Capítulo Quinze: “Você se lembra?”

Assim que Hinata acordou, com sua respiração acelerada, ofegante, acendeu o abajur ao lado da cama e ficou encarando a parede de frente pra si. Não havia nada ali, a não um tapete que ficava no chão. Conforme fitava a parede vazia seus pensamentos voltavam-se para seus sonhos, tentando achar um motivo para ter sonhado aquilo.

Lembrou-se que o primeiro sonho era repetido, ela sonhara com aquilo logo depois do encontro com Naruto e aquela percepção a assustou. Se fora tão cedo assim, ainda não tinha achado o diário de Shakko, ainda não tinha ouvido falar de Tenko. Então onde estava a lógica para seu sonho?

Jogou as pernas para fora da cama, seus pés tocando o chão, mas permanecendo sentada ali. Inclinou-se, apoiando os cotovelos nas coxas e passou as mãos pelo rosto, como se isso fosse lhe ajudar a pensar com clareza, ou compreender por que tivera aqueles sonhos. Seria por que se impressionara?

Shakko vira Kyuubi em forma humana e com uma humana. E ela sonhara com isso e Kyuubi era Naruto. Mas se fosse isso, por que ele não lhe dissera logo então? Não, não fazia sentido, decidiu. Estivera com Kyuubi naquele dia e nem ele e nem Naruto haviam lhe dito nada sobre isso. Seus sonhos eram apenas isso, decidiu. Não poderia ser mais nada.

Justificava seus sonhos estranhos com o desejo de juntar aquilo pelo que era fascinada por quem estava se vendo apaixonada. Seria perfeito, não é mesmo? Riu de si, revirando os olhos para seu pensamento ridículo de que aquilo poderia ser verdade.

Decidida a acalmar seus pensamentos e seu batimento cardíaco, se levantou da cama e foi para o banheiro de seu quarto. Seus sonhos tinham sido tão intensos que suara e agora precisava tomar um banho, mesmo sendo de madrugada.

Ao entrar debaixo do chuveiro, deixou que os sonhos se repetissem em sua mente, um por um. Os olhos fechados e até mesmo um sorriso meio irônico, que era destinado a si, por pensar que aquilo poderia ser verdade. Mas então, enquanto se ensaboava lembrou de algo. Primeiro, fora uma sensação, ao ouvir o nome Naruto. Ok, relacionada a lenda das Kitsunes.

Em seu sonho, sua eu tinha dito que tinha achado aquele livro na biblioteca de casa. Ela também.

Então a sensação que tivera ao ler o nome Kyuubi, como se já o conhecesse. Seguido da mesma sensação ao ver a Kitsune naquele dia.

No sonho ela conhecia Kyuubi tão bem que era sua…

Hinata estava ofegante novamente, os pensamentos corriam tão rápidos em sua mente, ligando uma coisa a outra que sentia até mesmo uma pontada na cabeça, como se ir tão rápido pudesse fazer tudo explodir. Mas não podia evitar, precisava terminar. Sabia que precisava.

– Infelizmente ela faleceu … Ele a matou.

A voz de Kyuubi dizendo aquilo para ela ecoou em sua mente, ao mesmo tempo que o sabonete caía de sua mão. No segundo seguinte, o que veio não foi uma parte de seu sonho. Em sua mente viu uma grande raposa negra como a noite, com nove caudas dançando às suas costas, um sorriso maligno nos lábios repuxados sobre dentes afiados e olhos vermelhos como sangue.

Viu uma daquelas caudas perfurar sua barriga, e levou as mãos ali como reflexo. Seu corpo foi para frente e ela viu, através das lágrimas, a figura de Naruto correndo em sua direção.

Não tinha notado que tinha fechado os olhos, mas quando os abriu percebeu que estava ainda em seu banheiro, com as mãos sobre o ponto onde deveria ter um buraco devido a perfuração daquela cauda, mas não havia nada.

Ela conhecera Tenko. Não apenas ele, ela conhecera Naruto. Kyuubi.

Com a percepção disso, veio a maior de todas. Seus sonhos eram lembranças. Lembranças de uma vida que até aquele momento ela não lembrava, mas que agora voltava em enxurradas de pensamentos que a levaram ao chão…

…

Por mais que quisesse estar perto dela, Naruto resolveu que ir para casa seria a coisa mais certa a se fazer. Daria a escolha a ela de procurá-lo ou não. Sabia que aquilo seria extremamente confuso para a Hyuuga. Sonhar com coisas que até poucos dias lhe eram lendas. Saber que vivera nessa lenda. Ele se perguntava o que ela pensaria, já que não se lembrava de nada disso.

Escolhera não mostrar a morte para ela. Aquilo era algo que evitava reviver em sua mente. Ver o corpo sem vida e coberto de sangue fora motivo de muitos pesadelos e até mesmo a destruição de grande parte da floresta quando os pesadelos começaram. Ele não queria reviver aquilo nunca mais, se possível.

Ao chegar em casa tomou um banho rápido, evitando pensar nos detalhes e no que poderia ter feito ao invés do que realmente fizera. Aquilo não seria bom. Já tinha feito.

Colocou uma calça de moleton preta por cima da cueca e se jogou na cama, olhando o teto. A cama era a única coisa que não fora trocada através dos anos que se passaram. Naruto a manteve conservada e sempre consigo. Aquela era a cama que ele dividira com Hinata tantas e tantas vezes, onde ela dormia com um belo sorriso no rosto e ele observava até cair no sono. Nunca poderia se desfazer dela.

Virou para o lado, sentando-se em seguida. E se ela se afastasse depois daquilo? Ele teria de ir atrás dela e esclarecer tudo, é claro. Não, Hinata não iria se afastar sem descobrir o que aquilo significaria e sem falar com ele. Tinha certeza disso. Então por que estava tão nervoso?

Queria que ela viesse correndo para ele. Logo. Mas a cada instantes as horas se passavam e nada da sua amada aparecer. Talvez devesse ter ficado lá. Pegou o celular e olhou. Nenhuma ligação. Jogou o aparelho em cima da cama novamente e se jogou par trás, passando as mãos pelo rosto.

Não sabia o que fazer e ao mesmo tempo sabia que a única coisa que realmente poderia fazer era esperar. Esperar que ela criasse teorias e explicações e depois viesse com todas elas para ele, talvez ainda mais confusa.

Ao pegar o celular novamente apenas adicionou Sasuke e Sakura na listagem e escreveu um única mensagem: “Contei a ela.”

Eles estariam dormindo… ou não. Mas tinha certeza que não veriam a mensagem tão cedo. Por isso mesmo jogou o aparelho entre os lençóis e fechou os olhos. Revivia suas lembranças. As mesmas que fizera Hinata reviver.

Passados vários minutos, horas talvez, Naruto perdera noção de tempo, ouviu uma batida à porta. Levantou-se. Talvez fosse ela. Correu para atender antes que algum empregado resolvesse o fazer. Estava extremamente ansioso.

Lá estava Hinata. O longo cabelo escuro e liso caído solto, um vestido verde escuro com mangas e sapatilhas e seu rosto… pálido. Quando os olhos perolados encontraram os azuis, havia muito mais ali do que lágrimas. Naruto notou algo que fez seu coração perder o compasso.

Hinata mal encarou os olhos de Naruto e, no segundo seguinte, o abraçou, passando os braços ao redor de seu pescoço, o corpo sendo praticamente jogado contra o dele e fortes soluços lhe saindo sem controle. Naruto a abraçou de volta, passando os braços ao redor de sua cintura, a puxando para junto de si e para dentro da casa.

– Eu não acredito… eu não acredito! Kyuubi… Naruto-kun… - ela soluçava, ao mesmo tempo que ria.

– Hinata… - ele passou as mãos pelos longos cabelos, com a voz mais baixa que um sussurro. Não conseguia acreditar naquilo que parecia. - Você… Você se lembra? Realmente lembra?

– Si-sim… - ela se afastou apenas alguns centímetros, olhando para ele. Algumas lágrimas encorriam por seu rosto, deixando-a vermelha pelo quanto já chorara. Naruto passou as mãos por ali, secando-lhe o rosto. - Como não lembrei antes? Isso é tão estranho.

– Shh… - ele pediu, a puxando para o sofá, mas sempre a mantendo perto de si.

– Não… Eu.. Escute Kyuubi… - ela percebeu que ele fez uma careta e sorriu. - Naruto. Você adotou mesmo esse nome não é?

– Sim. Ele foi quase uma escolha sua. Eu gosto. Gosto de ver você me chamando pelo meu nome de nascimento, mas eu prefiro Naruto.

– Tudo bem. Naruto… Eu tinha a sensações. Todas as sensações, sabe? Eu conhecia o seu nome, porque eu tinha lhe apresentado esse nome. Eu conheci o seu nome de nascimento, também por isso. Lembrei de nossa vez junto na floresta, porque eu vivi isso. Eu… eu queria saber tanto sobre as Kitsunes porque eu era apaixonada por uma. - ela riu, e ao mesmo tempo as lágrimas escorreram por seu rosto. - Quando lhe vi, como raposa na floresta, eu sabia quem era. Eu tinha certeza que era Kyuubi e foi por isso que apareci e eu sabia disso porque era você! Eu não entendo por que não me permiti lembrar antes. Até quando lhe vi em frente a biblioteca quando voltei. O que senti…

– O que sentiu?

– Completa. - sussurrou, mirando aqueles lindos olhos azuis. - Oh, Ky… Naruto-kun. - se corrigiu rapidamente. - Eu tinha voltado e era como se estivesse procurando algo. Eu estava. Estava fazendo de tudo para saber tudo sobre as Kitsunes. E então eu te vi. Mesmo o desejo ficando, eu senti que não precisava procurar tanto… Eu soube que tinha encontrado algo.

– Mas ainda queria repostas.

– Sim.

– Você realmente se lembra? - ele ainda não conseguia acreditar. Era bom demais. Parecia que ele quem estava sonhando agora.

– No início, quando acordei, era como se eu quisesse lembrar e ao mesmo tempo quisesse esconder tudo de mim. Ficava tentando achar respostas e tentando me convencer de que não era nada demais, apenas sonho. Mas então lembrei de Tenko.

Ambos estremeceram. Naruto pegou as mãos da Hyuuga, apertando com carinho. Quando ela olhou nos olhos dele, havia muito pesar ali.

– Lembrei da minha… - antes que pudesse terminar sentiu o dedo indicador de Naruto apoiado em seus lábios, pedindo que ela não falasse aquilo. Não o fez. - Depois disso eu lembrei de tudo. Da primeira vez que nos vimos, do nosso primeiro encontro, de cada um depois… tudo.

– Você se lembra. - agora ele dissera aquilo aliviado. Ao que Hinata acenou, afirmando, ele sorriu. Era um grande sorriso, um que simplesmente tirou o fôlego da jovem e fez com que ela também sorrisse.

Naruto a puxou para junto de si, fazendo com que acabasse meio deitada sobre ele. Os lábios do loiro encaixaram-se com perfeição e um certo desespero ao dela. Saudoso por um beijo que ele queria dar-lhe desde o momento que a vira. A mão esquerda se perdeu em seu cabelo, mexendo ali. Enquanto a mão direita permanecia apertando a cintura dela.

Hinata primeiro se surpreendeu, mas não mais do que um segundo. Logo seus lábios se moviam junto ao dele, as mãos no rosto de Naruto, os polegares acariciando-o ali. Assim ficaram por vários minutos, as mãos em carinho enquanto os lábios matavam a saudade.

– Bem vinda de volta pra mim… - ele sussurrou para ela, as testas coladas e um sorriso nos lábios.

– Estou tão feliz… - ela sussurrou, o rosto corando por isso. - Eu te amo…

– Eu te amo, Hinata. - novamente ele a beijou, mas desta vez de uma forma mais calma.

Hinata foi quem se afastou desta vez, o olhando como quem perguntaria algo. Ela não mudara e ele ficou feliz por perceber isso.

– Como pude voltar?

– Achei que você pudesse me explicar isso melhor.

– Como assim?

– Bem. Para que alguém possa voltar, como você voltou, é preciso que um sacrifício seja feito. - ele viu o olhar surpreso de Hinata. - Eu não matei ninguém! - apressou-se a explicar. - Não funciona assim. Para que você pudesse voltar alguém teria de dar a vida no lugar da sua. Fazer isso com esta intenção, entende?

Hinata acenou, afirmando. Lágrimas escorriam por seu rosto novamente. Naruto não entendeu.

– Você quer que eu diga como foi possível não é?

– Bem… sim. Sabe, isso é comum para as Kitsunes. Os humanos não têm isso. Seu pai disse alguma coisa, mas até hoje não entendi aquilo e sua mãe…

– Minha mãe foi quem se sacrificou por mim. - ela disse. Mais lágrimas escorriam. Naruto estava se desesperando. - Ainda não entendeu por que eu tenho o diário de Shakko e como sabia de sua mancha? - agora quem estava surpreso era o loiro. - Sim. Shakko era minha mãe, Naruto.