The Wild Youth escrita por moonshiner


Capítulo 4
Oh, bigmouth strikes again


Notas iniciais do capítulo

WHO'S BACK, WHO'S BACK? V-I-O-L-E-T
Cara, eu sou muito lerda pra fazer capítulos novos. Puta que me pariu gente, desculpa.
Eu só sei que eu tô muito feliz, porque nesse meio tempo, os leitores foram de 11 pra 23 e eu tô explodindo de emoção



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Sam

Uma tragédia insólita cometida de uma maneira habitual. Duas palavras que deveriam se nocautear, mas que fazem seu dever com maestria.

Sem mais delongas e com seus floreios, a tragédia do colegial está viva e falante. Os boatos - os linguarudos - atacam novamente.

Tudo começa numa tarde de sexta - feira, um pouco antes do Sol se pôr. Não sou uma pessoa metódica, mas sei interpretar sinais. Eu sei quando algo está prestes a dar errado.

Eu já havia sido encarada por espinhos, e um sapo havia tentado me beijar. No entanto, eu ainda estou viva. Eu sou durona para caralho e tal.

Saindo da sala de aula de história quando os primeiros indícios da catástrofe começam a florescer. Uns cochichos aqui, umas risadas dali.

Algumas líderes de torcida passam por mim, jogando seus cabelos sedosos pelos ombros e me empurrando com os quadris. Elas saem serpenteando pelo corredor como verdadeiras víboras, mas isso não me incomoda. Talvez um pouco. Ás vezes, para caramba.

Mas hoje não são só elas.

Aos poucos, as salas vão se esvaziando e as minhas incertezas vão aumentando. Eles estão rindo, se acomodando, se agrupando e apontando para os seus próprios celulares. E olhando para mim.

Em poucos minutos, eu sou soterrada por uma notoriedade ínfame que eu não desejaria nem para pior pessoa da cidade. Nem mesmo Isaac Lahey, eu acho.

No refeitório, a situação não parece ter mudado de forma. Eu só estou tentando comer em paz, mas o caminho que leva até a minha mesa parece uma corda bamba.

– Você vai me ensinar tudo o que você sabe com a língua mais tarde, Lancaster! - Will Solace grita, se escondendo atrás dos seus amigos veteranos em seguida. A covardia dos novatos me intriga.

Reviro os olhos e suspiro. A vontade mais profunda do meu âmago é empurrar a cara dele dentro da privada. Veteranos têm esse poder.

Ando calmamente até a mesa em que os meus amigos estão, olhando em volta uma vez ou outra. Eu odeio ser encarada de maneiras tão rudes e desdenhosas, mas, sendo a Sam Lancaster que eu conheço, é quase impossível eu não ter de tudo o que eu repudio. Mesmo que eu não queira, sempre quando eu não quiser.

Bianca semicerra os olhos, desconfiada. Nate está tentando prender o riso, sendo ele mesmo. Nico está estranho. Meio sorrindo, meio hesitando, contendo um paradoxo no olhar. Quando eu chego mais perto, ele infla o peito, todo pomposo, como se tivesse um motivo pra se orgulhar. Ele era Nico di Angelo, o único motivo para ele se orgulhar de quem é, é a lista imensurável de garrafas de uísque antigo que ele surrupia do próprio emprego todo santo final de semana. Não que eu ache isso exatamente admirável, só é útil.

– Primeiramente, bom dia. - Bianca fala, piscando seus olhos caricatos e sorrindo amigavelmente. - O que houve, minha flor?

– Eu queria saber. - Me sento entre Leo e Bianca, roubando uma batata frita do magricela. - Alguma dica?

Nico solta uma gargalhada, sendo repreendido por um tapa da irmã. Ele pigarreia e me encara, divertido.

– Desculpa. Tinha algo na minha garganta. Bem profundamente.
Eu arqueeio as sobrancelhas, alternando meus olhares entre Nico e Bianca.

Nate arregala os olhos, sorrindo com arrogância.

Ele e Nico não são nada parecidos; Nico é mais alto, mais assustador, mais fanstasmagóricamente atraente e mais insuportável. Nate é magro, usa óculos de grau e tem uma paixão descomunal por Homem - Aranha. Nico é o estereótipo Garoto-Perdido-Misterioso-Cheio-de-Não-Me-Toque e Nate é o Peter Parker sem pudor ou super poderes. E mesmo que não fossem nem um pouco parecidos fisicamente, carregam no mesmo DNA a prepotência conhecida pelos di Angelo há séculos de tradição. Isso acaba os ligando mais do que o próprio sangue.

– Quando eu te dou maconha, coisa que eu não fiz noite passada, você me espanca e chega até a ficar bem bonitinha, mas você nunca esquece com quem você transa.

Nico esconde o rosto entre as mãos, mas eu não acho que ele esteja com vergonha. Talvez esteja. Com vergonha alheia, provavelmente, já que ele sabe o que eu fiz e eu nem sequer tenho ideia.
Leo e Bianca se entreolham, roubando todo o silêncio do refeitório para eles mesmos.
– Tá - Leo bate com as mãos na mesa -, vocês são inúteis, eu falo para ela.

Ele suspira como se fosse fazer um discurso.

– Estão dizendo por aí que você fez besteirinhas com o Isaac Lahey e o resto do time de Lacrosse. - Ele faz uma careta e comprime os lábios. - E que talvez, sei lá, mas só talvez, você tenha feito uns favores para o professor de história em troca de algumas notas máximas em trabalhos...

– O QUE?!

Eu bato com as palmas das mãos na mesa, sentindo as minhas bochechas esquentarem.

Algumas pessoas de mesas próximas se viram por causa do barulho.
Bianca enrubece e esconde o rosto dentro da própria jaqueta.

– E quem diria isso?

Nico balança a cabeça negativamente, pondo os pés sobre a mesa. Umidece os lábios.

O sorriso a seguir dilacera qualquer esperança que eu tenho dele ser uma boa pessoa no fundo. Aquele sorriso faz meu sangue correr mais intensamente, por motivos errados. O maior erro de Nico di Angelo, na minha mais humilde opinião, é existir.

– Sabe, as pessoas dessa escola são profundamente impressionáveis. Acreditam em qualquer coisa que escutam por aí. Mas eu tenho que admitir, eu sou bom em foder a vida das pessoas. Tão bom que você nem percebeu que fui eu, Lancaster.

Eu gelo

Não por medo, tristeza súbita e paralisante ou qualquer coisa do tipo. Eu estou com raiva, e eu tenho inclinações psicóticas quando fico com raiva em público. Eu não quero sofrer os efeitos daquilo.

Principalmente porque eu sei que quando eu fico com raiva, eu me sinto á beira de um precipício. Ou eu caio ou eu mato alguém, mesmo que não faça sentido. Se eu não caio, o vento vai acabar me empurrando.

É uma questão de segundos e eu sou uma bomba atômica.

Eu cerro os punhos.

– Qual o seu problema? - Rosno.

Ele ri e se levanta da cadeira, graciosamente descarado. Ele não responde.

– Por que você fez isso?! - Grito, atraindo os olhares das pessoas ao nosso redor. - Tá, eu transei com o Isaac. Mas o time de Lacrosse? DORMIR COM PROFESSORES? POR QUÊ?!

Eu desfiro alguns tapas contra seu peito, seus ombros e seus braços. Eu só não lhe dou um tapa no rosto porque ele segura minhas mãos antes disso.

– ME LARGA!

Leo se levanta, pondo-se entre a gente.

– Eu realmente não sei por que raios você fez isso, e eu quero muito quebrar a sua cara no momento. - Ele fala, olhando para Nico com o cenho franzido. - Eu pensei que você não podia ser mais babaca do que você já é. E você foi.

Nico joga a cabeça para trás e ri com rouquidão.

– Eu estava brincando com ela. Nós sempre implicamos um com o outro. Se vocês ficam ressentidos por causa disso, que seja.

– Por que? - Eu falei, meio sufocada. Era disso o que eu precisava. Todas as minhas algias e noites de insônia faziam aniversário naquela noite, e eu só precisava de alguém para libertá-las. Ele parecia a pessoa perfeita. - Você disse que se importava, noite passada. Agora você simplesmente aparece aqui agindo como se fosse brincadeira, mas não é. Você esqueceu que a gente mora em uma cidade pequena e que esse tipo de coisa pode ferrar a vida de alguém! Então por que você não fala logo seus motivos? Eu quero ouvir.

Ele deu um passo pra trás, oscilando entre o babaca de hoje e o garoto que se importava na noite da fogueira.

– Eu falo muitos coisas que ás vezes não significam aquilo exatamente. Principalmente pras garotas. E um bônus: eu havia bebido naquela noite.

Bianca pigarreou. Ela não parecia nem um pouco disposta a parar a briga, porque sabia que era por um motivo justo. E ela estava decepcionada demais pra sequer defendê-lo. Nate nem parecia se divertir, o que ele deveria.

Leo se afastou um pouco da gente, nos olhando cautelosamente.

– Eu te odeio. Você me odeia. A gente faz merda um pro outro o tempo todo, por que dessa vez seria diferente? - Ele enrolou uma mecha do meu cabelo no indicador, segurando o meu queixo.

Eu o empurrei, rindo com escárnio.

– É claro que você não se importa. Ninguém se importa com você, então você não sabe ligar pras pessoas também.

A expressão dele foi de quem acabara de levar um soco no estômago.

– Você devia perceber o quanto soa ridícula dizendo essas merdas. Para de drama, você vai sobreviver.

Eu assenti.

– Eu realmente deveria parar de drama, né?

– Claro.

– Obrigada pelo conselho.

Em seguida, eu lhe dei um soco no nariz.

Abençoadas sejam as aulas de luta do verão passado.

..............

Audrey Hastings tinha grandes olhos verdes e inquisitores, analisando cada fragmento. Com seus vinte e oito anos, cabelos em brasa e um sorriso tão bonito, eu me perguntava por que uma pessoa tão carismática estava estacada no meio do nada, alertando adolescentes sobre seus distúrbios psicológicos. Algumas pessoas foram feitas pra serem tão boas, que é difícil acreditar que elas existem.

– Nico - ela o chamou, com a sua voz terna. - Quero que me responda com sinceridade: por que difamou a Sam dessa forma?

Deixei meu cabelo escorrer pelas minhas bochechas, escondendo um sorriso meu.

Nico assentiu.

– Eu só queria deixá-la irritada. Não era pra chegar a esse ponto. - Ele encarou os próprios pés, parecendo uma criança repreendida.

No seu pescoço, as marcas das minhas unhas. Efeitando as suas orbes negras, um belo de um roxo. Me senti tão orgulhosa que pediria pro Nate fotagrafar com a polaroid dele.

Audrey ajeitou o óculos no rosto, corando um pouco nas bochechas. Um sorriso compreensivo invadiu sua face.

– Quando você tem sentimentos reprimidos, muita das vezes conflitantes e controversos, é normal se sentir confuso e agir impulsivamente. Na maioria das vezes, as consequências têm lá sua gravidade, então eu recomendo que diga pra Sam o que sente por ela.

Enquanto Nico se engasgava com a própria saliva, Audrey deu uma piscadela na minha direção. Eu ri.

– Quem falou em sentimentos aqui? Sentimentos. - Ele forçou uma risada. - Até parece.

– Eu disse sentimentos? Pode ser atração sexual. Atração sexual reprimida gera hostilidade sem fundamento. - Ela tornou a insistir no assunto. Talvez fosse mesmo.

– Ela é gostosa, mas é chatinha. - Ele endireitou a postura.

– Bastante lisonjeiro, muito obrigada. - Rebati.

– Reprimir suas vontades também não é uma boa coisa. - Audrey abriu a gaveta, remexendo alguma coisa. Tirou de lá um de seus famosos panfletos de auto-ajuda. Em letras garrafais num escarlate chamativo, estava escrito "5 maneiras de dizer que a ama".

Nico abriu e fechou a boca, meio perplexo. Pegou o pedaço de papel com agressividade e me encarou como se eu tivesse culpa.

– Essa sessão maldita já acabou? - Resmungou, afundando na cadeira. Nico acariciou as futuras cicatrizes do seu pescoço, fazendo uma careta.
Audrey sorriu e sua carranca relaxou automaticamente.

– Já acabou sim. - Suspirou, passando as mãos nas ondas da saia. - O diretor mandou dizer que vocês vão cumprir detenção por quatro meses. E a partir de agora, vocês vão ser parceiros de laboratório. E vão ter mais de uma sessão comigo, uma vez por semana. A propósito, vou pôr em prática um projeto meu. Vocês são boas cobaias.

Psicólogos tinham toda essa coisa de esconder a ternura e a confiança no menor dos atos. Os talentosos, é claro. Principalmente a Audrey, cujo os cabelos ruivos eu conhecia desde os oito anos. Ela era uma antiga amiga da família. Exatamente por isso, eu não quis discutir. Ela seria uma boa coisa durante quatro meses tendo que aguentar aquele projeto emo de gigolô. Quanto a isso, preferi não pensar muito.

– Ótimo. - Nico soltou um muxoxo, praguejando coisas inaudíveis. - Posso cometer suícidio agora?

– Á vontade. - Respondemos em uníssono.

Ele levantou apressadamente, pegando a mochila em cima da mesa.

– Te vejo por aí, Little L. - Ele deu uma piscadela, sumindo pela porta em seguida.
..............

Eu estava voltando pra casa á pé quando percebi que algumas estrelas costuravam o céu até a borda. Elas iam das pontas dos meus dedos, até o fim da rua, onde eu nem sequer sabia se existia um céu. Eu não sabia nem se existia um infinito de verdade além da gente. Isso eu deveria saber, mas não sabia. Como muitas coisas são e não são ao mesmo tempo.

Estranho o fato de já ter anoitecido quando eu saí da escola, pois é. Acontece que eu prolongava meu tempo longe de casa, por puro prazer de ver coisas que passavam. Vazios que iam embora com a facilidade com a qual chegavam. Eu passava em algumas livrarias, em alguns cafés, sentava debaixo de algumas árvores. Tudo pra ver o Sol se pôr sem ter que ver memórias. Memórias de outra pessoa, ou as minhas mesmo. Desde a morte da minha mãe, qualquer coisa era motivo pra evitar o silêncio. Eu não sei se era a minha própria loucura falando, mas ás vezes parecia. Podia ser loucuras dos remédios. Podia ser loucura de quem costumava ser eu, mas era só efeito colateral do luto. E, sinceramente, é uma merda.

Eu busquei um lugar para me esconder quando vi as luzes da minha rua retinindo na calmaria da noite.

Eu não queria encontrar o meu pai e o meu irmão discutindo de novo. Eu queria silêncio, cinco minutos ouvindo os mortos. Cinco passos pra chegar na porta.

Cinco passos pra pisar nas flores do jardim.

Cinco passos, tudo o que eu havia evitado sentir o dia todo. Um vazio latente.

Abri a porta meio hesitante. A sala piscava sob a luz fraca do abajúr. Estava vazio.
Eu trocaria três semanas dentro daquela casa por um lugar no mundo onde o céu não tivesse as mesmas estrelas.

Joguei minha mochila pela casa e caminhei até a cozinha, ouvindo algumas risadas se aproximando.

– Pai? - Chamei. - Cadê você?

Uma silueta masculina surgiu no fim da sala. Sob a pouca luz, pude identificar os seus cabelos quase grisalhos bagunçados e um recém sorriso no rosto. Ele estava usando um avental de cozinha.

– Você chegou! - Meu pai disse. - Seus amigos estão na cozinha, venha.

Colocou a mão nas minhas costas, guiando-me.

– Ér... oi.

Leo desviou a atenção do fogão, com um sorriso caloroso. Bianca levantou os olhos do box de Gossip Girl que segurava nas mãos e sorriu também. Nate estava sentado no balcão, a polaroid nas mãos e algumas fotos no colo. Ele sorriu junto.

– Olha quem chegou! - Leo exclamou. - A gente estava te esperando. Estou ensinando seu pai a fazer taco de espaguete. Vocês só têm lasanha nessa casa?

Eu ri.

– Você tem um jardim bastante fotografável ao pôr do sol, Sammy. - Nate comentou, tomando um gole de vinho. - Eu te dou as fotos de presente, se você quiser.

Eu assenti.

Por último, Bianca pulou do seu lugar, sacudindo a caixa da série e sorrindo maliciosamente.

– Eu trouxe um Archibald, um Bass e um Humprey. Vou dormir aqui hoje e você vai passar a madrugada comigo assistindo. Estamos entendidas? - Ela deu uma piscadela, sacudindo os ombros numa dancinha desajeitada.

Era esquisito o fato de que ela era irmã gêmea do Nico. Ela era tão superior a ele.

– O.k, eu aceito. - Ri, bagunçando os cabelos de Leo e sentando no balcão, ao lado de Nate.

Meu pai coçou a barba por fazer. Ele sempre fazia aquilo quando queria puxar um assunto desagradável.

– A escola me ligou hoje á tarde. Detenção, ein? - Daniel Lancaster deu um sorriso emoldurado pelas olheiras de seus olhos. - Não sei como reagir, é a primeira vez que isso acontece. Você, ahn... vai dormir sem sobremesa.

Nós rimos.

– Ei. - Bianca chamou. - Eu conversei com o Nico. Ele tá meio arrependido, mas você sabe que ela não vai pedir desculpas, não é?

Eu balancei a cabeça, dando um sorriso despreocupado.

– Eu já notei isso. Descobriu por que ele fez aquilo?

Nate e ela se entreolharam, arqueando as sobrancelhas e franzindo os lábios de uma maneira maldosa.

– Desconfiamos de uma coisa. Mas ninguém sabe ao certo. - Nate falou baixo, ajeitando o óculos nos olhos. - Achamos que ele gosta de você.

– Quem gosta de quem? - Daniel perguntou, um pouco alerta demais.

– Nada. - Dissemos em uníssono.

Eu corei.

– Três pessoas me disseram isso hoje, e eu me recuso a ouvir de novo.

Leo deu de ombros, sorrindo sarcasticamente enquanto mexia o molho de tomate na panela.

– Se você quer ser cega, o problema é seu.

Eu revirei os olhos.

– Eu vou matar o irmão de vocês. - Meu pai falou, simplesmente.

........

Serena: Eles não dizem quem você é, você é quem diz a eles.
Eu desliguei a televisão porque todo aquele papo de "sambe na cara deles" estava começando a me deixar deprimida. Eu queria ser que nem a Blair, ás vezes. Felizmente, os boatos me davam a chance de ser uma vadia louca daqui pra frente. Podia até ser divertido, se eu quisesse.

As trovoadas soaram mais alto, fazendo a minha espinha gelar. Tudo se tratava sobre a chuva, no fim das contas. Ela trazia várias coisas, levava muitas também.

Bianca dormia com a cabeça no meu colo, aninhada no meu casaco. Olhando daquela forma, as sardas emoldurando as bochechas num sorriso apagado, ela quase parecia virgem.

Ri e acomodei seu rosto num travesseiro, levantando do sofá.

Era nessa hora que começava, geralmente. Minha mãe me levava pra ver a chuva antes do Sol. A gente dançava na grama, sem parecer que um dia uma de nós morreria. Era um estado entorpecente. Era quando a gente agarrava qualquer coisa que estava ao nosso redor, e eu me sentia pura. Pura por transformar qualquer coisa em algo bonito. Até a dor.

Eu queria repetir a sensação. Esfolar os pés na grama cortante, até amanhecer. Ela era verde, e o azul me lembrava seus olhos. Eu tinha seus olhos, um pouco mais acizentados e tempestuosos. Tinha nos cabelos castanhos alguns fios loiros, que me lembravam seus cachos. Eu tinha até a sua voz, quando eu queria. Era só eu querer. Os lábios cheios, as covinhas nas costas e nas bochechas. Até a mesma altura. Ás vezes eu me evitava no reflexo do espelho, porque eu tinha medo de ser um fantasma. Que insano, não é?

Deslizei até a porta, tocando a maçaneta sem hesitação. A porta rangeu e eu deixei que o cheiro da chuva tomasse conta de mim. Agarrar algumas gotas seria uma boa.

Dei uma primeira pirueta quando os meus olhos encontraram a escuridão e meus pés tocaram a chuva.

Ela me chamava de passarinho. Eu cantava bastante na chuva, eu me lembro.
Dei mais uma volta, pisando em algumas rosas do jardim. A chuva. Sempre ela.

– Você sabia que parece uma lunática quando faz isso no meio da noite? - Uma voz reconhecível falou.

Parecia um fantasma, tanto quanto eu. Tinha cabelos loiros molhados beijando o rosto pálido. Os olhos azuis tinham mais coragem que os meus nos últimos meses, porque haviam, ao menos, se dado o trabalho de chorar por uma perda.
Nas malas, eu sabia que ela carregava mais do que algumas roupas. Noites de insônia, algias. Colecionávamos as mesmas perpectivas.

Ela sorriu. Sorriu tristemente.

– Eu não sabia pra onde ir. - Deu de ombros, deixando rastros solúveis na água por onde passava. - Minha mãe me expulsou de casa.

Maggie. Esse era o nome dela. A pessoa que parecia uma versão mais amargurada de mim mesma, e eu sabia por quê. Ela era minha melhor amiga.

– Eu disse que você podia me procurar quando precisasse conversar no meio da noite, mas não sabia que levaria tão á sério.

Ela riu, ali mesmo, na chuva. Eu acabei fazendo o mesmo.

– A gente vai se foder se ficar na chuva. - Ela declarou o óbvio.

– Mais do que a gente já é? Eu sobrevivo.

– Mas meus discos dos Smiths não.

Puxei-a ela manga molhada do casaco, abraçando seu pescoço.

– Eu também precisava te contar umas histórias, afinal de contas. Quer entrar?


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Notas finais do capítulo

EU QUERIA DIZER QUE ESSE CAPÍTULO EU DEDICO ALYESKA E A MAGGIE, ESSAS LINDAS



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