O Peregrino escrita por Deusa Nariko


Capítulo 1
Capítulo I


Notas iniciais do capítulo

Olá, olá e olá!
Desde que os Spoilers do The Last saíram, meus dedos estiveram coçando para que eu escrevesse uma Fanfic SS com foco na jornada de redenção do Sasuke e em como o Sasuke voltou de forma definitiva para Konoha (sossegou o rabo lá, como eu prefiro, humpf) e ficou com a Sakura.
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Portanto, O Peregrino foca-se mais no Sasuke, mas isso não significa que eu não abordarei outros personagens aqui como os membros do Taka, tio Oro e o Kabuto.
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Essa Fanfic foi inspirada na música Higanbana da Anju. A letra está fortemente conectada com o enredo ^^
Quem quiser conferir, a música é linda:
https://www.youtube.com/watch?v=58ceeF9Robk
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Boa leitura!



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O Peregrino

É certo que não passo de um viajante, um peregrino nesta terra. Mas e vós, sereis mais?

— Johann Wolfgang Von Goethe.

Capítulo I

Yu no Kuni (País das Fontes Termais), dias atuais.

Karigakane era um bom lugar para se ficar. A vila, em si, era modesta, crescendo à base da montanha, prosperando devido ao cultivo do arroz. Seus moradores foram gentis o suficiente para não me importunar com perguntas sobre o meu passado; acolheram-me sem questionamentos e eu contribuí para os seus sustentos da melhor forma que consegui.

Quando o inverno caía sobre a aldeia, tirânico, a solidariedade conjunta imperava; toras para a lenha eram divididas, mantas e cobertores eram distribuídos, a comida era racionada e particionada em medidas iguais, desde os mais jovens até os mais anciãos contribuíam para o progresso em meio à estação mais implacável.

A neve, por nenhuma motivação especial, me pareceu mais alva, mais pura ao cobrir os picos angulosos das montanhas, os descampados desfloridos, os topos dos pinheiros naquele ano. Talvez, no fim, tratassem-se apenas dos meus olhos, inteiramente abertos para o mundo, aptos, enfim, a ver o belo e o fascinante até mesmo em sua forma mais simples e insignificante.

As estalactites de gelo decoravam os rochedos de formatos selvagens nos dias mais frios e escuros, envolviam flores e frutos em redomas vítreas que só descongelavam no fim da estação, com a proximidade da primavera.

Já faz três anos que a Quarta Guerra Ninja terminou. Já faz três anos que deixei Konoha em busca de remissão pelos meus pecados e respostas as quais até hoje procuro incansavelmente, infindavelmente.

Conheci lugares, recantos, templos sagrados, pessoas das mais variadas idades movidas pelas mais variadas crenças e motivações. Vaguei por florestas úmidas e inquietas, por desertos escaldantes sob um sol fustigante e velejei por mares revoltos sob uma lua eternamente vigilante.

Meu exílio auto-imposto ao longo desse meio tempo fez-me refletir e amargar cada ação e decisão que impulsiva e inconsequentemente eu já tomara. Um passado que até hoje me assombra e me impede de seguir em frente, que me incapacita de retornar ao meu lar e recomeçar.

Se dissesse que não os vejo, os sinto junto a mim, certamente mentiria; os rostos de meus pais e de meu irmão estão sempre presentes nos meus pensamentos, espreitando em segundo plano, refletindo-se na dor e no torpor de minha alma esvaziada.

O meu único consolo são os elos que forjei com meus companheiros. Naruto e Sakura, em diversos momentos, foram tudo o que me mantiveram são, tudo o que me impediram de cair na tentação do poder e do mal, uma serpente maligna que, acredito, está encravada em minha essência desde o momento em que invejei meu irmão, mesmo que fosse uma criança na época.

A ausência de meu braço esquerdo é meu lembrete constante do caminho que devo seguir. Às vezes, em raros momentos nos quais me distraio, sou capaz de jurar que ainda o sinto; meu punho fantasma, meus dedos que já não mais existem, recebendo ordens de minha mente petulante para que se cerrem, se esmaguem contra a palma de minha mão invisível.

Nos meus sonhos, eu vejo Konoha, eu vejo o Distrito do meu clã ardendo sob as chamas implacáveis do Amaterasu, alegorizando todo o ódio que um dia eu já senti e fui capaz de suportar.

A paz espiritual ainda é uma meta que devo alcançar.

Quando penso nas palavras de repúdio e ira que já propaguei, minha alma se amarga e se recolhe para ruminar um passado que me envenenou durante grande parte da minha vida.

Devo a Naruto, o fato de que fui resgatado de um abismo de trevas, sofrimento e solidão. Devo à Sakura a certeza de que possuo um porto-seguro, um lugar para retornar para quando me sentir pronto, a minha única chance de escrever um futuro.

Nessa noite, porém, não sonho com meus pais, meu irmão, meu time, ou mesmo com o passado que me flagela; meus sonhos são inquietantemente vazios nessa noite. Vejo espectros de cores, relances de forma que se materializam em um único ramo perante mim.

Flores. Vermelhas como sangue, de aspecto bulboso e pétalas dispersas e irregulares, de segmentos estreitos e inclinadas para trás; uma haste longa a equilibra, sem folhas. Vejo as flores e não compreendo o seu significado, tampouco reconheço a espécie exótica.

Quando desperto, na calada da madrugada, em um quartinho nos fundos de uma pensão, repenso o seu propósito implícito.

Aquela é só a primeira noite de muitas em que o sonho esfíngico se manifesta em meu subconsciente vulnerável. A cada vez que desperto, no silêncio e no pesar dos meus pensamentos, considero deixar Karigakane e seguir para o próximo vilarejo, para a próxima montanha, para o próximo país.

Kaede, a anciã dona da pensão na qual me hospedei, trocando estadia e comida por alguns serviços braçais, lamenta meu informe na manhã posterior enquanto me estende um copo de porcelana fina com chá de erva-doce — reconheço o aroma.

— É realmente uma pena, Sasuke-san, esperava que pudesse permanecer conosco até a primavera ao menos; o desgelo da passagem da montanha não costuma acontecer até meados de Fevereiro.

— Ouvi dizer que há uma rota alternativa para me levar para fora da montanha — comento com casualidade e, em resposta, a mulher de longos cabelos grisalhos e rosto pesado suspira; ela sabe que já me decidi.

— Sim, mas há muitos bandoleiros e mercenários que utilizam aquela passagem, Sasuke-san, e para alguém na sua condição...

Quando estendo o meu único braço direito até o chá, Kaede funga baixinho.

— Eu serei cuidadoso — prometo-lhe porque tenho certeza de que meus dias em Karigakane se findaram e porque sinto que a necessidade de mover adiante está ameaçando me sufocar.

— Minha pensão não costuma receber tantos hóspedes nessa época do ano — ela lamenta —, mesmo as fontes termais com propriedade curativas da montanha já não atraem mais muitos turistas até tão ao norte desse país. Tê-lo como companhia nesses dias, Sasuke-san, foi muito precioso para mim.

Assinto porque Kaede também foi uma boa companhia para mim; seu tom calmo e brando, seus gestos maternais e zelosos, suas palavras afetuosas permanecerão comigo mesmo depois que eu me instale na próxima região.

— Obrigada por fazer companhia a uma velha viúva solitária como eu — diz-me ela, curvando-se em uma mesura enquanto agradeço tudo o que fez por mim também.

Sinto o aroma da erva-doce quando beberico o chá, o calor que se propaga pelo meu corpo num dia frio de inverno. Apanho minha Kusanagi e meu poncho gasto e o visto como aprendi a fazer, virando-me com um único braço, uma única mão.

Olhando-me no espelho recentemente, percebi o quão desleixado me tornei. Meu cabelo cresceu nos últimos anos e eu não me dei ao trabalho de voltar a cortá-lo. Minhas roupas estão puídas e rasgadas nas bordas e o solado de minhas sandálias desgastou-se precocemente.

Já não tenho nem mesmo o orgulho do meu clã e da minha linhagem sanguínea para me apoiar. Sou um reflexo apagado e ofuscado do que fui um dia.

— Ah, Sasuke-san — Kaede me chama quando já estou à porta, pronto para partir.

Viro-me e a encontro parada no meio da recepção, das tábuas gastas do assoalho, uma muda de roupas limpas e novas está apertada contra o seu tronco robusto e curvado. Ela sorri por entre as rugas proeminentes em seu rosto, os olhos apertados em fendas pelas pálpebras caídas.

— Antes de partir — ela estende o embrulho para mim, ainda sorrindo —, leve isso. Eram do meu filho mais velho, mas já não vejo mais propósito em guardá-las. Você é tão alto quanto ele era, então presumo que servirão perfeitamente.

Quando hesito, ela persiste.

— Não se constranja, não faz sentido nos apegarmos aos mortos, não é mesmo? O melhor que temos a fazer é guardar as boas recordações e seguir em frente.

Aproximo-me para apanhar o embrulho e a agradeço com uma mesura.

Saio pela porta da pensão para o frio implacável do inverno. O cheiro de cinzas impregna o ar; tenho um longo percurso a percorrer e pretendo partir o mais depressa possível, entretanto sou pego pela visão do vale logo abaixo coberto pela neve.

Enfio a muda de roupas em uma bolsa que escondo sob o meu manto e prendo a Kusanagi na parte de trás da minha cintura. Os habitantes de Karigakane gradualmente despertam para um novo dia; selam cavalos, carregam carroças, preparam-se para seguir para as arrozeiras.

Contornei a entrada da pensão cercada de neve e desci o caminho estreito que me levaria até o acesso principal à vila. O silêncio e a paz me traziam conforto, alento. Consegui esboçar até mesmo um pequeno sorriso quando um grupo de crianças atravessou meu caminho, rindo e correndo.

Elas passam por mim sem nem ao menos pestanejar, sem qualquer receio. A maioria das pessoas aqui cresceu isolada demais para ouvir sobre os meus feitos ou sobre os feitos de outros homens do meu clã. Não tenho ideia se alguns deles permanecem ignóbeis a respeito da minha identidade, do meu fardo, ou se eles apenas ignoram o meu passado me concedendo o benefício da dúvida.

Tento olhá-las com desaprovação conforme elas passavam por mim sem desacelerar ou olhar devidamente para frente, quase trombando com minha figura, na verdade, se eu não tivesse reflexos tão rápidos. Mas falho.

— Rui, Akiyo, Haruhiro! — um timbre feminino ecoou à distância enquanto uma jovem esforçava-se para alcançá-los, o rosto corado pelo esforço físico. Era Aiko, constatei.

Ela estacou diante de mim, ofegante. Os punhos cerrados apoiados nas coxas.

— Bom dia... Sasuke-san... Per-... Perdão pelos meus... irmãos — disse-me, a respiração entrecortada, oferecendo-me um sorriso.

Olhei-a em silêncio; não havia me incomodado verdadeiramente com a comoção que as crianças haviam causado. Em seguida, ela as olhou desaparecer no fim da trilha com desânimo e resignação.

— Aquelas crianças...

— Deixe-as — eu lhe disse, o que a fez me encarar, estupefata.

— Mou, Sasuke-san, crianças precisam ser disciplinadas e corrigidas. Kaa-san ficaria irada se meus irmãos pudessem fazer o que quisessem o tempo todo.

Pensando em minha infância e em como eu a desperdicei e ela foi desperdiçada, meneei a cabeça e endureci o olhar.

— Não, deixe-as. Crianças são crianças, no fim.

Ela suspirou, exasperada, mas acabou se resignando. Aiko era uma boa menina, ingênua e talvez um pouco teimosa, mas uma boa menina. O rosto redondo e infantil ainda carregava traços da pré-adolescência, assim como o rubor forte em suas bochechas. Os olhos grandes e castanhos ainda tinham muito para ver e descobrir do mundo.

— Oe, Sasuke-san... Kaa-san te convidou para o jantar essa noite.

— Estou de partida — recusei o convite cortês, mostrando-lhe a minha bolsa embaixo do manto.

A decepção foi notável em seu rosto, assim como a derrota em seu timbre agudo.

— Ah, mas já?

— Preciso mesmo ir — confirmei e ela desviou o olhar, encabulada. — De qualquer forma, agradeço o convite.

Desviei o meu rosto também, intentando passar por ela e seguir meu caminho quando meu olhar recaiu casualmente sobre a orla da trilha, onde a neve havia sido afastada e amontoada próximo aos cascalhos. Ali, na beira da trilha, estava a flor que eu vira em meus sonhos.

Olhei-a intrigado, ressabiado; era um ponto obscenamente rubro cercado pela neve cândida, um pingo de sangue em um lençol impecavelmente branco. Olhei-a por tanto tempo, que só despertei com a voz de Aiko, estrídula.

— Ah, uma Higanbana! — ela exclamou com a mesma proporção de surpresa que me atormentava secretamente.

— Higanbana? — repeti o nome, extasiado.

— Estranho — desconversou, meneando a cabeça. — Higanbanas não são comuns nessa região, muito menos nessa estação. — Então, ela me olhou, finalmente: — É um Lírio-aranha vermelho, Sasuke-san; são venenosas, portanto não prestam nem mesmo para buquês.

Seus olhos se estreitaram antes de proferir as próximas palavras — as que me permiti registrar.

— São flores relacionadas à dor e à saudade causada pela morte.

Dor e... Saudade. Dois sentimentos que carreguei dentro do meu coração por tantos anos. Faz sentido que eu tenha começado a vê-las nos meus sonhos... Higanbanas, as flores da morte.

— Bem, Sasuke-san — Aiko estendeu uma mão diante do rosto e acenou para mim —, acho que isso é uma despedida então... Cuide-se e volte quando puder! — E sorriu.

Eu assenti e segui pela trilha margeada pela neve, o ar gelado condensando diante do meu rosto. Eu havia planejado me dirigir para outra aldeia, mas ao oeste do País das Fontes Termais e o mais perto possível da divisa com o País do Fogo — certos hábitos demoram a morrer.

Mas naquela mesma noite, encolhido em torno de uma fogueira parca cujas chamas estalavam de uma forma sofrida, em uma floresta inquieta, em uma gruta sussurrante, eu sonhei novamente com as flores da morte, as Higanbanas.

Kaze no Kuni (País do Vento), um ano antes.

Então, é verdade o que estão dizendo? — Um shinobi de Suna indagou, uma mesa à frente da minha, o semblante iluminado. — O Jinchuuriki da Kyuubi, Uzumaki Naruto, realmente vai se casar na próxima semana?!

Senti o peso de cada uma daquelas palavras conforme elas flutuavam dispersas entre os meus pensamentos emaranhados, mordiscando o meu consciente persistentemente com uma ideia tola.

O outro shinobi, ao lado dele, concordou vigorosamente.

— Sim, com a herdeira do clã Hyuuga pelo que ouvi dizer. O Kazekage foi formalmente convidado para a cerimônia.

— Oh, eu aposto que será uma cerimônia bem íntima e tradicional.

O outro assentiu mais uma vez, entretido demais em beber seu chá para ocupar sua boca com algo a mais. Calmamente, eu me levantei do canto onde estivera sentado, deixei o dinheiro sobre a mesa, junto com a conta, e saí da casa de chá, situada em uma aldeia no meio do nada.

O país do Vento era extremamente agradável, apesar dos imensos desertos causticantes e da ventana constante. Eu estava dividido, em conflito comigo mesmo, ainda absorvendo as palavras daquele sujeito...

Sem que percebesse, eu sorri, e meus pés me levaram até um caminho que eu sabia que me conduziria para Konoha. No entanto, depois de ponderar melhor, virei o meu corpo e me acovardei, voltando por onde havia vindo.

Ainda não estava pronto para voltar, para me mostrar perante eles. A culpa e a vergonha eu ainda carrego comigo.

Fechei os meus olhos e puxei o capuz do meu manto sobre a cabeça, apertando meu passo, rumando na direção oposta daquela onde meu coração queria realmente estar.

Perdoe-me, Naruto.

O paraíso está logo depois do céu incendiado

E eu não posso voltar para o ontem

Quando eu assisti o pôr do sol desvanecer...

Por que os meus olhos ainda procuram pelo céu do amanhã

Se eu não posso mais olhá-lo com aquele que eu amo?

Anju — Trecho de Higanbana.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado e não deixem de comentar, a opinião de vocês é importante para mim ;D
...
E, sim, eu farei muito suspense com essa suposta "morte" da Sakura-chan ;-;
E não, eu nunca vou te perdoar por ter faltado ao casamento do melhor amigo, Sasuke-kun ;-;
...
Nos vemos nos reviews.
Até o próximo!