Acontece no Verão escrita por Joice Santos


Capítulo 2
Capítulo 2 - Final


Notas iniciais do capítulo

Segunda e última parte, amores.

FELIZ NATAL



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/576729/chapter/2

Dois meses depois...

Esses meses foram imensamente difíceis. Rosalie só piorou...

Eu vivia mais no hospital com ela do que em minha própria casa. Os pais dela então, nem se falava. O Sr. Hale pediu afastamento do trabalho e, juntamente com a esposa, não saíam do hospital com a filha. Eu ainda ia às aulas, mas não tinha cabeça nem vontade para prestar atenção no que os professores explicavam. Às vezes matava aula pra ficar com Rose e meus pais não brigavam mais. Eles entediam minha necessidade.

O câncer estava se tornando cada vez mais agressivo e as sessão de quimioterapia antineoplásica – ou simplesmente quimioterapia – começaram. Os médicos precisavam impedir com urgência que as células malignas se espalhassem cada vez mais.

Rosalie ficou destruída ao saber da nova fase do tratamento. Significava mais horas no hospital, ficar mais fraca e sonolenta e, a pior parte para ela, perder os cabelos. Ela chorou antes, durante e depois da primeira sessão. Eu não saí de perto dela nem um minuto sequer, segurando sua mão e a deixando chorar. Ela precisava disso. Depois o cansaço a venceu e ela adormeceu no leito do quarto do hospital.

Algumas semanas depois, após a quarta sessão, foi que começou.

Eu estava no quarto com Rose, ela havia acabado de voltar do banheiro, após vomitar outra vez. Seus pais conversavam com os médicos lá fora e minha mãe havia ligado e dito que estava vindo visitar Rose.

–Emm, eu... – nem houve tempo dela terminar a frase. Rose se inclinou na cama e vomitou copiosamente no chão. Me levantei rápido da poltrona e me sentei ao seu lado, passando a mão em suas costas.

Depois de tossir algumas vezes, ela ergueu a cabeça e limpei sua boca com uma toalha que havia ao seu lado na cama.

–Eu não aguento mais isso, Emm. Não aguento. – ela falou tentando parecer raivosa, mas estava segurando o choro. – Eu quero morrer. – apertou os olhos e se deitou na cama.

–Não digo isso Rose. Vai passar. – estendi minha mão para tocar seu rosto, mas ela me afastou. Suspirei. Ultimamente seu humor oscilava constantemente.

Não demorou muito para que ela adormecesse. Saí de lá e fui para cantina do hospital, encontrar meus pais.

–Como ela está? – mamãe perguntou.

–Dormindo. – dei de ombros.

–A Sra. Hale disse que se ela passar essa noite bem poderá ir pra casa amanhã. – papai contou.

–Isso é bom. – falei, bebericando o café que estava a minha frente.

–Sim, ela precisar sair um pouco daqui. - mamãe disse. – Vai ficar tudo bem, Emmett. – ela apertou minha mão e sorriu.

E eu queria mesmo acreditar nisso.

Algumas horas depois, eu estava no corredor, em frente ao quarto de Rose. Mamãe e papai haviam ido embora cuidar de Alice e eu ficara, como sempre, para esperar Rosalie acordar e me despedir. Os pais dela estavam no quarto com ela.

–Não! Mãe! Não, não! –Escutei gritos vindos do quarto de Rose e logo me apavorei. Fiquei de pé e rapidamente abri a porta, entrando e dando de cara com uma Rosalie chorando desesperada.

Havia tufos de cabelo dourado espalhados pelo travesseiro e alguns no chão. Rose estava com as mãos na cabeça, como se o gesto pudesse impedir os fios de caírem. A Sra. Hale tentava acalmá-la, ora abraçado-a, ora secando as lágrimas que rolavam por seu rosto doentemente branco.

–Rose, Rose. Calma, por favor. – sentei ao seu lado, tentando segurar sua mão. Ela puxou no mesmo instante.

–Sai daqui, Emmett. Me deixa em paz! – ela berrou em meio ao choro.

–Não, eu vou ficar com você até se acalmar. – segurei sua mão com força. Dessa vez não a deixara soltar. Puxei sua cabeça para meu peito, vendo a Sra. Hale se sentar na poltrona a nossa frente, secando as próprias lágrimas. O marido havia ido chamar um médico, eu acho. Ou talvez não aguentasse presenciar o sofrimento da filha.

Rosalie chorou e chorou. Foram incontáveis os minutos que se arrastaram. Eu não a pedia para parar, só queria ficar com ela para demonstrar que seria sempre assim, sempre estaria do seu lado.

[...]

No dia seguinte, Rosalie e a família puderam voltar pra casa e, após pensar a noite toda no hospital e durante essa manhã, ela decidiu o que seria melhor a fazer em relação aos cabelos.

–Você sabe que não tem que fazer isso agora, não é querida? – a mãe dela quis avisar.

No caminho para casa Rose insistiu que queria passar no cabeleireiro e cortar os cabelos. Eu estava sentada com ela no banco de trás. Eu nem havia ido ao colégio, queria estar no com ela assim que saísse do hospital.

–Eu quero fazer isso agora. – ela sussurrou, desviando o olhar da janela para as mãos.

Então, para não cansar Rose, sua mãe desceu e entrou no salão, retornando minutos depois dizendo que havia dado o endereço da casa deles e que a cabeleireira iria logo mais até lá para cortar os cabelos de Rosalie em casa. Ela sorriu, fracamente, mas sorriu. Acho que estava satisfeita por ninguém vê-la depois do corte.

No fim da tarde, a mulher de cabelos curtos e vermelhos chegou. Eu e Rose estávamos deitados em sua cama. Às vezes ela sorria de alguma coisa que eu falava, mas na maior parte do tempo ficávamos em silêncio enquanto ela brincava com meus dedos.

–Pode nos dar licença, Emmett? – A Sra. Hale pediu, entrando com a tal mulher que viera cortar os cabelos da minha loirinha.

Beijei o topo da cabeça de Rosalie e saí, sussurrando um “vai ficar tudo bem”. Ela apenas assentiu.

[...]

–Vamos filha, você foi quem quis cortar tudo de uma vez. Agora vai querer ficar enfurnada neste quarto o dia todo? – o senhor Hale falou, sentado na beirada da cama da filha. Eu observava a cena encostado a porta.

Rose estava aninhada à mãe na cama, chorando. Entre seus dedos havia uma mecha dourada, lembrança que pediu pra guardar de seus cabelos.

–Filha você precisa de ar, vá andar um pouquinho com o Emmett. – a senhora Hale tentou, beijando a testa da filha.

–Parem de tentar me fazer sair! Não adianta me dizerem que ninguém vai olhar pra mim, porque vão. Não digam que eu não pareço uma aberração, porque pareço! – Rose esbravejou, escondendo a cabeça no peito da mãe. A cabeça que agora não havia nem mais um fio sequer de cabelo dourado. Escutávamos apenas seu choro abafado.

–Chega, eu não vou admitir que você diga isso. – eu falei, mesmo que ela não tivesse prestando atenção.

Saí rapidamente da casa dos Hale e entrei no primeiro cabeleireiro que encontrei pela frente.

Eu não ia deixar aquela garota incrível se esconder atrás da mãe, dentro de um quarto, por estar com vergonha de sair com a aparência que está. Rosalie continua linda para mim, sempre vai ser. E se eu tinha que fazer algo drástico para tirá-la de lá e fazer com que saísse comigo, respirasse ar puro outra vez, então eu faria qualquer coisa.

Não demorou muito e logo eu estava batendo na porta da casa de Rosalie outra vez. O senhor Hale me recebeu primeiramente com espanto, mas sua expressão logo foi substituída por um sorriso e um abraço caloroso.

Subi as escadas com ele na frente.

–Filha, o Emmett voltou.

–Mande-o ir embora. – Rose resmungou. Ela estava deitada de costas para porta.

–Não vou sair daqui até que você olhe pra mim. – falei, cruzando os braços, apesar dela não estar me vendo.

–Emmett, não adianta tentar me convencer. Eu não... – ela parou de falar no instante em que me viu.

No instante em que viu minha cabeça igual à dela, sem nenhum fio de cabelo.

–Emm. –seus olhos cor de mel encheram-se de lágrimas.

–Sabe como é. Se não pode derrotá-los, junte-se a eles. – dei de ombros, caminhando em sua direção.

Rosalie segurou minha mão, se sentando sobre os joelhos. Me sentei ao seu lado e ela passou a mão em minha cabeça lisa.

–Você tá parecendo um polegar, sabia?! – Ela riu e uma lágrima escorreu por sua bochecha.

–Vai ficar me zuando é? – brinquei, fazendo cócegas nela. Rose se contorcia na cama enquanto eu estava em cima dela, fazendo cócegas por todo seu corpo.

–Emmett? Meu Deus! – a voz da senhora Hale nos fez parar.

–Mãe, o Emm está parecendo um polegar. Igual a mim. – a risada gostosa da minha loirinha tomou o ambiente, fazendo meu coração se aquecer. Eu rasparia o cabelo quantas vezes fossem necessárias para vê-la sorrir daquela forma.

–Estou vendo, meu bem. – a mãe de Rose se aproximou e me puxou para um abraço. – Obrigado, querido. – sussurrou em meu ouvido.

Por menor que fosse o gesto para qualquer pessoa, para a família de Rose, principalmente para ela, era algo completamente importante. Era como se ela entendesse que eu estaria com ela em todas as situações, não importa como.

Então resolvemos sair os quatro juntos e encontrar minha mãe e Alice no parque. Rose colocou uma boina vermelha, mas eu ia com minha cabeça completamente a mostra, o que a fazia rir toda vez que me olhava.

–Ai minha nossa senhora das Barbies! Mãe olha o Emm! – Alice berrou quando nos viu. A baixinha apontou o dedo na minha direção, na outra mão segurava um balão cor de rosa.

Esme, minha querida mãezinha, precisou piscar algumas vezes quando se aproximou de nós, mas não disse nada além de sorrir.

–Mãe, a senhora não vai falar nada? – a anã perguntou, indignada por eu não receber uma bronca. – Quando eu peguei a tesoura pra cortar uma franja em mim a senhora fez um discurso. – tagarelou.

–Deixe de ser chata, Alice. E seja educada, a Rose e a família dela estão aqui ou não percebeu? – cutuquei minha doce e pentelha irmã caçula.

–Oi Rose, olá senhor e senhora Hale. – a baixinha fez carinha de anjo e até piscou os olhinhos. Ela sabe mesmo derreter corações.

–Olá Lice, eu amei seu vestido. – Rose a elogiou, fazendo minha irmã balançar o corpo de um lado para o outro, só pra exibir a roupa.

–Obrigada, ele combina com meu balão. – ela olhou pra cima, vendo o balão rosa flutuar com o vento. -Mamãe, eu quero pipoca! – Alice puxou o casaco da nossa mãe, já apontando para o pipoqueiro parado do outro lado da rua.

–Tudo bem, coisinha pequena. Até mais, gente. E Rose, você está linda querida. – mamãe soprou um beijo e piscou pra minha namorada. Notei quando as bochechas da minha loirinha ficaram vermelhas e ela sorriu sem graça.

–Vem, vou te comprar um balão. – falei, puxando Rose para o homem que vendia vários balões coloridos perto de uma árvore. Os pais dela estavam apreciando a companhia um do outro, observando a fonte.

Escolhi o balão vermelho para Rosalie, era a cor favorita dela e combinava com a boina em sua cabeça.

–Obrigada Emm, eu amei. – ela sorriu verdadeiramente, fazendo meu coração falhar algumas batidas. Ela tinha esse dom. Pegou o balão na mão e ficou observando a luz fraca do sol reluzindo na bexiga de ar quente.

– E eu amo você. – falei, para logo em seguida beijá-la. Um beijo rápido, calmo e singelo, porém que era capaz de demonstrar todo meu amor e carinho, fazendo jus ao que eu acabar de dizer.

Encostei minha testa na dela, sem quebrar nosso contato visual. Os olhos cor de mel tinham vida outra vez, brilhavam com a luz, reluzindo o que ela estava sentindo no momento. Podia ter certeza que Rose havia esquecido pelo menos por esses breves minutos, toda essa coisa de doença, cabelo, morte. Éramos apenas eu e ela, num parque, aproveitando a companhia um do outro, com um balão vermelho de testemunha e as pessoas que passavam ao nosso redor, sorrindo.

Naquela noite meus pais e os de Rose me deixaram dormir com ela. Sim, dormir, apenas isso – repetiram os adultos.

Um colchão de ar foi colocado no chão ao lado da cama da minha loirinha, mas no momento eu estava deitado em sua cama, tendo ela no calor e conforto dos meus braços. Eu estava contando algo muito bobo em relação à Alice e Rosalie ria, mas quando o som de sua risada cessou e, a meia luz do abajur, ela virou e me encarou com seus grandes olhos cor de mel, senti meu corpo enrijecer.

Seus lábios, levemente esbranquiçados, roçaram nos meus. Podia sentir seu hálito fazendo todos meus pelos se arrepiarem. Ou ela parava com esse pequeno e tentador contato ou eu não conseguiria me controlar, afinal eu sou um cara de 17 anos cheio de hormônios sambando sem controle pelo corpo. Então ela me beijou.

Não foi um beijo simples, comum ou calmo como sempre. Beijar Rosalie nunca era comum. Mas dessa vez havia algo mais. Ela queria mostrar que queria algo mais além de beijos e passeios de mãos dadas.

–Rose. Vai com calma. O que acha que está fazendo? – perguntei, quando a afastei, segurando seus ombros com cuidado e firmeza.

–Emm, eu sei que vou morrer e, quando isso acontecer, não quero morrer virgem. – ela falou, com a maior naturalidade do mundo.

–Pare de dizer essas bobagens sobre morte. –resmunguei, tentando ignorar a outra parte de sua fala.

–Então me beija que eu paro. – Rose subiu em cima de mim, deixando um joelho de cada lado de minhas pernas. Suas mãos seguravam meu rosto, como que para eu não fugir. Mas eu não queria fugir, apesar de achar que aquilo ali estava um tanto errado.

–Seus pais estão dormindo no quarto no fim do corredor, você tem noção disso? – disse, tentando ganhar tempo para me controlar. É eu estava cedendo a essa garota incrivelmente tentadora. A garota pelo qual sou apaixonado desde criança.

–Não precisamos fazer barulho. – ela falou enquanto tentava tirar minha blusa. Segurei suas mãos e ela parou, me encarando. – Escuta Emm: eu amo você, okay? Se não for com você não vai ser com ninguém mais e não é porque talvez eu não tenha outra chance, mas sim porque eu só quero com você. – seu olhar caramelado nunca foi tão intenso.

Eu a queria mais que tudo nessa vida, de todas as formas possíveis. Éramos adolescentes que descobrindo o amor juntos e se não fosse com ela com certeza não teria o mesmo efeito com mais ninguém.

Dessa vez eu a beijei, começando calma e lentamente. Rosalie tirou minha blusa e eu fiz o mesmo com a sua. Sabe se lá de onde tirei tanta prática, mas abrir o fecho do sutiã dela não foi tarefa complicada. Enquanto terminávamos de nos livrarmos das nossas roupas, Rose acabou rindo, como se aquilo fosse a maior aventura de sua vida. A mais engraçada e excitante. Bom, pra mim estava sendo.

Não poderia imaginar nada melhor que estar ali com minha loirinha, no momento sem cabelos, mas linda como sempre. Lembrei-me de quando nos beijamos a primeira vez, há uns dois anos atrás. Ela havia guardado o primeiro beijo pra mim e agora estávamos avançando outro nível, só que dessa vez os dois havia guardado o momento especialmente um para o outro.

–Eu amo você. Pra sempre. – falei, mantendo nossos corpos unidos.

–Até depois do sempre. – ela me beijou, deixando o momento mais especial com aquelas palavras.

E ela tinha razão. Nos amaríamos até depois do sempre.

[...]

Três semanas depois...

A situação havia se complicado. Apesar de parecer bem, Rose teve uma piora muito considerável. Na semana passada ela havia sido trazida para o hospital, no ultimo sábado durante a madrugada, com hemorragias e dificuldades respiratórias, após um desmaio. Desde então ela vivia ligada a vários aparelhinhos, sendo monitorada constantemente.

A senhora Hale não ia pra casa há dias, não queria deixá-la sozinha de maneira alguma. Os médicos, ontem, chamaram os pais de Rose para conversar, enquanto eu e minha mãe estávamos no corredor da sala de espera, querendo dar boa noite a Rose antes de irmos.

–Os rins dela estão parando de funcionar, não há muito que possamos fazer além de dar remédio para dor e esperar. – o doutor disse.

–Vocês não podem deixar minha menina morrer. Eu pego isso aqui pra que? Vocês tem que salvá-la! Façam um transplante, o que for necessário, eu não quero saber, só a quero bem ok?! – a senhora Hale esbravejou, na porta do quarto de Rose.

–Senhora, se acalme. Como já disse, não há o que ser feito, na situação em que ela está não sobreviveria a mais uma cirurgia. A última, do fígado, a debilitou muito. Sinto muito. – o médico terminou, indo ao encontro de uma enfermeira.

Foi a primeira vez que vi a senhora Hale nesse estado, gritando. Ela sempre era muito calma. Mas eu a entendia. Rosalie estava morrendo, e isso era motivo de revolta para qualquer um.

Chamei minha mãe e pedi para que fôssemos pra casa. Ela não entendeu muito bem, já que toda noite eu em despedia de Rose. Eu não queria vê-la, não naquele momento, não cheia de fios e debilitada. Eu não tinha forças pra isso, não agora.

Naquela noite, me tranquei no quarto e chorei. Chorei feito um garotinho assustado. O choque da realidade me dominando. Eu iria perdê-la, ela iria embora e dessa vez seria pra sempre. Não, eu não tinha forças para suportar isso.

Como que para piorar a dor e cortar meu coração de vez, uma enxurrada de lembranças veio a minha mente. Desde quando a conheci até hoje à tarde no hospital quando a visitei. Então os pensamentos mudaram, imaginando uma vida sem Rosalie. Era doloroso demais, irreal, um pesadelo que eu não queria que se concretizasse. E, infelizmente, eu não tinha maneira alguma para impedir aquilo.

Hoje, pela manhã, estranhei o fato de minha mãe vir me acordar com uma bandeja de café da manhã. A menos que estejamos doentes, ela nunca faz isso comigo ou meus irmãos.

–Emm, o pai da Rose ligou e pediu pra perguntar se você quer ir à praia com eles. – mamãe falou, se sentando na beirada da cama, ao meu lado. A voz dela era tão doce. Afastei a bandeja para cima do colchão e deitei minha cabeça no colo dela. Meu cabelo estava bem curtinho ainda, mas já crescia de novo.

–Rose não pode ir à praia, mãe. – respondi, sabendo que os médicos não a deixariam sair estando ligada a todos aqueles aparelhos. E ainda mais com este tempo frio.

– Os médicos a liberaram por esta tarde, depois ela tem que voltar para o hospital. Eleazar me disse que ela pediu muito por isso a noite toda. – minha mãe acariciava minha cabeça.

Não entendia porque, mas pra mim aquilo parecia mais um último pedido de Rosalie.

Tratei logo de afastar o pensamento, não era de pensar naquilo. Se minha loirinha queria ir à praia, então eu iria com ela e faria ser uma tarde bem divertida.

[...]

Mamãe me deixou levar Alice e eu até gostei de ter a companhia da minha anã de jardim favorita – e única, é claro.

Quando chegamos à casa dos Hale, escutamos os gritos da mãe da Rose. Carmen berrava ao marido dizendo que Rose devia voltar para o hospital. Pelo vidro do carro dos Hale pude ver minha namorada no banco de trás, a cabeça encostada no vidro.

–Chega Carmen! Nós vamos para La Push, queira você ou não. Quer ficar aí se lamentando ou procurando mil formas de fazer nossa filha se curar de vez então fique. Mas o que está a deixando pior é a forma com que você está lidando com isso. Como mãe você devia apoiá-la, ficar do seu lado, não exigir que ela ficasse trancada naquele quarto cinza de hospital. – o senhor Hale falou, nervoso, com a respiração pesada.

A senhora Hale estava parada na porta, o rosto vermelho coberto de lágrimas. Ele balançou a cabeça e se virou para nós, dando um sorriso forçado pra mim e Alice, enquanto abria a porta do carro.

– Vamos, crianças? – tentou animar a voz, disfarçando ansiedade.

Apertei a mão de Alice sem sinal de que ficasse quieta e entrasse no carro. Rose sorriu pra mim assim que me viu, acomodou a cabeça no meu ombro e eu beijei sua cabeça. Então fomos em silêncio para praia La Push.

O vento frio, típico da região, soprava no local. Apesar de estarmos na última semana da primavera, não estava calor. O estado de Washington tem esse pequeno defeito, sempre chuvoso, nublado ou gelado. Semana que vem começaria o verão, para alegria de Rose. "Um pouco de sol é sempre bom, se não me fizer soar, é claro." Era o que ela sempre dizia.

Eu e o senhor Hale estendemos lençóis na areia macia e Rose se sentou comigo neles. Alice viu crianças jogando bola e pediu para ir brincar com elas, eu deixei. Eleazar resolveu pescar, mas acho mesmo que ele queria pensar na vida, ficar sozinho um pouco.

Depois de um tempo, quando ouvimos um barulho de carro e o bater de porta, olhamos para trás e vimos a senhora Hale se aproximar. Rosalie não pode conter o sorriso por ver a mãe ali e as duas se abraçaram. Então o senhor Hale desistiu de pescar e se juntou a nós nos lençóis.

Alice voltou para perto de nós e tirou da bolsinha cor de rosa um potinho daqueles de fazer bolhas de sabão. A anã pediu para Rose, que estava enrolada em um cobertor, assoprar as bolinhas e assim ela fez, enquanto Lice corria para lá e pra cá estourando a bolhas.

Os lábios de Rose, apesar de estarem esbranquiçados, tinham um sorriso de fazer parar meu mundo. A pele começando a ficar com manchas arroxeadas, os ossos saltados. Mesmo assim ela era a garota mais linda do mundo pra mim, a que eu amaria até depois do sempre, a que eu nunca esqueceria.

Passamos uma tarde completamente tranquila, ouvindo o som das gaivotas, a risada das crianças, o barulho do mar. Era a incrível a calma que nos tomava ao ficar assistindo as onde quebrarem lentamente na praia.

Então, quando o sol estava se pondo, voltamos para casa. Quer dizer, os Hale me deixaram em casa, depois foram levar Rose de volta ao hospital.

[...]

05h16min da manhã, primeiro dia do verão.

–Emm, acorda filho. – senti alguém me balançando, mas minha cama estava muito boa para que eu quisesse sequer abrir os olhos. –Emm, acorda.

–Mãe? – abri os olhos em fendas, tentando me acostumar com a claridade da luz acesa. Olhei para pó relógio constatando que era muito cedo para levantar, ainda mais que era a semana das férias de verão.

–Filho, temos que ir para o hospital. A Rose piorou. – foi o que bastou para eu ficar desperto.

Em poucos minutos eu estava de pé e vestido, querendo sair logo de casa. Não adiantou a insistência de minha mãe, eu não iria comer nada.

O caminho para o hospital pareceu demorar um século, mas quando finalmente chegamos desci apressado, já sabendo de cor o caminho para o quarto de Rose. Encontrei um casal de tios dela sentados com a cabeça baixa e de mãos dadas. Eles pareciam estar rezando. A senhora Hale saia nesse exato momento chorando inconsolada do quarto da filha, com o senhor Hale logo atrás, a amparado.

Não, não. Eu cheguei tarde? Ela se foi? Por favor, Deus, não.

–Ei, Emm, ela quer te ver. –Eleazar disse e tocou meu ombro. Só então percebi que minhas pernas estavam travadas. Eu não queria encarar o momento, meu coração sentia que ele havia chegado.

Forcei meu corpo a se mover, um médico encostou a porta assim que entrei. Assim que meus olhos alcançaram a cama, meu coração trincou. A imagem de uma Rosalie completamente debilitada, fraca, respirando lentamente e que parecia até mais magra do que antes, era de dar agonia. Eu só queria a tirar dali, levá-la pra qualquer lugar que estivesse batendo um sol quente e aconchegante, na esperança de que isso fosse curá-la.

–Oi Emm. – sua voz saiu fraca, quase um sussurro. E ela sorriu, sorriu sinceramente por me ver ali, como se estivesse feliz. Como se nada estivesse acontecendo.

Mas estava. Meu mundo estava desabando. Ela era meu mundo e estava, nesse momento, escorrendo por minhas mãos como areia e eu não podia segurá-la comigo.

Com passos lentos caminhei até sua cama, me agachando e segurando sua mão. Quando depositei um beijo casto sobre a pele pálida, quase translúcida, e pude sentir como estava fria.

–Que bom que veio. – ela sorriu de novo. Apertei um pouco sua mão, eu não conseguia falar ainda. Olhá-la, escutar sua voz rouca, estava me dando vontade chorar. Um bolo se formava grosso e pesado em minha garganta. – Desculpe te acordar tão cedo.

Apenas neguei com a cabeça e dei de ombros, forçando um sorriso.

–Eu estava com tanta dor na noite passada, mas agora quase não sinto nada. Me entupiram de remédios. - ela tentou rir. - Eu queria te ver. Sabe, eu acho que chegou a hora. – ela falou e suas palavras lentas cravaram meu coração de forma dolorosa. Por um momento eu senti meus pulmões falharem, de repente havia ficado difícil respirar.

Abaixei a cabeça, encostando minha testa em sua mão, e chorei. Eu não queria ouvi-la dizendo isso, porém não queria imaginar o quanto ela sofreu com essas malditas dores. Descansar seria o melhor agora, ela havia lutado demais. Mesmo assim não dava para me conformar, eu só queria chorar, pensando que com as lágrimas esse momento tenebroso iria embora.

Mas não ia.

–Ei, Emm não chore. – senti quando ela se remexeu na cama e sua mão acariciou meus cabelos curtos. – Vem cá, deita comigo. Por favor. – ergui a cabeça a tempo de ver uma lágrima cristalina rolar por sua bochecha. Mesmo assim ela mantinha o sorriso lá, intacto, sem sinal nenhum de ser forçado.

Com cuidado, me deitei ao seu lado na cama. Rose me abraçou por trás, eu encarava a pequena janela, onde os raios de sol fracos começavam a dar sinal.

–Minha mãe disse que hoje é o primeiro dia do verão. Fiquei feliz. – ela comentou. Eu sabia o que Rosalie estava tentando fazer, estava tentando deixar o momento mais comum possível, cotidiano. Como se aquela fosse uma conversa normal nossa na cama de seu quarto em casa, ou no meu quintal.

Mas era difícil pra eu imaginar isso quando os barulhinhos incessantes daquelas máquinas eram tudo que ouvíamos. E eu estava grato por ainda ouvi-los.

–Você está com medo? – resolvi perguntar.

–Estou. Não de morrer, no começo eu tinha, agora não. Estou medo de não te ver nunca mais, não ver minha família. Medo de esquecer vocês.

– Não vai, nunca vamos esquecer você, Rose. É impossível. Sei que você nunca vai se esquecer da gente também. – afirmei.

Se é uma coisa que eu tinha plena certeza na minha vida era que a presença de Rose jamais seria esquecida. Nem se eu quisesse, nem que tentasse. Ela estava pra sempre cravada em meu coração e memória. No coração principalmente.

– Eu espero. – ela falou e eu senti uma pontada de desespero em sua voz. Seus lábios deram um beijo demorado em minha nuca.

Não houve arrepios como sempre sentia quando me beijava ali. Houve um sentimento profundo, doce e singelo de amor verdadeiro. Houve saudade se sentir aquele toque novamente. E ela nem tinha ido ainda.

Enquanto estávamos deitados naquela cama de hospital, Rose acariciando meus cabelos quando deveria ser eu quem devia lhe fazer carinho, eu me lembrei. Lembrei-me de tudo que vivemos juntos. Das brincadeiras infantis, os aniversários, as idas na praia. Seu sorriso bobo apreciando a vista enquanto o sol aquecia sua pele quase transparente com manchas arroxeadas na nossa última visita a La Push. Nossa primeira e única noite de amor.

Lembrei-me do nosso primeiro beijo, da forma doce e envergonhada que ela me contou que o havia guardado para mim.

Sua partida e nosso reencontro. E então a doença, as noites mal dormidas, as revoltas, a queda de suas preciosas mechas douradas. A aceitação e por fim a espera. A espera desse dia que rezei para que jamais chegasse.

Porque Rosalie era todo meu mundo, meu sol, o calor que existia em mim. Até mesmo o frio, a ardência no peito e o sufoco. Tudo isso eram efeitos dela em mim. Era ela em mim. E não saberia mais como respirar se ela não o estivesse fazendo.

Meu corpo tremia com meus soluços. Eu não queria mais segurar, não podia mais. Eu queria gritar pra todos ouvirem o quanto era injusto alguém tão bom quanto ela ser privado de vida e saúde. Era errado e eu não sabia como consertar. Eu não podia.

–Shii, está tudo bem, Emm. - ela falou baixinho. - Vai ficar tudo bem, não precisa ter medo. Eu to aqui, ok?! Eu to aqui. - ela me abraçou como pôde, os fios em seus braços magros dificultavam isso.

– Não, não vai. O que eu vou fazer sem você, Rose? Eu não vou aguentar. - chorei, me virando na cama com cuidado para encará-la. Com certeza eu parecia um garotinho assustado e era exatamente assim que eu me sentia.

–Claro que vai. Você vai ficar com sua família e lembrar-se de mim. Quando estiver calor, num dia bem ensolarado de verão, olhe para o céu. Procure o topo mais alto de uma montanha. Eu vou estar lá te esperando. - ela sorriu débil, e mesmo sem forças, com os lábios roxos, era o sorriso mais lindo e sincero do mundo.

– Promete? -eu pedi. Eu estava com tanto medo. Ela podia não estar, mas eu estava.

–Prometo garoto das covinhas fofas. - ela riu de leve depois tossiu. Então acariciou minha bochecha e roçou seu nariz de leve no meu.

–Ah minha loirinha... - acariciei seu rosto como todo cuidado e delicadeza. Ela era meu cristal mais raro e fino prestes a estilhaçar. Prestes a estilhaçar meu coração.

– Te amo, Emm. Nunca se esqueça disso, ok? -Ela fechou os olhos, o sorriso fraco não lhe saia do rosto abatido.

–Jamais, Rose. Eu te amo, mais do que qualquer pessoa amou ou vai amar alguém.

Beijei sua testa com delicadeza, respeito, cuidado e carinho. Acima de tudo amor. Eu queira demonstrar com aquele simples encostar de lábios tudo que sentia por ela. Queria que fosse assim sua última lembrança de mim. Como a pessoa que mais a amou na vida. Como o garoto que ela tornou homem, que ela fez descobrir o sentimento mais puro e forte que existe do mundo.

Uma lágrima rolou por seu rosto e eu a beijei.

–Feche os olhos, Emm. Vai ficar tudo bem. -Ela pediu e eu obedeci, me aconchegando mais a ela. Deixei minha torrente de lágrimas molhar sua camisola hospitalar enquanto absorvia seu cheiro. - Vai ficar tudo bem, Emm. Eu estou aqui, meu amor. -ela repetiu.

Só então percebi que Rose repetia aquilo mais para si mesma do que pra mim. Ela havia mentido, ela estava com medo sim. Só queria que eu me sentisse seguro, confiante e calmo, pensando que era assim que ela também se sentia.

Mas esse medo de perder um ao outro, nem se quiséssemos poderíamos aplacar.

[...]

Rosalie se foi no fim da tarde daquele dia, durante o por do sol, junto com ele.

Queria poder dizer que nossa história teve um final feliz. Que ela se curou, que voltamos a La Push e nos divertimos. Mas não foi assim que aconteceu.

Rose morreu, e isso era um fato dolorosamente arrasador. Mas o quanto viveu, como viveu, a forma que esteve conosco, sempre nos fez sorrir. E era assim que nos lembraríamos dela. Sorrindo. Aquele incrível sorriso cativante, doce. Quente. Um sorriso de verão.

A família ficou inconsolável. Todos nós ficamos. Jasper, que não pode acompanhar de perto a doença da irmã, mas sempre que podia a visitava e ligava todos os dias, se sentia culpado por não ter estado perto como queria. Seus pais não o culpavam, ninguém fez isso, mas eu notava o sentimento de culpa em seus olhos durante o velório.

Os olhos tão iguais aos dela.

Sei que ainda vou me encontrar com ela, todos nós. Sua família, a minha. Ela está lá, no topo da montanha, correndo na grama, dançando com os raios de sol e me esperando como prometeu. Jamais irei esquecê-la, assim como sei que ela se lembra de mim a todo instante.

Como havia dito no começo, a vida sempre nos prega peças. Ela me pregou uma de muito mau gosto. Levou meu amor de infância, minha loirinha, embora. E, apesar de odiar esse fato com todas as forças, fico completamente feliz e realizado por ela ter feito parte da minha vida. Por termos construído uma história juntos. Construído nossa vida juntos.

Rose pode ter ido para “um lugar melhor”, como dizem. Mas a carregarei comigo até o dia em que possa vê-la novamente. E amarei para sempre.

Até depois do sempre.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Quero agradecer quem comentou e já também quem vai comentar. Espero que tenham gostado, apesar do fim. A vida é sim gente, nos prega peça, nem sempre tudo tem um final feliz. Sim, eu estou chorando aqui.
Um beijo no coração de vocês



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Acontece no Verão" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.