Baby, it's cold outside! escrita por Jones, Samantha Silva, isa


Capítulo 3
Falling In Love At a Coffee Shop - Draco/Astoria - Lu


Notas iniciais do capítulo

Olá! :)
Aqui a musiquinha da fic: https://www.youtube.com/watch?v=erywPdFfORE
Espero que gostem.



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Eu estava pensando em como seria ótimo me jogar do penhasco mais próximo só para me livrar do cheiro de fritura, cupcakes quase vencidos, cigarros baratos e cerveja irlandesa que um cliente acidentalmente derramara em mim (poderia ser pior - mentalizava pela quinquagésima vez - poderia ser vômito) quando Draco atravessou a porta giratória imunda.

Ignorei o fato de que ele era um sopro de alivio naquela noite insuportável e nós tivemos uma rápida conversa visual antes dele ir se sentar em sua mesa habitual. Rudolph The Red Nosed Reindeer começou a tocar pela sétima vez desde que meu expediente teve inicio, mas, de algum modo, apenas me senti grata por não ser Jingle Bells. Eu não sei quando todos os meus sonhos ardentes se reduziram a um único e vital desejo de que as canções natalinas interpretadas por Frank Sinatra não fossem tocadas por um misero dia naquela espelunca que eu eufemicamente insistia em chamar de trabalho, porem, independente da quantidade de tempo, todas as minhas forças se voltavam para esse único pedido de Natal.

Oferecendo o cardápio e uma estúpida coroa de papel seda exatamente igual a que eu estava sendo obrigada a usar para Malfoy, eu estiquei o pescoço brevemente para ter certeza que ninguém me supervisionava e então disse:

– Para hoje temos A Inevitável e Inadiável Terrível Morte da Alma da Astoria e Por Favor Me Tire Daqui Eu Vou Enlouquecer como especialidade da casa.

Ele encarou o cardápio com seriedade antes de me olhar por cima do menu.

– Hm. A primeira opção parece interessante.

– Você é o pior filho da puta que existe. – Fingi estar anotando algo na caderneta de pedidos. – Ok. Confere. Um soco saindo em... – Eu encarei o relógio de parede. – Meia hora. Só aguardar.

– Estou ansioso. – Garantiu, colocando o artefato trouxa na cabeça e se recostando confortavelmente, como se ali fosse o melhor lugar do mundo para se estar em um dia como aquele.

Eu girei os olhos e enquanto andava em direção as outras mesas, me permiti encarar suas costas por dois ou três segundos, pensando em como eu provavelmente estava me tornando dependente da nossa amizade nebulosa e pouco ortodoxa. Draco e eu tecnicamente nos conhecemos desde sempre, porque é isso que bruxos que se consideram nobres e de puro sangue como nossos pais fazem: mantêm laços estreitos ou pelo menos polidos entre si, na esperança doentia de que eventualmente seus filhos acasalem, procriem e mantenham a espécie intacta.

No entanto, nós só tivemos real consciência de quem éramos quando terminei meus estudos na Beauxbatons, voltei para a Inglaterra e passei um verão inteiro em sua casa com meus autoritários e pouco didáticos pais. Não sei exatamente – nem em qual ordem aconteceu – mas descobrimos que tínhamos muitas coisas em comum: nós dois somos sádicos depressivos, nós dois temos uma concepção pouco positiva do mundo, nós dois gostamos bastante do cheiro enjoativo dos meus cigarros franceses e nós dois achamos uma eficiente distração e fuga de realidade transarmos um com o outro loucamente quando temos tempo ou muitas crises existenciais na cabeça.

É legal porque desse jeito evitamos as poções alucinógenas e conseguimos balancear a dosagem de quanto álcool ingerimos nos finais de semana, apesar de não estarmos realmente muito interessados no nosso bem estar físico, quando já temos um psicológico tão fodido para lidar.

De qualquer modo, é isso que fazemos e eu me sinto bem de ter alguém com quem contar, mesmo que seja alguém que as pessoas do nosso mundo preferem evitar. Draco tem um histórico incrível de merdas no colegial, mais graves e mais sérios que os meus, que se resumiam em fugir da escola e experimentar uma ou outra droga trouxa com colegas igualmente trouxas e de condutas suspeitas. Mas a verdade é que ele é muito mais que essas coisas murmuradas por aí. Ele é meu melhor amigo. Consideravelmente imbecil e arrogante às vezes, mas ainda assim. Ele é o melhor incidente que poderia me ocorrer.

Eu provavelmente teria morrido de tédio ou teria me tornado uma misantropa louca que não sai do quarto se nós não tivéssemos nos tornado amigos. Ao invés disso, agora eu morro de tédio no café trouxa onde trabalho e não costumo passar mais do que algumas horas de sono no meu quarto (talvez porque ele seja o pior quarto alugado do mundo: minúsculo, mal iluminado e com manchas estranhas e de odor suspeito no papel de parede velho e encardido) e embora a vida não seja ótima, eu pelo menos saí da casa dos meus pais, o que significa que minhas dores de cabeça foram reduzidas em 85% e meu orgulho e autoconfiança aumentaram uns 100% agora que me sustento sozinha.

E eu acho que vale a pena, mesmo que eu tenha que trabalhar doze horas por dia em datas como essa e aguentar toda sorte de clientes infelizes possíveis e, Merlin que me ajude, os felizes também, e ainda me desdobrar com pratos e cardápios e limpeza de mesas.

Papai teria um infarto se pudesse me observar, e esse pensamento sempre me dá forças para continuar a manter minha prodigiosa carreira de garçonete. Me concentrei nisso o tempo inteiro, até poder tirar o avental, trocar de roupa e, finalmente, acompanhar Draco até a noite cortante que fazia do lado de fora.

Já fazia certo tempo desde que isso se tornara uma rotina, mas ainda era irônico observar Malfoy e eu em um bairro trouxa. Assim como ele, eu havia sido criada para sentir calafrios a cada vez que escutasse falar sobre pessoas não-bruxas, e por muito tempo na vida, eu realmente senti. Mas daí meu pai decidiu que não cometeria o mesmo erro duas vezes e me mandou para Beauxbatons ao invés de Hogwarts como minha irmã mais velha e isso basicamente me fez surtar e fazer tudo que ele considerava errado só de pirraça. Então agora essa sou eu. Draco não é tão adepto a tudo como eu me considero, mas, embora ele nunca vá dizer em voz alta, gosta do anonimato. Gosta de poder andar numa boa nas ruas, mesmo que elas estejam infestadas de gente que ele considera burra.

E há muita gente na rua hoje. Passando apressadas, gargalhando, carregando compras, esbarrando umas nas outras como formigas tontas, entorpecidas de um espírito de felicidade estranho. Luzes bonitas explodem em cores por todos os lugares possíveis e um Papai Noel robótico errante que parece programado pra cantar e dançar (mas não faz nenhuma dessas duas coisas direito) me assusta por um instante.

Olho para o Draco e ele parece mais quieto que o natural.

– Assustado? – Eu pergunto, por implicância.

Ele não ri, nem me manda para o inferno. Estranhando, resolvo franzir o cenho e observá-lo melhor. Tenta acender o isqueiro com uma mão tremula e empunhar um cigarro com a outra, que não está num estado melhor. Traga profundamente.

– Você parece prestes a confessar um assassinato. – Eu analisei e ele permaneceu em silencio, o que me fez continuar. - Caso seja isso, tudo bem, ficarei do seu lado.

– Não é isso. – Ele diz, o cigarro entre os dentes. Por um instante, esqueço que o assunto pode ser sério e apenas constato o quanto ele parece charmoso destruindo os próprios pulmões.

– Ok. – Foi minha resposta limitada. De repente me senti muito cansada. O trabalho drena minhas energias e Draco drena meu psicológico.

– É só... Odeio o natal.

– Hm.

– Odeio pessoas felizes.

– Certo.

– Odeio essa merda toda.

Eu assenti novamente com a cabeça.

– E às vezes odeio você também.

– Eu?! – Arregalei os olhos, sem conseguir me conter. – O que eu tenho a ver com tudo isso?

– Tudo. Você é... – Ele fez uma careta, como se o que fosse dizer causasse sofrimento físico – Você é praticamente uma manhã de Natal.

Eu soltei uma gargalhada sarcástica.

Ele me encarou, sem expressão.

– Não. Estou falando sério. Se o Natal fosse uma pessoa ele seria você. Você força as pessoas a serem felizes, porque é tão insuportavelmente bonita com esses peitos e esses olhos e o seu humor. E você me força a ter esperanças estúpidas e a dizer essas coisas sem sentido.

– Eu estou em duvida se devo me desculpar, agradecer ou te xingar.

Ele olhou para baixo e pareceu ruborizar por um instante. Eu mexi com a neve com a ponta dos sapatos. Aquela era uma conversa estranha. Geralmente eu sabia o que Draco queria dizer, mas agora tudo estava turvo numa nuvem de constrangimento.

Ele pisou na guimba de cigarro e puxou a manga do meu casaco.

– Obrigado por não sair correndo.

– Bom, não pensei nisso quando criei minha lista de opções.

– Obrigado.

Eu suspirei e já ia pedir uma explicação decente sobre tudo aquilo quando ele abriu a boca novamente:

– É possível que talvez eu esteja apaixonado por você.

– Uau. Isso parece terrível. – Murmurei.

– Eu sei.

– O que vamos fazer a respeito?

Draco encolheu os ombros.

– Eu pensei em te chamar pra morar comigo.

– Na casa dos seus pais? – Guinchei, sem querer.

– Não. No lugar que eu comprei para morar com você.

Senti um misto de comoção e de raiva que me fez querer chorar e odia-lo. E sair correndo, agora que ele tinha dado a ideia. Infelizmente eu gostava demais da cara dele, então permaneci estacada, sentindo o estomago revirar de um jeito péssimo, enquanto eu fazia força para encarar um ponto fixo qualquer.

– Astoria?

Eu continuei olhando o ponto fixo, mas meus olhos ficaram perigosamente vermelhos. Draco se colocou na minha frente, me encarando. Eu me concentrei em seu pomo de Adão e em como seria fácil apertar as mãos naquele pescoço até matá-lo, até fazer com que ele parasse de fazer aquilo comigo, embora, tecnicamente, ele não estivesse fazendo nada.

– Não. – Eu disse por fim – Não, obrigada.

Draco não escutava muitos “não” na vida, acho que foi por isso que ele levantou meu queixo com cuidado, para eu olhar para ele e ele ter certeza de que eu estava falando sério.

– Não. – Repeti. – Não posso ir morar com você enquanto você decide se gosta de mim ou não. Posso te ajudar a relembrar todas as razões pelas quais você não deveria gostar, podemos começar a sair com outras pessoas, podemos estrangular sua duvida tal qual um garotinho psicótico faria com um passarinho, mas isso é tudo.

– Por quê? – Ele quis saber, mas não do jeito exigente de costume, foi mais como um tipo inédito de desespero.

Por quê? Eu perguntei para mim mesma.

A resposta me atingiu como um murro. O que é ridículo. Mas me fez começar a chorar.

Draco me olhou genuinamente espantado.

– Oh, Merlin. – Eu sussurrei, mortificada, cheia de vergonha de mim mesma. – Oh, porra. Caralho. Que horror. Desculpe. Eu preciso ir embora.

Mas ele agarrou meu braço e me prendeu em um abraço estranho.

Eu me dei conta de que parecia estranho porque nós nunca tínhamos feito isso.

Nos abraçado.

Parecia mais intimo do que qualquer coisa sexual que já tínhamos feito até então, o que me fez chorar ainda mais e acabar contando que eu sentia muito, que morar com ele era uma proposta muito legal na verdade, mas que eu não podia lidar com o fato de que ele talvez estivesse apaixonado por mim porque se ele descobrisse que não estava ele partiria meu coração e eu acabaria morando com cinquenta gatos antes dos quarenta anos. Então eu eventualmente morreria e eles comeriam meus órgãos.

– Ninguém vai comer seus órgãos. – Ele disse e me apertou mais forte, fazendo parecer uma promessa.

Eu concordei com a cabeça porque a despeito de tudo ele parecia tão convidativo, quentinho e cheirando a roupa, shampoo e perfume caros, e eu só queria abraçá-lo para sempre e deitar a cabeça em seu pescoço e talvez chorar mais um pouco, só para me sentir sonolenta depois e pegar no sono ali mesmo.

Não sei por quanto tempo ficamos assim. Tempo o suficiente para eu entender que ele tinha certeza e pra ele saber o mesmo ao meu respeito. Havia um oceano de palavras que poderíamos dizer, mas nós éramos melhores no silencio.

Draco encostou a testa e o nariz nos meus e eu pensei, não pela primeira vez, em quantos cantos escuros nós tínhamos. E quando ele me beijou, pensei em como era um milagre que conseguíssemos iluminar um ao outro ainda assim.

– Vamos para casa. – Eu disse e ele sorriu.

De mãos dadas, nós analisamos a situação. Precisaríamos andar pelo menos umas cinco ruas para encontrar um bom lugar para aparatar.

Então nos misturamos entre as pessoas passando apressadas, gargalhando, carregando compras, esbarrando umas nas outras como formigas tontas, entorpecidas de um espírito de felicidade estranho que, assustadoramente, nós compartilhávamos.


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