Dossiê Bellatrix escrita por Ly Anne Black


Capítulo 10
Rejeição e Nymphadora


Notas iniciais do capítulo

Para Josy Chocolate, "doente com cenas de parto" ;)



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Fazia uma manhã fresca de sábado naquele abril, de outra forma, ventoso e úmido. A primavera apenas começava a despontar sobre Ottery St. Catchpole, como vinha sendo há quase duas semanas. Ela sempre chegava devagar, como se estivesse despertando de uma espécie de sono de ninfa, mas em algum momento, Andrômeda sabia, abriria seus olhos de vez, e em uma das próximas manhãs eles acordariam com as flores esplendorosamente desabrochadas, como se nunca houvesse havido inverno.

Pensando em como estava aguardando impaciente esse momento chegar, colocou duas xícaras de chá quente sobre a mesa da varanda. Sua irmã mais velha pegou a própria xícara e deu um gole curto. Tinha os olhos voltados para o horizonte, onde o sol se deitava cada vez mais tarde, com o passar dos dias. O céu estava se tingindo de lilás, rosa e amarelo pálidos, para além das árvores.

– Não dá para dizer que esse é um lugar ruim para se morar.

Sabendo que esse era o jeito orgulhoso de Narcissa admitir que gostava de Ottery, Andy sorriu em concordância.

– É claro que não se compara com as colinas de Wiltshire – Cissa bebericou mais uma vez seu chá, o cabelo loiro claro escorregando para os seus ombros quando ela se inclinou, e depois voltando ao lugar quando ficou ereta – Há um lago atrás da mansão. Você não acreditaria.

– Talvez eu passe lá um dia desses para ver com os meus próprios olhos. – Andy brincou, mas a irmã lhe deu um olhar alarmado que depois ficou repreensivo, ao perceber que estava debochando. Andy pigarreou – mas você não veio aqui para discutir quem tem a melhor vista.

– Não, não. – Cissa concordou, sua expressão ficando mais focada imediatamente – eu vim para saber sobre Bellatrix. Como está a nossa garota?

– Ela está, você sabe, sendo Bellatrix, em todo o seu esplendor rebelde.

– Dando trabalho?

– Nem tanto. – deu de ombros a castanha, olhando para o pomar em frente a casa, longamente – Não o quanto eu imaginei. Ela toma as poções, ela ainda não tentou roubar a varinha de ninguém ou fugir. Eu estava bem preocupada enquanto ela não saia do quarto, mas há um tempo atrás as coisas mudaram.

– Mudaram? – isso preocupou Cissa, fazendo franzir suas bem delineadas e loiras sobrancelhas.

– Ela tem saído de casa. Na verdade, ela passa o dia inteiro fora, tanto quanto pode. Volta para o jantar.

– Isso não pode ser bom – postulou a outra – voe está certa de que ela não tem ido a lugares? Falado com pessoas? Você sabe que ela não deve...

Andrômeda deu um sorrisinho.

– Ela não tem deixado Ottery, nem por um momento. O único modo de fazer isso sem varinha seria ir até o povoado trouxa pedir por carona, e eu sei que a Bella prefere comer uma dúzia de gatos mortos do que...

– Então onde ela tem ido? – interrompeu Narcissa, que nunca tinha paciência com as metáforas engraçadinhas que suas outras duas irmãs pareciam gostar tanto de usar.

– Ted a viu esses dias, enquanto estava recolhendo madeira. Mas ela já deve estar voltando, então eu acho bom que ela mesma te responda.

Como se para concordar com suas palavras, uma sombra veio surgindo do meio das árvores do pomar, andando sem pressa especial através da sebe e para dentro dos limites da casa.

Ela não se parecia em nada como Narcissa esperava vê-la. Para começar, estava coberta de terra da cabeça aos pés, como se tivesse passado o dia dentro de um buraco de furanzão. Seu cabelo estava emaranhado atrás das costas com grumos de terra e pequenos pedaços de galho e folhas, e o rosto tinha traços de terra seca, assim como as roupas. Os joelhos de suas calças estavam imundos, mas nada de compara às mãos. No geral Bellatrix parecia alguém que tinha sido enterrada viva e aberto o caminho de sua própria cova afora com as unhas.

Apesar disso, estava menos abatida do que da última vez que Narcissa a vira. Seus ossos saltavam um pouco menos de debaixo da sua pele. Uma muito sutil sombra de cor marcava seu rosto, mas, novamente, isso podia ser um efeito visual de toda a terra sobre a pele branca.

O aspecto dela fez Narcissa saltar da cadeira num primeiro susto. Bella lhe olhou com um brando interesse, sem fazer caso do seu estado lastimável.

– Narcissa. Oh, isso em seu pescoço é uma coleira? Eu sabia que Lucius te daria uma eventualmente. Ele parece ser do tipo que gosta de manter os seus pertences ao alcance das mãos.

Os dois olhos azuis celeste da Black se estreitaram para a irmã caçula, e ela apenas levou os dedos à sua gargantilha.

– Bellatrix. Você tem noção de como se parece? Não chegue perto de mim, imunda desse jeito.

– Eu não ia – ela rolou os olhos para a outra irmã – Andrômeda, olá. Você por acaso colocou um cavalo para me seguir?

– Eu o quê?

Bellatrix suspirou, particularmente aborrecida pelo tom surpreso da irmã.

– Hoje quando eu sai para a estufa ele me seguiu. Um grande e preto cavalo duas vezes maior do que um normal. Ele não parece enfeitiçado, mas eu sei que você e seu marido caipira tem uma afinidade com os animais, então eu pensei...

– Não tem cavalo nenhum, não que eu saiba. – Andrômeda estava preocupada agora. – Existem alguns cavalos do outro lado do Rio Ottery, mas eles são completamente... Você tem certeza...?

– Se eu tenho certeza que um bicho de dois metros de altura ficou rondando a estufa o dia inteiro e veio atrás de mim até quase o fim do pomar agora mesmo? É, eu tenho bastante certeza – disse, zangada. – Se você ao menos pensou...

– Estufa? – Narcissa pescou – que estufa?

Mas Bellatrix não lhe deu qualquer atenção.

– Desenfeitice o cavalo, Andrômeda - ela disse chateada – Eu tenho cumprido o nosso acordo, e eu não preciso de um vigia.

– Não tem cavalo nenhum!

Cansada da conversa sem nexo, Narcissa se aproximou de Bellatrix, a despeito de sua condição imunda, e pegou pelo seu braço.

– Você precisa de um banho. Você tem uma consulta médica marcada para esta noite e precisa estar apresentável.

– Boa sorte com isso – Andy caçoou, azeda – ela tem fugido de água o quanto pode na última semana.

– Absolutamente inaceitável. – Cissa já a estava arrastando para dentro da casa, enquanto Bella tentava se livrar do seu aperto de aço, ao mesmo tempo que pensava, que tipo de pessoa fala "absolutamente inaceitável"?

– Eu tenho uma consulta no meio da noite? Você está me levando para um médico vampiro, Narcissa?

Tinham chegado ao banheiro, e a Malfoy trancou a porta atrás delas, se voltando chateada para a irmã.

– Não é um vampiro, é um bom médico que aceitou nos atender fora do horário comercial para evitar que você fosse vista. Agora olhe para você mesma, o que pensa que está fazendo? Chafurdando na areia como um gnomo, você ficou completamente louca? O que nossa mãe pensaria de você agora?

– Ah, mamãe – a morena deu um suspiro falsamente saudoso – o que a mamãe pensaria de mim, grávida do traidor de sangue, enfiada na casa do sangue-ruim, destituída da minha varinha? Por alguma razão, acho que ela nem ia reparar na terra.

As duas faziam um forte contraste no espelho do banheiro – Narcissa toda branca e ouro em vestes bruxas com perfeito caimento, sua joia no pescoço reluzindo e nenhum fio de cabelo loiro fora do lugar ao longo das suas espáduas magras. Bella, toda palidez e roupas folgadas e terra sob as unhas. Era difícil achar qualquer semelhança entre as irmãs naquele momento, apesar do olhar, o mesmo olhar obstinado e desafiador, mas por suas próprias razões.

– Tire a roupa, Bellatrix. Não temos tempo para isso.

Houve um momento de silencio em que Bella mudou o peso de seu corpo de um pé para o outro e escolheu encarar a parede.

– Eu não posso.

Ela não estava mais debochando.

– Há algo errado com o bebê?

Os lábios tensos da caçula se curvaram, mesmo que ela não quisesse.

– Há algo certo?

Cissa deu um longo suspiro e um passo para frente.

– Bella...

– Não! Não me venha com Bella. Não é você que tem que olhar pra isso. Você não tem que sentir crescer! – estava falando antes que conseguisse morder a própria língua para se impedir.

– É por isso que você não tem tomado banho? Para não ver?

– Está maior agora. – foi tudo que ela disse. – está... enorme.

Apesar da pretensa falta de entonação na voz da irmã, Cissa a conhecia desde sempre, e ela podia ler bem a postura de Bella. Nunca a tinha visto desconfortável em seu corpo. Narcissa se perguntou, não pela primeira vez, se aquilo era mesmo sobre estar grávida de Sirius e por ele ser um traidor do sangue.

Se ele estivesse com ela, ela se sentiria daquela maneira? Mas é claro que nunca saberiam, sendo ele quem era e o caminho que optara seguir, e que qualquer plano de conciliação futura entre os dois estava além da realidade.

Tinha ficado acordada mais de uma vez pensando se havia sido uma boa ideia conservar aquela criança viva. Ela sempre seria filha de quem era. O fruto de um desamor arraigado em mágoa e fracasso.

– Venha aqui, Bella. – ouviu a si mesma dizer, condescendente, a puxando pela mão terrosa para o lado da banheira – vamos fazer isso juntas.

Bellatrix não protestou quando foi despida pela irmã, peça após peça pesada de terra até o chão, nem quando sentou na banheira e água quente da ducha foi despejada sobre sua cabeça. De olhos fechados, se concentrou em não olhar para baixo, não olhar, não olhar.

Ver a deixava nauseada. Pensar sobre, igualmente.

Mas havia sempre o peso sobre seu estômago, uma pressão constante, a pele e os músculos repuxados. Se concentrar em outras coisas ajudava. Era por isso que gostava da, para começo de conversa. Mas em momentos como aquele, que o foco era a si mesma, bem, estes beiravam o insuportável em todo o seu esplendor.

Cissa tirou a terra e os galhos de seu cabelo e os desembaraçou não com magia, mas com os dedos, como um dia a própria Druella Black tinha feito com cada uma das suas filhas, há muito tempo.

Foi preciso esvaziar e preencher a banheira três vezes para se livrar de toda a sujeira. Depois Narcissa conjurou uma grande toalha e a enxugou sem magia, a fez sentar sobre a tampa do vaso sanitário e escolheu um pente de osso de Andrômeda para alinhar seu cabelo.

Bella arriscou olhar para o espelho. Um par de olhos pretos cansados encontrou os seus, num rosto muito branco, um rosto de criança assustada. Não era como devia se parecer. Ela era uma futura comensal da morte, ela era uma grande e poderosa sonserina, uma herdeira Black. É claro que no momento era difícil se colocar nessa posição, porque ela estava sendo penteada após ter sido banhada por sua irmã mais velha, e isso devia ser o máximo da decadência.

Olhos azuis buscaram os seu no espelho, azuis e limpos como um par de safiras.

– É tão ruim assim?

Ela cavou a voz do fundo da garganta.

– É pior que ruim.

– Dói?

Ela negou, não doía.

– Falta pouco agora, irmãzinha.

– Você não entende. – ela suspirou, cansada demais. – Eu o odeio. Aqui dentro, dentro de mim, seu coração está batendo, e eu o odeio mais do que a qualquer coisa que já odiei na vida inteira.

– O que você esperava? Esperava amá-lo?

Amá-lo. Uma coisa azeda subiu por sua traqueia queimando o fundo de sua garganta feito ácido.

– Andrômeda disse que era inevitável.

– Mas é diferente para ela. Ela quer, ela sempre quis um bebê.

– Não, Cissa, me ouça! – Bella afastou a mão de Cissa de perto dos seus cabelos, levantando-se, num ímpeto de impaciência – Eu não posso amá-lo, eu nunca vou amá-lo. A cada segundo que fica aqui dentro, me destrói. Ele existe, controla minha vontade, mexe com o meu corpo, mas eu não consigo sentir nada por essa coisa além de ódio.

– Mas você não precisa...

– Não posso fazer isso. – ofegou. – Eu não fui feita para ser... para ter... Como posso deixa-lo sair vivo? Existir no mesmo mundo que eu? Como?

Narcissa parecia alarmada, o olhar da irmã era vago, perdido, louco. Talvez aquilo fosse mesmo um erro, e ela tivesse razão. Mas a criança teria de nascer, não era como se pudessem voltar atrás.

– Nós conversamos sobre isso, Bell. Um sangue puro...

– Eu não ligo se é sangue puro. Eu não o quero, eu não quero dar vida a ele, eu não posso... eu pensei que eu podia, mas eu descobri que não. – os lábios dela tremeram visivelmente e havia um riso profundamente amargo cravado em seu rosto, diferente de tudo que Cissa tinha visto – Você consegue conceber um mundo onde eu Bellatrix, tenha tido um filho dele? De Sirius Black?

Ela tinha vergonha de falar aquilo em voz alta. Depois de tudo, não era a desonra de estar grávida de um bastardo, ou de ter fugido da escola, ou o que fosse, que a incomodava, mas isso. Ser a mãe do filho dele. Do filho que ele nem ao menos queria no mundo. Porque Sirius deixara isso claro. Com o seu silêncio.

– Bellatrix, você precisa se responsabilizar pelos seus erros. Não vire para mim agora e diga que não pode suportar, quando pode suportar muito bem se deitar com Sirius sabendo que ele era um traidor. Você vai ter essa criança. E depois que ela nascer, então tudo ficará mais fácil.

Bella não disse nada, pois o alarme da humilhação estava piscando de novo na sua cabeça, por detrás das palavras da irmã.

– Vá se vestir, a consulta é em uma hora. – disse a loira, fria e calmamente, como se não tivessem acabado de ter aquela conversa constrangedora. – E tire Sirius da sua cabeça. Ele nunca saberá sobre a criança, ou vice-versa. Em pouco tempo será como se ele nunca tivesse existido, você verá.

– BD –

A cerimônia terminara e a maioria dos adultos estava do lado de fora, comemorando mais um casamento dentro da família Black. A prima em segundo grau de alguém tinha se casado com um tio qualquer, provavelmente seu próprio tio. O importante era que eles estavam em família. Isso acontecia mais do que de vez em quando, para aquela família, ao longo dos séculos, mas era sempre um grande evento.

"Conservar a linhagem pura", era como chamavam quando casavam sobrinhos com tios, primos com primos ou, mais raramente, avós com netos e até meio irmãos, essas últimas combinações mais antigas, porque o Ministério fazia o que podia para impedir uniões deste tipo.

Dentro da família Black não importava tanto. Desde que a riqueza ficasse em família. Desde que mantivessem os degenerados do lado de fora.

Bella nunca fora contra, mas Sirius frequentemente se incomodava. Do alto dos seus oito anos, ele estava postulando seu desagrado sentado no batente do altar onde os noivos se ajoelharam mais cedo.

– As famílias normais não fazem isso – ele estava resmungando por sob sua franja lisa e bem cortada. Nessa época ele ainda não mandava em seu corte de cabelo e Wallburga Black o mantinha na linha. – Eu li que casar com parentes pode fazer você ter filhos defeituosos. Vai ver por isso que somos assim.

– Assim como? – Bella, que não se importava de amarrotar seu vestido, sentou ao lado dele no batente.

– Estranhos.

– Eu não sou estranha – rebateu, ofendida.

– Bem, você é. Seus olhos são muito grandes para a sua cara.

– Não são, não – ela arregalou os olhos, o que praticamente ajudou a provar o ponto do primo, mas não pode evitar, estava escandalizada com o comentário. Quem era ele para dizer uma coisa daquelas? Todo mundo sabia que ela era a criança mais bonita da casa.

– Diga o que quiser, mas é o que eu acho. Eles não deviam casar os parentes. Qual é a graça que isso tem? Se você é forçado a casar com alguém que você conhece a sua vida toda?

– Não é para ter graça, o casamento. – disse, didática, porque aparentemente Sirius não estava em dia com suas lições de sangue e da linhagem – é para nos manter puros. Eles provavelmente vão te casar com algum parente, sabe. Seus pais eram primos, assim como os seus avós.

Sirius fez uma cara de completo nojo.

– Merlin me livre disso. Já pensou se eles quisessem me casar com Narcissa? Aquela lambida.

Sirius não tinha bons modos, Bella observou, mas isso não a incomodava em especial. Ao contrário das outras pessoas – e isso incluía a irmã dela e muitas vezes ela própria – ele falava o que ele pensava. Sempre. Era uma coisa corajosa de se fazer tendo pais como os dele. Dizia-se que Orion batia com uma fivela em brasa, quando precisava castigá-lo.

– Narcissa é muito velha para você. Se eles fossem te casar com alguém, seria comigo, porque temos idades parecidas. – ela falou aquilo como uma mera observação lógica, sem nenhuma comoção.

Mas quando ele não disse nada ela olhou para ele pensando se tinha dito algo errado.

– O que foi? – pressionou, porque ele tinha uma expressão peculiar.

– Eu teria que te amar para casar com você.

– Você o quê? – ela franziu, sem entender. Do que ele estava falando?

– Mas eu acho que é menos mal. – ele disse pensativo, como quem escolhe entre dois legumes qual é o menos pior para se colocar no prato – Você tem esses olhos esquisitos, mas pelo menos não é a lambida da sua irmã.

– BD -

Ted Tonks passou a folha do Profeta Diário, pulando uma digressão enfadonha sobre a nova legislação para o transporte mágico interestadual, procurando talvez a sessão de esportes, querendo saber se o Appleby Arrows tinha saído da linha de rebaixamento após os jogos do fim de semana. Ele estava como sempre apreciando a calmaria da sua casa após Andrômeda ir para cama, então a madrugada era o momento onde ele podia ler o jornal calmamente.

Essa foi a razão pela qual se espantou quando alguém desceu as escadas, pisando com força nos degraus como se estes tivessem lhe ofendido pessoalmente. Achando que era Andy e que havia alguma coisa errada com o bebê, deixou o jornal de lado e fez menção de levantar. Mas a silhueta magra no ultimo degrau era de Bellatrix.

– Ah, você está ai, mestiço. – ela disse, apenas pelo hábito. Era toda olheiras escuras e pés descalços e parecia um pouco desorientada.

– Bellatrix. – ele resmungou, mas franziu o cenho para ela – que cara é essa?

– Nada da sua conta.

Passou direto por ele para a cozinha. Voltou uns minutos depois com uma garrafa de água nas mãos, e ficou parada no meio da sala, o que não era de jeito nenhum um comportamento típico da caçula Black.

– Bellatrix – ele chamou de novo, estranhando – alguma coisa errada?

Ela lhe olhou irritadiça.

– Você não tem uma vida para cuidar?

– Era o que eu estava fazendo, até você surgir em minha sala como se tivesse sido atingida por um balaço.

Ela viu o jornal em suas mãos, e correu os olhos longamente para a poltrona, para a escada, e de novo para ele. Ela por fim pareceu se decidir de uma difícil deliberação.

– Preciso sentar por um momento. Mas vá em frente e siga fingindo que eu não existo. – completou, acomodando-se na poltrona – Eu estarei fazendo o mesmo do lado de cá.

Ted seguiu a sugestão, ou ao menos ele tentou, voltando os olhos para o jornal, mas ele não podia, não se ela parecia tão incomodada com alguma coisa, olhos fixos no nada. Ele folheou o profeta sem realmente lê-lo por alguns minutos e o baixou com um suspiro resignado.

– São os pesadelos? Ele são comuns, você sabe, a essa altura. Nada com que se preocupar.

A garota se voltou para ele como se ele fosse um inseto verde na sua comida.

– O que você sabe sobre isso? Você também teve pesadelos quando estava grávido, foi?

Ele bufou.

– Você não consegue evitar ser intragável, não é menina, mesmo quando você obviamente poderia baixar um pouco a sua crista e ser um menos odiável para o seu próprio benefício.

– Sai naturalmente. – soprou, sem se importar, em nenhum grau, se o incomodava.

Ela não sabia que estava exigindo todas as fibras da paciência do seu cunhado durante aqueles dois meses que estava em sua casa, e ele estava a ponto de pular em seu pescoço porque ela era tão mal agradecida, insolente e escorregadia; inclusive com a Andrômeda, que a acolhera de boa vontade.

– Não são pesadelos. – ela disse por fim, falando mais com a parede do que com ele. – São apenas sonhos.

– Com o bebê?

Não – torceu o rosto, perturbada – por que, era suposto que eu sonhasse com isso, ainda por cima?

Ele deu de ombros.

– Andrômeda sempre sonhava, a partir do quinto mês. Ela tinha pesadelos sobre o bebê nascer com alguma deformação, quatro braços, um focinho de porco. Ainda acontece às vezes, são os hormônios.

– Não. Ele é perfeito. – ela se surpreendeu com as próprias palavras, mas percebeu que, de alguma forma, sabia que era verdade. Essa percepção a perturbou especialmente, porque ela não queria ter qualquer certeza ou conexão sobre a coisa dentro dela.

– Certo – o rapaz a olhou com alguma estranheza, reclinando novamente no sofá – Que... bom. Eu vou fazer um café. Você quer alguma coisa?

Bella escondeu sua surpresa por Ted estar sendo civilizado. Ele era na maior parte das vezes, se estava na frente de Andrômeda, mas só para não aborrecer a esposa. Quando estavam só ele e Bella em casa, ignoravam a presença do outro, então, era a primeira vez que o mestiço era solícito espontaneamente. Considerou a oferta.

– Bem, poção do sono, talvez? Se houver alguma.

– Você não pode, faz mal para o bebê. Mas eu sei de uma coisa que vai ajudar.

Ele voltou minutos depois com uma tigela e uma colher.

– O que...?

– Sorvete de creme com creme de avelã.

Bella lhe olhou em profunda incredulidade, mas Ted apenas fez um gesto de encorajamento. Sem ter nada a perder, ela experimentou um pouco da combinação, que para a sua surpresa derreteu e explodiu em sua boca. Era possivelmente a coisa mais deliciosa que já tinha provado. Um arrepio de prazer balançou seu corpo quando engoliu, e Tonks tinha uma expressão de vitória e convencimento em seu rosto para cima dela.

– Viu só? Eu te disse.

Ela não lhe respondeu com qualquer comentário irônico, ocupada que estava em dar uma segunda garfada. Se não fosse contra a sua natureza e contra a sua dignidade, poderia até ter agradecido Tonks, mas apenas saboreou a enxurrada de endorfina em seu sistema, como se fosse o que estava precisando há muito, muito tempo.

Ted a assistiu, divertido. Em alguns momentos sua cunhada era um projeto de bruxa má com a alma sombria, mas esse não era um deles. Ele via uma garota genuinamente feliz com uma bola de sorvete. Isso até que ela se engasgou, os olhos se alargando, e arfou. Se inclinou para frente, largando a tigela com um estrépito sobre a mesa de centro.

– Bellatrix, o que há? – ele se alarmou, inclinando para ela.

Arrrg – ela fez um barulho gutural apertando os maxilares, claramente começando a entrar em pânico.

– É o bebê? Você está sentindo alguma dor?

Ela negou. Seu rosto estava verde. Seus olhos eram dois pires quando olhou para ele.

– Eu acho... – arfou – Está... se movendo.

– O quê?

– A coisa... está se mexendo. – apontou para a barriga, atormentada – Como... vivo.

Ele finalmente compreendeu, com alívio, se permitindo um sorriso. Seus olhos se ascenderam, divertidos.

– É claro que está, o que você... espera. É a primeira vez que você sente?

Ela assentiu. Estava além das palavras, lívida. A situação toda era um pouco inusitada, especialmente porque ela estava encarando aquilo com um terror exagerado.

– Bellatriz, isso é perfeitamente norm—

– Não! – ela guinchou, estridente – O que ele quer? O que ele tem? Ele quer sair?

– Não, hei, calma ai – disse, a voz se suavizando, enquanto agachava ao lado dela no tapete. Estendeu a mão, mas Bella se espremeu contra a poltrona.

– Não toque em mim, você não ouse!

– Ok, tudo bem, eu não vou. – a tranquilizou, recolhendo a mão. – Mas você precisa respirar, ok. Ele não quer sair. Só está te dando um oi.

– Ele o quê? Por que...?

– Bebês fazem isso – ele disse, com aquele sorriso irrefreável – Se mexem, esperava que ficassem nove meses sem se mover? Mas a primeira vez é sempre mágica.

– Se você coloca dessa maneira. – aquilo foi quase um choramingo entredentes. Ele teria a tranquilizado colocando a mão sobre seu ombro, talvez seu cabelo, mas se tratando dela, nunca era uma boa ideia. Apesar disso Ted estava achando toda a situação enormemente divertida – e isso é bom, significa que é saudável. E que gosta de sorvete com creme de avelã.

– Eu acho que vou vomitar – anunciou, se erguendo, mas Ted a segurou na cadeira, o olhar severo e intenso.

– Você não vai vomitar, garota. Está tudo bem. Vai ficar tudo bem.

Ela começou a negar. Se viu incapaz de parar de negar, a cabeça se movendo de um lado para o outro.

– Por que você luta tão intensamente contra o seu bebê? Era de se esperar que uma bruxa pudesse perceber a magia elementar quando ela se agita dentro de você.

Ela ficou olhando para ele, sem ter o que dizer.

– Ele ainda está mexendo? Vou chamar Andrômeda, ela vai gostar de sentir.

– NÃO! Espera. – Bella segurou sua manga, inquietação em seus olhos escuros – Não a chame. Vamos manter isso em segredo. – ele ergueu o cenho, duvidoso, e ela apertou os lábios – Tonks?

– Ok. Certo, como quiser, Black. – se afastou, indo sentar no sofá de novo. Estava encarando, ainda. Uma sombra de riso em sua boca fina – Pare de fazer essa cara.

– Que cara?

– De quem tem um alienígena na barriga.

– Bem, engula um alienígena vivo, e você saberá do que eu estou falando!

Ele ficou olhando para ela, se segurando fortemente para não ter um acesso de riso. Bellatrix sustentou seu olhar, a despeito de si mesma, querendo manter qualquer raspa de dignidade no tacho da sua recorrente humilhação.

– Você vai terminar esse sorvete? Porque se você não for, eu vou levar de volta para a cozinha.

Ele fez menção de pegar a tigela, mas Bellatrix avançou sobre ela e tomou para si, feroz. – Você não ouse. – sibilou para Ted, afundando a colher no doce.

– BD –

Rosas. Era de se pensar que fosse fácil cuidar de flores tão banais como rosas, mas Bellatrix estava se percebendo na contramão desse conceito. Frustrada, enxugou o suor da testa e com isso espalhou um rastro de terra no rosto, mas não se importou, sequer percebeu.

– Roseira estúpida – reclamou, para ninguém em especial, uma vez que aquela planta, por mais peculiar que fosse, certamente não ia ouvi-la. – Qual é o seu problema, afinal? Que mal esse vaso te fez?

– Ai está você – uma voz a sobressaltou, e ela percebeu que Andrômeda entrara na estufa sorrateiramente. Uma vez que a irmã não era nem sutil nem silenciosa, com aquela barriga enorme, Bella só pode concluir que a gravidez estava a deixando com os sentidos ruins. – Brigando com as plantas.

– É essa roseira idiota, toda vez que eu tento colocar uma muda dela num vaso, com a exata mesma terra que está no chão debaixo dela, ela seca e morre.

– Uau. Ela é bonita. Nunca vi dessas por aqui.

Era uma roseira com flores tão absolutamente brancas que reluziam na luz difusa da estufa. Ela se destacava contra as outras plantas pela sua própria cor, e seu brilho e a delicadeza de suas pétalas.

– Tem alguma propriedade mágica especial?

– Teimosia, eu acho – disse Bella, fazendo a irmã rir, mas ela mesma não achando qualquer graça. - Você voltou cedo do hospital hoje.

– Estou de licença, oito meses de gravidez, lembra?

– Impossível esquecer – indicou a barriga enorme dela. – Você tem certeza que isso daí é um humano, e não um bebê elefante?

Andrômeda não lhe deu qualquer atenção, como já vinha ignorando as piadas da irmã sobre o seu tamanho. - Tinha me esquecido desse lugar. Quando Ted comprou a propriedade o vendedor nos avisou que tinha uma estufa velha aqui nos fundos, mas lembro de ter dito que estava irrecuperável.

– Parece que ele estava errado. – Bella ironizou.

– Você é boa com as plantas.

– Quem diria.

Bella não gostava de admitir, mas a irmã estava deslumbrante em seu fim de gravidez. Sua pele e seu cabelo estavam impecáveis, mas acima de tudo seus olhos brilhavam, ela irradiava felicidade de todos os seus poros gestantes, como algum tipo de deusa da fertilidade. A caçula duvidava que a sua própria gravidez pudesse lhe trazer uma beleza adicional – na verdade enquanto as semanas ia passando, ela só ficava mais pálida, mais magra, mais circunspecta que nunca.

– Ted me disse que seu bebê mexeu, um dia desses.

– Ah, seu marido é um fofoqueiro, Andrômeda, que inferno.

Ela riu, segurando a barriga.

– Ele não fez por mal, ficou preocupado, disse que você pareceu assustada.

– Eu não... não assustada, apenas pega de surpresa. Não é todo dia que uma coisa viva se move dentro de você. Bem, não era. Agora é.

– Como se sente sobre isso?

– Não é nenhum piquenique no parque.

– Eu sei, é mesmo estranho. Mas você se acostuma.

Bella fez cara de quem não ligava, acionando seu modo "descaso". Começou a arrancar alguns galhos secos de uma trepadeira, distraidamente. Não gostava de companhia na estufa. Aquele espaço era dela, dela e das plantas.

– Bella, eu sinto muito. Você não devia estar passando por tudo isso sozinha.

Ela franziu o cenho, sem entender onde Andrômeda queria chegar. Graças a ela e Narcissa estava forçosamente tendo companhia o tempo todo, não?

– Eu quero dizer, sem o pai do seu filho. Deve ser ruim.

Não aquele assunto de novo, lamentou. Não bastavam os sonhos, não bastavam as lembranças, sempre havia alguém que o trazia a tona.

– Eu não tenho como saber, lembra? Nunca houve um pai.

– Ah, querida. – disse, lhe olhando com pena – há um pai... e não é vergonha nenhuma você lamentar que ele não está perto de você. Imagino que se sinta sozinha... e que queira alguém a noite, para lhe abraçar, para dizer que está tudo bem.

– Essa é você, Andrômeda, eu não tenho a menor necessidade...

– Não minta pra mim. Você gostaria que ele estivesse aqui.

– Quê? Sirius? Eu gostaria que ele ardesse no inferno. – ela começou a arrancar folhas que não devia estar arrancando de uma Desmiotoflora, que rapidamente se encolheu para longe e seu alcance - Eu o odeio, lembra? Traidor do sangue, grifinório, babaca? O maior erro da minha vida?

Andy sorriu tristemente.

– As coisas poderiam ter dado certo entre vocês. Mas são dois cabeça duras.

– Já chega. Eu não vou ouvir essas asneiras nem mais um segundo – ela perdeu a paciência. Saiu e deixou a irmã sozinha, pisando forte e sem rumo entre as arvores. Parou dali a alguns metros, ofegante, o peito palpitando.

Olhou para as mãos sujas de terra; elas tremiam sem parar.

Não precisava olhar para saber que tinha companhia. Sempre, enquanto estava fora de casa, ela tinha. O enorme cavalo negro se aproximou silenciosamente dela e parou ao seu lado, os olhos cor de ametista lhe vigiando.

– Pelo menos você não me enche. – disse, tremulamente, cravando as unhas nas palmas das mãos, furando sua carne. – Eu vou dar uma volta. – anunciou. Fez menção de seguir e o animal prontamente deu um passo a frente. Ela sorriu, sem emoção – E é claro que você vem comigo.

– BD –

Em algum momento da sua vida, Bellatrix tinha decidido que não gostava de cavalos. Não é que ela tinha medo deles, é obvio, sendo uma bruxa, não havia motivo, era só que, eles eram tão...

A palavra era imponentes. Eles realmente agiam como se nada pudesse afetá-los, por que eram tão potentes, com suas patas musculosas, seus olhos inteligentes. Cavalos não eram confiáveis. Bem, então havia aquele, que a seguira fielmente até o povoado de Ottery, ao longo do rio. Mesmo que ela estivesse sem varinha, não parecia que corria perigo.

Na verdade ela tinha a estranha impressão que ele se colocaria entre ela e um perigo, se precisasse.

Devia ser uma imagem e tanto, aquela dupla incomum na vila trouxa, um enorme corsel selvagem e uma garota magra e grávida com terra nas mãos. As pessoas lhe olhavam quando passavam por ela, mas eram trouxas, então Bella não se incomodava em olhar em seus rostos ou imaginar o que estariam pensando dela.

Sabia que havia uma parte do povoado, bem do lado oeste após o açougue, onde um pequeno comércio de artigos bruxos estava instalado. Tonks comentara algo sobre comprar ferramentas mágicas ali, e um ou outro ingrediente para poções. Demorou algum tempo para achar o lugar, mas então reconheceu uma vassoura de quadribol apoiada casualmente numa janela, como se fosse uma vassoura de varrer ordinária.

Uma bruxa com um olho de vidro opaco a recebeu numa espécie de balcão. Atrás dela havia uma precária arrumação de prateleiras e ganchos com uma diversidade de coisas que a uma primeira vista pareceriam comuns, mas eram mágicas – frascos empoeirados de poções e peles de Cantagalo, artigos de limpeza Mme. Samovary e um gordo amasso aninhado sobre uma pilha de livros.

– Em que eu posso ajudá-la, minha jovem? Talvez algumas poções para esse bebezinho nascer forte?

– Não. Eu tenho uma oferta. Se a interessar – Bella tirou algumas sementes do bolso do seu avental, ela as tinha reunido naquela manhã antes de Andrômeda chegar à estufa – estou disposta a vender, se puder me oferecer um preço bom.

A velha bruxa arregalou seu olho bom para as doze perfeitamente redondas sementes de Avieiro Dourado, uma planta que quase todo bruxo devia conhecer, porque com uma chance de um em dez, ela dava frutos de ouro puro na primavera.

– Isso é muito especial, onde conseguiu? – perguntou a mulher, desconfiada.

– Não importa. Está interessada?

Logo Bella tinha alguns galeões em suas mãos, porque como supusera, aquela velha bruxa não perderia a oportunidade de tão bom negócio. A mulher lhe sorriu grata pelo preço abaixo do mercado que Bellatrix lhe fizera.

– Posso lhe ajudar em mais alguma coisa, minha querida?

– Sim, na verdade. Onde eu posso encontrar uma boa sela?

– BD –

Passava da hora do jantar quando ela voltou ao chalé dos Tonks, e seu retorno sobre o lombo alto do cavalo foi pontilhado por uma miríade viva de cores de um ostentoso crepúsculo. Ela apenas se aproximou da casa e foi recebida aos gritos por um Ted Tonks fora de controle.

– BELLATRIX! AONDE INFERNOS VOCÊ ESTAVA!

Ela vinha entrando a pé. O cavalo se recusara a chegar perto da casa, então partira para dentro da floresta, ainda selado.

– Sim, porque eu estou morrendo de vontade de lhe dar satisfações.

– Você devia estar aqui! Você sabe que não pode...

– Tonks, eu apenas fui no povoado. Por que você está tão... qual é o problema?

Só então ela percebeu que realmente havia um. Por que ele estava tremendo, seu rosto estava branco, e tudo aquilo não era só porque ela tinha sumido umas horas.

– Andrômeda... – ele arfou – ela está em trabalho de parto.

– Ela o quê? Mas ainda não está na hora. – rebateu, piscando.

– Bem, há alguma coisa errada, ela está sangrando. Ela não devia, mas ela está.

– Ela vai morrer? O bebê vai morrer? E porque diabos vocês ainda não estão no hospital?
– Bella não podia acreditar em como ele estava sendo incompetente sobre uma emergência como aquela com sua irmã. E ao mesmo tempo ela já estava correndo para dentro de casa, Ted atrás dela.

– Eu estava tentando enviar uma mensagem para a parteira, mas na verdade, eu não acho que há tempo.

– Parteira – Bellatrix repetiu, horrorizada. É claro. Andrômeda vinha sustentando a ideia de ter o bebê em casa. Ninguém estava levando aquilo a sério, mas era suposto que ainda tivessem um mês para convencê-la do contrário. Porque uma futura medibruxa ia se recusar a ir ao hospital, estava longe de compreender – Onde ela está?

– Quarto – ele disse, sem fôlego.

E ela estava, sentada na beira da cama, contorcendo-se sobre a sua barriga. No momento que viu a cena, Andrômeda lívida e sentindo dor, ela congelou no portal.

– Ted – Andy chamou, estendendo a mão para ele. Não parecia ter notado que Bella também estava ali. Seus olhos estavam vermelhos. Sua boca, pálida. – Ted, você conseguiu?

– Eu mandei uma coruja, mas eu não acho...

– Que vai dar tempo, eu sei. Eu estou tendo contrações, e elas estão muito próximas.

Os olhos dele cresceram com terror. Para Bella aquilo não queria dizer muito.

– O bebê está bem? – ele perguntou com temor.

– Ele está, mas ele não vai continuar, ele precisa sair...

– Você quer dizer...

– Sim – ela assentiu, corajosamente, a despeito de sua dor – Precisamos fazer o parto agora.

Ted começou a negar veementemente.

– Não, não, não mesmo...

– Não temos tempo para isso – Andy disse sobre sua respiração, se voltando para Bellatrix – Bella. Vou precisar de você.

A garota recuou, alarmada.

– Eu não... nem pensar.

Só que o que ela recebeu de volta foi um olhar tão duro, e sério, e profundo, que a segurou sem seu lugar.

– Bellatrix, se você não me ajudar e ajudar o Ted a fazer isso, o meu filho pode morrer.

Ted também olhou para ela. Ele estava implorando qualquer coisa com seus olhos esverdeados cintilando à beira do desespero. Andy gritou, comprimindo sua barriga enorme, e Bellatrix fechou os olhos por um momento, imaginando muito do que a vida devia ser, mas na verdade não era. E então ela os abriu, engolindo muitas sensações conflitantes em seu peito, em sua garganta, na boca do seu estômago, e falou.

– Tudo bem. O que eu preciso fazer?

– BD –

As horas seguintes foram um borrão, enquanto eles seguiam as orientações dadas por Andrômeda entre seus gritos e seus gemidos e sua respiração entrecortada. Ela sabia exatamente como fazer um parto porque ela já tinha feito um na Escola de Medibruxaria, mas então administrar seu próprio parto não era nada perto disso. Não quando ela tinha medo de fazer qualquer coisa errada e prejudicar seu bebê. Não quando seu marido e sua irmã mais nova estavam tão assustados quanto ela, ou talvez um pouco mais.

Em algum momento da confusão ela realmente acreditou que tudo fosse dar errado. Ela não podia sentir sua criança mexer. Era tarde demais e tinha perdido sangue e todo o líquido. Ted estava ao seu lado, tendo sua mão estrangulada por ela, enquanto ele beirava repetidamente o topo da sua cabeça e remetia o mantra do vai-dar-tudo-certo e do empurre.

Bellatrix estava atrás de suas pernas abertas. Era impossível ler seu rosto, mas ela procurou os olhos de Andrômeda querendo lhe passar alguma coisa, alguma coisa de presença.

– Empurre, Andy. Eu posso vê-lo. – foi tudo que ela disse, sob sua respiração, franja preta suada colando a sua testa, e muita ansiedade endurecendo seus ombros.

Andy obedeceu. Ela empurrou a despeito de si mesma e do fim de suas forças. E quando seu primeiro e único filho saiu de dentro dela, foi a sua irmã que o aparou, e mesmo naquele momento, seu rosto deixava claro que não estava acreditando que aquilo estava acontecendo.

O choro inundou o quarto. Bellatrix suspendeu o recém-nascido para a luz e olhou surpresa para Ted e Andrômeda, um primeiro sorriso de satisfação aparecendo em seu rosto torcido pela tensão.

– Parece que é uma menina.

– BD –

Mais tarde naquela noite, Bellatrix ainda experimentava uma sensação formigante de irrealidade. O céu noturno e as luzes, tudo estava borrado nas bordas como uma lembrança, ou como se ela estivesse vendo de fora, ela não sabia bem o que pensar e apesar de que só há pouco tempo seu coração parara de bater alucinado, não sabia como devia se sentir.

Tinha acabado de fazer o parto da sua irmã. Trouxera a filha do sangue-ruim Tonks para o mundo, mas ela também era uma Black, uma nova e viva Black com um cacho de cabelo loiro sobre sua cabeça. Se lhe perguntassem alguns meses atrás... bem, ela riria com todo o seu cinismo das possibilidades.

Tonks se aproximou dela inclinando-se também na sacada do quarto, onde Bella estava observando o rio Ottery.

Andrômeda e a filha descansavam tranquilamente na cama, exaustas de todo o estresse nascimento. Bella esperava ser ignorada até o outro dia porque ela não era mais necessária na cena da família feliz, mas então ela tinha ficado, afastada, porém ali. Queria ter certeza que Andrômeda estava bem.

Mas o que ela não queria, era ter que conversar com Tonks. Nenhum tipo de conversa "pós-parto", não tinha como isso ser bom.

Ele não lhe deu opção.

– O nome dela é Nymphadora.

Silencio.

– Obrigada pelo que fez lá dentro, Bellatrix – disse o rapaz, uma suavidade sincera em sua voz – eu não teria conseguido sozinho.

– Você teria. Você só preferiu deixar pra mim o trabalho sujo. – respondeu sorrindo cínica, porque era assim que ela era, e ela até se segurou para não dar a sua opinião sobre aquele nome, porque o estrago já estava feito, não estava?

Ted não se incomodou. Ele estava feliz demais para. Seus olhos pareciam duas estrelas, Bella mal conseguia encará-lo.

– Eu sei que eu falei coisas ruins sobre você e eu achei que estava certo – ele continuou, em seu tom alegre e pretencioso como se agora que era pai, detivesse toda a verdade do mundo. – Mas talvez eu estivesse errado. Talvez, só talvez – e ele lhe deu um sorriso genuíno, porque era tudo que Ted conseguia fazer naquele momento – Ainda haja salvação para você.

(Continua...)


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Notas finais do capítulo

Sim, Bella fez um PARTO. E vocês, concordam com o Ted, acham que ela talvez tenha salvação??

Obrigada a todos, TODOS os comentários. E também a quem está lendo, mas não comentou ainda... eis sua chance! Louca pra saber o que todos os leitores acharam desse capitulo!



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