O Peregrino escrita por Deusa Nariko


Capítulo 2
Capítulo II


Notas iniciais do capítulo

Segundo capítulo.
Boa leitura!



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O Peregrino

Capítulo II

Yu no Kuni (País das Fontes Termais), dias atuais.

Eu tenho tentado ser mais receptivo às pessoas ao meu redor nos últimos anos. Tenho tentado me abrir com elas, permitir que se aproximem — mesmo que um pouco. Acredito que se estabelecer vínculos com elas, se permitir que os seus sentimentos, esperanças e crenças cheguem até mim, alcancem-me, eu serei capaz de compreender um pouco mais do mundo e de mim mesmo.

Confesso que no início foi difícil me desapegar de minha natureza auto preservativa. A arrogância e a aversão estavam tão profundamente enraizadas em mim que tive de lutar contra os próprios preceitos arraigados para enfim descerrar as trancas que protegeram o meu coração por tantos anos.

O que vi, ouvi e aprendi depois disso consolidou as palavras que um dia Naruto cravou na minha existência, em nossa última batalha no Vale do Fim. É possível que a empatia seja um sentimento inerente à natureza humana? É possível que, agindo conjuntamente, a humanidade possa construir um novo mundo, como Naruto alega desejar fazer?

Tenho me questionado o verdadeiro propósito dos Shinobis; qual seria o nosso real designío? Madara uma vez acreditou que o chakra que usamos em combate se tratava de uma maldição, a consequência destinada a condenar a humanidade a um ciclo de caos e destruição. Teria Ootsutsuki Kaguya selado o fado dos humanos quando ingeriu o fruto da árvore?

De fato, seus descendentes e os descendentes do Sábio dos Seis Caminhos, Ootsutsuki Hagoromo, não fizeram nada mais do que travar guerras e mais guerras em todos esses milênios. Eu mesmo, assim como os meus predecessores, acabei preso a uma batalha que vinha sendo travada há tanto tempo.

Indra e Ashura, os irmãos destinados a lutarem um contra o outro, encarnação após encarnação, hoje convenientemente encarnados em mim e em Naruto.

É estranho pensar que fui o primeiro a romper isso, esconjurando os sentimentos de Indra dos meus, reconhecendo Naruto, tanto pela sua força como pelo seu coração. É provável que essa imprecação termine nessa geração, encerrando o conflito familiar.

Já faz três anos que lutamos pela última vez e as recordações ainda permanecem vívidas em mim, tal como as cicatrizes que carrego no meu corpo.

Lutei tanto contra mim mesmo e contra os meus sentimentos, acreditei que se concentrasse todo o ódio do mundo em mim, eu traria a paz definitiva. Só não percebi, sozinho, que estava a ponto de cometer o mesmo erro que o meu irmão cometeu.

Se perdoei Itachi? É difícil responder essa questão, mas eu o amo de uma forma irrevogável, provavelmente o amarei o suficiente por cem vidas. Isso me basta.

Levei um tempo para perceber que todo o meu ódio era apenas a minha dor, a minha mágoa camuflada. O limiar entre sentimentos tão discrepantes uma vez me levou aos portões da insanidade, afinal.

Ainda tento apagar lembranças de dias tão obscuros, não apenas porque me doem, flagelam-me, mas porque preciso seguir em frente, de alguma forma. As amarras do meu passado não parecem querer afrouxar tão cedo, por outro lado.

É por isso que decidi viajar pelo mundo, para conhecê-lo e conhecer-me consequentemente.

O sol ainda não nasceu no leste quando soterro com neve o que restou de minha fogueira; há algumas ameixeiras silvestres pendendo de um ramo cristalizado, próximo à caverna na qual me abriguei noite passada. Eu as recolho e as guardo para mais tarde, por enquanto quero apenas aquecer os músculos de minhas pernas com uma corrida.

Quando os meus pés tocam os ramos mais altos, das árvores mais altas que chegam a se entrelaçar umas às outras, tecendo uma espécie de teia ramificada, o ar gelado da matina atravessa minhas roupas e empurra para trás o meu capuz da cabeça.

A floresta desperta paulatina do seu estado transitório de torpor conforme a luz da alvorada é filtrada pelas ramagens. Ouço o canto das cotovias e o zumbido do vento em meu ouvido enquanto me movo. As árvores não passam de borrões estroboscópios.

Percorro um quilômetro e meio sem reduzir o ritmo quando avisto com minha visão periférica uma lebre da neve mordiscando um arbusto. Eu a abato com uma kunai e desço das ramagens para o solo para reclamar minha presa. Há um descampado por perto e decido que ali é um bom lugar para acender minha fogueira.

Confesso que reaprender os sinais de meu Katon: Goukakyuu no Jutsu com apenas uma mão à disposição foi mais difícil do que previ no início. Ainda me lembro do dia em que enfrentei Haku no País das Ondas e em como ele me inspirou para que buscasse a minha independência como Shinobi.

Eu certamente estaria em desvantagem com um membro a menos, se não tivesse forçado o meu corpo, o meu estilo de luta, o meu arsenal de jutsus a se adaptarem à minha nova condição.

Penso no meu pai e no que ele diria se me visse realizando selos com apenas uma mão enquanto retiro a pele e as vísceras da lebre, limpando-a devidamente e depois espetando a carne em alguns galhos rentes à fogueira para cozinharem bem. Enquanto aguardo, aquieto meu estômago com as ameixas que recolhi mais cedo.

Quando termino meu desjejum, apago a fogueira e decido seguir o meu caminho. Há pelo menos mais dois quilômetros e meio até a próxima cidade turística do País das Fontes Termais, Akane, à sombra do monte Ontake.

Depois de alcançá-la, eu já fiz planos de seguir para o País da Neve e, em seguida, para o País do Trovão. Já faz algum tempo desde que estive lá, embora tenha ocultado minha presença, pois sei dos ressentimentos que os ninjas de Kumogakure alimentam por mim em secreto. Não que eu possa culpá-los, afinal, por um tempo, usei a Akatsuki para os meus objetivos e me permiti ser usado por Obito.

Quase três horas e meia depois, cruzo a entrada da cidade, encapuzado, disposto a não chamar atenção para mim, muito menos revelar minha identidade.

Akane é um centro turístico conhecido pelos hotéis e pelas fontes termais abundantes, também pelas belíssimas paisagens, agora fustigadas por meses de um inverno rigoroso. A cidade, em si, cresceu à base da montanha e se expandiu para o restante do vale ao longo do tempo. Pela sua localização estratégica, Shinobis de todas as nações a atravessam de ano em ano.

A cidade não costuma estar tão cheia nessa época do ano, mas parece que nesse inverno a situação se inverteu. Andando pelas ruas, reconheço Shinobis afiliados a diferentes vilas, alguns até mesmo das Nações Aliadas. Na verdade, estou surpreso pelo fluxo de transeuntes que circulam por entre as casas de banho e as chashitsu.

Escolhi uma delas aleatoriamente chamada “Yukiyanagi” porque queria colher algumas informações e sei que em lugares assim, Shinobis se reúnem para confraternizar. Quando entrei, me escondi em um canto discreto e ordenei à atendente um chá simples de gengibre e uma porção de arroz.

— Gostaria de mais alguma coisa? — A mulher me perguntou, mas eu neguei, dispensando-a com um aceno de cabeça.

Alguns minutos depois, ela retornou com o que eu havia pedido e demorou-se exageradamente para me servir.

— Esta cidade não vê tantos Shinobis em um inverno rigoroso como esse há muitos anos. Me pergunto o que causou toda essa comoção — ela comentou com casualidade enquanto derramava o chá em meu copo com uma lentidão enervante.

Mantive os olhos baixos, evitando contato visual a qualquer custo. Não queria ser reconhecido tão cedo, especialmente se eu levasse em consideração a quantidade de ninjas — e alguns civis — naquele estabelecimento. Quando viu que não obteria uma resposta mais simpática de mim, ela sorriu brevemente e se retirou.

Comi minha refeição e bebi o chá sem pressa, devaneando acerca dos sussurros cuidadosos que ouvia aqui e acolá. Estava terminando de comer quando captei uma alteração nos timbres dos diálogos sibilados, o zumbido ansioso se tornou um silêncio pesado. A calmaria rapidamente foi substituída por uma sensação de inquietação, uma tensão progressiva e palpável.

Olhei à frente e notei que um Shinobi de Taki sentado ao balcão havia exagerado no sakê e agora discutia vigorosamente, com sua fala arrastada e embolada, com outro Shinobi — que eu instantaneamente reconheci pelo hitaiate se tratar de um ninja de Konoha.

Alguns curiosos já se encontravam a postos, para separar uma briga eventual. Até mesmo a atendente de antes parecia levemente retesada em derivação da tensão.

— Repita o que disse agora pouco, seu merdinha! — bradou o ninja de Konoha, que eu não reconhecera o rosto, ao se levantar com brusquidão, derrubando uma banqueta no processo que caiu com um estalido agudo no assoalho.

O outro, intoxicado em seu estado ébrio, levou a garrafa de sakê à boca e a entornou de uma vez sem cerimônias, um filete de bebida escorreu pelo canto do seu lábio.

— Eu disse que Takigakure está na merda por conta do desgraçado do seu Hokage, seu saco de bosta.

O Shinobi de Konoha recuou violentamente, como se acabasse de ter recebido um soco. De onde estava sentado, notei o suor que escorria pela sua face morena. Ele se recuperou rápido e avançou contra o outro homem como uma fera enjaulada.

— Quem você pensa que é para insultar o Hokage?!

O ninja de Taki se levantou cambaleante, enxugando a boca com as costas da mão e, enquanto suas pernas trançavam, assumiu uma postura defensiva, os punhos oclusos à frente do corpo que bambaleava.

— Vou te fazer engolir essas palavras junto com os seus dentes, maldito! — urrava o outro com indignação.

— E por acaso eu falei alguma mentira? — continuou, indiferente à ira que despertava. — O Rokudaime não passa de um desgraçado e um covarde. Um ano atrás o que ele fez para proteger a sua adorada vila dos meteoritos da lua? Aceite que sem o poder amaldiçoado daqueles bastardos dos Uchihas, o seu Hokage é um merdinha fracote que se meteu onde não devia.

Observei os olhos estalados do Shinobi de Konoha, o brilho do suor na sua pele, seu rosto descorado, mas me ative verdadeiramente às palavras do outro: no que Kakashi havia se metido em Taki?

— Seu miserável, Konoha respondeu a um pedido de ajuda e é assim que vocês nos agradecem?!

— Taki não precisa dos bastardos da Folha se metendo nos nossos assuntos — balbuciou em resposta, cada palavra tão afiada quanto uma lâmina. — Mas que bom que a temporada de caça a Shinobis da Folha parece estar aberta em Taki.

— Seu...! — silvou o outro secamente antes de investir contra o homem com a fúria enlouquecida de um bicho ferido.

De dentes cerrados e punhos selados, ele avançou sem trepidações; tão firme quanto uma bigorna. Seu punho direito foi o primeiro a colidir contra a face do Shinobi, o som do golpe reverberou no estabelecimento antes que o corpo do oponente registrasse a força do soco e cambaleasse violentamente para trás.

Ele caiu por cima de outras banquetas, derrubando-as e tombando por cima da pilha. Algumas pessoas se afastaram, receosas, outras se aproximaram, atraídas pelo calor da discussão que agora ganhava nova repercussão.

Não levou mais do que meio segundo para o Shinobi de Taki — ainda que embriagado e com seus reflexos desacelerados pelo álcool —, se levantasse da pilha de entulho e revidasse o golpe, tentando acertar o outro. No entanto, parece que seu senso de equilíbrio estava afetado demais também, de forma que ele não demorou a voar por cima de algumas mesas; sangue brotava de um corte no seu supercílio esquerdo.

O Shinobi de Konoha se aproximou a passadas largas, agarrou o colarinho do homem e o empurrou de encontro à mesa, mantendo-o imobilizado.

— Vocês, ratos de Takigakure, deviam aprender um pouco mais sobre a gratidão.

Em seguida, ele ergueu o homem de cima da mesa. Levantei-me porque agora, com eles tão próximos, temi que o Shinobi de Konoha pudesse me reconhecer. A atendente, finalmente, achou que seria um momento conveniente para interferir na briga:

— Já basta de confusão! Os dois... Fora do meu estabelecimento! — bramiu a plenos pulmões com as mãos pousadas nos quadris.

Os dois homens se encararam em silêncio, numa disputa silenciosa e irracional, regada pelo fervor imprudente da ira humana. O Shinobi de Taki sorriu com ironia antes de cuspir na face do outro homem que em represália atirou-o contra mais algumas mesas.

Por infortúnio do destino, dei um passo em falso no exato instante em que seu corpo aplainou em direção aos fundos da casa de chá, por pouco não batendo em meu próprio corpo e me derrubando, mas em consequência, senti um puxão forte e persistente em minha nuca pouco antes que um novo estalido soçobrasse em meio ao espavento, seguido de centenas de minúsculos tinidos, como gotas de chuva.

Olhei, com certo desconsolo, para a explosão de contas rubras conforme elas se expandiam numa profusão descontrolada. Foi como um baque, uma pancada em meu âmago, não pelo valor monetário, mas pelo significado que me levou a usá-lo.

O colar de contas vermelhas que há pouco estivera em torno do meu pescoço, descansando próximo ao meu coração, agora jazia no assoalho da casa de chá, arrebentado, destruído.

Fronteira de Kusa no Kumi (País da Grama), dois anos antes.

Por favor, eu insisto que aceite! — persistiu o homem enquanto me seguia por uma estrada erma, margeada por grandes arrozeiras que já se encontravam prontas para a colheita.

Detive-me, olhando o homenzinho insistente por cima do ombro. Ele sorriu, simpático, as gengivas rosadas à mostra, sem receios, os dentes já inexistentes devido à idade avançada.

— Por favor, você acabou de salvar a minha vida! É justo que eu o recompense de alguma forma.

— Não é necessário — eu assegurei, mais uma vez, mas ele já abria sua sacola em busca de algo para me oferecer.

— Ora, vamos, não seja tímido! Você me foi muito conveniente lá atrás com aqueles bandidos imundos e eu, honestamente, me sentiria mal se não o recompensasse de algum jeito.

Eu me virei para ele, afadigado de tentar contra argumentar. Aquele homenzinho era apenas um comerciante simplório que ganhava a vida nas estradas e galgando de cidade em cidade.

Ele fuxicou no conteúdo de sua sacola até parecer ter encontrado o que procurava:

— Aqui, você com certeza faria bom uso disso! — ele me estendeu uma espécie de estojo de ferramentas de caça.

Eu, calmamente, mostrei a ele minha kusanagi, atrelada ao cinto em minha cintura. Ele coçou a cabeça calva, desconcertado. Tornou a remexer em sua sacola obstinadamente e de lá, dessa vez, puxou um conjunto de colares de todos os tipos e tamanhos, com contas das mais variadas cores.

— Não sou muito do tipo que usa adereços — observei com consternação e o homenzinho sorriu.

— Colares não são apenas enfeites, sabe? Eles carregam histórias, sentimentos, destinos... Não são como quaisquer outras joias estúpidas, acredite em mim. Agora ande, pois estou com pressa!

Estendi a mão até os colares, tocando-os com receio, hesitação.

— Nah, tudo bem, eu te ajudo a escolher! Do que você gosta?

Sorri para mim mesmo, não havia muito que eu apreciasse, prestasse a atenção devida. Olhei para os colares e apenas três me chamaram a atenção. O homenzinho sorriu e separou-os para mim, um por um.

— O amarelo é vibrante e irrequieto, é caloroso como o sol e renova as nossas esperanças, não é? Já o verde tem um quê reconfortante, é sábio e ameno.

Por último, ele separou um colar cujas contas diferenciavam-se dos outros dois.

— Mas apenas o vermelho é intenso e fervoroso, de uma devoção indubitável e perene; ele aquece o coração, não?

Meneando a cabeça mais para mim mesmo do que para as palavras daquele ancião, eu apanhei os colares de uma vez e os coloquei em torno do meu pescoço. O peso das contas era reconfortante, ele estava certo, afinal.

Uma vez mais, aquele estranho sorriu para mim, condescendente:

— Agora você pode levá-los consigo aonde quer que vá, Sasuke.

Sim, eu posso.


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Notas finais do capítulo

Sim, os colares que o Sasuke usa no The Last representam o Time 7. Sasuke nunca foi de usar cores claras, quanto mais 3 cores chamativas juntas, o único motivo para ele fazê-lo seria o seu amor pelo Time 7 mesmo *-* HAHAHAHA
...
E o mistério continua! No próximo, as más novas chegam... :c Como será que o Sasuke reage a isso?
...
Obrigada mesmo pelos reviews lindos! Eu amei cada um deles, não imaginei que O Peregrino fosse ser tão bem recebida :3 E eu responderei cada um deles, não se preocupem! ;D
Qualquer errinho de digitação, me perdoem, digitei esse capítulo quase todo hoje Hehe
...
Até o próximo!



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