Enjoada. Essa era a perfeita descrição para o que eu estava sentindo no momento. Enjoada no sentido bom, muito bom, aliás. Há muito tempo não sinto os lábios de Travis nos meus dessa forma, nem suas mãos apertando minha cintura e minha nuca tão intensamente, nem seus cabelos macios entre meus dedos finos.

Eu me sentia errada, e ao mesmo tempo a pessoa mais exata do mundo. Só de pensar em quantas outras bocas a de Travis já havia estado me sentia enjoada, e ao pensar que agora ela seria minha também.

Não sabia muito bem como havíamos chegado a esse ponto. Dança com o Will, dedos delicados, soco, braços fortes, puxão, quintal, palavras gritadas, desculpas, parede, boca. Tinha quase certeza de que essa era a ordem de que as coisas tinham acontecido, quase... A única coisa com que realmente me importava naquele momento era que tudo voltasse a ser como era antes. Sem brigas, sem periguetes, sem armários de limpeza, sem fobias, sem depressão.

Alguns segundos depois Travis se descolou parcialmente de mim, levando suas mãos grandes e geladas até as minhas que se encontravam em sua nuca, sua testa encostada na minha e os olhos firmemente nos meus, indecifráveis. A respiração acelerada. Não sei se pela adrenalina ou pela necessidade de ar que o beijo nos causara.

Não tínhamos necessidade de discutir o passado, mas as palavras saíram da minha boca antes que eu pudesse impedir e logo as lágrimas inundavam meus olhos.

–Por que Trav? Por que você me abandonou daquela forma?
–Juro que não faria isso sem meus motivos Kay, me perdoa por favor.
–Motivos? Que tipos de motivos te levariam a fazer isso?
–Vou te contar tudo, prometo. Mas antes vamos pro meu apartamento.

Olhei para Travis com olhar assustado e desconfiado. Ele simplesmente sorriu.

–Calma, não vou tentar nada okay? Sei dos seus planos de castidade até eu colocar uma aliança dourada nesse dedo.

Sorri com a atitude dele e o segui até seu carro, inexplicavelmente sabendo que poderia confiar nas suas palavras.

POV Travis.

Talvez levar Katie para o meu apartamento não tenha sido a melhor opção. Por muito tempo vários tipos de pés pisaram ali. Mas não se engane, não, nunca faria nada com ninguém que não fosse a Katie. Simplesmente levava garotas para jantarem em meu apartamento, esperando que alguma delas tivesse as mesmas atitudes de Katie para que eu pudesse simplesmente me apaixonar por outra pessoa. Como pode ver, nada disso adiantou. Agora, vendo a Kay entrar na minha residência, com a ponta dos pés descalços tocando o assoalho, os olhos verdes grandes e desconfiados, senti as mesmas borboletas no estômago que não sentia a anos, senti que meus olhos brilhavam ao vê-la e um sorriso totalmente sincero estampar meu rosto.

Em pouco tempo Kay e eu já havíamos esquecido qualquer tipo de vergonha ou receio. Embarcamos em uma empolgante conversa sobre filmes e séries enquanto ela estava sentada em cima do balcão da minha cozinha, tomando suco de abacaxi e balançando as pernas, que não eram grandes o suficiente para se encostarem ao chão.

Assim como eu esperava, logo o assunto acabou e, quando Katie abaixou a cabeça e aquietou as pernas, eu sabia o que viria a seguir. Queria muito mesmo poder adiar isso, mas enquanto esse peso pairar sobre nós, nunca voltaremos a ser como antes, antes de toda essa confusão acontecer. Me levantei da cadeira onde estava sentado e fui até ela, levantando seu rosto com o dedo indicador. Estremeci ao ver seus olhos inundados pelas lágrimas e ainda mais inútil ao lembrar que eram por minha causa.

Katie Pov.

Deixei algumas lágrimas rolarem enquanto Travis me abraçava. Só percebi que estava prendendo o fôlego quando solucei pelo choro e, ao aspirar aquele cheiro novamente, lembranças voltaram a tona em meu subconsciente.

Flashback:

Estava começando a sentir falta de ar, minhas unhas já estavam azuis por conta do ar condicionado ligado ao máximo e meu vestido que deixava boa parte das minhas pernas amostra.

Já tentara abrir a porta milhões de vezes, mas, sem duvidas, haviam trancado pelo lado de fora. Já passava da meia-noite e a única coisa que me confortara até o momento era a voz de Travis me dizendo que buscaria ajuda e que faria de tudo para que eu saísse dali bem. Porém essa sensação de conforto já passara a algum tempo. Faziam exatamente duas horas e trinta e sete minutos que Travis me prometera ajuda. E até agora nada.

De repente o frio aumentou e minhas pálpebras já não tinham força para se manterem abertas. Tudo ficou escuro e só me lembro de ter acordado em uma maca, pensando que fosse a manhã seguinte e ter sido informada de que haviam se passado duas semanas.

Travis Pov

Ali, abraçado com Katie, foi que percebi o quanto fui idiota por ter acreditado em palavras inúteis de pessoas inúteis naquela noite de baile. Logo algumas lembranças inundaram a minha mente.

Flashback:

Estava desesperado por ajuda. Quando ouvi os gritos de Katie vindo do armário de limpeza simplesmente enlouqueci e, assim que tive certeza de que era ela, sai correndo atrás de alguma ajuda.

Depois de alguns segundos trombei com alguém, mais especificamente Lily. Tentei pedir rápidas desculpas e continuar correndo, mas mãozinhas com unhas gigantescas pintadas de vermelho escarlate me segurarem e não me deixarem continuar meu caminho.

–Travis, querido. – ouvi uma voz enjoada dizer. – Fiquei sabendo que a Katie ficou presa no armário de limpeza.

–Exatamente por isso que eu estou correndo, será que você poderia me sol...

–Calma, querido. – Ela me interrompeu – Fiquei sabendo também que foi o Smith que prendeu ela lá dentro sabia?

–Como assim Lily? Aah quando eu pegar esse cara. – Senti meu sangue ferver.

–Hey hey. O pobrezinho não teve culpa de nada, nããão. Esses olhozinhos aqui viram tudinho em. Vi muito bem que a Katie seduziu ele, sim. Não o culpo de tê-la trancado lá dentro depois que a namorada dele viu tudo. – Ela disse com voz inocente e futriqueira.

–Não, não Lily. Você deve ter visto errado e...

–Prefere mesmo acreditar na sua namoradinha fajuta do que em mim? Que te conhece desde o primário?

–Na verdade nós nunca fomos amigos e...

–Isso não vem ao caso, querido. O que importa agora é que a sua namoradinha te traiu na cara dura. Tem mesmo certeza de que ainda quer vê-la a salvo como se fosse uma pobre princesinha inocente?

–Certo, você me convenceu.

Minha raiva foi maior do que qualquer outro sentimento e só me lembro que, ao sair dali, fui para um barzinho de esquina qualquer e bebi todas quanto me corpo podia aguentar, acordar no outro dia em uma cama desconhecida, com uma pessoa desconhecida, em uma casa desconhecida.

Imediatamente peguei o celular e liguei para Miranda, A noticia me veio a tona: Katie estava em coma por hipotermia.

Katie Pov.

Depois de muito choro, muita conversa e muito suco de abacaxi, Travis e eu acabamos nos resolvendo e... bem, posso dizer que tudo voltou ao normal, como antes de tudo aquilo acontecer.

Algumas semanas já haviam se passado e Travis estava mais fofo do que nunca. Já não sabia mais onde enfiar os ursinhos de pelúcia quase diários que eu recebia, sem contar as visitas inesperadas e os chocolates quentes em dias frios.

Nunca me senti tão bem em toda a minha vida e tenho certeza de que aquele brilho nos olhos de Travis nunca estiveram tão fortes como agora.

Desde que voltamos nunca mais tive meus ataques de choro e de claustrofobia, depressão fora daqui e tanta certeza de que talvez, algum dia, poderíamos ter nossos felizes para sempre. Até porque, quando a magia começa, ela nunca pode terminar.