O Peregrino escrita por Deusa Nariko


Capítulo 19
Capítulo XIX


Notas iniciais do capítulo

Décimo nono capítulo. Leiam as notas finais!
Boa leitura!



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O Peregrino

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Capítulo XIX

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Taki no Kuni (País da Cachoeira), dias atuais.

Depois da fuga de Ichiro e seus cúmplices, tudo o que me restou foi retornar ao princípio da minha investigação, a vergonhosa estaca zero.

Nuvens cinzentas ainda diluíam no céu clareado, mas o desfiladeiro rochoso que orlava o rio Kitakamu, caudaloso no período das monções, jamais seria o mesmo. Nossa batalha havia modificado o cenário permanentemente.

No lugar onde antes se erguiam imensos paredões de calcário, penedos centenários e um promontório com formato de flecha, agora havia apenas pedregulhos dos mais variados tamanhos amontoados sobre uma ribanceira instável — grande parte das rochas havia caído nas águas do rio.

A floresta de pinheiros e bordos evidenciava de um modo mais brutal os resultados da batalha: algumas estavam apenas um pouco chamuscadas, já outras haviam queimado até as raízes e se pareciam com veios negros emergentes na terra fustigada.

Sozinho, eu ruminava amargo as palavras de Ichiro, sua ignorância a respeito do paradeiro de Sakura. É verdade que a possibilidade de ela ter sido feita prisioneira por Shinobis de Taki era uma das linhas de investigação mais prováveis, mas ele me pareceu sincero ao afirmar que desconhecia onde Sakura estivera todo esse tempo.

Irritado por haver chegado, mais uma vez, a um beco sem saída no que diz respeito a localização de Sakura, não notei a aproximação de Karin até ouvi-la chamar meu nome:

— Sasuke, você está bem?

Olhei-a através da tênue bruma de vapor que subia da cachoeira abaixo de nós; ela embaçava as lentes dos óculos que Karin usava e estorvava a capacidade de qualquer um que tentasse lê-la por meio dos seus olhos escarlates.

Entretanto, eu a conhecia o suficiente para entender o sentido ambíguo em sua pergunta, mesmo que me negasse a admitir o sentimento de derrotismo que me abatia.

— Não estou ferido — murmurei e voltei a observar a correnteza forte lá embaixo, as palavras de Ichiro ainda ecoavam dentro da minha cabeça, atormentando-me.

Segundo ele, havia sido Sakura a atirar-se no rio na esperança de escapar dos membros da Higanbana Sangrenta. Havia sido a própria Sakura a provocar a ruptura do penhasco onde lutaram. Pensando nisso agora, rangi os dentes, é óbvio que ela evitaria ser capturada indo até o fim sem se importar com os perigos ou com as consequências dos seus atos. Tudo para proteger Konoha e a missão.

Essa é a Sakura a quem eu me habituei nos últimos anos e ela é tão irritante por se colocar em perigo dessa forma.

Ao que parecia, minha única pista continuava a depender da cooperação de Ajisai e eu, honestamente, preferiria encarar outra batalha como a que acabei de travar a ter que sondá-la por respostas. Precisava agir, contudo, e depressa. Cada minuto que eu desperdiçava significava que Sakura ainda corria perigo.

— Você está procurando por ela, não está, Sasuke? Essa é a sua missão.

Virei-me para Karin, que não havia se movido um centímetro. Ela ajeitou a armação dos óculos no rosto e encarou-me com obstinação. Não precisei explicar minhas motivações para ela e, por isso, eu era grato.

— Não precisa me fornecer detalhes desnecessários, apenas responda à minha pergunta. É a tal garota chamada Sakura, não é?

Anuí com um meneio da cabeça e Karin pareceu se satisfazer com minha resposta embatucada e relutante. Ela apoiou uma mão no quadril e perfurou-me com seus olhos inclementes.

— Escute-me, eu não pedirei por pormenores, até porque os assuntos de Konoha pouco me interessam, mas se Sakura estiver mesmo em Taki... Bem, você poderia ter me dito isso antes! — elevou o tom de voz para me recriminar e em seguida uniu as mãos para formar um selo.

Karin fechou os olhos calmamente e sua expressão franzida relaxou pouco a pouco. Reconheci a técnica que ela usava no mesmo instante, com um estalo da mente.

Kagura Shingan! — ela sussurrou através dos dentes cerrados e compenetrou-se em sua tarefa com ainda mais devoção, crispando o sobrecenho enquanto uma gota de suor deslizava por sua têmpora esquerda.

Depois de quase meio minuto em silêncio e imóvel (mal respirando), Karin exalou um suspiro frustrado e eu relaxei meu corpo tensionado. Quando se situou novamente, ela abaixou as mãos, derrotada, e olhou-me quase embaraçada.

— Não consegui senti-la com meu Olho da Mente de Kagura; minha técnica me permite sentir e detectar fluxos de chakra individuais em um raio de até dez quilômetros, o que significa que ou ela não se encontra nessas imediações ou não está consciente para que eu possa senti-la.

Havia uma terceira opção, pensei, mas essa alternativa era tão sombria que não me atrevi a suscitá-la; era doloroso demais para mim apenas cogitá-la. Karin só seria capaz de sentir Sakura, agora que seu Olho da Mente de Kagura estava aberto, se ela estivesse nas proximidades e consciente.

— Continue tentando encontrá-la — instiguei-a com insatisfação crescente. — Tomei uma decisão e tenho um trabalho para vocês três — indiquei com a cabeça para Suigetsu e Jūgo, que trocavam algumas frases esporádicas a alguns metros dali.

— Sasuke — Karin me deteve antes que eu pudesse deixar o local para informar minha decisão. — Aqueles caras... Eles não são o que eu chamaria de Shinobis ordinários. O modo como surgiram do nada, sem que eu pudesse senti-los e, depois, desapareceram da mesma forma, sem deixar vestígios... — ela pausou o bastante para suspirar e concluir seu raciocínio: — O que quero dizer é que eles são perigosos. Muito perigosos — enfatizou com um tom sombrio, franzindo os olhos para mim. — Tome cuidado, Sasuke.

— Tomarei — garanti e me afastei, seguindo na direção de Suigetsu e Jūgo.

Reunimo-nos, muito embora eu conseguisse entender claramente a razão da relutância de Suigetsu em me dirigir a palavra. Jūgo fitava-me com complacência, o que era tão incômodo quanto o silêncio raro do espadachim. Karin havia cruzado os braços e não havia dito uma só palavra desde então.

Suspirei ao perceber que a iniciativa deveria partir de mim. Por isso, encarei cada um deles com firmeza:

— Eu tomei uma decisão — informei-os convictamente. — E ela implica que nos separemos, pelo menos por enquanto.

— Temos que nos separar? Por quê? — Suigetsu questionou-me com exasperação.

— Pretendo enviá-los em uma missão especial. Com isso, vocês serão de grande ajuda não só para Konoha como também para as cinco grandes nações. Não fui totalmente honesto com vocês, admito.

Ao vê-los encarar-me como se eu tivesse lhes prestado um grande desserviço, recuei, defensivo.

— Minhas motivações para me envolver nessa missão para Konoha são muito pessoais, mas o que precisam saber, o que é essencial — enfatizei num tom cortante —, é que estou procurando alguém que é importante não só para mim, mas para toda a vila. Uma Kunoichi cujas habilidades são muito estimadas e valiosas.

Depois de uma pequena pausa, prossegui, alheio aos três pares de olhos que me dissecavam:

— Ficou claro para mim que em grupo chamaremos atenção desnecessária e isso é o que eu quero evitar a todo custo. Especialmente porque tenho certeza de que assim que se recuperarem da batalha, Ichiro e os outros retornarão para me caçar.

“Não quero que nenhum de vocês esteja por perto quando isso acontecer.

— Então o que devemos fazer, Sasuke? — Jūgo adiantou-se, mas foi cortado pelo gesto exaltado de Suigetsu.

— Opa, espera um pouco! Eu estou achando essa história muito mal contada — ele resmungou e recebeu uma cotovelada de Karin nas costelas; apesar do seu corpo ter se liquefeito no local em que ela o atingiu, ele simulou um ar ferido apenas para irritá-la.

— Cala a boca, tubarão, e deixa o Sasuke terminar!

— Você faz tudo pelo Sasuke, não é verdade?! — provocou-a, arrancando uma careta de Karin e um suspiro de Jūgo. — Deveria considerar pensar por si mesma alguma vez, é sério, e parar de lamber os pés dele só por um minuto. Você parece uma cadela abanando a cauda para o Sasuke!

— Ora, seu...! — Karin rosnou e ergueu o punho para acertá-lo, e foi nesse momento que eu decidi pôr fim à discussão banal.

— Silêncio, vocês dois! Escutem o que eu tenho a dizer. É importante.

Quando tive meu pedido atendido, tratei de abrandar o meu tom.

— Não temos ideia do que o Lorde Feudal esteja mancomunando com uma organização criminosa tão perigosa, mas a julgar pela informação que Ichiro nos forneceu, não é algo pequeno. Seja o que for que estejam planejando, Sakura descobriu e, por isso, ela foi interceptada e atacada pelos membros da Higanbana Sangrenta antes que pudesse repassar essa informação.

“Sakura não é uma Kunoichi comum; é a discípula não só de uma Sannin lendária como também de uma Hokage. As habilidades dela, médicas e de combate, são reconhecidas por muitos líderes de grandes países. Para que o Lorde Feudal arriscasse tanto a sua posição atacando alguém tão afamado, só posso concluir que o que ele planeja deve ser impedido, caso contrário podemos ser levados a uma guerra entre as grandes nações e os países menores, em breve.

— Isso sim seria desastroso, não? — Suigetsu divagou enquanto alisava seu queixo, pensativo.

— É por isso que estou enviando-os nessa missão — expliquei com extrema seriedade: — Quero que os três se infiltrem em Takigakure e roubem a informação que Sakura conseguiu extrair antes de ser atacada. Descubram o que o Lorde Feudal planeja e, em seguida, enviem uma mensagem para o Rokudaime Hokage, informando-o da situação. Não se identifiquem, apenas tenham certeza de que ele receberá a informação em mãos; digam que são meus subordinados e que eu vou me concentrar na busca por Sakura a partir de agora.

— Não se preocupe, Sasuke, nós faremos — Jūgo garantiu-me e Suigetsu bufou.

— Olha só, outro que adora abanar a cauda!

— Cala a boca, ameba, e se concentre na missão! — Karin demandou e tornou a erguer o punho para ameaçá-lo.

— Então, nos despedimos aqui; mais uma vez, estarei em débito com vocês — murmurei e os três anuíram.

Em seguida, eles partiram, deixando-me para trás no desfiladeiro arruinado com o som das águas ocupando cada lapso de silêncio numa cadência contínua. Mirei o cenário destruído uma última vez, as pedras chamuscadas por meus jutsus e pelos jutsus de Raiden, e também parti, refazendo o caminho de volta para a vila de Imagawa.

Entrementes, eu ruminava a minha decisão e o quão longe estava disposto a ir para obter respostas: a única forma era encurralar Ajisai e exigir dela nada menos do que a verdade.

O tempo estava contra mim e contra Sakura também.

⊱❊⊰

Quando alcancei a vila novamente, perto do fim da tarde, havia um burburinho atípico entre os seus moradores.

Ouvi comentários esporádicos a respeito de uma tempestade estranha que se formou a oeste e concluí que eles discutiam a respeito de minha luta, tive certeza quanto a isso quando escutei o relato assustado de um homem a respeito de um relâmpago com forma de dragão.

Por sorte, nenhum deles desconfiava ainda do meu envolvimento nesse acontecimento de forma que meu disfarce continuava seguro, mas não por muito tempo se eu não me apressasse.

Apertei o passo e bati à porta da casa de Yoshiaki, ele certamente já havia partido em viagem e eu contava com isso. Com apenas Naomi e Ajisai em casa, seria mais fácil eu me aproximar. Depois de quase um minuto, foi Naomi quem me atendeu:

— Ah, Sasuke-san, se veio procurar por meu pai receio que chegou tarde... Ele partiu há uma hora e só deve retornar em duas semanas.

— Na verdade eu preciso conversar com a sua filha — expliquei-me um pouco embaraçado e eu estranhei a reação dela às minhas palavras.

— Ajisai? Bem, ela está me ajudando a preparar o jantar agora. Se puder aguardar alguns minutos — sorriu-me, mas eu percebi que o fazia simplesmente por cortesia.

— Não tem problema, diga a ela que a estou esperando aqui mesmo.

Dito isso, afastei-me da porta e fui me acomodar na varanda da casa enquanto o céu escurecia gradativamente e a temperatura voltava a cair. Eu estava faminto, não havia comido nada durante o dia todo, mas minha prioridade no momento era obter respostas, eu lidaria com todo o restante — inclusive o cansaço que estava sentindo — mais tarde.

Levou quase um quarto de hora, mas finalmente Ajisai surgiu à porta.

— Mamãe me disse que você estava me esperando — ela disse com os olhos baixos e as faces coradas.

— Preciso que você me diga a verdade.

Decidi que andar em círculos não resultaria em nada e que eu já havia atravessado a fase em que me submeteria a galanteios apenas para não afugentá-la. Sakura estava correndo perigo e eu estava disposto a tudo para evitar que Ichiro e os outros dois a encontrassem primeiro.

— Que verdade, Sasuke-san? — Ajisai desconversou com falsa inocência, simulando um ar desentendido.

— Não minta para mim. Eu estou sem paciência e sem tempo, infelizmente. Diga-me, como você sabe quem eu sou? Como sabe que conheço Sakura?

Ajisai alisou uma mecha do cabelo escuro e pressionou os lábios. Olhou ao redor, visivelmente nervosa, e em seguida me puxou para fora da varanda e em direção a uma trilha que nos levaria para um pequeno pomar. Tentei relutar contra o seu toque, sentindo-me desconfortável com a situação. Eu não admitia que qualquer pessoa me tocasse.

— Aonde estamos indo?

— Espere mais um pouco, não podemos conversar com privacidade enquanto minha mãe estiver nos vigiando.

Quando estávamos debaixo de uma velha ameixeira que perfumava o ar noturno com suas flores diminutas, Ajisai me soltou e me olhou constrangida.

— Desculpe-me se não fui honesta contigo. A verdade é que mamãe me alertou para que eu não me metesse nos assuntos dos Shinobis e me proibiu de comentar sobre a Kunoichi que desapareceu há algumas semanas.

— Sakura — eu disse e ela me encarou, surpresa. — O nome dela é Haruno Sakura.

— É, eu sei — admitiu embaraçada. — Eu a ajudei quando a epidemia se alastrou na nossa vila.

— Quer dizer que a conhece? — conjecturei e Ajisai assentiu.

Vagalumes zumbiam suas asas ao nosso redor, eram inúmeros pontinhos luminosos contra a noite.

— Sakura-san ajudou muito a nossa vila, curou os nosso doentes. Eu a ajudei a tratar dos pacientes mais graves, cuidando deles até que se reestabelecessem completamente.

— Isso não explica como sabe sobre mim — apontei e Ajisai mordeu o lábio, receosa.

Com um suspiro, ela enfiou a mão na manga do seu quimono e retirou de lá um pedaço de papel cartão meticulosamente dobrado. Sem me dizer nada, entregou-o a mim. Peguei-o e o desdobrei, curioso. Fiquei surpreso quando reconheci os quatro rostos estampados na fotografia: três indiscutivelmente sorridentes e um que esboçava apenas um pequeno sorriso.

Era uma foto do Time 7, tirada algum tempo antes de eu partir na minha jornada mundo afora por insistência de Naruto e Sakura. Nela, Sakura e Naruto rodeavam-me felizes e Kakashi apoiava cada uma de suas mãos nos ombros deles. Eu estava no centro da fotografia e parecia em paz.

— Onde encontrou isso? — questionei-a e Ajisai encolheu os ombros ainda mais envergonhada.

— Na mochila da Sakura-san, ela a deixou no quarto que alugou, na casa da velha Shizuka. Eu juro que não fiz por mal! — ela defendeu-se exasperada. — Isso foi logo depois das notícias terem chegado à nossa vila, sobre o desaparecimento dela no rio Kitakamu.

“Shinobis de Konoha chegaram alguns dias depois e começaram a fazer perguntas. Perguntaram se ela havia deixado algum pertence para trás... Algum pergaminho ou carta. Fui eu quem encontrou a mochila dela. Eu a esvaziei, mas só encontrei alguns pergaminhos em branco e essa fotografia. Fiquei com medo que descobrissem o que fiz, entretanto, e decidi esconder a bolsa dela em um fundo falso no roupeiro.

Ajisai enrubesceu de repente e desviou os olhos dos meus.

— Eu te achei tão lindo... — confessou, corada. — Queria olhar para o seu rosto todos os dias, por isso peguei a fotografia para mim. Sinto muito, mas não tive a intenção de prejudicar ninguém. Quando Sasuke-san chegou com o meu avô há alguns dias, fiquei tão feliz. Pensei que fosse o destino me unindo ao homem por quem me apaixonei.

— Eu não sou quem você pensa. E não posso corresponder os seus sentimentos — respondi com franqueza.

Ela secou os cílios subitamente molhados e fungou.

— Eu sei. Agora eu compreendo.

Respirei fundo, esforçando-me o máximo para ser paciente, mas eu também estava ciente do tempo que estava desperdiçando ali. Poderiam me tachar de insensível, eu pouco me importaria.

— Isso é tudo o que você pode me dizer sobre a Sakura? Não tem ideia de onde ela pode estar agora? Ela está correndo perigo e eu preciso encontrá-la antes que seja tarde.

Ajisai suspirou e voltou a me encarar, decidida.

— Na verdade, Sasuke-san, eu tenho um palpite sobre o paradeiro da Sakura-san. E acho que vale a pena você investigá-lo. Mamãe não aprovaria que eu me envolvesse nos assuntos de Konoha, mas Sakura-san salvou muitas pessoas que eu conheço e, por isso, vou ajudá-lo.

— Então onde ela está? — pressionei-a aflito e Ajisai abrandou o tom.

— Bem, só há um lugar em que ela pode ter se escondido para se recuperar.

Dizendo isso, ela ergueu os olhos para o céu, para mais longe, para a cadeia de montanhas que circundavam toda aquela região.

— Uma montanha que os supersticiosos dizem ser assombrada, não muito longe daqui: o pico das Shibito-bana.

— Shibito-bana? — ecoei o nome, pouco familiarizado, e Ajisai anuiu.

— Lírios-aranha vermelhos ou... A flor dos mortos.

⊱❊⊰

Ho no Kuni (País do Fogo), três anos antes.

Depois daquela noite, Sakura e eu passamos a nos evitar. Não de propósito, como a maioria certamente imaginaria, e não pelos motivos que terceiros cogitariam. Eu não estava arrependido do que fiz, mas me preocupava a possibilidade de que Sakura estivesse.

Certo que a beijei em um impulso cheio de raiva mas também de desejo. Tsc, Sakura não tinha ideia do quanto mexia comigo e, por isso, eu a chamava de irritante.

Devo frisar que ela não é o tipo “comum” de irritante, mas o meu tipo, mais especificamente. O tipo de irritante que transtorna meus pensamentos e erradica minha paz, a minha calma.

Já faz dois dias desde aquela noite e não consigo tirar da cabeça o gosto da sua boca, o cheiro do seu cabelo e a textura da sua pele sob os meus dedos. É embaraçoso admitir que tenho tido sonhos inadequados envolvendo Sakura, especialmente porque o gemido que ela deixou escapar na minha boca está me atormentando de tanto desejo.

Naquela manhã, decidi ficar em casa estirado sobre a cama porque não tinha ânimo para mais nada, nem mesmo para arrastar Naruto para um treinamento. Era um dia abafado, típico do país do Fogo.

Ouvi batidas à porta e bufei, imaginando se tratar de Naruto. Levantei de má vontade, não me importando em vestir uma camiseta; estava quente demais. Quando atendi a porta, no entanto, surpreendi-me com a visão de uma Sakura furiosa plantada à minha soleira.

— Sakura? O que está fazendo aqui?

Seus olhos claros me fulminaram, raivosos, e eu me afastei um pouco para deixá-la entrar. Ela o fez sem cerimônias, irrompendo na quitinete como um furacão. Parou o suficiente para desatar os fechos de suas botas ninja e eu me recriminei por olhar suas pernas tão descaradamente.

— Sakura, perguntei o que está fazendo aqui — lembrei-a não porque queria dispensá-la, mas porque sua visita (e sua recusa em me responder) não fazia sentido.

Seus ombros estavam tensos e ela suspirou antes de se voltar para mim.

— Aconteceu alguma coisa?

Sem me dirigir a palavra ainda, ela encurtou a distância entre nós e ergueu sua mão. Seu próximo gesto me deixou aturdido. Mais ouvi do que senti o golpe, para ser franco. Também estou ciente de que ela tomou cuidado (talvez inconsciente) de não infundir chakra na sua mão, caso contrário eu teria bem mais do que uma sensação de ardência na face agora.

— Isso é por me beijar, idiota! — ela gritou comigo entre lágrimas de fúria. — E por me ignorar no dia seguinte!

Eu não sabia se estava mais surpreso por ela haver me chamado de idiota outra vez, se por ela haver me esbofeteado pela segunda vez desde que voltei à vila ou se por eu haver magoado seus sentimentos... de novo.

— Você não beija uma garota em um dia e no outro esquece que ela existe, entendeu?! — ela prosseguiu enquanto eu alisava a face que seu golpe acertara. — Você, principalmente, não beija uma garota porque sentiu pena dela!

— E por que você acha que eu te beijaria por pena?! — silenciei-a com meu tom igualmente alterado. — Por que está sempre assumindo o que eu sinto ou deixo de sentir?!

Sakura gaguejou a princípio, mas não demorou a se recompor:

— Talvez porque eu nunca saiba o que você está pensando! Talvez porque, às vezes, eu acredite que você nunca estará ao meu alcance!

Aproximei-me um passo e ela recuou outro por reflexo. Ainda assim, insisti, cercando-a e assomando sobre ela. Sakura só parou quando percebeu que eu a havia encurralado contra a parede. Nós dois resfolegávamos e, aposto, ela estava tão consciente daquele magnetismo entre nossos corpos quanto eu estava.

— Sakura, entenda... — eu murmurei e abri um meio sorriso arrogante para ela. — Eu sempre faço o que eu quero. Ninguém nunca me forçará a nada.

Apoiei minha mão na parede, bem ao lado da sua cabeça e inclinei-me até que pudesse pressionar o meu rosto na pele sensível do seu pescoço. Sakura estremeceu, mas não me afastou — o que me motivou a continuar. Rocei a ponta do meu nariz antes de me atrever a ir um pouco mais longe e, então, pressionei minha boca na sua pele perfumada.

Ela arquejou em resposta aos meus estímulos e levou as mãos até as minhas costas nuas, deslizando os dedos através da minha espinha. Senti seu toque trêmulo, a princípio, mas não demorou muito a adquirir confiança e passar os braços ao redor do meu torso, trazendo-me para mais perto.

Seu rosto enterrou-se no meu peito e sua boca pressionou minha pele também.

— Por que você nunca me diz o que está sentindo? — Sakura suspirou e subiu a boca para beijar meu ombro. — Abra o seu coração para mim, Sasuke-kun.

Não consegui expressar em palavras meus sentimentos, mas quem disse que eu dependia delas para isso? Enrosquei minha mão no cabelo de Sakura e puxei seu rosto de encontro ao meu, colidindo nossos lábios. Foi calmo e brando dessa vez, ao contrário da outra noite em que eu estava afoito para explorá-la de todas as formas possíveis.

Sakura puxou meus cabelos para ditar o ritmo com que nossas bocas se moviam e mordeu meu lábio quando eu tentei me impor sobre ela, suspirando docemente em seguida, assim que tornei a ceder à sua vontade, como a criatura deliciosamente controversa que ela era.

Grunhi sem pensar quando seu joelho meteu-se entre as minhas pernas e seus quadris pressionaram minha virilha. Afastei-me bruscamente porque o sangue nas minhas veias de repente se tornou fogo líquido. Sakura estava me provocando?

Quando voltei a fitá-la, ela estava tão desalinhada quanto eu: com as faces em chamas, a boca apartada e ofegante, inchada devido aos meus beijos, mas os olhos continuavam excitados; as pupilas estavam dilatadas e as íris, escurecidas. Balancei minha cabeça a fim de desanuviá-la de tantos pensamentos inapropriados. A adrenalina que senti no momento em que ela roçou-se contra a minha virilha foi tamanha que por pouco não ativei meu Sharingan.

Depois de havermos nos recuperado, ou ao menos até que meu corpo voltasse a esfriar (especificamente uma parte do meu corpo, para o meu constrangimento), Sakura olhou para mim com um sorriso doce.

— Ne, acho que é melhor eu ir, Sasuke-kun.

Eu também achava, pois estivera prestes a cometer loucura com Sakura. E eu não queria que fosse assim, que acontecesse assim. Ela merece o melhor de mim e nada menos do que isso.

Quando ouvi a porta da frente bater, suspirei aliviado. Em seguida, corri para o chuveiro.


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Notas finais do capítulo

E, FINALMENTE, no próximo capítulo... Não sumam, não, leitores, alguém está prestes a chegar, viu?
...
Queria agradecer a todos que desejaram melhoras para o meu avô e me deram apoio, mas, infelizmente, na última quinta-feira ele veio a falecer, depois de um mês e meio na UTI. Apesar de devastada, estou tentando lidar da melhor forma possível com a perda e a saudade que já sinto. Obrigada a todos mesmo!
...
Amanhã trarei para vocês o primeiro capítulo do Spin-off de O Peregrino: Cosmos. Como já disse, esse Spin-off ocorre bem antes dos eventos de O Peregrino e retrata as duas vidas passadas do Sasuke: Madara e Indra e as consequências das decisões que ambos tomaram. Obviamente haverá romance. Conto com a presença de vocês lá! ;)
...
Agora, estou indo assistir ao episódio de Fear The Walking Dead porque já estou atrasada Haha
...
Comentem, ok? Isso me motiva a escrever e, consequentemente, trazer o capítulo mais rápido para vocês.
Até o próximo!