Coliseu escrita por Bela Escritora


Capítulo 7
7 - Percy Jackson


Notas iniciais do capítulo

Hey, pessoal! Olha quem voltou? Eu sei, eu sei... faz MUUUUUUITO tempo que eu não publico nada, mas eu ando realmente sem tempo. Mas eu compensarei! Nas férias de Dezembro, claro, porque agora não rola mesmo.
Enfim. Esse capítulo ficou um pouquinho mais comprido do que o normal, mas acho que valeu a pena cada palavra. Divirtam-se, porque é pra isso que eu escrevo.



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— AU! - reclamei quando Thalia acertou o escudo no meu peito com tanta força que me derrubou no chão - Au duplo.

— Levante-se, Cabeça de Alga - ela falou. - E pare de resmungar.

— Você e Annie tem se falado? - perguntei ainda estirado no chão e sem dar sinais de obedecê-la.

— Não, por quê? - ela perguntou apoiando a espada no ombro.

— Por que ela me chamava de Cabeça de Alga.

— Certo, que seja. Agora levante-se para continuarmos seu treinamento.

— Estou cansado - reclamei me sentando e alcançando a espada de treino com o pé. - Não podemos treinar mais depois do almoço?

— Será que você só pensa em comer?

— Eu estou em crescimento - falei me erguendo.

— Não estará mais se você morrer na arena. - O estomago dela roncou alto e eu sorri. - Certo, você venceu dessa vez, cabeção. Vamos pegar nosso caldo de peixe.

— Pão. Peixe não.

— Percy, você não é Apolo para ficar fazendo poesias. - Acompanhei ela até a lateral da área de treinamento, onde um guarda muito mal-humorado servia tigelas de madeira com uma mistura cinzenta gosmenta e com alguns pedaços suspeitos no meio. - Pode parar, ok?

— Há-há, engraçadinha - respondi entrando na fila junto com ela. - Eu já encontrei Apolo uma vez. Ele não ficava fazendo rimas o tempo todo.

— Eu também - Thalia sussurrou, já que estávamos muito perto dos guardas. - Ele é quente!

— Claro que ele é quente! Ele é o deus do sol!

Ela bufou e bateu com a mão na testa e eu fiquei olhando para ela sem entender. O que eu tinha feito de errado dessa vez? Nós dois nos aproximamos da bancada onde o guarda servia comida e eu peguei um pão duro.

— Não vai querer o caldo, graeco? - perguntou o guarda com um ar de irritação.

— Depende... Do quê é? - perguntei.

O homem fechou a cara, tomou uma vasilha na mão e me entregou.

— Descubra sozinho seu cretino.

Thalia me arrastou para perto dos estábulos, me dando um sermão sobre eu ser muito idiota e que estava pedindo para morrer nas mãos de um guarda. Deixei a vasilha de lado e mordisquei o pão com o estômago agradecido. Observei os arredores. Aquilo com toda certeza era melhor do que as celas fedorentas e escuras do subterrâneo, mas continuava sendo uma prisão. Uma construção na lateral do Coliseu com acesso às catacumbas por onde entrávamos para a arena. As celas onde dormíamos formava um U ao redor do pátio central, onde eu podia contar vinte e cinco jovens semideuses transformados em gladiadores do imperador. Filhos de Deméter, Hécate, Dionísio, Quione... Todos aqueles que possuíam alguma habilidade extraordinária além do fato de serem filhos de um deus. Annabeth, por exemplo, nunca viria para cá.

— O caldo é de porco - Thalia falou me tirando dos meus devaneios. - Se não for comer, então me dê.

— Nem vem - retruquei agarrando a tigela com ambas as mãos ao mesmo tempo em que o soldado responsável por chamar os gladiadores que lutariam no dia surgiu em seu lugar habitual.

— Atenção Gladiadores! - ele bradou e, de repente, todos os sons do pátio pararam. Algumas cabeças saíram de dentro dos quartos e outras se viraram para o homem, que tinha sido apelidado de Quíron. Na minha opinião fora uma péssima escolha. O Quíron que eu conhecera tinha bunda de cavalo. - Os selecionados para lutar hoje são: 130 e 202 contra Hércules; 187 contra Coruja; 235 e 209 contra feras; e 136, 210 e 240 contra Atlas. Estejam diante do portão ao meio-dia!

Ele enfiou o pergaminho de onde lera os números embaixo do braço e partiu marchando. Eu olhei para Thalia, que tinha o rosto entre as mãos, e suspirei. E lá estava eu, indo de volta para o Coliseu. Coloquei a mão em seu ombro, consolador e observei o rosto daqueles que estavam indo para a arena, lutar antes de nós e depois. Para os soldados éramos apenas números, mas entre nós tínhamos um nome, uma história. Éramos amigos.

— Vai dar tudo certo, Thalia - falei, mas minha voz continha um toque de hesitação. Da última vez que eu fiz essa promessa, Charles Beckendorf morrera. - Vamos voltar para cá.

— Espero que sim - ela murmurou erguendo a cabeça. - Quem mais vai com a gente?

— Número 136 - falei. - Não sei quem é.

— Zöe - ela falou apontando uma garota de cabelos castanhos e pele bronzeada. - Era uma arqueira de Ártemis quando foi capturada. Melhor comer a sua sopa logo, ou então você não terá tempo para isso.

Passamos os seguintes minutos em silêncio, presos em nossos próprios pensamentos. Eu, por exemplo, ficava tentando descobrir como a minha mãe estava. De vez em quando eu sonhava com ela, via ela cuidando dos cavalos da nossa fazenda e rezando escondida para meu pai. Ela chorava todas as vezes que via Blackjack, meu garanhão negro. O que ela estaria fazendo agora? Meus devaneios foram interrompidos quando Zöe se aproximou para conversar com Thalia.

— Thal. Como você está? - ela perguntou parando diante da amiga.

— Me preparando mentalmente para voltar para aquela arena - ela respondeu torcendo a boca mal-humorada. - E você?

— Eu estou tentando descobrir quem é o 240 - ela comentou.

— É esse garoto com cara de idiota sentado do meu lado - Thalia respondeu apoiando o queixo na mão.

— EI! - reclamei me virando para ela. - Eu não sou surdo, ok? - A filha de Zeus apenas revirou os olhos.

— Pera, mas você é o cara que explodiu o sistema subterrâneo de água!

— Sim, sou eu. Percy Jackson.

— Como você fez isso? - perguntou ela cruzando os braços.

— Hum... Deixe-me ver... O nome do meu pai começa com P e ele é um dos três grandes.

Thalia bufou e me olhou com cara de cansada. Estava irritada por ter que voltar para a arena. Com toda a certeza ela não tinha passado por bons momentos lá. Bom... Quem tinha, não é mesmo?

— Não é como se isso a surpreendesse. Ela é filha de Atlas, Cabeça de Alga. Uma Hespéride - ela comentou.

— Ah! - Olhei para Zöe meio sem saber como agir perto dela. Nunca tinha encontrado uma ninfa desse escalão, apenas as ninfas da natureza e da água que viviam perto da minha casa e aquelas que tinham me ajudado a fugir dos romanos por tanto tempo e a quem eu seria eternamente grato. - Você deve ter... hum... muito ódio de nós, mortais por termos feito isso com você.

— Percy, eu estou entre os mortais desde a época de Heracles. Já me acostumei com o jeito deles de agirem. - Ela olhou para a minha espada, apoiada nos degraus da escada em que estávamos sentados. - E essa espada era dele.

— Contracorrente? - perguntei trocando a tigela de caldo vazia pela arma. Zöe assentiu. - Prometo que vou devolvê-la assim que sair daqui, mas por enquanto acho que seria pedir a minha morte recusar esse presente dos deuses. - Ela me olhou confusa. - Héstia me entregou ela no formato de um estilete - respondi e ela se sentou diante de mim e Thalia.

— Da última vez que eu a vi, ela era um grampo de cabelo - ela respondeu tocando a lâmina de bronze.

— É, eu acho que o cabeçudo não ia ter um bom uso para um grampo de cabelo, Zöe.

As duas riram e eu me limitei a revirar os olhos e ficar encarando meu reflexo na lâmina da espada.

— Acho que nem para um estilete ele tem - Zöe falou, o que gerou mais risos ainda. Eu sorri. Era bom que as garotas se distraíssem. Eu tinha ido para a arena fazia pouco mais de dois meses, mas Thalia e só tinha entrado na arena uma vez e há três meses. Para Zöe eu tinha certeza de que não seria nada fácil voltar.

O tempo passou mais rápido do que eu esperava e, de repente, eu me vi de pé dentro das catacumbas do Coliseu, em uma parte que eu nunca tinha ido antes. A área dos Gladiadores. “Ótimo” pensei deprimido “Estou do lado inimigo agora. Só falta me enviarem para matar um dos meus amigos.” Estava de pé diante de um suporte de espadas, observando as várias lâminas de aço enfileiradas lado a lado e as manchas de sangue que algumas delas traziam nos punhos quando Thalia me cutucou no ombro. Ela trazia nos braços o peitoral de uma armadura romana de couraça tingida de preto com detalhes em metal e uma ombreira de mesmo material e com espinhos para fora.

— Eu não vou usar isso. - reclamei enquanto ela me entregava as duas coisas.

— Você realmente quer morrer, não? - ela me perguntou séria. - Se não usar a armadura você não dura três segundos na arena!

— Não a armadura. A ombreira. - falei - Não vou usar isso.

— Você pode tentar encontrar outra, Cabeça de Alga - Thalia disse dando de ombros e me puxando pelo cotovelo até onde ficavam os elmos. - Vista a armadura e escolha um.

— A ombreira faz muita falta? - perguntei apoiando o peitoral no chão.

—Bom... Ela protege o braço que você usa para lutar, dificultando que ele seja decepado.

— Dificultando. Obrigado por ser honesta - resmunguei olhando a peça de armadura com desgosto.

Para a minha alegria, um cara que era três vezes maior do que eu brotou do meu lado, falou que aquela coisa era dele, arrancou da minha mão e foi embora sem dar nenhuma satisfação. Só depois que eu percebi que estava sem proteção para o braço, o que permitiria que ele fosse facilmente decepado. Thalia bufou e me arrastou para o depósito de armaduras, onde eu a ajudei a vasculhar as peças em busca de uma ombreira que me servisse e que não tivesse tachas para fora. Acabei por ficar com uma de placas sobrepostas de couraça.

Enquanto ela me ajudava a prender a peça sobre a toga preta que eu e todos os semideuses usávamos, reparei na armadura dela: um peitoral de couraça com uma águia e um pinheiro de metal. A minha, por outro lado, tinha dois cavalos empinados e um tridente.

— Que honra usar o símbolo do império - comentei vestindo a armadura por cima das tiras da ombreira.

— É antes de tudo o animal símbolo do meu pai, assim como os cavalos são do seu - ela retrucou.

Voltamos para o estande de elmos. Restara apenas alguns poucos e feios. Escolhi um simples de ferro e sem enfeite algum, assim como o de Thalia. Meus olhos ficavam totalmente ocultos pelas sombras que o objeto causava, o que era bom, assim o meu oponente nunca saberia para onde eu estava olhando.

— Vou precisar de uma bainha? - perguntei para ela.

— Você não terá tempo de colocar a espada na bainha - Zöe falou surgindo atrás de mim. Olhamos ambos para ela, confusos. Normalmente ela preferia ficar com as amigas dela, antigas caçadoras de Ártemis. - Os guardas mandaram que ficássemos em nossos grupos de combate.

— Certo - Thalia murmurou ajustando o escudo no braço. - Alguma ideia de como será Atlas?

— Não é meu pai, isso é certo.

Passamos o resto da tarde esperando. Pouco tempo antes de nossa batalha, fomos arrastados até os portões e forçados a assistir 235 e 209, dois filhos de Dionísio, lutarem contra tigres. Um deles se recusou e acabou devorado. Sobrou para o outro matar as duas feras, feito que ele também não conseguiu.

— Eu não entendo - comentei ouvindo a platéia gritar em êxtase. - Por que ele não usa o poder dele de fazer videiras crescerem e prenderem as duas bestas no chão?

— Porque se eles fizerem isso são mortos pelos arqueiros que ficam no perímetro da arena - Zöe respondeu.

— Eu não entendo por que você está aqui e não com os outros, nas celas. Você tem algum poder? - perguntei enquanto os tigres e os corpos eram recolhidos e o apresentador narrava o próximo jogo. O nosso jogo.

— Não - ela respondeu enquanto eu colocava o capacete e os portões se abriam. - Mas os legionários acham que sim.

Corremos para fora. O elmo protegendo meus ouvidos dos gritos e meus olhos do sol. Ou então eu já estava ficando acostumado com todos os fatores desorientadores do Coliseu. Pela primeira vez, percebi que a platéia não nos vaiava. Olhei para as meninas, prestando atenção no que o apresentador falava.

— Apresento a vocês a novata Águia! - Thália ergueu a espada e a multidão gritou em êxtase - A veterana Lua! - Foi a vez de Zöe erguer o arco e receber os aplausos - E o novato Caríbidis! - ergui a espada, imitando as garotas e ouvi Thalia rir atrás de mim. Maldito seja aquele apresentador. Caríbidis fora uma ninfa um dia. Preferia ser chamado de Hipocampo - Os três estão aqui para desafiar o todo poderoso e o invicto Atlas!

Os portões do lado oposto da arena se abriram, revelando um homem que mais parecia um gigante. A pele cor de bronze tinha um brilho oleoso e era recoberta de cicatrizes dos mais diversos formatos. O cabelo negro era longo e ensebado e a barba também preta, era espessa e coberta de restos de comida. Usava a típica fralda dos gladiadores e uma ombreira coberta de espinhos. A minha ombreira. Nas mãos, uma espada e um escudo novos em folha. Ele caminhava a passos lentos na nossa direção, os olhos miúdos analisando cada um de nós e provavelmente concluindo que não tínhamos a menor chance contra ele.

— E então? - perguntei me colocando em posição de combate - O que fazemos agora?

Zöe respondeu dando um passo a frente e colocando uma flecha no arco. Seus olhos focados no alvo: o peito de Atlas. Tencionou a corda ao máximo, mirando a seta com calma. Três segundos ela esperou, arco e flecha de prata prontos. Três segundos que pareceram três horas. E então ela soltou a corda e o projétil percorreu um caminho reto e certeiro na direção do coração do gladiador. Mas ele tinha outros planos para aquela seta, e a desviou com a espada, soltando um grito grutal e partindo para o ataque como uma manada de touros de colchis.

— Agora ele ficou irritado! - Thalia gritou saindo do caminho dele. Eu fiz o mesmo, mas isso não impediu que ele viesse para cima de mim.

— Ah! Legal! O cara quer me matar. Nem fui eu que atirei a flecha! - resmunguei quando aparei um golpe de espada dele que fez meu braço tremer.

— Você está sem escudo, Percy! - Thalia gritou por cima da comemoração da multidão. - É um alvo mais fácil!

Ela atacou, mirando as costas desprotegidas, mas ele se protegeu do golpe com o escudo e a empurrou com ele para trás, fazendo-a rolar no chão para longe dele. E me deixando totalmente sozinho para enfrentá-lo. Engoli em seco e comecei a minha defesa. Não era a toa que o cara era invicto. Era um ótimo espadachim, muito melhor do que todos os outros que eu tinha enfrentado. Seus golpes eram firmes e fortes, o que me desestabilizava o tempo todo.

— Percy! Cuidado! - Thalia gritou tarde demais.

Atlas acertou seu escudo na lateral direita do meu rosto, me jogando longe. Sangue começou a escorrer da minha testa pelo meu rosto, dificultando a minha visão. Tentei me erguer, mas o mundo estava girando rápido de mais ao meu redor. Olhei para frente, desesperado, mas percebi que o gladiador não estava vindo na minha direção, mas sim, enfrentava Thalia em uma dança mortal de escudos e espadas. Senti uma mão no meu ombro e me virei para trás afobado. Era Zöe.

— Está tudo bem? - ela perguntou, mas eu mal consegui ouvi-la por causa do zumbido em meu ouvido.

— Estou tonto - resmunguei tentando me erguer.

— Fique deitado, por enquanto, Percy - ela falou. - Espere a tontura passar para voltar ao combate.

— E se não passar? - perguntei alcançando a minha espada.

— Então reze para os deuses para que vençamos essa luta - ela respondeu caminhando na direção da batalha e colocando uma flecha no arco.

De repente, o outro ombro de Atlas, aquele que não tinha proteção nenhuma, ganhou três espinhos de prata enfeitados por penas brancas. O gladiador urrou de dor, se virando na direção da caçadora, que se aproximava dele correndo.

— Ah não, você não vai! - ouvi Thalia gritar ao acertar a cabeça dele com a parte chata da espada - Sua luta é aqui comigo, porco-espinho!

Quase pude ouvir ele bufar de ódio enquanto se voltava na direção da filha de Zeus e retomava o combate, dessa vez com mais fúria.

— É luta que você quer? - ele berrou. - Então é luta que eu vou te dar! - Ele acertou Thalia com o escudo, jogando ela do outro lado da arena. Quis chamar por ela, mas mordi a língua. Preferia que ele pensasse que eu estava morto ou desmaiado.

Atlas então se virou para Zöe, bem a tempo de levar uma nova flechada no mesmo braço de antes. Dessa vez ele apenas grunhiu e partiu para cima da caçadora, que se jogou no chão para desviar de um golpe de espada. Com velocidade e graça, ela puxou uma flecha da aljava e atirou, mirando o olho do homem. Este, porém, desviou a seta com sua espada e o projétil veio se cravar diretamente na batata da minha perna.

— Argh! - grunhi agarrando a perna ferida e acabando com qualquer disfarce que eu tivesse conseguido criar anteriormente. Zöe se virou na minha direção para me olhar no mesmo instante em que Atlas armava um novo ataque. - Zöe, cuidado!

A hespéride foi atingida em cheio pelo braço do gladiador e caiu rolando no chão de areia. Vi Thalia na outra extremidade do pátio se erguer com dificuldade e partir para o ataque. Eu até tentei fazer o mesmo, mas andar com uma flecha trespassada na perna não é muito fácil. Ouvi o som de metal contra metal, quando as espadas da filha de Zeus e de Atlas se chocaram. Eu me foquei em quebrar a seta e arrancá-la da minha perna o mais rápido possível. A dor insuportável dessa atividade, porém, tinha outros planos para mim, e me fez diminuir o ritmo de remoção. Ela também nublou os meus pensamentos durante o processo, por isso a única coisa que eu lembro é o sangue que veio depois, escorrendo pela minha perna aos borbotões e tornando a minha sandália pegajosa.

Pus-me de pé e caminhei em direção ao combate. Cada passo causava uma dor aguda no local da ferida, tornando quase impossível andar. Era como se, cada vez que eu colocasse o pé no chão, a cabeça de cobra do rabo da Quimera desse uma mordida na batata da perna. Eu me aproximei lentamente dos dois combatentes, o mais silencioso possível (não que isso fosse um problema, os gritos frenéticos da multidão que nos assistia já eram suficientes para encobrir qualquer ruído que eu fizesse).

Meu plano era simples. Chegar por trás dele e atravessá-lo com a minha espada. Fácil, não? Bom... Até podia ser, mas a sorte não estava do meu lado hoje e, por conta disso, Atlas conseguiu prever meu movimento (ainda não sei como, ele estava de costas para mim o tempo inteirinho!) e, antes que eu pudesse chegar perto o suficiente para atingi-lo, ele me atacou. Ao tentar aparar o golpe, minha espada foi jogada longe e, para escapar daquele gladiador monstrengo, tive que dar uma cambalhota para fora de seu alcance e correr até a minha espada, o que não fez nada bem para a minha perna ferida. Olhando pelo lado positivo, eu não tive que correr de volta para a luta, já que Thalia fez o favor de empurrá-la até mim. Amigos servem para isso, certo?

Acertando golpe atrás de golpe, a filha de Zeus fez o gladiador recuar um passo depois do outro. Ela realmente estava enfurecida. Eu ainda estava ajoelhado, recuperando o fôlego e me preparando psicologicamente para a dor que eu sentiria ao levantar, quando Atlas tropeçou nos próprios pés, ou foi atingido no nariz pelo escudo de Thalia. Não tenho certeza de qual dos dois, já que ele estava de costas para mim. O que importa é que ele caiu na minha direção e eu vi nisso uma oportunidade de acabar com a luta. Ok, ok. Eu só ergui a espada para me defender do peso morto e gigante que caia na minha direção, pronto para me esmagar.

Com os olhos fechados, esperando morrer esmagado, senti o sangue do homem escorrer pela minha mão. Suspirei aliviado e, sem consegui suportar o corpo gigante do gladiador mais um segundo sequer, joguei-o para o lado, puxando a espada para fora de suas costas. A platéia berrava em êxtase, mas eu estava surdo para ela. De repente percebera que Zöe não tinha se levantado desde a hora que fora jogada para longe por Atlas. Thalia me ajudou a me erguer do chão poeirento e coberto de sangue.

Uma troca de olhares rápidos foi o necessário para que corrêssemos até a figura atirada no chão com respiração ofegante e as mãos apertadas contra a lateral do corpo, os dedos já começando a ficar vermelho.

— Zöe - Thalia chamou ao se ajoelhar ao lado dela, afastando o cabelo do rosto da menina.

A menina abriu os olhos. Ela estava assustada, mas olhou para mim preocupada.

— Percy - ela ofegou - Sua perna...

— Está ótima, não se preocupe - menti. - Foi só um arranhão. Vou ficar novo em folha em dois dias.

— Eu sinto muito - ela sussurrou.

— Deixe isso para depois, Zöe - Thalia falou com voz chorosa. - Vamos te levar para a enfermaria. Eles poderão cuidar de você lá...

Mas a garota não nos ouvia mais. Ela olhava para algo - ou alguém - muito além de nós. Seus olhos estavam vidrados bem ao meu lado, e eu temi que houvesse outro gladiador ali, mas quando virei, não encontrei nada.

— Minha senhora... - ela sussurrou. - A senhora veio...

Olhei para Thalia, confuso, mas ela não parecia estar entendendo mais do que eu. Ficamos os dois olhando do lugar vazio ao meu lado para o rosto branco da garota. Zöe voltou os olhos para o céu azul, onde o sol começava a se por e uma luz alaranjada o coloria.

— As estrelas... Não consigo vê-las.

Tencionei a mandíbula e abaixei os olhos, o sangue dela banhava a areia próxima ao meu joelho, deixando-a em um tom carmim. Não sabia como ela tinha se ferido, mas tinha certeza que aquilo tinha sido culpa de Atlas. Se aquele cara não tivesse morto, eu ia arrumar um jeito de matá-lo vinte vezes das mais diferentes formas. Uma brisa fresca soprou pela arena e a caçadora sorriu, os olhos ainda encarando um céu mais distante do que o nosso.

— As estrelas... - ela sussurrou por fim. - Posso ver as estrelas novamente, minha senhora.

E então, em nossa bolha que nos isolava do grito da multidão, fez-se silêncio. A respiração de Zöe cessou e seus olhos perderam o brilho enquanto encaravam o céu. Thalia começou a chorar, mordendo a mão para evitar os soluços. Lágrimas de ódio travaram a minha garganta e arderam nos meus olhos. Ela era mais uma. Mais uma que morria nessa arena. Senti o ódio fervilhar em meu sangue, mas me controlei ao me lembrar dos arqueiros no perímetro da arena. Não queria ser o próximo a morrer. Iria sobreviver, por todos aqueles que tinham morrido e pelos que ainda iam morrer naqueles jogos doentios. Ergui os olhos para o céu e o que eu vi fez brotar um sorriso nos meus lábios. Uma constelação nova em folha brilhava sobre a arena. Uma jovem garota empunhando um arco retesado. Cutuquei Thalia, fazendo-a olhar para cima, o que causou mais choro por parte da menina.

Os portões se abriram e guardas apareceram para retirar os corpos. Enquanto arrastavam o cadáver de Atlas, pude ver que a proteção de seu braço era feita de placas de metal e que, uma delas, estava levantada em uma ponta afiada coberta de sangue. “A arma do crime” pensei me erguendo com dificuldade. Observei, com pesar, o corpo de Zöe ser carregado para longe de nós, para nunca mais ser visto. Olhei para o céu uma última vez, observando a constelação da caçadora, e caminhei manco na direção dos portões abertos que nos esperavam. Arranquei, com ódio, o elmo da minha cabeça e o segurei embaixo do braço.

Ao entrar para as catacumbas, reparei em duas crianças cercadas de guardas e espremidas contra a parede lateral do túnel que levava para as profundezas do Coliseu. Uma menina e um menino. Ambos de cabelos negros e pele cor de oliva. Poderiam ser gêmeos, se não fosse pela diferença de idade. “Novos prisioneiros” pensei com ódio. Queria arrancá-los dali. Salvá-los do destino que os aguardava. Mas sabia que não podia. Em vez disso, me contentei em encarar os dois nos olhos. O garoto, que eu supunha ser o mais novo, me olhava impressionado, mas a única coisa que eu sentia naquele momento era vergonha.


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Notas finais do capítulo

E então? Expectativas? Opiniões? Dicas? Deixe tudo nos comentários. Sou uma pessoa legal. Não descobri ainda como morder através da internet, então podem ficar tranquilos.
O próximo capítulo já está em andamento, mas não garanto que ele seja postado tão cedo. Por isso mesmo, até o próximo século! (brincadeira, até o próximo capítulo!)



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