ApocalipZe escrita por Sr Devaneio


Capítulo 19
Capital dos Mortos - 01


Notas iniciais do capítulo

E aí, povo! Como vão vocês?
Estou vivo e trazendo mais um capítulo dessa história. Peço desculpas pelo sumiço e estou muito feliz em anunciar que consegui vencer a preguiça e o bloqueio! o/
Vou tentar aproveitar pra escrever muito enquanto a parte ruim dessa vida não volta e enquanto isso vocês vão lendo a continuação.
Espero que tenha ficado legal (estou há o quê, dois meses nessa parte!?) e só digo uma coisa: daqui pra frente as coisas só vão esquentar.
Por isso preparem-se, peguem suas armas e vamos lá!



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Aquela foi uma manhã com um café bem inusitado. Senti o cheiro assim que desci as escadas.

– Prato da manhã: Macarrone au micro-ondas! – disse Vítor, numa tentativa chula de um sotaque estrangeiro qualquer.

Apesar de ter sido eu quem acordara todo mundo no quarto, fui o último a lavar o rosto e descer.

– O quê? – perguntei, segurando o riso.

– Macarrão esquentado no micro-ondas, velho. – ele respondeu, sem a mesma alegria inicial.

Comemos e nos preparamos rápido. Felizmente, como o clima da cidade era seco, as roupas secaram muito bem durante a noite.

Ao sairmos, Emi fez questão de fechar e trancar as portas e janelas da casa. Já eu fiz questão de pegar os pacotes de macarrão restantes na casa, um pouco de tempero e farinha. Diminuí o volume da mochila ao máximo e para isso tive que tirar meus cadernos e estojo da mesma, pendurei a tira da câmera em volta do pescoço e coloquei nela o dispositivo que a prendia à minha mochila – um invento recente que permitia a tiragem de fotos sem a necessidade de ficar segurando a câmera.

Havia um cheiro de fumaça tão forte no ar que chegava a ser pungente. Vinha de todos os lados, ângulos e direções, o que só podia significar uma coisa: as chamas não haviam parado. Pelo contrário, continuaram consumindo casas, prédios e comércios até destruir bairros e mais bairros.

Andamos por mais ou menos uma hora, quietos como no dia anterior. Em algum momento acabamos subindo as “W’s” e me peguei observando vias da W4. Se continuássemos por esse caminho, iríamos acabar no Ana Lídia, o clássico “Parque do Foguete”, que já fora frequentado por todas as gerações de brasilienses.

Chegamos em um ponto que se dividia em um retorno no meio de uma virada para a direita de um lado e uma para a esquerda do outro. Se olhássemos ou continuássemos para baixo seria possível ver e daríamos de cara com o Pátio Brasil Shopping; se subíssemos e passássemos pela rotatória, daríamos de cara com o Ana Lídia.

E foi o que fizemos.

Paramos rapidamente na rotatória para beber um pouco de água debaixo de uma árvore e foi nesse momento que eu me dei conta de que não tinha enchido minha garrafinha.

Ao nosso redor, as ruas estavam completamente engarrafadas com carros vazios. Alguns tinham as portas abertas e praticamente todos ainda estavam com os motores ligados. O número de mortos aqui se podia considerar “bom”, o que significava que não chegavam a ser uma horda, apenas alguns muitos aqui e ali, mas a uma distância escapável.

Atrás de nós erguiam-se os prédios e centros empresariais de Brasília, erguendo-se através das muitas árvores espalhadas pelas ruas, avenidas e onde quer que tivesse um pouquinho de terra. Imponentes e majestosos, cheios de janelas de vidro que cintilavam e refletiam a luz solar matinal.

À nossa frente já era possível ver a gradezinha verde que rodeava o parque. Não era algo muito “antiladrão”, mas duvido que alguém acharia algo para roubar lá dentro.

– Eu já suspeitava, mas porque estamos indo nessa direção? – perguntou Verônica tranquilamente, assim que terminou de guardar sua garrafa.

Emi virou-se e respondeu:

– É caminho no nosso trajeto. Também achei que poderiam querer ver o parque por uma última vez.

– Entendi. – disse, simplesmente.

Eu não tinha parado para pensar assim... Melhor dizendo, eu não queria ter parado para encarar esse fato. “Ver o parque pela última vez” foram palavras que me soaram amargas e traziam uma sensação não muito boa. Quer dizer, isso passava e tinha passado pela minha cabeça frequentemente, mas num canto escuro e afastado. Agora que tinha sido dito em voz alta, a dureza dos fatos foi como um tapa.

Talvez fosse realmente isso mesmo. Nunca mais veríamos as coisas que vemos agora. Nunca mais veríamos as coisas que já tínhamos visto até agora. A escola, as avenidas, as lojas... Porém o mais assustador era que esse não era um “nunca mais veríamos porque cada dia é um dia diferente do outro”, não é porque “cada momento é único”, mas porque de fato e literalmente nunca mais passaríamos por esses lugares de novo.

É... a vida realmente sabe como virar nosso mundo de ponta-cabeça.

– Todos respiraram um pouco? – perguntou Emi.

Alguns assentiram. Eu ainda estava tentando engolir a realidade.

– Podemos ir, então!? – ela disse, mas soou mais como uma afirmação do que com uma pergunta.

E fomos.

Alguns metros depois, pulamos a gradezinha sem dificuldades e pronto, lá estávamos nós, no Parque-da-Infância-de-Todo-Mundo.

O parque ficava numa boa área. Era todo arborizado, (salvo a parte do foguete, que ficava na única parte que tinha areia) e todos os brinquedos eram de ferro, salvo uns dois ou três, que eram simplesmente cercadinhos situados na área de areia para as crianças menores (acho).

Também havia algumas típicas mesas e cadeiras de concreto, para piqueniques ou simplesmente para os pais se sentarem enquanto conversam uns com os outros e observam as crianças brincarem.

Esse lugar era tão infância...

Tirei algumas fotos do local e me dirigi ao brinquedo que sempre fora a atração principal. Quando cheguei aos pés do foguete, coloquei no modo filmadora e escalei-o, filmando o máximo de coisas que eu queria lembrar, mas sem demorar muito.

Não havia nenhum deles por ali, o que era surpreendente.

Quando terminei, fui em direção ao cercadinho mais próximo do foguete, sentei e fiquei observando as coisas ao meu redor, tendo nostalgias e relembrando passados e momentos. Eu tinha essa mania estranha. Gostava de relembrar fatos passados e coisas do tipo sempre que estava em um lugar que me trazia boas lembranças.

Tirei uma foto daquela vista. O foguete, o céu azul e ensolarado, o parque praticamente deserto.

Devíamos ter passado uma meia-hora ali. Nãos ei o que os outros ficaram fazendo enquanto eu me recolhia aos meus próprios pensamentos, mas em seguida tive uma ideia e a propus para o pessoal:

– Galera, será que dá pra irmos na Torre de TV também?

– Se não demorarmos, não vejo problema... – disse Emi.

Os outros concordaram ou não opinaram. Então rumamos para o enorme ponto turístico.

Não foi preciso chamar o elevador, ele já estava no térreo. Apenas entramos e esperamos trinta segundos até chegarmos no ponto em que era permitido os visitantes ficarem.

Era uma vista fenomenal e contrastante O caos de quarteirões inteiros em chamas, que geravam incontáveis colunas de fumaça (elas realmente haviam se multiplicado consideravelmente de ontem pra hoje) no ar misturando-se à calmaria de uma capital silenciosa.

Ninguém ousou dar um pio durante o tempo que permanecemos ali e o clima ficou um tanto pesado, como o de um velório.

Tirei uma foto daquela vista: o letreiro que dizia “EU AMO BRASÍLIA” em letras grandes, a fonte logo atrás e estendendo-se por uns bons três ou quatro quilômetros, todo o Eixo Monumental.

E em todos os lugares, cada centímetro de asfalto ou grama que havia, centenas e centenas deles.

Eu sabia de alguma forma que estávamos nos despedindo de nossa querida cidade e nos preparando para enfrentar um perigo inimaginável. Muito maior do que o que corremos na escola.

Quando descemos, pegamos uns bons pedaços de pau que estavam por ali a fim de nos defender caso fosse preciso. Apenas Vítor e Nathália ficaram sem nenhum.

A torre de TV e fonte, junto com o letreiro “EU AMO BRASÍLIA”, estavam atrás de nós. Um coração substituía a palavra “AMO”. À esquerda, um dos setores hoteleiros, à direita, a entrada para a W3 – que estava completamente lotada – à frente, finalmente a rodoviária. Uma fileira enorme de carros e ônibus ocupava toda a pista desde a entrada da W3 até a rodoviária.

Do ponto onde estávamos podia-se ver muitos deles, andando errantes a uns bons trezentos metros na Antes-movimentada-e-cheia-de-vida-W3.

Respirei fundo e como um sinal, Emi disse:

– É agora. Atenção e cuidado ao máximo, olhos e ouvidos bem atentos. Se eles chegarem perto demais, apenas os repilam e se afastem logo em seguida.

Apertei o pedaço de madeira que segurava como se minha vida dependesse dele enquanto Emi fazia uma pausa.

Logo retomou:

– Deixem que Vanessa ou eu os acertemos pra valer. Mais importante ainda: de maneira alguma tentem dar uma de heróis. Se baterem e eles continuarem se aproximando rápido demais, peça, por ajuda. Ou fujam, que nós outros iremos logo atrás.

Respirei fundo. Era agora.

– A gente vai morrer... – soltou Vítor, no momento em que eu havia conseguido juntar alguma motivação.

Aquilo me desmotivou novamente.

– Não, não vamos. Vamos até aquela loja, pegaremos o que precisarmos e daremos o fora. Seremos rápidos, e nenhum deles vai nos alcançar. – afirmou Emi.

Eu tinha que ir. Todos tinham. Para o nosso bem.

Então, me lembrei de minha alma.

Ó Senhor Jesus... – inspirei fundo, dizendo as palavras bem baixinho. Aquilo me revigorou.

Eu era uma pessoa que acreditava. Então, se algo desse errado, pelo menos minha alma seria salva.

Vítor olhou para mim por um breve instante. Liguei a câmera e acessei as configurações.

– O que está fazendo? – perguntou Vítor, ao meu lado.

– Programando ela para disparar continuamente a cada cinco minutos.

Ele ia dizer alguma coisa, mas foi interrompido:

– Pessoal... Vamos lá! – disse Emi, dando o primeiro passo rumo à uma muito-provável-morte-certa-e-dolorosa.


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Notas finais do capítulo

Até logo (espero)!
Fiquem bem e muitíssimo obrigado pela paciência! :)
Nos vemos logo em breve.



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