Parola escrita por


Capítulo 20
Quando em tortuga, faça como os piratas


Notas iniciais do capítulo

AHOOOOOOOOY MARUJOS! TÔ SUPER FELIZ PELOS RETORNOS DOS ÚLTIMOS CAPÍTULOS, SÉRIO, AMO VOCÊS! Muito obrigada por todo o apoio de vocês até aqui! Ah, nesse capítulo eu cito Salmagundi, mas sem stress, não é nada muito cabuloso, ok? É só um tipo de salada nojentíssima que os piratas comiam, haha.



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Rastejar sobre as raízes doía tanto que Benjamin mal podia enxergar o caminho à sua frente. Era guiado por um instinto de sobrevivência, uma memória desbotada que trazia um calor familiar. O calor do sorriso do seu pai. Em outra ocasião, ambos estiveram naquele arquipélago.

– Essas ilhas possuem muitos segredos, filho.– Ben lembrava-se da forma como seu pai sussurrou as palavras, como uma confidência importante demais para um garoto de oito anos. O pequeno Benjamin jurou não contar os tais segredos para ninguém, a curiosidade refletida no brilho dos seus grandes olhos. Seu pai o colocou em seus ombros e, dirigindo-se à grande árvore, começou a discursar.

– Você vê as raízes? Indicam uma grande profundidade, e esse é o segredo da ilha.

Naquela época o menino não sabia o significado de profundidade, por isso continuou em silêncio, esperando uma explicação mais detalhada. Mas, ao invés de continuar a falar, o pai contornou a grande árvore, colocou o filho no chão e bagunçou os seus cabelos negros.

– Preste muita atenção, Ben.– Ele instruiu, enquanto tateava o chão coberto de areia e raízes. Por fim, encontrou um fino fio de ouro, enterrado e quase imperceptível. Puxou o fio delicadamente, a outra extremidade desaparecia no tronco da árvore. Um pequeno ruido emanou da árvore, quase inaudível graças ao som do mar. Contudo, o som aumentou gradativamente, seguido de uma vibração também crescente. As folhas chacoalharam, parte do tronco se partiu com um ruído ensurdecedor e então tudo se aquietou novamente. O homem, tomando o filho pela mão, caminhou em direção à fenda no tronco.

Agora, o sangue e o suor em sua pele secavam, a areia arranhava sua pele e, a cada batida em uma raiz, seu corpo dolorido pedia socorro. Rastejar com pés e mãos atados era, sem dúvidas, um atraso na sua jornada. A maré começava a subir e, com desespero, Benjamin sentiu pequenas ondas molharem o seu corpo. Utilizava os joelhos e cotovelos, que já ardiam graças ao atrito, para chegar o mais rápido o possível até o lugar que seu pai havia apontado. Precisava encontrar o fio dourado.

☠☠☠

Trad e Po entraram na taverna, farejando no ar o cheiro de comida fresca e bebida farta. Uma grande mesa estava posta com caldeirões de sopas e ensopados,linguiças, bandejas de frango, javali e boi assados, torta de rins, Salmagundi, guizados, grandes queijos e frutas tropicais. O cheiro da comida atingiu-os como golpes no estômago. Só agora haviam percebido o quanto sentiam falta de comida de verdade. As rações limitadas do Sangue fizeram com que eles se esquecessem da comida quente, suculenta e saborosa. Serventes mal-vestidas caminhavam pelo recinto, distribuindo e recolhendo canecas de cerveja, rum e vinho. Sorriam simpática e convidativamente para os clientes que, atrevidamente, tocavam seus corpos e despejavam galanteios

Os gêmeos se sentaram à mesa e logo se atiraram aos deliciosos pratos. A fome, atiçada pelos sentidos, era tanta que dispensaram os talheres e boas maneiras. Enchiam ao máximo suas bocas sem se preocuparem com queimaduras, combinações e engasgamentos. Uma servente de cabelos loiros trançados e batom vermelho nos lábios colocou duas canecas sobre a mesa, estendendo a mão direita na direção dos gêmeos, à espera do pagamento.

– Não pensem que é de graça, docinhos.

Ambos, ainda com as bocas cheias, enfiaram as mãos nos bolsos, tirando moedas douradas e entregando-as à moça. Po demorou o seu olhar nos quadris da servente, que saiu com uma piscadela. Logo, ambos haviam voltado a comer vorazmente, bebendo a cerveja para empurrar a comida goela abaixo.

Os demais tripulantes do Sangue tinham o mesmo comportamento, vivendo cada segundo em terra como o último. Eles riam, gritavam, cantavam, contavam histórias e mentiras uns para os outros, gastando seus butins em comida, bebida e jogatinas.

Conforme a noite se tornava madrugada, prostitutas apareciam pela taverna, se exibindo vulgarmente, rindo alto e se oferecendo para os homens, que agora, de barriga cheia, bebiam e jogavam, trocando histórias sobre cobras gigantes e sereias sedutoras. Po se despediu do irmão, na companhia de três ruivas de idades próximas, provavelmente irmãs.

– Tem certeza de que não vai querer uma também?– Ele zombou, rindo alto antes de beijar a irmã mais velha demoradamente, os dedos caminhando sobre o seu decote.

Para Trad, que começava a ser tomado pelo sono, uma cama confortável bastaria naquela noite. Saiu da Taverna de Miss Roberta cambaleando, embriagado e feliz, quando tropeçou em um corpo jogado no chão. O choque foi seguido de um gemido feminino.

Agachando-se para ver melhor, Trad percebeu que ali, junto à lama e sujeira havia uma mulher. Seu olho direito estava roxo e inchado, sangue escorria dos seus lábios. Os braços nus tinham cortes e hematomas, lágrimas e poeira cobriam o seu rosto e a sua pele ardia em febre. O rapaz, mesmo dificilmente aguentando a si mesmo, pegou a garota e, desajeitadamente, jogou-a sobre o ombro. Mal percebeu que, naquela posição, a saia dela ficava levantada.

Zanzou tonto pelo peso e pela bebida até encontrar uma hospedaria. O dono olhou o estranho casal dos pés à cabeça e, dando de ombros, deixou-os entrar. Aquela não foi a situação mais inusitada do seu dia.

– Jovens!– Resmungou antes de pigarrear. Trad então percebeu o que o homem quis dizer com o comentário.

– Senhor, não é nada do que está pensando, eu a encontrei jogada no chão e...– começou a explicar, mas o velho ergueu uma mão para que se calasse.– Só não quero saber de gritaria na minha hospedaria, não me importa o que vocês piratas gostam de fazer, só não acorde os outros hospedes.

Trad revirou os olhos. Convencer o homem de que os dois não eram um casal seria impossível e aquela moça precisava de cuidados urgentes. Subiu as escadas de madeira com passos largos, rumo ao quarto vazio.

Uma cama de casal com lençóis encardidos e travesseiros de palha era iluminada por um velho candeeiro. Insetos eram atraídos pela luz e o ar úmido aquecia ainda mais o aposento. Uma tina cheia de água e dois baldes estavam no canto do quarto, próximos à janela.

Trad observou a garota por uns instantes. Não sabia se ela estava acordada ou adormecida. Não sabia nem se ela estava viva. Pousou a mão sobre sua testa por alguns segundos e, constatando o calor, decidiu tomar algumas providências. Não sabia o motivo, mas sentia que devia cuidar dela.

Desembainhou a sua faca de cabo preto, cortesia do capitão Casto, e a utilizou para rasgar um grande pedaço de pano da saia da moça. Sua consciência ordenou que não olhasse para as pernas dela, porém ele não pode se conter. Devagou por alguns segundos antes de voltar para a ação. Molhou o pano na água da tina e limpou o rosto, braços e pés da sua paciente. Percebeu que, apesar de suja e maltrapilha, tratava-se de uma garota muito bonita: cabelos castanhos e volumosos, lábios cheios e traços fortes. Seu nariz, meio torto, era charmoso e harmonizava bem com o rosto. Trad traçou o arco da sobrancelha da moça com o dedo indicador, fascinado por descobrir um novo tipo de beleza. Quem seria essa garota? O que lhe havia acontecido?

Decidiu procurar o dono da hospedaria, tentar desfazer o mal entendido e conseguir algo para a garota comer. Encontrou o homem baixinho no mesmo lugar onde havia o visto pela última vez.

– Problemas no paraíso, hein jovem?– Perguntou o proprietário, sorrindo presunçosamente.

– Na verdade, senhor- Trad tentou responder educadamente, coçando a cabeça– eu nem mesmo a conheço. Encontrei-a na rua, machucada e inconsciente. Acho que uma boa refeição pode animá-la um pouco.

O velho não pareceu convencido, mesmo assim concordou em ceder a última tigela da sopa especial de sua esposa, uma mistura de restos de carne e vegetais. Trad segurou a tigela cuidadosamente e subiu as escadas mais uma vez, abriu e fechou a porta do quarto com cuidado para não fazer muito barulho. E então foi acertado por uma pancada na cabeça.

☠☠☠

Túlio foi acordado por vozes e movimentação no porão. Wade libertava Owen de suas correntes, enquanto Zaki apontava uma espada para o prisioneiro. Túlio lembrou-se do destino dos prisioneiros que chegavam até o porto, eram vendidos como escravos.

– Não se esqueça da nossa conversa.– Disse o loiro a ele, antes de seguir tranquilamente pelo porão, em direção à escada. Zaki e Wade se entreolharam, porém nada disseram. Já estavam espantados o suficiente por saber que aquele prisioneiro magricela havia sobrevivido por tanto tempo. Certa vez, ao tomar conhecimento de que Owen ainda estava vivo, Casto comentou que suspeitava de que algum marujo o estava alimentando. Agora, o capitão negociava o escravo com um rico comerciante.

O homem oferecera uma quantia muito além do que o escravo magro e doente valia. O capitão, ambicioso como sempre havia sido, tentou ainda aumentar o preço. O comprador concordou com a quantia estipulada sem reclamações. Pagou pelo escravo com sacos de moedas douradas, sorrindo como se o frio da noite não o incomodasse, como se realmente fosse o dono de todo aquele dinheiro e não se importasse com o destino que ele teria. Forçava uma expressão feliz para que o medo que sentia daquele homem não transparecesse em sua face. Então ele avistou Owen, ele estava sendo conduzido por dois homens, embora não apresentasse resistência alguma. Sentiu-se mal por vê-lo tão debilitado. Era deprimente perceber o quão longe ele estava indo com o plano que forjaram juntos.

– É um prazer negociar com o senhor, Miguel.– Casto disse, apertando sua mão com um sorriso amarelo escancarado.


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