A Esfera dos Renegados escrita por Boo, Jr Whatson


Capítulo 14
Herança Familiar


Notas iniciais do capítulo

Olá, Boo aqui!
Boa leitura~



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Anteriormente...

— Disseram que eu entrei em coma por traumatismo craniano, mas ninguém falou nada sobre o tempo.

— De 2016, Ed. Estamos em 2016. Você esteve fora por cinco anos.

[x]

— Beno Kabroom. 19 anos. Acusado de suspeita de assassinato. A mãe morreu ontem, dia 11, com facadas no coração. Irmão de outro suspeito do assassinato, Ty Kabroom.

[x]

— Beno Kabroom, Lomba Neto e Riko Marteleto são os três mais procurados pela polícia no momento.

[x]

— Meu deus! Sério que já te libertaram? Eu vim te salvar, besta. Eu era a distração enquanto elas se infiltravam lá dentro. Parece que agora nós somos a distração!

[x]

— Eu preciso... daquela esfera. Você não sabe o quanto.

— Da última vez que tentei descobrir sobre, estava nas mãos de um caçador de recompensas. Um tal de Luke Chase. Parece que aquele fotógrafo chato o achou antes de nós. Não consigo dizer se eles mantiveram a esfera consigo ou se ela foi entregue à polícia, mas acredito que não vá ser tão difícil de recuperá-la.

— Ótimo. E o moleque?

— Vivo. Mantido sob custódia da polícia como suspeito, já que o irmão escapou de outro presídio durante um ataque de um jovem rapaz aos guardas da unidade somado a uma fuga coletiva que pode ou não ter a ver com esse rapaz. Em todo caso, o sujeito Beno Kabroom perdeu a memória, precisamos saber se tem a ver com as propriedades da Esfera.

[x]

Uma TV, em vitrine, repassando a luta de três dias atrás, quando Iris, a melhor lutadora da estação, perdeu seu posto e o passou para uma garota desconhecida, que se chamava-se Eva.

[x]

— Para onde vamos agora, Ty?

— Preciso resolver umas coisas. Temos que passar na minha casa para conseguir o que eu quero.

[x]

— Eu me chamo Katerina Salazar. E quero a sua colaboração. [...] Há mais ou menos uns cinco anos, eu me especializei em tortura. Por mais que desde o início eu mantivesse claro meu objetivo, que era voltado para o bem maior, é difícil não se perder e se deixar levar nesse caminho. Nós podemos dizer que é tudo ficção, uma válvula para as nossas mentes, enquanto no nosso ‘mundo real’ tudo pode ser resolvido pela passividade da paz, com diálogo e com a democracia nada corrupta que temos. E, no entanto, tanto eu quanto você sabemos que isso é mentira. Eu te observei, Sr. Ribs, por um bom tempo. Eu admirava seu trabalho como vigilante. E preciso saber se você está comigo, Sr. Ribs. Ou está dentro ou está fora.

— Desculpa, Katerina. Desculpa. Eu não sou mais um moleque. Acabou para mim. Acabou.

[x]

— Foi afirmado hoje uma reviravolta na lista de criminosos dessa semana. Os famosos músicos Kabroom foram considerados inocentes. Isso se deve a uma voluntária auto-acusação da parte de dois homens. Eles afirmam que eles foram os verdadeiros culpados pelo assassinato de Cloud Kabroom, mãe dos irmãos. Porém um dos jovens, Ty Kabroom, fugiu da prisão com dois outros criminosos super perigosos, mas mesmo assim ainda não está na lista negra da lei. Ou seja, se virem Lomba Neto e Riko Marteleto por aí... podem denunciá-los à polícia que estará garantida a recompensa de vocês.

[x]

— Nos desculpe, Sir... A gente foi obrigado a isso, Sir... Ela nos obrigou a isso, Sir... Aquela garota é um monstro!

—"Ela" quem?

— Eu não sei, ela simplesmente brotou no QG procurando por você, Sir... [...] De alguma maneira ela sabia que nós éramos os culpados pelo assassinato da mulher lá.

— E ela nos sequestrou!

— E nos torturou! Até a gente dizer a verdade!

—_x__

Segundo arco: A União Faz a Força?

Capítulo XIV – Herança Familiar

14/03/16 

Riko’s POV

Lomba grunhiu, claramente irritado com o magrelo. Estendis, ou algo assim. Revirei os olhos, ele era estressado demais, tinha que viver a vida mais de boa. Ele virou para mim, bufando, e sorri para ele. Dizem que se você sorrir para as pessoas, elas podem se sentir contagiadas.

― Por que você ‘tá com essa cara de boboca aí, porra?

― Vai tomar no meio do seu ânus! - gritei. - Eu aqui na maior boa intenção, seu pau no cu.

― Vocês xingam demais. - Estendis comentou, nos censurando. Arqueei uma sobrancelha para ele.

― Ih, mamãe. E você é quem, é a polícia agora?

Ouvimos sirenes. Ty me encarou, risonho.

― Ué.

― Juro que eu não ‘tava tentando invocar. - levantei as mãos em rendição.

Lomba esticou o pescoço, tentando espiar pela janela. Também tentei, vendo apenas o capô de um carro que parecia ser totalmente preto. Ele deu de ombros, antes de falar:

― Deve ter sido uma ambulância, seus otários.

― Aposto que você também se cagou. - O dono da casa acusou o loiro, cínico.

― Cala a boca.

E então, batidas secas na porta. Tapei a boca, segurando uma risada. Dava para perceber que as pessoas engoliam em seco, nervosas, o que tornava a situação ainda mais cômica.

― Alguém em casa? - Ouvimos uma voz masculina.

― É óbvio que não tem ninguém aí. Sua fonte não disse que os policiais foram embora? - Essa voz era mais grave, parecida com a de um locutor de rádio.

― Às vezes, minhas fontes podem não ter 100% de certeza de tudo. Você quer arriscar? Acho bom. Não custa nada usar um pouco de esperteza, novato.

― Desculpe. De toda forma, não tivemos nenhuma resposta. Deve estar vazia.

Lomba bateu na minha cabeça antes que eu começasse a gargalhar. Estávamos totalmente ferrados. Iríamos voltar para o hospício ou para a prisão. Eu não tinha um futuro. Isso parecia deprimente, e também hilário, por todo o esforço fracassado. Pelo menos eu tinha o Lomba, por um bom tempo.

― O que você ‘tá fazendo parado aí? - Meu amigo perguntou, me fazendo perceber que não havia mais ninguém na sala.

Ele me puxou em direção ao pequeno banheiro, enquanto as vozes pareciam estar do lado de fora da cozinha. As palavras “janela quebrada” e “abra para mim por dentro” já diziam tudo, nos fazendo apertar o passo. Quando me vi dentro do cômodo, Estendis passava por outra porta. Neto e eu o seguimos, fechando ela ao passar.

― Quê? E eu que sou louco? Quem é que faz uma porta que liga um banheiro a uma garagem?!

― Essa é fácil. - O magrelo riu. - Se alguém estiver com muita vontade de ir ao banheiro quando chegar da rua por aqui, - explicou, a voz mudada em uma patética tentativa de imitar Ty. Ou ao menos era o que parecia - é só correr para o banheiro.

― Fecha a matraca e me segue. - O mesmo sussurrou.

Logo depois de reclamar, Ty foi até umas caixas que pareciam pesadas, enfileiradas e empilhadas. Ele começou a empurrá-las, tomando cuidado para que não caíssem. Todo mundo ficou parado, o que me fez ir ajudar meu antigo colega de prisão.

― Só empurrar?

Ele nem respondeu a pergunta óbvia, e portanto eu só o imitei. Uma entrada mal iluminada levava a uma escada baixinha, como se fosse para um andar mais abaixo.

― É seguro irmos aí? - O amigo do Kabroom perguntou, um pouco assustado. - E como você sabe desse lugar?

Apesar da clara insegurança dele, todos descemos a escada.

― Antigamente, isso era um subsolo. Como se fosse um G2, algo assim. Quando nos mudamos, meu pai resolver cimentar e cobrir todo ele, porém foi uma coisa demorada e não estava finalizado quando ele resolveu sair de casa. Pouco antes de ir embora e assinar os papéis do divórcio, ele fez uma parede falsa.

Paramos em frente à parede. Ty a empurrou, perto de seu limite esquerdo. Uma porta cedeu, abrindo. Entramos e ele a fechou. Tinham algumas coisas penduradas na parede, uma delas era um cano. Ele pegou o cano e travou a porta por dentro.

― Do lado de fora vai continuar parecendo uma parede normal. Enfim, agora é um espaço relativamente pequeno. Talvez do tamanho do meu quarto. Minha mãe e meus irmãos acharam que ele tinha terminado tudo e que não tinha mais nada aqui, então esse virou o meu esconderijo.

Já do lado de dentro, Ty acendeu um abajur, o ligando a uma das poucas tomadas que eu enxergava no local. Porém, a iluminação continuou baixa, pois a única fonte de luz que havia como conseguir.

Pude observar vários fios amarrados uns nos outros, uns lençóis arrumados no canto, papéis amassados e reunidos em uma lata de lixo, uma mesa de madeira acompanhada de uma cadeira, pedaços de metal aleatórios e montinhos de poeira por aí.

― Que daora. - comentei, admirando o cuidado que o rapaz tinha com o lugar. - Você já deve ter feito umas coisas muito doentes aqui.

― Não, mesmo. - Ele franziu o cenho, com uma cara de garoto certinho. Revirei os olhos de novo, antes de rir.

― Não sabe o que ‘tá perdendo.

― Riko, fica quieto, idiota.

― Ih, estressado. - rebati. - Se a gente for atrás da Ya, você fica animadinho de novo? - zombei, vendo Lomba ficar vermelho de raiva.

― Calma, rapaz, estamos numa situação delicada aqui.

― Isso aí, escuta o Estendis.

― Do que você me chamou? - Estendis fez uma cara muito feia, o que me fez rir mais.

― Estendis. Não é seu nome, Estendis?

― Não, seu imbecil!

― ‘Tá bom, vou te chamar de tio, então.

Ty começou a gargalhar, tentando não fazer barulho, e colocou a mão no ombro do magro estressado.

― Estêndido, entendeu? Estên-di-do! E meu nome é Peagá, seu engraçadinho de meia tigela. Não sou seu tio!

― Shh, você está falando muito alto, Peagá. - usei um tom engraçado.

Peagá suspirou, murmurando um pedido de desculpas contrariado. Logo mudou a expressão, algo tinha chamado sua atenção. Ele apontou para uma das coisas penduradas, nos fazendo olhar para elas.

― O que é aquilo, Ty?

― Aquilo? - A pergunta foi feita em um tom desentendido.

― Nada de se fazer de sonso, Boca de Guitarra. Aquilo é uma espada, não é? Por que diabos você tem uma espada?

Ao ouvir a palavra espada, minha boca se alargou em um sorriso.

― Acho que meu pai deixou aí, é uma Double Edge Katana. Ao que parece, temos muitos “segredos de família”. - Com esse comentário, Estêndido deu um meio abraço no rapaz. Eu e Lomba nos entreolhamos, curiosos. - Eu demorei um bom tempo para me arriscar a usar, também, então não sou lá muito bom.

― Posso brincar com ela? - perguntei, meus olhos se arregalando.

― Não. E você está com cara de lunático.

― Qual é, você ‘tá me julgando, ô Bois Não Choram.

― Ele é um lunático. - O loiro deu de ombros. - Eu sou lunático. Vocês são meio idiotas, não?

― É verdade, Neto. E, por isso, nós deveríamos estar fazendo silêncio ou ao menos nos preocupando com isso, certo?

― Oops. - Eu comecei a rir mais uma vez.

Atendendo a sugestão do tio magro, ficamos todos quietos. Eu me sentei, começando a brincar com as mãos, enquanto Kabroom pegava sua katana e começava a treinar alguns golpes, possivelmente por precaução. Lomba ficou andando em círculos perto de mim e Peagá parou para assistir o amigo.

― Sabe... - chamei a atenção do meu amigo. - É estranho admitir esse tipo de coisa. Mas a Ya faz falta às vezes. Já estamos um bom tempo longe dela. Teríamos visto ela algumas vezes nesse tempo.

― É.

― Será que ela foi punida pela sua travessura? - lembrei que ele me contou de ter deixado o PEM com ela, sem que ela soubesse.

― Não me importo.

― É verdade, né? Se você se importasse, não teria deixado ela lá com esse risco. - comentei, como se fosse óbvio, seu olhar me fuzilando, apesar da risada.

― Isso.

Às vezes até eu acreditava nisso. Que Neto era alguém que não se importava com nada. Tinha um porém. Ele se importava comigo. E com ela.

Depois de quase uma hora, Ty resolveu subir para ver se ainda tinha alguém na casa. Estávamos suando muito aqui, e queríamos ir para um local mais fresco. E, de acordo com eles, mais seguro. Ele voltou não muito depois, abanando o corpo com a própria blusa.

― A barra está limpa. Podem parar de reclamar desse calor “tão” infernal.

Saímos do esconderijo não mais tão secreto da casa Kabroom.

[x]

Luke’s POV

― Que porcaria.

― O que foi? - Nicholas perguntou, com seu habitual olhar entediado.

― Foi inútil ir até lá. A única coisa de relevante que achamos foi esse pedaço de papel estúpido.

Retirei do bolso um papel de carta amarelado, com os seguintes dizeres:

“Ao meu estimado amigo Isaías Kabroom,

Deixo, como previamente combinado, a Esfera Mística sob seus cuidados e o de sua família por todas as futuras gerações, como únicos nos quais eu confio para mantê-la em segurança. Seu uso deve se restringir a situações em que for estritamente necessário e peço sabedoria para tal. Por meio dos poderes investidos em mim e com o apoio do Primeiro Ministro, torno esse acordo oficial.

         João Francisco de Sousa Coutinho, Presidente Provincial

Província de Santa Catarina, 1862.”

― Isso não diz nada sobre as propriedades da esfera, só diz que ela já era uma coisa estranha que existia na época de um bando de cadáver.

― Material histórico sobre a burrada que o Governo fez um dia. Tsc. Energúmenos. - Ele comentou, com clara frustração.

― Se aqueles moleques, donos da casa, voltarem lá procurando por isso...

― Não vão achar, simples. Para de complicar tudo, Luke. Além do mais... Eu tirei muitas fotos durante nossa breve visita. Fotos dizem muito a respeito da vida das pessoas. Tenho muito a usar contra eles se isso for necessário. E bem, que seja, nós temos a maldita bola. Os nossos cientistas vão desvendar logo, logo o que ela tem de tão especial. E ela será um artefato muito útil para o nosso atual Governo. Quiçá para o Estado. - Por mais que seu tom fosse monótono, as frases do fotógrafo tinham um quê de sombrias. - Por que você está reclamando, mesmo?

― Sei lá, eu só–

― Prefere ficar caçando recompensas?

― Cintra, você é um saco. - reclamei.

― O saco que te salvou de uma vida medíocre. - Ele sorriu de lado, irônico.

Só porque eu tinha o que ele precisava.

― Também adoro você. - Não menti para o baixinho.

Eu odeio pessoas. Entretanto, às vezes algumas delas podem ser legais. O Cintra era uma delas. Só preferia não ter que aguentar ele por tantas horas.

― Se está cansado, vá para casa aprimorar suas habilidades de luta, que tal? - Exigente.

― Você disse cansado e lutar? - arqueei as sobrancelhas. - Acho que prefiro jogar. - comentei.

― Não conte comigo.

― Não faz mal, só tenho um controle, mesmo.

Acenei para ele, seguindo o caminho oposto, o papel amarelo de volta no bolso.

[x]

16/03/16 

Katerina’s POV

Esse era, possivelmente, um dos momentos mais calmos da minha semana. Estava recostada a minha poltrona, uma música da banda Daughter tocando em um volume de mediano a alto enquanto eu degustava um chá de maçã com canela.

Minha mente se permitira abandonar os pensamentos que ultimamente atormentavam-na, deixando uma atmosfera totalmente relaxada nesse final de tarde. E então alguém bateu na porta.

― Já vai! - gritei, já imaginando quem poderia ser.

― Sou eu, Lisa!

Abri a porta com um sorriso cordial. Não estava nos meus planos recebe-la agora. Ao ver a face da pessoa atrás dela, entretanto, fiquei satisfeita pelo ocorrido não contrariar minhas expectativas. Ninguém menos que o jovem que aparecia em todos os noticiários locais nos últimos dias, Beno Kabroom. Embora... Suas madeixas não eram mais loiras, e sim negras. Tinta de cabelo, pelo cheiro forte.

― O que houve? - perguntei, fingindo surpresa.

― Eu não sei, Kat. Esse rapaz aqui estava andando na nossa rua, na hora em que eu voltava do supermercado. Ele me perguntou por você. Me diga... você aprontou algo?

― Não, Lisa. Bem, entrem, vamos descobrir o que é. - gesticulei, chamando-os.

― Não vou atrapalhar, seja lá o que for. Tenho que arrumar as coisas em casa. Tchauzinho, Kat. Tchau... Desculpe, qual é o seu nome? - Ela inquiriu.

Pelo tom de voz, Lisa realmente não sabia quem ele era, o que me deixou aliviada. Não teria problemas com sua curiosidade por ora.

― Beno, acho.

―Certo. - Ela franziu a testa. - Até logo, "Beno Acho".

Garoto estúpido.

Adentramos na casa. Ofereci água, o que ele prontamente aceitou, e fui pegar enquanto ele sentava no sofá. Logo sentei-me a sua frente, a expressão séria.

― E então...?

― É, oi. Eu ‘tava lá na delegacia, e aí fui perguntar para um policial se alguém tinha passado procurando por mim, já que disseram que meu irmão ‘tá vivo, ou vai que foi outro parente, sei lá. Ele disse que tinha passado uma mulher se oferecendo para me dar abrigo, que ela me conhecia, e me entregou um papel com o nome da rua e o seu nome, mas... desculpa, mas eu não lembro de você, não.

― Como você já sabe, meu nome é Katerina. - retirei o gravador do bolso. - E nós ainda não nos conhecemos.

― Então o que você quer?

― Vamos por partes, pode ser? - Beno assentiu. - Eu vou te mostrar gravações de duas conversas que eu tive recentemente. Elas explicam um dos meus grandes objetivos atuais. Quero que você ouça com atenção e reflita um pouco, antes de eu falar de outra preocupação minha.

As duas últimas eram das minhas convocações, feitas ao Ed e à Eva. Beno poderia analisar prós e contras para formar uma opinião. Afinal, apesar da preocupação, Eva era uma garota normal e ainda assim escolheu lutar ao meu lado, enquanto Ed já era um velho vigilante e, contudo, recusara a proposta.

Meu interesse nesse garoto era um. Ele era um Kabroom. Em seguida, eu explicaria a ele o porquê de convocá-lo. Mesmo que ele provavelmente esteja odiando toda essa situação e o interesse de todos na maldita coisa que levou sua mãe à morte, talvez a esfera que ele possuía possa nos ajudar a limpar esse mundo. E talvez ele e Ty Kabroom sejam os únicos que possam utilizá-la corretamente. Protegê-la do mau uso. Ou nos guiar nisso tudo.

Um problema era o fato de ele ter perdido essa esfera em algum momento.

Fitei o garoto a minha frente, intensamente, a expressão de quem ouvia com atenção. Passados mais alguns minutos, as gravações chegaram ao fim. O som de uma antiga sessão de tortura se iniciava e eu precisei desligar o aparelho.

― Katerina.

― Sim?

― Eu sei que a garota briguenta já perguntou isso, só que... Por que eu? - Por um instante, eu quase tive pena dele. Aquele garoto estava verdadeiramente perdido. - Quero dizer... isso tudo parece muito legal. Seu propósito é divertido, desde que “tudo” aconteceu eu já tive que fugir e lutar umas vezes, tinha até um cara muito babaca e engraçado que tinha uma péssima mira. Mas eu nem mesmo sei quem eu sou. Como um cara como eu, que ainda por cima foi acusado de assassinato, pode ser útil pra você?

― Vou te pedir calma. Sei que isso deve estar ficando chato e frustrante. O meu interesse está relacionado àquela esfera que estava com você.

― De novo? - Reação previsível. Pobre rapaz.

― Sabendo o que eu pretendo fazer com essa cidade e, talvez mais futuramente, com o estado, é de se imaginar que algo como aquilo seria muito útil. Não somos heróis, Beno. Ninguém que tenta fazer justiça com as próprias mãos, em um mundo sem poderes, sem Super-Homem, Mulher Maravilha e o caralho a quatro, pode ser considerado um. Somos justiceiros. Nem vilões nem mocinhos, às vezes até mesmo o que se considera como anti-herói. Nós só estamos tentando fazer desse mundo um lugar melhor. O que significa extorsão, infligir dor, “pecar”, se você acreditar em Deus.

Dei uma pausa, para que ele pudesse digerir minhas palavras. Quando ele assentiu, prossegui:

― E, como eu disse ao Ed, esse é um caminho perigoso. Podemos nos tornar o que lutamos contra. É por isso que eu vim... não, que eu preciso de você e do seu irmão. Espero que você já saiba que tem um irmão. Vocês pertencem a uma família que guardava essa esfera. Pessoas tão confiáveis a ponto de guardar um poder tão grande, pelo que parece. Pode ser que vocês sejam os únicos que possam manuseá-la sem causar estragos indevidos.

“Além disso, por que não unir o útil ao agradável? Você não tem para onde ir, já que seu irmão está se escondendo, por ter sido incriminado anteriormente. Algo que já deve ter sido resolvido, mas ainda não consegui rastreá-lo. Eu preciso encontrá-lo, também, assim como você. Eu vou te ajudar a descobrir quem você é e o que aconteceu. Vou te levar a quem pode trazer suas memórias de volta, de fato. Então o melhor para você é ficar comigo. Como o melhor para mim é ficar com você. O que me diz?”

Kabroom claramente estava em dúvida. Mais que isso. Ele não confiava em mim. E por que deveria? Eu tinha gravações que relatavam casos de violência cometidos por mim, eu mesma me delatando por tortura. Como confiar em uma mulher que tem um porão superior ao tal “Quarto Vermelho da Dor”?

― Olha. Eu não sei se posso responder por mim mesmo. Eu posso ficar com você até acharmos meu irmão e aí ele decide a nossa posição?

― Sem problemas, garoto. Eu não posso obrigar ninguém, e quero cooperação, não coação. Sabe... - ri para ele. - Aposto que você só aceitou ficar aqui porque quer um teto para dormir.

― Na mosca! - sorriu de volta, a expressão de quem foi pego fazendo arte.

― Bem. Você pode comer e beber à vontade o que tiver na casa. Vou pedir que você não saia da casa sem me avisar, talvez possa me acompanhar algumas vezes, até chegarmos ao Ty. O sofá é bastante confortável para dormir, também. Tenho livros para te entreter, e internet, você pode assistir filmes no meu laptop e essas coisas.

― Suuussa. Quem é Ty?

― Seu irmão.

Ele fez um “aaah” e bati o indicador na cabeça, indicando que ele deveria usar a cabeça. Levantei-me, indo pegar duas fatias de bolo. No meu planejamento inicial do dia, essa hora eu iria fazer umas ligações. Uma delas para o escroto do orfanato. No entanto, ver um filme não seria nada mal.

― Ei. Você quer um bolo?

― Bolo! - exclamou, feliz.

― Vou tomar isso como um sim. E ver um filme? Topa?

― Tem The Wall? - reconheci o nome, embora não lembrasse ao certo.

― Hmm...

― Acho que é um que eu gosto muito. Do Pink... Pinky... Sei lá. - Bingo! Sorri, abrindo a geladeira, antes de rebater:

― Pink Floyd. Certo. Posso ver se tem no Popcorn Time. Consegue lembrar um gênero que goste?

― Sei lá, ação parece legal.

Eu podia aproveitar um pouco o tempo com esse moleque. Afinal, eu sempre quis ter irmãos, provavelmente por causa da época do orfanato. Um menino, então... cobrir o vazio do Pietro. Até que achássemos Ty, os dias com Beno Kabroom seriam divertidos.


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Notas finais do capítulo

AAAAAAAAAH, feels. Começou o novo arco~!
Reviews?
Boo.



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