devolvemos.
Eu tentei não rir.

– Essa é a coisa mais errada que você já fez? - Debochei. - Sério?
Ela bufou, irritadiça e impaciente.

– Estamos aqui para explorar a maravilhosa mansão aos pedaços do Peter ou pra falar de mim?!

Eu ri.

– Certo, certo. Você venceu.

Continuei avançando. Tinha a sensação de que a casa ia se dissolver sob nossos pés a qualquer momento, de tão decadente. Vi alguma coisa subindo na parede, correndo para trás de um retrato abstrato. Não falei nada.

– Temos que ir até o porão. - Anuncei. - Eles guardavam todos os filmes dele lá, deve ser enorme.

Ela assentiu. Ainda não havia dito para Charlotte que nos conhecíamos desde crianças, mas acho que ela já sabia. Senão, qual outro motivo para me deixar levá-la ao porão de uma casa no nosso primeiro não-encontro? Uma casa que nem era minha.

– Eu sei quem é Peter Soneclair, de nome. Só não sei quem foi.

Estava tentando encontrar o porão. Passamos pelo hall de entrada e fomos atá as traseiras de uma das escadas. Um armário. Na vastidão empoeirada que se encontrava a sala, todas as estantes vazias. Na cozinha, algo deplorável.
Charlotte entortava o nariz pra tudo aquilo que parecia ter perdido a validade em 1978. Tudo mesmo, como a própria casa. As outras coisas não existiam. Uma pintura só na parede, um sofá rasgado. As paredes desrespeitadas ao extremo, o carpete cheirando a bebida e cigarro de outras pessoas. Com marcas de coisas que eu não saberia decifrar.

Era um ambiente desconfortável, que me fazia questionar todas as vezes da minha vida de por quê eu ainda estar lá. Que tipo de pai manda você para uma casa abandonda na intenção de impressionar alguém? Francamente.

– Eu ainda quero saber o que estamos procurando aqui. - Disse.
– Olha, não é culpa minha. - Respondi, meio na defensiva. - Meu pai disse que o primeiro encontro dele e da minha mãe tinha sido aqui, aí eu pensei: nossa, deve ser um lugar bacana, só que parece a porra da mansão da família Adams.

Ela encarou as próprias botas de frio e se deu por vencida por alguns segundos. Sabia que não estava reclamando, e ainda sim não poderia tirar esse direito dela. De qualquer forma, a palavra "encontro" pareceu absorver toda sua atenção.

Peguei o celuar no bolso e pressionei o flash da câmera, buscando explorar a casa mais calmamente. Estávamos no coração apedrejado de um poeta em ascenção na época dos Beatnik. Uma coisa que poderia facilmente sair dali, era liberdade.

Entramos por um corredor amplo. Escuro, barulhento e envergado, porém amplo. Não existiam fotografias na parede, nem pinturas. Eu não sabia se ele tinha posto tudo a venda antes de morrer ou se o descuido da cidade com a casa havia feito com que algumas pessoas roubassem. Era triste.

Charlotte vinha logo atrás de mim, tocando a parte de trás do meu casaco com as pontas dos dedos, como se estivesse com medo de me perder de vista. Apontei a luz da lanterna pro fim do corredor e senti Charlotte me segurando antes que eu pudesse chegar até lá.

Parou num canto específico, levantando seus pés sobre um tapete e colocando-o novamente.

– Escuta isso. - Ela pousou o pé sobre o piso. O chão fez um barulho meio oco e um som pequeno e metálico retiniu.

Posicionei a laterna bem na frente do local enquanto Charlie tirava o tapete sujo de cima. A poeira se iluminou modestamente ao redor e depois cessou.

– Achamos. - Falei, sorrindo.

Segurei o gancho que faria a porta se abrir. Frio, pesado e protetor. Antes que pudesse levantar, Charlotte interceptou.

– Pra que você quer entrar aí?

Eu respirei fundo.

– Porque aqui, Charlotte, é o cemitério de um dos caras mais importantes pro cinema de Westfield. - Respondi. - Se não fosse ele, aposto que nem saberia quem é Audrey Hepburn.

Ela revirou os olhos.

– Mas e os ratos? - Tornou a perguntar. - E se tiver, sei lá, um defunto ali?
Puxei o pedacinho de metal decididamente e senti o cheiro de mofo tomar conta das minhas narinas. O silêncio se esgueirou por nós dois e circundou cada pedacinho de casa, dançando uma valsa lenta com mais poeira que continuava a espirolar por aí. Tossimos, não pela primeira vez.

Dei a lanterna para Charlotte e coloquei meus pés suspensos dentro do buraco.

Ela levantou a mão mais um pouco e eu pude ver claramente: pilhas e mais pilhas, de cadernos, de prováveis roteiros esquecidos, de fotografias, de discos, de filmes soterrando boa parte das paredes. Aquilo sim seria maravilhoso.

Me larguei livremente sobre o chão do porão, o cheiro de lugar fechado e esquecido se acentuando a cada passo. Eu não conseguia ver nada. Charlotte entregou meu celular nas minhas mãos, por não estar muito no alto. Se jogou contra o piso de madeira logo em seguida, espirrando.

Coloquei a luz bem no seu rosto. Seus olhos se iluminaram por outros motivos. Todos aqueles filmes. Todos eles. Todos aqueles possíveis roteiros nunca terminados. Ela sorriu sem pudor.

– Eu disse que você acabaria se impressionando. - Sorri vitorioso.

Ele tinha posto quatro estantes circundando quem quer que entrasse lá. A sensação era de sufocamento. Causa da morte: asfixia. Asfixia por criatividade esquecida.

Charlotte dedilhou algumas fitas, alguns rolos de filme e tamborilou seus dedos pálidos pelos díarios enfileirados na estante. Abriu a boca como se fosse dizer algo, mas apenas se calou.

– Nós vamos ver algumas dessas coisas? - Perguntou. - Quer dizer, é errado, mas...

– Eu sei. - Balancei a cabeça. - Mas é mais justo do que deixar a vida toda do cara apodrecendo aqui embaixo.

Ela me olhou, depois olhou pros possíveis roteiros, depois pros diários, depois pra coleção imensurável de filmes inacreditáveis que ele parecia ter e depois me olhou novamente.

– Nenhum artista vem ao mundo com a intenção de que ninguém saiba a sua história, certo?

Eu concordei.

– Mas... se ele queria que alguém soubesse, por que guardou por tanto tempo?

– Questionou.

– Ele só queria que as pessoas certas soubessem. - Falei.
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Fomos para a casa da Charlotte depois de pegar tudo o que precisávamos. Umas cartas, uns diários, uns poemas que não eram dele. Eu expliquei pra ela toda a história: ele tinha sido famoso por ter todos os seus trabalhos bem sucedidos conhecidos a partir de pseudônimos. Seu pai, Joseph Young Soneclair, havia sido um cineasta famoso e por isso, ele não queria ficar preso no nome da família. Ele foi casado com uma das musas de Hollywood, que morreu misteriosamente e precocemente em 1958. Ele se matou uns anos depois, e isso era tudo o que sabíamos. Só descobriram os filmes que ele mesmo havia dirigido em 1963, depois de se matar.

Charlotte ficava fascinada com qualquer tipo de coisa que demonstrasse a parte crua do ramo. Qualquer coisa que fizesse ela entender e aprender que a sétima arte estava conectada a sua própria carne. Aquilo a deixava ainda mais animada, decidida, imutável de sua própria índole. Lembrei da garota de cinco anos que me mandava ajoelhar e fingir de anão. Lembrei da garota que um dia correu por aí com uma filmadora. Lembrei por meio de flashes, mas me perguntei se ela sabia que nos conhecíamos.

Seus olhos me seguiam como se soubesse.

Estávamos sentados no tapete roxo e aveludado, saboreando nossos pedaços de pizza.

– Eu lembro de quando você era criança e gostava de se vestir de rainha má. - Falei.

Ela pareceu surpresa. Era o mesmo caso que o meu. Ela sabia que nos conhecíamos, mas havia guardado para si mesma.

– É. Eu percebi. Sinceramente, que tipo de otário não perceberia? - Debochei. - Alta, magra, linda, com esse sorriso bonito e a covinha no queixo. Que tipo de otário não perceberia? - Repeti.

Ela corou levemente e riu pelo nariz.

– Bem, tem a ver com os motivos pelos quais eu voltei. Eu pensei que se ninguém se lembrasse de mim, eu poderia ser uma pessoa totalmente diferente. - Confessou. Não parecia sentir muito orgulho daquilo, mas isso não a impediu de sorrir. Tinha um sorriso inacreditavelmente bonito para qualquer pessoa que olhasse. Era verdade. - Não funcionou, eu ainda me preocupo em chegar cinco minutos atrasada nos lugares e todas essas coisas. Mas eu me senti um pouco diferente naquela festa da sua amiga Sam, e apesar de ter sido uma merda pra mim, valeu a experiência.

Eu pisquei um pouco. Queria perguntar o que tinha acontecido de tão ruim na Califórnia. É óbvio que ela não iria responder.

– Eu não te contei porque queria te pegar de surpresa. - Peguei minha jaqueta jeans em cima da cama king size e tirei de lá a foto que minha mãe havia me mostrado mais certo. Segurei-a entre o dedo e só cedi quando Charlotte me deu o último pedaço da pizza de calabresa.

Ela sorriu admirada.

– Meu Deus, que criancinhas mais esquisitas. - Acariciou os rostos das fotos com a unha comprida. - Mas éramos umas gracinhas.

– Ainda somos. Não perdemos o sex appeal. - Retorqui.

Ela soltou uma gargalhada contida e se jogou para trás no tapete, apoiando a cabeça no braço. Fiz o mesmo, afastando a caixa de pizza vazia do seu lado.
Deitamos um do lado do outro, as cabeças quase se encostando. Seus cabelos escuros, longos e sedosos estavam derramados pelo chão, envolvendo-a como uma manta, como se flutuassem. Tinham cheiro de banana com canela.

Sua pele era clara. Seus lábios eram lindos. Seus olhos eram cor de mel, bastante expressivos por causa das sobrancelhas grossas. Tinha um nariz longo, mais interessante do que bonito, mas isso não tirava nem um pouco a aparência delicada e antiquada. Ela realmente parecia uma bonequinha dos anos 50.

– Essa é a primeira amizade que eu faço em longos anos presos nessa cidade. - Comentei. - E eu não estou com vontade de me decepcionar, então, por favor, seja decente.

– Prometo. - Ela cruzou os dedos e pousou sua mão sobre o peito. - Juro solenemente, porque também sinto isso.

Ficamos em silêncio por alguns segundos. Eu admirava e sempre admiraria nossos intimidade mútua e precoce. Não queria que fosse algo do momento, queria que durasse mais do que o previsto. Não é todo dia que você encontra uma pessoa com quem você possa falar de serial killers e em cinco segundos depois comentar sobre uma receita de bolo. Esse tipo de pessoa só aparece uma vez na sua vida, e depois, só mais uma, para fechar a rodinha.

– Me promete uma coisa? - Perguntou.

– Depende.
– Vamos nos proteger de sermos otários.

– Totalmente de acordo.

Ela riu fraquinho e virou seu rosto pra mim.

– E a casa do Peter pode ser nosso lugar especial. E nunca vamos mostrar essas coisas pra ninguém. É coisa nossa.

Eu assenti. Proposta promissora.

– Nada mais justo. - Concordei.

– Ótimo.

Estar com Charlotte, por algum motivo, me fazia sentir o espalhafatoso aquecimento no peito de se estar em casa de novo. Ela tinha cheiro de primavera e olhos que pareciam me lembrar todos as pequenas coisas que eu havia esquecido que gostava quando pequeno. Era um sentimento que atropelava alguns outros. Sentia saudades de alguém que não me lembrava e poderia conhecer de novo.

Quando ela escorregou o braço pra perto do meu, fiquei com vontade de fazer outra proposta.

Se sentir saudade de alguma coisa, qualquer coisa, a gente se liga de madrugada.

Senti que só poderia fazer aquilo futuramente.

Tentei não segurar sua mão.

Não a toquei, de verdade.

Colocar suas mãos perto das minhas, contanto que elas não se toquem. Toda aquela coisa de música da Taylor Swift que as garotas adoram e os meninos têm vergonha de admitir que sentem.


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Notas finais do capítulo

E aí? O que acharam? Amaram? ODIARAM? Próximo capítulo Nate e Bianca.
Comentem, porque capítulo passado recebi dois reviews e eu tenho 40 leitores. Meliorem, bixas