Nothing Left to Lose (HIATUS) escrita por The Stolen Girl


Capítulo 13
Resquício de amor




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/564713/chapter/13

Acordo com o telefone tocando, me obrigando a abrir os olhos e aceitar que precisava levantar. Sinto a respiração de Chas em meu pescoço e constato que ele ainda dorme.

Procuro o celular, que não sei onde deixei. Não é como se houvesse muito espaço aqui para perder algo, e meu apartamento nem está assim tão bagunçado, mas não consigo encontrá-lo. Então o som para e eu perco a ligação. Escuto Chas se mexer na minha cama e quando olho ele está me observando, com uma expressão sonolenta.

– O que foi?

– Meu celular estava tocando.

– Quem era? Está meio cedo – ele diz checando as horas.

– Não consegui atender e também não sei onde meu celular está. Que horas são?

– 7h30.

Isso me deixa um pouco preocupada, porque ninguém me liga, muito menos a essa hora.

– Liga pra mim, por favor.

Então poucos minutos depois estou com o celular em mãos, depois de tê-lo encontrado embaixo do armário da cozinha. Era minha mãe. Ligo de volta, já pensando no que ela poderia querer comigo. Geralmente, quando quer me ver, ela simplesmente aparece aqui, sem dizer nada.

– Oi, mãe.

– Oi, minha filha – ela não diz mais nada, mas percebo um tom triste em sua voz.

– O que aconteceu? – o silêncio do outro lado da linha chega a ser inquietante, mas ela por fim responde.

– Eu sei que você provavelmente não se importará, mas é que... Eu achei que devia te contar.

– Por favor, mãe, me diz logo o que houve.

– Seu irmão está no hospital. Sofreu um acidente durante a madrugada, batida de carro. Ele está mal, Charlie.

Não sei o que dizer, ou se ela espera que eu me mostre preocupada. Mas, infelizmente, a verdade é que algo dentro de mim parece sim se importar.

– Que hospital? A senhora está com ele? – ao ouvir a palavra “hospital”, Chas se levanta e para ao meu lado.

– Vou te mandar tudo por mensagem, querida. Mas não, agora estou em casa, vim buscar umas coisas.

– Tudo bem, obrigada. Um beijo, mãe.

Desligo o telefone e minha cabeça começa a trabalhar. Meu irmão, mal num hospital. O que eu devo fazer? Porém, apesar de não achar que ele seja merecedor e de fato não saber o que fazer, sinto que, lá dentro, já decidi.

– Vamos comigo ao hospital, Chas?

__________________________________________

A enfermeira me leva até o quarto. Pedi que Chas me esperasse na recepção pois, por algum motivo, queria ver Cameron sozinha.

– Se precisar de algo, me chame. – a enfermeira diz e sai, fechando a porta.

Um cômodo nunca me pareceu tão pequeno para tantas lembranças e sentimentos. Penso que aquele garoto, que apesar de já ser um homem ainda parece um garoto, é meu irmão e eu não sei nada sobre ele. Estaria namorando? Teria tido algum filho por aí? Onde está morando?

E de repente os arranhões na pele dele e a agulha em seu pulso parecem estar em mim. Lembro das vezes em que estive em hospitais como aquele, simplesmente por ter sido idiota o suficiente para ferir a mim mesma. Lembro que Cameron nunca mais me visitou em nenhuma de minhas idas ao hospital depois que o expulsei na primeira vez, assim que seus pés adentraram meu quarto.

E talvez todos aqueles cortes não tenham sido por causa de Nicolas. Talvez não tenham sido por causa de Cameron ou pela perda de meu pai. Porque talvez a culpa disso tudo tenha sido minha. E isso me atinge como um tapa.

E eu sei que não deveria estar mais uma vez pensando em mim mesma ou no meu passado, porque meu irmão está aqui na minha frente, inconsciente.

E parte de mim também está adormecida. Toda aquela parte do meu coração que um dia se destinou a amar aquele garoto, estava adormecida . E agora parece querer despertar de um sono que eu insistia em manter.

E esse mesmo garoto também é parte de mim. O formato do rosto e a pequena pinta no queixo. A dor da perda de um pai. Anos da vida que passamos sozinhos. Essas são coisas que nos unem e que eu escondi por muito tempo. E eu não sei o que pode acontecer a ele agora, nem qual seu estado. Mas sei que quero aceitá-lo como a parte que deixei pra trás.

– Charlie?

Encaro seus olhos agora abertos, limpando as lágrimas que imperceptivelmente haviam caído, molhando minhas bochechas. Seria hora de chamar a enfermeira?

– Só um minuto, e-eu, é... Vou chamar a enfermeira pra você e...

– Espera.

Paro onde estou, a apenas alguns passos da porta. Ninguém diz nada e me sinto muito constrangida por ter sido pega ali e por parecer uma estátua num quarto de hospital.

– Está tudo bem? – ótima pergunta, Charlie. Maravilhosa mesmo.

– Estou com um pouco de dor, mas acho que sim.

– É melhor eu chamá-la pra ver isso.

– Não. Agora não. – Cam fecha os olhos e solta um longo suspiro – Me desculpa. Eu sei que já disse isso mil vezes antes, só queria aproveitar essa oportunidade porque, pela primeira vez, você está me escutando...

Não sei o que dizer, nem ao menos se devo dizer algo. Eu o desculpo?

– Tudo o que eu fiz, pode ter certeza, tenho todos os dias pra pensar nos meus erros e me culpar por isso. Sempre que coloco a cabeça no travesseiro, lembro do papai e em como eu não soube valorizá-lo... E agora ele não está mais aqui, por culpa minha. Mas também penso em você, Charlie. Em como perdi minha única irmã, apesar de você ainda estar andando por aí. E eu sei que você me odeia, tem todo o direito disso, mas eu... Eu te amo, Charlie.

– Eu também. – as palavras saem num sussurro, não querendo realmente ser ditas. Porque eu ainda não sei se isso é possível: amar alguém e desprezá-lo ao mesmo tempo.

Ele me olha surpreso, talvez por achar que nunca mais ouviria isso de mim. E enquanto choro e o abraço desajeitadamente, lembro dos dias que brincamos juntos, dos dias que eu o batia mas ele não revidava por eu ser sua irmãzinha. E espero, enquanto o abraço, que esse resquício de amor que sinto seja o suficiente por enquanto.

_____________________

O caminho de volta pra casa carrega uma atmosfera tensa. Chas presta atenção ao trânsito, mas às vezes me olha de lado.

– Eu quero tentar perdoá-lo, Chas.

Por sorte já estávamos chegando, caso contrário ele teria estacionado em algum lugar aleatório para que pudéssemos conversar. Ele não responde até que entremos em meu apartamento.

– Eu sempre soube, sabe? Que você era melhor que tudo isso e dia menos dia ia perdoar seu irmão.

“Porque você sempre foi melhor que eu”

A lembrança das palavras de Nicolas me faz sorrir, porque, pela primeira vez, sinto que talvez ele possa estar certo.

– O que foi? – Chas me olha de modo estranho – Sorrindo pras paredes.

Então ele está sorrindo pra mim também e algo dentro de mim se acende. Porque eu posso não ter acertado todas as contas e pendências da minha vida, mas ele está aqui.

– Obrigada por ter me acompanhado.

– Fico feliz que confie em mim pra isso. Sei que é um assunto muito pessoal.

Abraço Chas, sentindo sua respiração em meu pescoço e me arrepiando. O conforto que sinto com ele chega a ser inexplicável. Enquanto acaricio sua cabeça, sussurro:

– Que tal um café?


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Nothing Left to Lose (HIATUS)" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.