Diferente das outras gestações, Hermione estava sentindo-se muito bem. Sem enjoos, tonturas ou qualquer outra indisposição. O que a impedia de sentir-se inteiramente feliz e animada eram suas incógnitas. Ela estava certa de que Ron não merecia nem um pouco das suas lágrimas e sentimento de culpa, afinal ele causou a maior parte de tudo. Porém, Ron estava realmente disposto a recuperar o amor dela e reparar os erros cometidos, e isso deixava Hermione ainda mais dividida, se deveria escutar sua razão ou seu coração.

–Você vai ver o papai nadar, mãe? –perguntou Rose animada em finalmente ver o pai competir.

–Não posso, querida. –disse ela tentando não magoar a filha. –Eu tenho que trabalhar.

–Mas hoje é sábado e se eu não tenho escola, você também não tem trabalho. –argumentou a menina, certa do que dizia. –O papai ficaria muito feliz se você fosse.

–Desculpe, mas eu tenho coisas de gente grande para terminar.

–Gente grande é tão complicada. –disse Rose emburrada.

Hermione realmente tinha uns processos para ler, mas não era nada tão urgente que não pudesse esperar algumas horas. O que estava a impedindo de ir era o seu velho e irracional orgulho.

Há meses Ron treinava por esse dia e finalmente estava prestes a acontecer. Toda a sua família estava na arquibancada para apoia-lo, menos Hermione. Ele já esperava por isso, mas uma pequena esperança era nutrida de que Hermione apareceria para vê-lo, queria que ela fizesse parte deste dia tão especial.

A prova estava prestes a começar, Ron olhou ao seu redor na esperança de Hermione estar lá e para a sua surpresa, ela andava apressada em direção à piscina. Por um momento seus olhares se encontraram e Ron não pode deixar de sorrir, sendo retribuído por um mesmo sorriso vindo da esposa. Ron continuou a olhando, mas agora para o seu ventre que começava a exibir uma leve saliência, ali estava seu terceiro filho e Ron daria o seu máximo para ganhar aquela medalha por eles.

Tudo aconteceu muito rápido, segundos após cair na piscina, Ron havia cruzando e vencido a prova com o melhor tempo que já fizera desde que começara a treinar. Ver a sua família orgulhosa e receber a medalha que tanto sonhou, Ron não poderia sentir-se mais orgulhoso e satisfeito.

Molly Weasley havia preparado uma festa em sua casa para a comemoração da primeira competição e medalha do filho.

–Parabéns, Ron. –falou Hermione ao ficarem sozinhos durante a festa.

–Obrigado. –agradeceu ele sem graça. –E obrigado por ter ido me ver, eu fiquei muito feliz em vê-la.

–Eu prometi, lembra? –disse ela sem disfarçar o tom triste que suas palavras carregavam. –Prometi que iria apoia-lo e estaria lá para vê-lo ganhar essa medalha.

–Você estará também nas próximas? –perguntou ele de repente.

–Próximas?

–Depois da prova o Coronel e o treinador da equipe de natação da Inglaterra me fizeram uma proposta. –explicou Ron os detalhes. –O treinador quer que eu faça parte da equipe, eu seria um atleta representando o meu país em competições. Mas para isso acontecer, eu preciso pedir dispensa do exército para me dedicar totalmente à natação.

Hermione foi pega de surpresa, pensou que tudo não passava de um meio do marido se recuperar. Servir ao exército era algo que desde que o conheceu, Ron sonhava em fazer e não o via fazendo outra coisa fora ser militar.

–Hermione? –ele a chamou após longos minutos em silencio. –Eu preciso da sua opinião.

–Minha opinião? –ela não entendeu. –O que você quer que eu diga?

–Não sei, talvez se é o certo a se fazer ou não. Você sempre me deu bons conselhos, ninguém mais me conhece melhor que você.

–Ron, eu não posso dizer o que você deve ou não fazer.

–Eu sei, obrigado por me escutar e desculpa por ter te magoado, mais uma vez. – Ron disse cabisbaixo, tirando sua medalha do bolso e entregou a esposa. –Tome, é um presente de desculpa para você e o bebê.

–Existe um presente de desculpa? –perguntou Hermione com lágrimas nos olhos.

–Não sei, mas é o que vocês merecem, depois de tudo que eu fiz e disse. –ele esboçou um sorriso triste antes de tocar na barriga dela. –Eu sinto muito por ter estragado tudo, se você me desse mais uma chance, eu prometo não te decepcionar.

Eles ficaram em silencio por um tempo, Ron ainda permanecia com sua mão acariciando a barriga da esposa. Hermione travava uma luta dentro de si, entre seu racional e emocional. Seu emocional dizia para ela esquecer tudo e se jogar nos braços dele, já o racional a lembrava das palavras ditas por ele que a machucaram tanto e que nesse momento precisava pensar na sua vida e em seus filhos.

–Eu te amo, Ronald Weasley. –ela por fim falou, colocando a sua mão sobre a mão dele em sua barriga. –E eu quero que esse bebê também cresça com uma família unida e o pai presente, mas eu não posso fazer tudo sozinha. Nos últimos anos eu tentei, juro que tentei o meu máximo, tudo para nos manter juntos. E o que eu ganhei com todo esse esforço? Nada além de palavras e atos que me machucaram de um jeito que nunca havia sentido.

–Desculpe, eu... –Ron tentou falar, mas a esposa não o deixou.

–Eu preciso dizer tudo o que guardei nos últimos anos. –Hermione continuou a falar, mantendo a calma e o tom de voz baixo, sem chamar a atenção dos presentes na festa. –Você não sabe o que eu passei a cada vez que o telefone tocava quando você estava fora metido em alguma guerra! Noites sem dormir, porque não falava há dias com você, tendo os piores pesadelos e em todos eu terminava viúva e sozinha com as crianças. Ou quando as crianças estavam doentes e eu precisava do meu marido ao meu lado dizendo que tudo ficaria bem. Acordar no meio da noite e poder te abraçar, não me sentindo sozinha.

Ron conseguia ver a dor em cada palavra do desabafo de Hermione, podia sentir toda a preocupação e angustia que ela passara por sua causa. Sabia que não fora fácil para a esposa ter que viver e cuidar das crianças sem ele ao seu lado, mas nunca escutara isso dela. Finalmente, Hermione estava abrindo seu coração.

–Quando bateram na porta da nossa casa dizendo que você estava desaparecido, foi como se um dos meus pesadelos tornou-se realidade. Então te encontraram e eu não conseguia acreditar, porque era muito bom e surreal para ser verdade. –ela não continha mais as lágrimas e as deixava escorrer pelo seu rosto enquanto falava. – Quando me falaram que você teria que amputar a perna a primeira coisa que passou na minha cabeça foi “obrigada, assim ele nunca mais irá para qualquer maldita guerra!”. Eu só não sabia que eu precisaria passar por tudo isso.

–Você se arrependeu? –perguntou ele.

–Do quê? –Hermione não entendeu a pergunta.

–De ter se apaixonado por mim, de ter se casado comigo, de ter deixado seus sonhos e projetos profissionais para trás, da família que temos, de ter cuidado de mim nos últimos meses. –disse Ron olhando diretamente para os olhos castanhos dela que tanto amava. –De tudo, Hermione.

–Não, Ron. –respondeu ela retribuindo o olhar e acariciando o rosto dele. –Nem por um segundo eu me arrependi. E você?

–Nunca. –disse ele antes de finalmente beija-la.

A sensação deste beijo era parecida com a sentida no primeiro beijo, ainda adolescentes na porta da casa dos pais de Hermione. Naquele momento, eles souberam que não poderiam passar mais nenhum dia de suas vidas sem desfrutarem desse beijo. Anos se passaram, tiveram seus altos e baixos, obstáculos a serem superados, perdas e ganhos, tudo os deixou ainda mais fortes e unidos.

–Vamos para casa? –perguntou Hermione depois do beijo, ainda abraçada a ele.

–É tudo o que eu mais quero. –respondeu ele depositando um beijo carinhoso na testa dela. –Vou chamar as crianças.

Ron teve uma noite de sono como há muito tempo não tinha, em sua cama estava de um lado Hermione dormindo nos seus braços e do outro seus filhos. Antes de se deixar levar pelo cansaço, Ron tomou uma decisão sobre a próxima etapa da sua vida.

Na manhã seguinte, Ron foi o primeiro a acordar, sua esposa e filhos ainda dormiam ao seu lado. Não estava sonhando, tudo era real e eles estavam ali. Levantou-se da cama e se arrumou sem fazer barulho para não acorda-los, antes de sair deixou um breve bilhete para Hermione não se preocupar sobre o seu sumiço.

–Já cedo, Tenente Weasley? –perguntou o Coronel Wilson ao vê-lo nadando. –Achei que iria descansar depois de ontem, pensou no que eu te disse?

–Foi para isso que eu vim cedo nadar. –respondeu Ron se aproximando da borda da piscina para que pudessem conversar. –E eu cheguei a uma conclusão.

–Pois bem, diga Weasley. –o senhor estava ansioso pela resposta.

–Eu vou apostar na natação. –disse ele sem rodeios. –O senhor e o treinador disseram que eu tenho talento e meus dias no exército acabaram de qualquer jeito.

–Sim, nós temos certeza que seu talento pode trazer muitas medalhas para o país. –o Coronel se abaixou para ficar a altura de Ron. –Mas não pense em aceitar a nossa oferta apenas porque é a única que lhe resta.

–Não, senhor. Eu não pensei desse jeito. –explicou Ron. –Desde pequeno meu sonho era entrar no exército, assim como meu pai, e eu fiz isso. Salvei inocentes, protegi meu país e seu povo, perdi amigos e me feri. Acho que cumpri meu dever como militar.

–Pode ter certeza que sim, Ronald.

–Essa oferta mexeu comigo de um jeito que há anos nada mexia. Sempre gostei de desafios e provar que sou capaz, esta na hora de fazer o mesmo, provando que seu capaz de representar meu país nadando com o mesmo orgulho que senti quando estava na guerra.

–Você é um bom homem, Weasley. –o Coronel o parabenizou. –Poucos teriam essa coragem, ficar acomodado no quartel e reclamando do ferimento seria mais fácil.

–Eu sei, já fiz isso até ver que de nada adiantaria. –sorriu Ron. –Só faria me afastar das pessoas que mais amo e vê-los todos os dias felizes é o que me da coragem e força para seguir.

–Continue com essa coragem e força e o veremos na próxima Paraolimpíada.

–Pode apostar que sim, esse é o meu objetivo. A lista de pessoas que amo e me ajudaram é grade e preciso recompensa-los com várias medalhas.

Depois de nadar um pouco mais, Ron foi para casa. A piscina agora seria o lugar que passaria a maior parte do seu tempo, porém sua esposa e filhos lhe esperavam em casa e Ron agradeceria todos os dias por poder voltar para eles.