The Mistake Of Chris escrita por Realeza


Capítulo 19
Three models of somebody, chalk and fountains


Notas iniciais do capítulo

* Três modelos de alguém, giz e fontes
Músicas: Art Of Letting You Go - Tory Kelly | Another World - The Vamps | Imagination - Shawn Mendes
O CAPÍTULO 19 TARDA MAS NÃO FALHA.
E É UMA CARTA. E TEM MOMENTOS LEGAIS E MEIO BAD E MEIO ROMÂNTICOS E EU TAVA COM SAUDADES DISSO AQUI ♥
Chega de caps lock mesmo que eu esteja um pouco eufórica. Eu não vou me prolongar nas desculpas até porque eu nem tenho nenhuma boa.
Eu estava com um probleminha de seis capítulos acumulados e um bloqueio de só conseguir escrever a mão (somado a preguiça que dá de digitar), mas finalmente estou publicando esse capítulo após 65 dias. WOW. Muito tempo, sério. Me perdoem. Só que parece que aconteceram mil coisas nesses dias e eu perdi um pedaço de mim no meio.
Enfim, espero que curtam.
(Na resposta de algum comentário, me perguntaram sobre personagens LGBT, e bem, hoje vocês irão saber de um.)



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Querida Hannah,

Amanhã faz um mês que não te escrevo. Sinto muito por isso, de verdade. Eu não sei muito o que aconteceu para que eu simplesmente não escrevesse. Mas na verdade, muitas coisas aconteceram aqui dentro.

Eu te escrevi uma vez durante esse tempo, mas minha carta era deplorável. Tão deplorável que nem cheguei a enviá-la. Foi no dia em que uma garota aqui tentou se matar. Na minha frente, Hannah. Na frente de um monte de outras pessoas. No próprio aniversário. Era mórbido demais para uma carta pra você.

Hoje foi um dia incrível. Steve veio me visitar e trouxe o namorado para me conhecer. Não, eu não escrevi errado. Steve tem um namorado. Ele se chama Gregg e foi muito mais legal comigo do que a maioria das pessoas é, sem todo um papinho idiota sobre o quão ruim deve ser tudo isso sobre mim.

Na terça, Steve me contou sobre o namorado e sobre ser gay. Existe uma maneira de reagir a isso? Um manual que eu desconheço ou sei lá? Como era de se esperar, eu fiquei sem reação.

— Hm. Bom pra você. — digo, sem conseguir pensar em algo melhor.

— “Bom pra mim”? — ele contesta minha resposta, mostrando o quão ruim ela foi. — Quero saber o que você acha disso, de verdade.

— Sei lá o que eu acho, Steve. Você namora com quem quiser e estou bem com isso. — Meu irmão sorri para mim com essa resposta. Imagino o que ele esperava dessa conversa. Se esperava que eu surtasse e gritasse ou qualquer outra coisa do gênero. Não é todo dia que você se assume gay para o irmão esquizofrênico, não é?

— Quero que você o conheça. Vou trazê-lo na quinta para isso, ok? — falou, depois de uma longa pausa.

Então hoje, Gregg apareceu. Eu não sei porque, mas passei os dois últimos imaginando-o de mil formas. Não sei bem o que esperava, mas Gregg não é nada dos caras que imaginei. Me deixei criar três modelos de supostos namorados para Steve: 1- Um bad boy com direito a jaqueta de couro, moto e cabelo despenteado pelo capacete. 2- Ainda seguindo a ideologia de que os opostos se atraem, algum cara metido a modelo de revista adolescente por quem todas as garotas do bairro teriam uma quedinha secreta e suspirassem quando ele passa as mãos pelos cabelos, o que acontece basicamente a cada cinco segundos. 3- Um outro Steve, arrumadinho e certinho, feito de conselhos simpáticos, meio-sorrisos, camisetas polo e sapa tênis de diferentes tons de marrom.

Gregg tem a pele negra e cabelos cortados curtos, e usa uma jaqueta jeans como a de Jeff. Segura a mão de Steve e os óculos escorregam ligeiramente do seu nariz quando ele sorri.

E o mais importante, Gregg faz meu irmão feliz. Eu não sou nenhum perito em amor nem nada do tipo, mas dá pra notar isso na forma como eles se olham e como Steve fica levemente ruborizado ao contar sorrindo como foi que se conheceram, a mais de um ano.

Meu irmão parece verdadeiramente bem, e fico verdadeiramente feliz por ele. Acho que as vezes eu esqueço que as coisas não foram terríveis só pra mim. Steve teve que lidar com as mesmas merdas dos nossos pais, sem o apoio de um irmão mais velho como eu tive. E se saiu muito melhor que eu nisso, ainda por cima. Diz que, agora que Gregg terminou a faculdade, eles podem morar juntos, mesmo que Steve ainda esteja no segundo ano do curso. Os colegas insuportáveis com quem divide o apartamento e o fato incontestável que está completamente apaixonado por Gregg são fatores que o influenciam muito a tomar essa decisão e também se anime com a mudança.

Ele conta da faculdade e de como é um milhão de vezes melhor do que o ensino médio, de como vai sentir faltas dos amigos e as festas. Não consigo imaginar Steve nessas tais festas, se embebedando e com música alta, principalmente depois do histórico de alcoolismo do nosso pai, com todas as garrafas e latas de bebida vazias que amanheciam jogadas pelo chão.

Concordo com Gregg sobre o ensino médio ser uma merda, mesmo que tecnicamente eu nem tenha terminado o primeiro ano e esteja fugindo disso internado aqui. Tenho certeza que você me confirmaria isso, de qualquer forma. Mas sei disso só por conta da lembrança que tive ontem. Vou narrar para você.

Estou de frente para o quadro negro e sinto os olhares do restante da turma as minhas costas. Como se fossem milhares de fagulhas me atingindo e perfurando a minha pele e os músculos e entrando na minha corrente sanguínea, e indo até o meu cérebro e meu coração e meus pulmões e é por isso que eu não consigo respirar direito.

Puxo o máximo de ar que consigo e olho para os meus dedos, manchados pelo giz que seguro. A lousa parece gigantesca a minha frente, como se fosse uma muralha impossível de escalar. Se não consigo escalá-la, como raios vou resolver a maldita conta que nela está escrita?

Leslie Enoch arranha o quadro com cada traço que faz. O barulho do giz e das unhas compridas dela se arrastando enquanto escreve parece ensurdecedor e se une aos cochichos da sala e aos milhões de fagulhas nas minhas costas.

Olho para Leslie ao meu lado, com as sobrancelhas unidas em concentração para continuar a resolver o cálculo. Encara novamente a muralha a minha frente e a conta que nem mesmo comecei. Uma parte racional de mim fala que posso resolvê-la, mas ela praticamente sussurra baixo demais comparado ao todo barulho restante que vem da minha cabeça e invade a minha cabeça e tudo mais.

Deixo o giz escorregar e ele se despedaça no chão. Não consigo me abaixar para pegá-lo. Não consigo me mexer. Tudo o que consigo fazer é ouvir as vozes de Justin e Noah e todas as outras me chamando de fracassado. Lixo. Retardado. Otário.

Não consigo me mexer. É isso o que eu quero dizer ao Sr. Howard quando ele me manda sentar logo após gritar com o restante da sala para que eles fiquem em silêncio. Se eles estão em silêncio, por que ainda ouço todas essas malditas vozes? Ele me toca levemente no ombro num gesto que deveria ser reconfortante, mas que consegue me transportar para um novo nível de pavor. Me retraio ao gesto, o que considero uma evolução impressionante, já que não conseguia me mexer.

Leslie Enoch me encara com um misto de estranhamento e nojo estampado em seu rosto, e por um momento, tudo se silencia. Assim que seus olhos se cruzam com os meus, me livro do toque do Sr. Howard e me afasto em direção a porta. Só penso em me afastar de tudo aquilo. Por isso, corro.

É uma bela lembrança, não acha?

Desculpe a ironia, de verdade. É só que lembrar de coisas assim não é nada bom e acaba me estressando um pouco. E realmente não quero que isso aconteça depois de um dia bom. Vou recompensar isso com uma lembrança boa de verdade, de nós dois antes disso tudo sobre a minha doença.

Lembra-se de Charlie Kennedy? Eu espero que sim, e que os esforços de Claire tenham falhado durante esse último na que não te vejo e ele não seja seu atual namorado. Desde que Claire se tornou sua amiga na oitava série e descobriu que Charlie tinha uma paixonite por você, ela vem tentando juntar vocês dois.

Naquele ano, ela tentou armar uma espécie de encontro entre vocês convidando-os para ir a um parque aberto, daqueles com brinquedos e jogos de fichas. Acho que Claire já via filmes de comédia romântica demais para pensar em algo assim. Acontece que você nem se tocou das intenções dela, achando que era só um passeio entre amigos e me chamou para ir junto. Vamos destacar que nós ainda éramos bem inseparáveis nessa época, acabando com todas as chances do pobre Charlie, que ficou de canto a maior parte do dia enquanto nós nos divertíamos juntos e Claire ostentava uma expressão descontente fruto da sua tentaria frustrada de ser cupido.

O mais engraçado disso foi que você nem sequer percebeu, Hannah. Continuava a me arrastar para brinquedos decorados com luzes coloridas e gastando fichas em tentativas inúteis de jogos para ganhar prêmios. Me levou em uma das cabines da roda-gigante para ver todos lá de baixo, seu coração disparado tanto pelo medo de altura quanto pela nostalgia de estar lá em cima.

Quando descemos, meu braço sobre seus ombros e ambos com sorrisos estampados nos rostos, Claire parecia ainda mais brava conosco. Para ela, era Charlie que deveria estar abraçado com você. É claro que você também não notou isso, já que só enxergou a fonte d’água mais a frente, seu sorriso se abrindo mais ainda enquanto procurava pelos bolsos moedas restantes que não foram usadas na compra das fichas.

Seus pais haviam nos contado a história de como se conheceram anos antes, de como criaram essa mania juntos depois que o primeiro encontro foi desastroso e ele acabou jogando uma moeda numa fonte no caminho pra casa, pedindo que ela aceitasse sair com ele novamente. Daquele dia em diante, nós dois sempre repetíamos o gesto juntos. Naquela idade, Claire achava aquilo a maior besteira do mundo, e quando te viu passar reto por Charlie Kennedy para ir correndo para uma fonte velha comigo, me olhou como se fosse me matar.

Você beijou a moeda antes de pressioná-la sobre os meus lábios também, e só então a atirou, fechando os olhos enquanto fazia o pedido, como se aquilo o tornasse ainda mais real. Eu ainda lembro claramente de você fazendo isso, Hannah. De cada detalhe mínimo daquele momento, o modo como o sol batia no seu rosto e evidenciava as sardas que pontilhavam seu nariz e suas bochechas.

Eu já estive entre seus pedidos alguma vez, seu pensamento preso em mim enquanto alguma moeda afundava vagarosamente? Porque, Hannah, a única coisa que eu pedia era você.

Ficar revivendo isso mentalmente é uma mistura de sentimentos que ferra um pouco com a minha cabeça. São lembranças boas, é claro, mas só lembranças. E eu sinto falta de você demais, Hannah. Ainda sinto, mas parece que era pior nos primeiros dias. Acho que na minha segunda semana aqui, eu descobri que havia uma fonte na frente do primeiro prédio. Gritei por horas até que a Dra. Lee só tivesse duas opções: me levar até lá ou me sedar. Felizmente para mim, ela optou pela primeira. Eu passei vários dias indo até lá e jogando moedas, implorando para te ver e coisas do tipo, pedindo mais e mais moedas para qualquer um, incluindo pacientes externos que estavam indo para consultas. Acho que assustei alguns deles.

Não vou a fonte a meses e evito até mesmo olhar naquela direção.

Você já teve algum Pensamento Errado? A doutora Lee trabalha muito comigo sobre não ter mais Pensamentos Errados, porque eles não me fazem bem. Os Pensamentos Errados são quando eu fico imaginando coisas que eu não deveria, como ficar vendo Emma morta sobre a mesa metálica de algum necrotério. Ou pensar no que eu fiz. Ou imaginar coisas ruins que podem acontecer. Ela diz que as outras pessoas não pensam coisas assim e que eu também não deveria. Que eu devo sempre só pensar em coisas que realmente estão acontecendo, porque a minha doença já me deixa bastante confuso e eu não deveria piorar mais com os Pensamentos Errados.

Eu não quero piorar mais, mas as vezes é complicado bloquear esses pensamentos. Fico visualizando mil modos das coisas darem errado, principalmente quando tem algo bom como hoje, com Steve e Gregg.

Novamente, Hannah, os “e se” são torturantes.

Eu espero que as milhares de possibilidades, boas ou ruins, não te torturem como fazem comigo. Espero que as coisas boas te surpreendam e te façam feliz, mas não quero que esqueça de mim. Uma pessoa me disse esses dias que eu sou mais egoísta do que penso, e nesse minuto, sei que isso é um pouco verdade. Sei que é egoísmo querer que você ainda goste de mim e se lembre de mim e me ame, porque tudo isso vai de alguma forma te fazer mal já que possivelmente não vou nunca mais te ver. Mas quero isso, Hannah. Me desculpe por querer, mas quero que esse sentimento seja reciproco já que ainda gosto de você e ainda me lembro de você e ainda te amo a cada dia que passo aqui dentro, sem que nada nem ninguém possa mudar isso. Eu preciso disso. É tudo o que me resta, Hannah.

Com amor,

Chris.


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Notas finais do capítulo

Um capítulo meio morno talvez? Certeza.
Nem tem perguntas de verdade a se colocar aqui, porque né.
1- Chris comentou da Emma na carta de uma forma muito superficial. Qual vocês acham que foi a intenção disso?
2- Talvez Claire e Charlie tenham algo a ver com o Erro?
3- Qual minha obsessão com nomes com a letra C nessa história?
4- Um espaço em aberto. Falem de como foram esses 65 dias. Contem lembranças legais de infância (sério, isso inspira muito). Ou só o que acharam mesmo.

Até mais ♥ Obrigada por lerem



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