Hastryn: Ascensão escrita por Dreamy Boy


Capítulo 31
O Legado




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Wolfric

Toda a nação do sul foi convocada por Susan para comparecer ao funeral do amado rei Vincent Prince. Aquele era o fim de uma grande era, marcada por uma grande paz em seus territórios e um dos melhores reinados que Horgeon já teve. A população lamentava a terrível perda, sem saber como seria o governo de sua herdeira.

O corpo foi coberto com um lençol e colocado sobre uma carruagem guiada por dois cocheiros e quatro cavalos extremamente ligeiros. Wolfric e Susan se encontravam no interior do veículo, acompanhando o cadáver até o grande cemitério da cidade, onde os mortos descansavam na paz dos deuses e seria realizada uma despedida.

A população caminhava logo atrás, seguindo os rastros da carruagem. Os membros de Allaren e Sarenth viajaram até lá especialmente para homenagear o morto pela última vez. Um homem que permaneceria para sempre na memória dos hastrynianos sulistas, aparecendo nos livros de histórias e em pinturas nos ambientes importantes.

Chegando ao cemitério, homens os auxiliaram a carregar o caixão até onde o corpo ficaria até se decompor. Foi aberta uma grande cova ao lado daquela onde a mãe de Susan havia sido enterrada. A princesa chorava ao perder mais um parente querido e Wolfric a abraçava, fornecendo um pouco de apoio em um momento difícil.

Como dizia a tradição, todos utilizavam vestimentas pretas. A cor escura simbolizava o luto, e aqueles que não estivessem seguindo o padrão não eram permitidos a continuar ali.  A tradição deveria ser respeitada de forma adequada, principalmente quando o falecido era um membro da família real.

Susan parou de frente para o caixão, começando a falar. Wolfric tinha uma de suas mãos sobre o ombro esquerdo da jovem, mostrando que estaria ao seu lado.

— Vincent, além de um grande rei, foi também um ótimo pai. — A princesa tremia enquanto falava, tendo dificuldades para continuar o discurso. — Criou e educou a mim com muito amor e paciência, o que é difícil de ver em algumas famílias. Quando minha mãe faleceu, acabou assumindo todas as funções e me protegendo mais do que já fazia antes. Se hoje sou essa pessoa, devo minha vida a este homem!

Wolfric decidiu homenageá-lo também.

— Mesmo sabendo que eu pertencia a uma classe social diferente da sua, o rei não me tratou de forma preconceituosa em nenhum momento. Fui sempre respeitado e bem acolhido. Serei eternamente grato a essas atitudes bondosas.

Em seguida, foi a vez de Arianna Luckov.

— Quando meu marido e meu filho desapareceram, Vincent permitiu minha entrada como funcionária das cozinhas do castelo. O trabalho se tornou uma importante distração, que me trouxe o ânimo de permanecer viva mesmo sem eles. Meu garoto reapareceu, mas mesmo assim jamais esquecerei o que foi feito por mim.

Wolfric e Susan se entreolharam nesse momento. O garoto sentiu um forte peso na consciência ao utilizar o nome de alguém que nem ao menos sabiam estar vivo. A dor de Arianna ainda existia e não havia sido curada, pois nunca recebeu notícias sobre sua família depois da viagem. Wolfric admirava a força da mãe adotiva. Ele a amava tanto quanto amava Aubrey.

Outros membros do continente fizeram seus discursos. Quando se encerraram, o sacerdote religioso se manifestou. Tinha um cajado em mãos, pronto para realizar o ritual de despedida.

— Peço que fechem os olhos e ouçam minhas palavras. Agora, rezaremos juntos para que a alma de nosso querido rei seja abençoada pelos deuses e levada diretamente ao paraíso. Deem suas mãos aos mais próximos.

Wolfric, Arianna, Susan, Aubrey, Aaron e Thorfin fizeram um círculo de mãos dadas, ouvindo as palavras do sacerdote. A população inteira as escutava com atenção e repetia em uníssono. No fim do ritual, abriram os olhos e o enterro ocorreu.

Cada um apanhava uma das pás e jogava um pouco da areia sobre o caixão, até que estivesse completamente coberto. Os habitantes de Sarenth e Allaren foram os primeiros, deixando os da cidade principal para o final. Susan optou por ser a última, preenchendo o espaço que faltava e lançando um buquê de flores sobre o chão. Permitiu que lágrimas guardadas durante todo o funeral finalmente escorressem de seus olhos. 

— Vamos embora.

...

A atual monarca estava com cada vez mais dificuldades em seu governo. Susan sofria muita pressão da população para inúmeras funções, como assinar papéis, ouvir petições dos mais pobres, responder às mensagens que recebia constantemente, viajar pelo reino para saber como andam as atividades produtivas. Antes de ser obrigada a assumir o cargo de seu pai, tinha disponibilidade para visitar orfanatos e contar histórias às crianças, porém, tudo aquilo a estava consumindo e a deixava exausta, sem que tivesse como voltar a fazer esses atos, o que a chateava profundamente.

— Acredito que já esteja na hora certa de marcar nosso casamento, Wolfric. — Susan desabafava, entristecida. — Não sou capaz de comandar Horgeon sozinha.

Wolfric esperava até que a rainha tocasse no assunto. Havia recebido uma carta inesperada e a guardou com o propósito de respondê-la em breve. Percebeu que não estava pronto para trazer Elliot Trannyth. A máscara de um morador do sul como qualquer outro era tranquilizante, mas o jovem não conseguia se esquecer da vida anterior que tinha anos atrás no continente nortenho. Muito menos da princesa na qual se imaginava casado em um futuro próximo. Entretanto, necessitava de foco para auxiliar a amiga em seu reinado. Eram vários pensamentos conflitantes que requeriam uma decisão definitiva.

— Devemos nos mostrar autoritários e não permitir que nos dominem. Como rei e rainha, temos que nos acalmar antes de tudo, pois ficar estressados com os problemas somente os tornará mais complicados do que já são.

— Será muito melhor do que eu nisso.

— Não diga isso! Existem pessoas que só descobrem o poder grandioso depois de bastante tempo, e você com certeza é uma dessas. É uma monarca bondosa, o primeiro passo para construir um bom período para o povo.

— Obrigada por acreditar em meu potencial.

...

Um casamento simples foi planejado, sem que muitos convidados fossem chamados. Susan e Wolfric não sentiam a mínima vontade de realizar festas gigantes, repletas de pessoas presentes e músicas por todos os lados. O luto por Vincent ainda era presente no coração de ambos e não viam motivo para celebrar.

Entretanto, a jovem utilizou uma belíssima vestimenta. O vestido era bege com detalhes vermelhos em seu tecido. As mangas iam dos ombros até a região das mãos. Os cabelos ruivos estavam soltos e escovados pelas damas de companhia. Em seu pescoço, foi pendurado um minúsculo pingente de ouro em formato de borboleta. Entrou no templo acompanhada de Thorfin, que se orgulhava do filho ao vê-lo casando com alguém de tanta importância.

O templo maior em largura do que em altura, em distinção ao de Arroway. Era construído na base de tijolos e as paredes tinham detalhes amarelos e brancos, junto com pinturas bonitas que retratavam a paisagem sulista com maestria. Os assentos eram também brancos, em contraste ao solo de madeira com imagens abstratas.

Wolfric tinha sido conduzido por Arianna até o altar. Aubrey seria a pessoa que o levaria se pudesse, porém, a farsa ainda permanecia presente em suas vidas. Quando a noiva estava próxima o suficiente, segurou sua mão e juntos se ajoelharam de frente para o sacerdote.

— Estamos aqui para realizar mais uma união aos olhos dos nossos amados deuses. Hoje, Wolfric Luckov e Susan Prince se tornarão um só e receberão a benção das forças divinas para que tenham uma vida maravilhosa, repleta de amor e muitos descendentes fortes.

Era um senhor de idade, com poucos cabelos grisalhos na cabeça e uma barba serrada malfeita. Utilizava um manto escuro roxo que descia até os pés, acompanhado de uma capa negra. Seus calçados consistiam em duas sandálias pretas. Em Hastryn do Sul, os sacerdotes podiam se casar e construir suas famílias, assim como quaisquer cidadãos, diferenciando-se dos costumes nortenhos.

— Rainha Susan Prince, aceita Wolfric Luckov como seu esposo e promete amá-lo e respeitá-lo no amor e na tristeza, na saúde e na doença, na riqueza e na pobreza, na glória ou na desgraça, até que a morte os separe?

— Aceito. — respondeu a ruiva, imediatamente após a fala do homem. Ela esboçou um sorriso alegre, provavelmente o primeiro depois de um bom tempo.

O sacerdote se virou para o rapaz.

— Wolfric Luckov, aceita a Rainha Susan Prince como sua esposa e promete amá-la e respeitá-la no amor e na tristeza, na saúde e na doença, na riqueza e na pobreza, na glória ou na desgraça, até que a morte os separe?

— Aceito. — Wolfric respondeu, com um aperto no coração. Apesar da grande relação que tinha com a jovem, não sentia um amor passional por ela. Afeto, companheirismo, mas não paixão.

— Levantem-se. — pediu o sacerdote, aguardando até que os noivos o obedecessem. — Peço aos presentes que ergam suas mãos e fechem os olhos, para fazermos uma corrente e rezarmos para a proteção de nossos.

A família de Wolfric assim o fez. Eram os únicos que estavam no local, já que Susan não tinha mais parentes vivos. Havia sido acolhida pelos Trannyth e por Arianna, que a amavam e a viam como a melhor escolha que Wolfric teria feito.

— O casal pode selar a união com um beijo. — Wolfric a puxou e uniu seus lábios aos dela. Susan correspondeu ao beijo no mesmo instante, o que o assustou de início. Ele a carregou até o lado de fora do templo, onde uma liteira os aguardava.

...

Wolfric observava Horgeon pela janela do aposento de Susan. O cômodo foi construído em uma altura adequada para se ter uma boa vista da região. Olhando para aquele belo cenário, com paisagens diferenciadas e construções atraentes à visão de qualquer um, refletia sobre como sua posição subira rapidamente em apenas cinco anos.

Chegou ao sul como um garoto desconhecido, filho de uma funcionária pertencente às cozinhas do castelo. Passou a praticar esgrima na primeira semana, aos poucos se tornando um hábil e reconhecido lutador entre os jovens. Virou o melhor amigo da princesa, amizade essa que o levou até onde estava atualmente. Além de poder voltar a ser Elliot quando estava com a amiga, tinha acesso livre à Grande Biblioteca, local em que poderia estudar ou ensinar história a Aaron sempre que fosse de seu desejo.

A partir daquele dia, seria o soberano do reino do sul.

— Susan...

— O que foi? — Ela o abraçou por trás, deitando a cabeça sobre seu ombro direito. — Está tudo bem?

— Sim, apenas precisava dizer uma coisa. Você agradece a mim o tempo todo por estar em sua vida, fornecer conselhos e ser um amigo bondoso, mas eu quem devo ser grato por tudo o que fez por minha pessoa e por meus pais. Outro ser humano em seu lugar talvez nos expulsasse de seus territórios ou até mesmo nos matasse. — Wolfric se ajoelhou, encontrando diretamente o olhar da nova esposa. Pegou sua mão direita com as suas e a beijou. — Você é um anjo.

O rapaz se levantou e a puxou para seus braços. Em seguida, cada um colocou sua respectiva coroa. De mãos dadas, deixaram o cômodo e caminharam pelos corredores até a varanda frontal, onde a população os esperava para ser feito o comunicado oficial da ascensão de Wolfric ao trono.

Era a oportunidade perfeita para mostrá-los os conhecimentos aprendidos nas aulas físicas e teóricas oferecidas por Gregory Muirden antigamente. Honraria não só a memória dos antigos reis, como também a dos guerreiros que morreram em prol de atos heroicos. Seu sonho de se tornar alguém eterno na lembrança dos humanos estava perto de se realizar, e Wolfric se preparava psicologicamente para isso. Imaginava livros, pinturas e contos criados com seu nome envolvendo aventuras e jogos políticos hastrynianos.

A cada passo que dava, refletia sobre o rumo que seguia. Sobre o que viria pela frente, uma página em branco na qual era seu dever preenchê-la corretamente. Não permitiria que seus inimigos a roubassem de sua posse, pois seu legado estava apenas iniciando.

Um dia, esse legado pertenceria não somente a Wolfric Luckov.

Mas também a Elliot Trannyth.


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Notas finais do capítulo

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