The Mistake Of Chris escrita por Realeza


Capítulo 18
That's Borderline and it's a shit


Notas iniciais do capítulo

* Isso é Borderline e é uma merda
Músicas: Too Much to ask - Arctic Monkeys | The quiet - Troye Sivan
Clichê dizer que eu não ando muito inspirada e todo o resto? Bastante, mas é a verdade. Minha vida é um grande "agora vai" daí não vai. Pela primeira vez em bastante tempo, eu não tenho usado TMoC pra fugir de qualquer coisa que esteja acontecendo e isso é bem merda, porque diminui bastante meu rendimento escrevendo. Enfim, não basta me lamentar em audios prazamiga, tenho que fazer isso aqui também.
Mais um capítulo sobre Challie, pra felicidade geral (ou não).
Eu amo essa música do AM, principalmente a versão acústica. Eu sabia que tinha que encaixá-la nessa primeira cena e soou muito bem pra mim.
Eu espero que curtam, apesar de tudo.



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Aparentemente, Callie tinha uma política sobre manter um mini kit de primeiros socorros no quarto. Nada de objetos afiados por conta das normas do hospital, mas o suficiente para fazer curativos.

Imaginei a utilidade daquilo. Saber que era porque Callie se automutilava não era nada confortável naquele momento, e eu nunca a tinha visto com nenhum ferimento vindo de queda nem nada do tipo.

No caminho, ela já havia se recomposto consideravelmente para parar no balcão de medicação. Calmantes ou sei lá. Me deixou no corredor enquanto tomava o remédio, para que a enfermeira não visse a minha cabeça machucada e descobrisse sobre a nossa pequena fuga.

Sem conseguir parar de pensar sobre o kit de curativos, finalmente pergunto:

— Pra quê você tem isso? — Ela está passando algodão na minha testa com anticéptico, com uma expressão concentrada.

— Você sabe pra quê. Não podia deixar os cortes inflamarem. — Ela fala como se fosse a coisa mais normal do mundo. — Mas relaxa, não precisa com a consciência pesada. Parei com isso, também por conta daquela ideologia dos cigarros. — Ela me olha nos olhos para dizer. — Quero ser uma pessoa melhor.

Não respondo e ela termina o curativo em mim, em silêncio. São duas da manhã e ela fica sentada ao meu lado na sua cama, ainda em silêncio, olhando diretamente pra frente.

— Você é mais egoísta do que pensa, Chris. — diz, e não tento contestar. — Uma parte sua insiste em ser assim, e é a mesma parte que se mantém apegado a Hannah.

— Não quero falar sobre a Hannah agora.

— Sabe o que é Borderline? O que faz comigo, junto com a depressão? — A minha falta de resposta acaba por ser uma resposta, negativa no caso, o que a faz balançar a cabeça em reprovação. — Nem faz questão de saber, de tentar me entender. Li tudo o que foi possível sobre esquizofrenia, sobre perdas de memórias traumáticas e tudo mais pra tentar entender você um pouco, sabia? Porque me importo com você.

— Me importo com você, Callie.

— Jura? — Sua voz é sarcástica, mas sei que no fundo há um tanto de verdade.

— Juro. — respondo convicto e me inclino para deitar a cabeça nas suas pernas. Callie não me impede e seu único movimento é virar o rosto na minha direção. — Você está bem menos histérica do que lá fora.

— Histérica é um eufemismo para como eu estava, não acha? — Sorri com o próprio comentário. — É isso o que o Borderline faz comigo: variações de humor, reações emocionais não convencionais, comportamento vicioso, como os cigarros e eu sendo uma semi-prostituta.

— Fora a depressão.

— Fora a depressão. — ela confirma e suspira logo depois.

— O que me dá alguns comprimidos a mais. — Só quando me olha nos olhos logo em seguida é que me dou conta das suas mãos acariciando meu cabelo. — É bem ruim.

Eu sabia que bem ruim não era nem capaz de traduzir tudo aquilo. E, eu disse algo que também não era capaz de traduzir o que eu sentia.

— Sinto muito.

— Isso não ajuda, Chris.

— O que ajuda, então? — Deixo implícita a minha vontade irracional de sempre querer que ela esteja bem.

— Você. — Me sinto franzir o cenho por um pouco de preocupação, e ela nota. — Não precisamos conversar nem nada, caso esteja pensando. Não entendo 100% você, mas aceito que seja assim.

— Estamos bem?

— Estamos. — Ela continua mexendo nos meus cabelos, e sou obrigado a admitir pra mim mesmo que seu toque é muito reconfortante. — Eu ainda estou com a política de te conhecer melhor e vou continuar com as perguntas, só pra constar. E quero respostas longas.

— Então pergunte, mas tenho uma condição. — É sua vez de franzir o cenho. — Revezamos as perguntas.

Ela assente e começa.

— Qual o pior dia da sua vida?

Logo começo a contar sobre Justin Cross e a descoberta da morte dos meus pais. Já repeti tantas vezes essas mesmas palavras em consultas com psicólogos que nem me provocam mais nenhuma reação em mim. Enquanto falo e me perco dentro dos olhos dela até me pegar pensando porque não senti vontade de avançar em Callie quando ela duvidou do que sinto por Hannah. Já fiquei bem mais exaltado quando o Dr. Morgan fez essa pergunta a muitos meses atrás.

— Talvez porque no fundo, saiba que ela tem um pouquinho de razão. — Quase dá pra ouvir a Dra. Lee falando, porque sei que é exatamente isso o que ela vai dizer na segunda, quando eu lhe contar sobre hoje. Balanço a cabeça em negativa, discordando adiantadamente.

Faço a mesma pergunta de volta para Callie, e ela me fala do dia seguinte a sua tentativa de suicídio.

É ruim ouvi-la, mas bom ter a certeza de que, de certa forma, aquilo só faz parte do seu passado.

Continuamos na troca de perguntas e histórias antigas. Nenhum dos dois menciona mais assuntos tristes, felizmente. Ficamos assim até as quatro da manhã, onde estamos exaustos demais para continuar. Ela me manda para o quarto, mas só saio depois de vê-la deitada e lhe dar um beijo na testa.

***

Acordo pela manhã com uma batida na porta, depois de ter dormido direto desde que voltei do quarto de Callie, às quatro e vinte e sete da manhã. Não sonhei com Hannah. Não fiquei pensando em tudo o que aconteceu com Callie horas antes. Estava tão cansado que simplesmente dormi, sem nem um pouco da insônia que sempre tenho.

Imagino no mesmo instante que ouço a batida na porta que seja Callie. Ela é o tipo de pessoa que viria me acordar para fazer sei lá o que, como no dia da ioga. Levanto e vou até lá com os pés descalços contra o piso frio, apenas para abrir a porta e constatar que não é ela, e sim Jeff que está do outro lado, com a barda por fazer marcando o queixo quadrado.

— Pensei que tinha se matado. — ele diz, num tom despreocupado de pura brincadeira, como se fosse algo completamente normal de se dizer. — Como a Emma.

Suspiro de frustração por seu último comentário e nem me dou o trabalho de contestá-lo.

— Boa tarde, hora do almoço. Vamos. — anuncia antes de me pegar pelo braço e me puxar pelo corredor. Paro menos de dois metros depois.

— Preciso calçar algo antes de ir. — Ele encara meus pés descalços e revira os olhos. Tira os próprios chinelos e os estende em minha direção.

— Satisfeito?

— E você?

— Que se foda. Vamos logo. — Não contesto novamente e os calço, seguindo Jeff pelo corredor.

Depois de alguns passos, volta a falar:

— Que merda aconteceu com você?

— Callie. — respondo de forma automática enquanto descemos as escadas. Ele sufoca uma risadinha. O ignoro até estarmos no refeitório, nos sentando a mesa junto com Mike. Somente espera que eu me sente antes de começar um mini interrogatório.

— Callie, não é? — fala novamente, em um tom de acusação junto com um sorriso malicioso em minha direção.

— O quê? — Ele ri mais uma vez da minha contestação.

—Isso, meu querido Mike, é o que uma garota gostosa faz com um garotinho frágil e deprimido como o Chris.

— O quê? Não, cara. Nós só...

— Chris, vi que saiu do quarto com ela e vi a hora que voltou. Não negue. — me interrompe Mike.

— Puta merda, anda me espionando de novo?

Ele não responde, e apenas acompanha Jeff em mais uma risadinha. Callie se aproxima com a própria bandeja e se senta ao meu lado, me dando um beijo delicado na bochecha antes de finalmente cumprimentar o restante da mesa.

— Qual o papo?

— Vocês dois. — responde Mike, apontando em nossa direção com uma batata frita espetada no garfo.

— Vai negar que passou a noite com ela?

— Não. — respondo, o encarando. Sinto o olhar de Callie em mim e me viro em sua direção. — Quer dizer, sim. Merda. Não do jeito que está pensando.

— De qual jeito então, Sr. Campbell? Sinceramente, eu não ligo pra quem você pega, Chris. Ela tem bons peitos. — Jeff aponta para o decote sutil da regata de Callie com o garfo, e ela cobre o local com as mãos, envergonhada, enquanto me encara como se quisesse que eu fizesse algo.

— Jeff, por favor, será que dá pra...

— Nós não transamos. Ele meio que me deu um fora também. — Callie declara me interrompendo, com a voz firme enquanto os encara. — Satisfeitos? — Ambos assentem em sua direção.

— Quando eu acho que o Chris não pode ser mais otário, ele me surpreende. — diz Mike, balançando a cabeça como se estivesse em negação enquanto troca um olhar cumplice com Jeff.

— Podemos comer em paz agora, por favor? — pede ela, como se estivesse se cansado da conversa.

— Podemos? — repito, encarando Jeff.

— O casalzinho que manda. — ele responde, dando de ombros.

Uma parte de mim duvidava que ele estivesse falando sério sobre parar com o assunto, mas incrivelmente ele permaneceu em silêncio como todos nós durante todo o restante da refeição. Agradeci silenciosamente por cada segundo que ele permanecia assim.

Quando terminamos, Callie me dá um outro beijo na bochecha antes de se levantar e sair, levando sua bandeja.

— Nos vemos mais tarde, bonitinho.

Tanto Mike quanto Jeff se viram e inclinam os pescoços para observá-la saindo, com o cabelo balançando de um lado para o outro a cada passo seu.

— Você é realmente um otário, Chris. — declara Mike uma última vez antes que eu também me levante e saia do refeitório.

Não a vejo mais tarde, essa é a verdade. O que me dá um tempo a mais para pensar no que aconteceu ontem, o que definitivamente não quero fazer. Enquanto isso, ela está ocupada recebendo a visita da irmã mais velha, Eleanor. Acho que esqueceu momentaneamente desse fato quando me disse que nos veríamos mais tarde.

Jeff me faz ficar junto com ele na sala de TV enquanto lança olhares a cada passo que escuta pelo corredor, procurando ter um vislumbre de Eleanor. De acordo com Callie, ele tem uma quedinha de penhasco por ela, o que é bem incompreensível. Desde o dia em que a viu, basicamente. Mesmo que ele tenha a louca da Nikky como namorada. Certo, não é nada surpreendente que Jeff não se importe em trair a namorada.

Eleanor pinta o cabelo de um tom de castanho avermelhado que não realça os olhos azuis que tem em comum com a irmã. E ela tem um jeito especialmente esnobe com Jeff, se bem que qualquer um tem o direito de se achar melhor do que ele quando se compara o status de psicopata drogado e assassino dos pais com qualquer outro. Ele deu em cima dela descaradamente em uma das visitas a Callie, logo depois de Callie parar com a fase vadia, sendo que Jeff ainda aproveitou essa tal fase. Basicamente nos meus primeiros dias aqui, quando eu mal saia do quarto. E quando lembro desse episódio, me arrependo imensamente disso por não tê-lo presenciado. Eleanor disse que ela ainda não estava demente nem usando drogas para sair com um cara como ele, que qualquer um seria minimamente melhor e que era melhor ele nem pensar em tentar algo novamente com Callie, caso não quisesse ser castrado.

Tenho um pressentimento de que Eleanor e Mike se dariam bem.

Passei o restante do sábado pensando sobre Callie e evitando pensar sobre Callie, pensando sobre Emma e evitando pensar sobre Emma, repetindo esse ciclo loucamente até que simplesmente desistisse e fosse dormir. Parecia uma boa ideia, principalmente comparando com a perspectiva de voltar para a sala de TV e ficar assistindo a programas aleatórios ou a luta de Jeff com o controle enquanto troca de canal a cada três segundos.

Callie disse que estamos bem. Me apego a isso para bloquear os pensamentos e o incrível fato de ela gostar de mim. Gostar mesmo de mim. Bem, ela não pode gostar de mim, quer dizer, por que gostaria? Deve estar confusa e carente e qualquer outra coisa que a torne incapaz de ver o quão loucura isso é. Como pode gostar de alguém que está aqui dentro, que surta esporadicamente e é dependente de remédios para não ter alucinações? Como pode gostar de mim, se nem ao menos me conhece completamente? Não sabendo do que aconteceu antes daqui? Me obrigo a parar, reafirmando que estamos bem. Que ela entende que não somos simplesmente amigos, mas que não posso namora-la nem nada do tipo.

No domingo, passo o dia na sala de jogos com Jeff e Mike. É ridículo ver Mike bebendo vinho direto da garrafa como Jeff, mas não falo nada. Tudo sobre sexta ainda está ferrando um pouco com a minha cabeça, a ponto de resultar em diversas tacadas erradas que Jeff reage me dando um tapa na nuca, brincando. Mike ri, mesmo que consiga ser um tanto pior do que eu nas jogadas.

Me pergunto várias vezes se me encaixo bem num jogo com um assassino e um agressor. E temo várias vezes que a resposta seja sim.

Jeff fala da namorada para Mike, e discutimos um pouco sobre o quão louca Nikky é. Jeff parece não se importar nem um pouco revelando que agora Nikky é quem traz as drogas para ele. Quero questionar quem raios trazia antes, mas sei que ele dificilmente revelaria, já que a revelação anterior foi seguida de uma pequena ameaça. Não parecia realmente sério, mas é o Jeff.

Ainda passo no quarto do Sr. Hughes quando está anoitecendo. Conto a ele sobre o piquenique de Emma e o de sexta, com Callie. Ele não parece ter grandes opiniões, mas sorri quando lhe falo sobre o que sinto por ela. Depois me conta da esposa timidamente, como se as memórias fossem se quebrar caso dissesse as palavras erradas. Felizmente, ele parece se lembrar que ela morreu, porque eu não seria capaz de lhe dizer isso nem em um milhão de anos.

Quando volto para o meu quarto, já está tarde. Demoro duas horas para finalmente conseguir dormir, quando finalmente desvio do turbilhão de pensamentos para ir em direção ao sono.


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