Hastryn: Ascensão escrita por Dreamy Boy


Capítulo 14
A Moça Misteriosa


Notas iniciais do capítulo

Idades:
Ulrick - 36 anos.
Elizabeth - 3 anos.
Richard - 5 anos.

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"Os seus olhares eram muito parecidos. Esse foi, certamente, um fator para que eu me sentisse atraído e voltasse a saber o que era paixão."
— Lothar Wildshade



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Lothar

A família Yorkan era descendente dos muitos escravos que trabalharam para os senhores de terra hastrynianos. Tempos atrás, quando finalmente ocorreu a libertação desses escravos, as famílias tiveram dificuldades para conseguir trabalhos e sobreviver às dificuldades econômicas existentes nessas regiões.

Quando conheceu o príncipe Lothar, Ulrick era um garoto pobre e um pouco mais novo. Aos poucos, foi se mostrando um cidadão de confiança que merecia um cargo mais respeitável e, dessa forma, poderia melhorar sua situação econômica e social. Atualmente, era provavelmente o ser humano mais próximo de Lothar Wildshade. Se alguém um dia poderia ser chamado de amigo pelo homem, essa pessoa seria Ulrick Yorkan.

Nos momentos em que não estava ocupado com as tarefas de supremo governante de Arroway, Lothar às vezes saía com o homem e passava momentos divertidos e ao mesmo tempo nostálgicos, nos quais relembravam tristes e felizes memórias acontecidas na extensa linha do tempo denominada como vida. Ulrick era o principal ouvinte de Lothar quando, em suas épocas de príncipe, o rapaz era apaixonado pela jovem Lucy e sentia vontade de pedir sua mão em casamento.

— Você é um homem de sorte. Sorte por ter sua esposa viva e por ter ganho pelo menos um filho homem que possa honrar seu nome no futuro. Esse era meu maior sonho, mas falhei horrorosamente.

— Isso é verdade. Não tenho mesmo como reclamar... Meus filhos são tudo de bom para mim. Mesmo que um deles seja uma menina, sinto profundo orgulho de Elizabeth, pois sempre faz o melhor possível para me deixar feliz e satisfeito. Meu senhor deveria sentir orgulho pela princesa Charlotte também... Ela é uma boa garota.

— Apesar do que todos pensam, minha filha não é assim... Tenho vontade de sair engravidando aleatoriamente as moças do reino para que uma delas me conceda um filho bastardo e possa trazê-lo aos meus cuidados. Assim, mesmo que de forma errada, terei um herdeiro decente para governar Arroway após minha queda.

— Majestade, essa não é uma boa atitude. Acredito que este seja o momento ideal para que o senhor se case novamente. Existem muitas senhoritas interessantes que, desde pequenas, são educadas e preparadas para o caso de um dia surgir a oportunidade de se tornarem esposas de homens importantes, que carregam títulos nobres.

— É complicado. — Lothar suspirou, desabafando. — Nenhuma das que me foram apresentadas conseguiu despertar meu interesse. Parecem tão... iguais entre si. As únicas que me chamam atenção são as prostitutas, e você sabe exatamente com qual utilidade estas mulheres são capazes disto.

Ulrick riu e encheu de vinho a taça esvaziada. Ingeriu um gole, acidentalmente derramando um pouco do líquido sobre a bochecha, que escorreu pela barba negra. Utilizou as próprias mãos para retirar o excesso, porém, Lothar não sabia se havia sido completamente limpo, já que a pele do homem era tão escura quanto a barba.

— Por falar nelas, talvez seja a hora de se divertir por uma noite e abandonar um pouco as responsabilidades do castelo. Pode ser relaxante! Existe um bordel que eu costumava frequentar antes de me casar. Deseja saber onde fica?

Lothar parou por alguns segundos e refletiu sobre a ideia.

— Sim. — respondeu. — Por que não? Aproveite que hoje estou de bom humor, antes que resolva mudar de ideia e expulsá-lo dessa sala. — Essas palavras não foram ditas com total sinceridade, havendo um pouco de zombaria nelas. Entretanto, até mesmo Ulrick deveria vê-lo como autoridade e alguém superior. Lothar fazia questão de lembrá-lo sempre disso.

Ulrick apanhou um pedaço de pergaminho que se encontrava sobre a mesa, como se estivesse à espera para ser escrito. Utilizou uma pena para anotar o nome do estabelecimento e, posteriormente, entregar o objeto nas mãos do rei, que leu em voz alta:

— Rosa Indomável.

...

Aguardou até que a noite chegasse e, junto com ela, o toque de recolher. Espiando através de janelas, constatou que todos do reino se encontravam adormecidos em seus respectivos dormitórios e quartos, com exceção dos guardas noturnos do castelo.

Vestiu um manto escuro para não ser reconhecido por pessoas indesejáveis e desceu a imensa fileira de degraus existentes nas escadarias, passando pelo salão de entrada e atravessando o pátio principal. Mostrou seu rosto para que os guardas abrissem espaço e permitissem sua passagem. Além daqueles dois, ninguém mais saberia que o homem encapuzado era Lothar Wildshade.

Naquela noite, seria um cidadão como os outros. Sentia curiosidade para saber como os habitantes daquela região lidavam quando não estavam diante de sua presença. Estava preparado para ouvir as piores fofocas e reclamações de seu sistema de governo, controlando o desejo de cortar a garganta de todos aqueles insolentes.

Pessoas ainda passavam pelas ruas da cidade grande. Proprietários de lojas ou estabelecimentos que deixavam o comércio funcionar até tarde, como era o caso do Rosa Indomável. Lothar evitou olhar diretamente para aqueles indivíduos, optando por seguir direto pelo caminho indicado.

Decidido a abandonar por horas a face opressora e intolerante que assombrava diariamente Hastryn do Norte, sentiu-se um pouco livre, como se o mesmo jovem de anos atrás houvesse renascido. O jovem que passava noites em claro olhando para o céu e admirando suas infinitas constelações, sem se preocupar com os problemas que envolviam o reino, pois estes eram cuidados pelo pai.

Dois garotos fugiam de suas casas pelas janelas e seguiam pelo mesmo trajeto. Lothar achou a cena engraçada, desejando que o tempo voltasse e pudesse ser alegre e travesso como eles. Apesar de que, para alguém da realeza, era extremamente difícil ter a mesma diversão que aquelas crianças. Eram apenas pessoas comuns, em meio a outras, sem que indivíduos se aproximassem delas por questões de interesse ou jogos de poder. Desde jovem, o rei era tomado por um profundo sentimento de inveja em relação a isso.

Avistou uma casa roa e teve a certeza de que aquele seria o local certo. Lothar raramente visitava aquela região de Arroway, de modo que não conhecia as novidades dali e não sabia o que era novo ou antigo em suas construções. Seu trabalho como rei exigia tarefas mais importantes do que visitar aqueles seres.

Os garotos foram na frente sem perceber sua presença e Lothar subiu as escadas de fora, preparando-se para o que encontraria ali dentro. Ao entrar, ficou impressionado com a elegância ousada do ambiente. Sua decoração, naquele dia, consistia em tapetes brancos espalhados por todo o salão, rosas vermelhas e amarelas em jarros de vidro encostados nas paredes também vermelhas, mesas e bancadas rústicas, barris de vinho sobrepostos às mesas de canto e cortinas brancas penduradas próximas às janelas. Um lugar extremamente bonito.

Um palco imenso se localizava no canto central do salão. Nele, garotas seminuas realizavam danças sedutoras, chamando a atenção de rapazes de todas as idades, que as paqueravam à distância. Lothar, sem tirar os olhos daquela cena, se sentou em uma mesa não muito longe do palco. Foi somente então que encontrou a fonte da música: um piano branco ao lado de onde as dançarinas estavam.

Uma garçonete se aproximou, carregando uma bandeja repleta de taças vazias em uma mão e a jarra fechada na outra. Depois de atender um cliente, voltou-se para Lothar.

— O senhor aceita uma taça de vinho?

Lothar fez um gesto positivo com a cabeça e em seguida estalou os dedos, ordenando que o líquido lhe fosse servido com rapidez. Obedientemente, a moça encheu o recipiente por completo e foi atender aos outros que berravam para receber suas bebidas.

“Essa bebida é simplesmente divina!”

Enquanto se deliciava com o forte sabor do vinho, deixou-se levar pela distração existente na bela canção responsável por entreter a todos os presentes. Era um som cativante, chamar de atenção até mesmo das pessoas que passavam pela rua e o ouvissem de longe.

Foi quando, carinhosamente, uma mão tocou seu ombro.

Olhando para trás, encontrou uma bela jovem, cujos cabelos louros desciam em cachos longos até a cintura. A moça se sentou na cadeira ao lado, sem esperar que fosse convidada pelo homem.

— Boa noite. — Sua semelhança com a Rainha Lucy era assustadora. Depois da amada esposa, aquela era a pessoa mais linda que Lothar já viu. Seu rosto era delicado, a boca carnuda e os olhos claros brilhantes o encaravam com seriedade, como se tivessem vida própria e dominassem a arte da hipnose. Uma parte de Lothar ficou triste por alguém tão perfeito, com porte de rainha, trabalhar em um lugar como aquele. — Deseja companhia?

Ele não teve como recusar. Apenas balançando a cabeça em um gesto positivo, concordou que a prostituta ficasse, ainda incrédulo com sua aparência. Foi apenas nesse momento que reparou o grande decote no vestido azul celestial, exibindo grande parte dos seios.

“Ela me parece tão familiar... Tenho a sensação de que a conheço de algum lugar. Mas de onde?”

— Como se chama, garota?

— Sem muitas revelações por agora. — respondeu, esboçando um sorriso provocante. Pessoas ousadas e misteriosas o atraíam. — Teremos bastante tempo para isso, não é mesmo?

— Com certeza. — Lothar a puxou para perto de si e uniu seus lábios aos dela em um longo e sedutor beijo. A prostituta posicionou uma perna sobre a sua e, minutos depois, sentou em seu colo. Permitiu que o rei beijasse e explorasse um pouco de seu corpo.

Quando ela parou, segurou delicadamente uma das mãos do cliente e o conduziu para um aposento especial, onde a iluminação era ainda menor. Sem demorar muito, Lothar retirou o manto e a armadura, preparando-se para se deitar com uma mulher depois de anos.

...

Quando despertou, abriu as cortinas do quarto, descobrindo que o sol já tinha nascido. Apressadamente, cutucou a prostituta para que também acordasse e recebesse seu devido pagamento. De seus pertences, retirou uma pequena sacola com moedas de ouro deixou em cima de um móvel de madeira.

— Voltarei hoje à noite. Esteja à minha espera e será recompensada.

— Será um prazer, senhor. — Não havia se pronunciado desde que abriram os olhos, portanto, foram as primeiras palavras direcionadas ao cliente naquele dia. — Ainda deseja saber meu nome?

— Sou Katherine, mas pode me chamar de Kath. — após ter o nome revelado, Lothar ficou pensativo, acreditando que realmente a conhecia e não era apenas confusão devido à semelhança com Lucy. — Estou acostumada com esse apelido.

Seu sorriso indicava que ela também o conhecia e sabia isso desde o começo, quando o procurou no salão. Finalmente tendo a conclusão sobre quem era a misteriosa mulher, Lothar descobriu sua identidade.

“Como não a reconheci?”

Agindo com indiferença, saiu do bordel e foi pelas estradas até voltar ao palácio. Lá, tomou um banho e retirou toda a sujeira adquirida no meio do caminho. Durante o banho, não conseguia parar de pensar no rosto de Katherine e em suas palavras.

Era alguém que fazia o que fazia por culpa dele. Não que Lothar sentisse remorso pelos seus atos, pois nunca se arrependia de nada, mas algo naquela mulher provocara nele um sentimento que nutria apenas pela falecida esposa. Lothar acreditava que jamais seria capaz de se apaixonar novamente. Mas o sentimento havia retornado, e da forma que menos esperava: à primeira vista.

— Do que está falando? — Ulrick demonstrava indignação, sem acreditar nas confissões ouvidas. — Vossa Majestade saiu para se divertir, não para se apaixonar por uma meretriz.

— Tenho culpa de ela não sair de meus pensamentos?

— Deve tomar cuidado com esses sentimentos, meu rei. — seu tom de voz procurava ser sempre gentil, mesmo que o mundo estivesse desabando ou caindo em caos e trevas. — Katherine pode ser perigosa, pois a morte de seu pai foi causada pelo senhor. Como uma leal filha, fará de tudo para se vingar e honrar a vida de Gregory.

— Isso é verdade. — Lothar resmungou, embravecido. Jamais confiaria em uma mulher, principalmente naquela. A última que manteve relações se revelou uma golpista, tentando enganá-lo ao jurar que tinha uma criança bastarda do rei em seu ventre e chantageá-lo, mas o filho era de outro. Lothar a torturou e matou, pois sabia que ela se deitara com muitos homens e nunca teria como comprovar o que dizia. A versão contada ao restante da população foi diferente e, nela, Lothar era o único cruel da história, mas ele não se importou e inclusive aprovou a ideia maliciosa de alguém que tentara derrubá-lo. — Com aquele olhar, não duvido que suas intenções sejam essas. Aposto que deseja minha cabeça sendo pendurada e exposta em praça pública para todos aplaudirem.

— Exatamente. O que pretende fazer com a garota?

— Como o prometido, irei novamente ao bordel quando o céu escurecer. Descobrirei as reais intenções de Katherine e a punirei caso esteja conspirando de verdade contra mim.

— Ela pode mentir.

— Ulrick, você sabe que fui muito enganado e sofrido no meu passado, mesmo que não conheça a história completa. Tenho certeza de que sei reconhecer um mentiroso.

— Sendo assim, creio que seja o ideal. Meu dever é respeitar a decisão de meu senhor.

...

Demonstrando indiferença em relação à descoberta, Lothar convidou Katherine Muirden para novamente lhe fazer companhia à mesa. Pediu dois copos de cerveja e a encarou fixamente, antes de iniciar uma decisiva conversa, cujos resultados eram inimagináveis.

— Quando a vi de início, senti imediatamente que a conhecia de algum lugar. — Lothar ingeriu um pouco do líquido antes de continuar. — Agora, sei quem você é de verdade. Há algo que queira me falar em relação a isso?

Katherine relutou em responder. Provavelmente tentava esconder o terror que sentia pela proximidade dos dois, agora que Lothar sabia quem ela era. O rei havia torturado inúmeras pessoas durante anos, portanto, havia adquirido práticas com isso e conseguia identificar quando alguém estava com medo.

Ela negou com a cabeça.

— Não fique desesperada, estou apenas conversando com você. — Lothar tomou calmamente outro gole da cerveja em suas mãos, ignorando a reação da garota. — Se estiver pensando será morta, fique calma, pois isso não acontecerá. Não hoje, pelo menos.

— O que fará comigo, Majestade?

— Pra que tenta pressa para saber? Beba comigo!

Obediente e se sentindo pressionada, Kath levou o copo à boca e consumiu o líquido rapidamente, sem contestar, deixando o recipiente vazio. Fazia o máximo possível para permanecer calma, mas tinha dificuldades. Lothar percebia isso e sorria por dentro.

— Que rápida! Vejo que gosta dessa bebida. Devo mandar os criados servirem mais?

— Não, mas agradeço a generosidade. Tenho o hábito de beber pouco.

— Compreendo... — Encerrou o assunto, olhando ao redor, à procura de certa pessoa. — Katherine, onde está a proprietária desse lugar? Poderia me levar até ela?

— Mafalda está com um homem. Não posso interrompê-la.

— Bom, hoje você pode! É uma ordem minha, portanto, obedeça! — gritou, mas sem chamar muita atenção dos presentes no salão, pois a música atual era alta e atraente aos ouvidos de todos.

A jovem se levantou e caminhou em direção à saída do ambiente, sendo seguida pelo rei. Katherine parou diante de uma porta próxima à do quarto onde Lothar foi atendido na noite anterior. Bateu três vezes nesta antes de receber uma resposta rude. A mulher a abriu, mostrando que utilizava uma camisola branca e os cabelos estavam soltos.

— Posso saber o motivo de ter sido atrapalhada em um momento tão importante?

— Importante será a conversa que teremos. — Lothar a encarou, friamente. Detestava a ignorância daqueles em menor posição a ele. — Aprenda a respeitar o monarca de Arroway, senão as consequências serão graves.

— Meu rei, peço desculpas por tamanha grosseria. Não sabia que era o senhor que estava aqui hoje. — Mafalda, diferente de Katherine, não se esforçava para esconder o pavor que sentia com a presença do homem, apertando suas mãos na tentativa de ser educada e amenizar a situação. — Seja bem-vindo!

— Poupe-me de suas hipocrisias. Quero ir para um local onde possamos conversar melhor. Katherine virá conosco.

Mafalda expulsou o cliente do quarto, empurrando-o para o lado de fora. Ordenou que se vestisse em qualquer outro canto e a esperasse lá em baixo, fazendo companhia aos amigos. Permitiu que o rei e a prostituta adentrassem o seu aposento, que era o maior de toda a residência.

— Katherine causou problemas? — Mafalda a olhou com desprezo, com vários pensamentos se passando pela mente. — O que você fez, garota?!

— Ela não fez absolutamente nada. — Lothar apanhou do bolso uma sacola com um número maior de moedas de ouro do que na primeira vez em que viera frequentar o prostíbulo. Lançou para que a mulher as pegasse. — Isso é o suficiente?

— Suficiente para o quê? — Seus olhos brilhavam. Parecia um rato faminto que estava prestes a se deliciar com o melhor queijo oferecido na cidade. Até mesmo Lothar se assustou com tamanha ganância. Decidido a acabar com aquilo de uma vez e sair para sempre daquela casa, o homem quebrou o silêncio e esclareceu as dúvidas.

— Para que Katherine seja minha e vá comigo para o castelo.


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