Em Chamas - Peeta Mellark escrita por Nicoly Faustino


Capítulo 15
Capítulo 15




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A tempestade, não diminui durante os dias seguintes. Vou até o telefone várias vezes com o intuito de ligar para Katniss, mas desisto. O que eu poderia falar? Conversar sobre o tempo? Isso ia ser ridículo! Durante esses dias tortuosos, deixei que minha depressão tomasse conta de mim. Não comi, pouco dormi, e acho que nem banho tomei. Mas eu pintei, muito. Depois de 3 dias trancafiado em casa, o telefone toca, eu disparo para atende-lo, já sabendo quem é.
– Peeta! Quer ir até o centro comigo, agora? – Katniss pergunta, parecendo ansiosa.
– É claro! – respondo sem esconder minha empolgação.
Quando coloco o telefone no gancho, observo as tantas telas que pintei. Katniss está em todas elas. Com um vestido deslumbrante vermelho, com uma jaqueta velha que ela usa para caçar, com um sorriso no rosto, uma lágrima no olhar.... Acho que pintei todas as facetas de Katniss. De todos os modos possíveis. Devo estar enlouquecendo. Junto todas as telas, e enfio num quarto nos fundos da casa. Deixo a foto que a mãe de Katniss me deu, lá também. Tomo um banho, que apesar de estar delicioso o contato da agua quente com a minha pele, é rápido. Me visto, e como um pedaço de pão velho que está em cima da mesa. A ligação de Katniss me tirou daquele estupor, que eu me deixei levar, e quando estou saindo de casa admito o fato de que estou realmente com fome. Volto e devoro o resto do pão, e mais um. Vou até a casa de Haymitch, e para minha surpresa ela já está lá.
– Você demorou – ela comenta.
Bom, é que tive que guardar um monte de retratos seu que passei três dias pintando sem parar, tive que tomar banho, pois eu estava todo sujo de tinta, e fedendo. E por fim, comi dois pães inteiros, por isso demorei. Eu queria responder isso.
– Me desculpe – é o que respondo.
– Vocês não estão pensando em me tirar dessa casa com o tempo assim, estão? – Haymitch pergunta, saindo do banheiro, com uma aparência horrível.
– Nós precisamos – Katniss responde impassível.
Ele assente com relutância, e saímos os três, andando por um caminho sinuoso que foi limpo no dia anterior, com paredes de neve ao lado maiores que eu.
Quando nos afastamos o bastante da Vila, é Haymitch que quebra o silencio.
— Então, estamos indo para o maravilhoso desconhecido, não estamos? — ele pergunta.
— Não — Katniss responde. — Não mais.
— Trabalhou nas falhas daquele plano, não foi, docinho? Alguma ideia nova?
— Eu quero começar uma revolta.
Haymitch só ri. Eu fico observando-a, para saber se entendi direito. Pensar numa revolta contra a capital, me estremece. Mas se Katniss quer lutar, eu vou estar ao lado dela.
— Bem, eu quero uma bebida. Diga-me como isso vai funcionar para você, entretanto— ele diz.
— Então qual é o seu plano? — ela retruca nervosa, enquanto eu assisto á discussão.
— Meu plano é ter certeza de que tudo está perfeito para seu casamento. Eu liguei e remarquei a sessão de fotos sem dar muitos detalhes.
Isso me pega de surpresa. Eu achei que... depois de tudo, esse casamento de fachada não iria mais acontecer.
— Você nem tem um telefone — Katniss diz.
— Effie o consertou. Você sabe que ela me perguntou se eu queria despachá-la? Eu disse a ela que quanto mais cedo, melhor.
— Haymitch — ela implora.
— Katniss. — Ele imita o tom dela. — Não vai funcionar.
Um bando de trabalhadores com pás de ferro, passa por nós a caminho da Vila, fazendo a nossa discussão cessar. Porém, nos damos conta de que já estamos perto demais da praça, o que faz com que continuar a conversa, seja arriscado. Quando chegamos a praça, paramos boquiabertos com as mudanças que aconteceram em míseros três dias, de tempestade intensa. Eu disse a Katniss que nada iria acontecer com esse mau tempo, mas estava terrivelmente errado.
A praça foi transformada. Um grande estandarte com o brasão de Panem está pendurado no teto do Edifício da Justiça. Pacificadores, em uniformes branco-puro, marcham sobre os paralelepípedos limpos. Pelos telhados, mais deles estão de guarda com armas. O mais desalentador é uma linha de novas construções – um posto oficial de açoitamento, algumas barreiras de defesa, e uma forca – colocada no centro da praça.
— Thread trabalha rápido — comenta Haymitch, se referindo ao novo pacificador chefe.
Do outro lado da praça, vejo uma fumaça espessa, e chamas enormes. Ali fica o prego. Cutuco Katniss com o braço, e ela encontra a direção em que olho. Seu rosto assume uma expressão de espanto e preocupação.
— Haymitch, você não acha que eles ainda estão... — ela não consegue terminar a frase.
— Não, eles são mais espertos que isso. Você seria, também, se tivesse passado mais tempo por aqui. Bem, é melhor eu ver quanto de álcool o boticário pode distribuir.
Ele sai, e Katniss olha para mim desconfiada.
— Para que ele quer isso?
A pergunta fica no ar, até que a resposta lógica, se infiltra em nossa mente. Para beber.
– Não podemos deixá-lo beber isso. Ele vai se matar, ou no mínimo ficar cego. Eu tenho um pouco de licor branco em casa – Katniss diz imediatamente.
— Eu também. Talvez isso o segure até Ripper encontrar um modo de voltar aos negócios — digo. — Eu preciso checar minha família.
— Eu tenho de ir ver Hazelle.
— Eu vou, também. Vou parar na padaria no caminho de casa — falo.
— Obrigada – é tudo o que ela responde.
A visita é rápida. A preocupação de Katniss desaparece, quando descobre que a mãe de Gale não foi visita-lo depois da tempestade por estar cuidando da caçula, que está com sarampo. Porém, a visita não é nada confortante. Descobrimos que as minas fecharam, não se sabe até quando, nem o porquê. Isso é terrível pois esse é o trabalho de 90% dos homens aqui no distrito. Hazelle, depois do incidente na praça, também perdeu seu trabalho que era lavar roupa das pessoas mais abastadas. As coisas estão tomando um rumo muito ruim por aqui. Agora, fica claro para mim, que um romance jamais poderia impedir uma revolta. Mas ações, geram reações, e muita gente inocente pode acabar pagando, se uma guerra vier mesmo a acontecer.
Quando saímos da pequena casa, Katniss me olha demoradamente. Penso em dizer tanta coisa para ela, mas só fico a fitar seu olhar. Sua expressão cansada. Tudo o que eu queria era devolver a alegria para essa garota. Ou melhor, dar alegria a ela, pois como eu posso devolver algo que ela certamente nunca teve?
— Você volta. Eu quero ir ao Prego – ela declara, quebrando o silêncio, e o momento.
— Vou com você – digo firmemente.
— Não. Eu já te dei problemas demais.
— E fugir de um passeio no Prego... isso vai consertar alguma coisa para mim?
Sorrio, e pego sua mão. Um gesto, para que ela entenda que eu sempre estarei ao seu lado. Andamos pelas ruas cinzas desse distrito escuro e triste, mas dentro de mim, uma chama de alegria está acesa, pelo fato de Katniss não ter tirado sua mão da minha, e por estar segurando até agora, mesmo já tendo chegado ao nosso destino, o prédio em chamas. Que costumava ser o prego. O seu segundo lar.
Depois de ver com os próprios olhos, a destruição, e constatar que não há mais jeito, ela insiste em verificar se as pessoas que trabalhavam lá estão bem.
— Não hoje, Katniss. Não acho que seremos de ajuda para qualquer um que estava ali – eu digo.
Ela hesita antes de começar a protestar, e depois assente. Afinal, estou certo.
Passamos na padaria, onde ela compra vários bolos do meu pai. Ele conversa um pouco comigo, sobre o tempo, e eu penso em como é bom ter uma conversa trivial, quando tanta coisa séria está acontecendo. Meu pai parece não perceber essas coisas ou finge não ver. Nos despedimos, e voltamos para casa. No caminho de volta, é Katniss que procura minha mão.
Conforme os dias vão passando, as coisas só pioram. Metade do Distrito 12 está passando fome. O número de crianças assinando as tésseras sobe, mas elas frequentemente não recebem seus grãos. Nas minas, os salários são cortados, as horas estendidas, mineiros são mandados para lugares de trabalho extremamente perigosos. A aguardada comida prometida pelo Dia da Parcela chega estragada e contaminada por roedores. E as instalações na praça sempre são usadas. Katniss convenceu Haymitch a contratar a mãe de Gale como governanta. É muito estranho chegar lá, e achar a casa limpa, arrumada, e comida no fogão. Mas ele nem percebe, pois está quase enlouquecendo com o racionamento de bebidas a que está sendo submetido. Não há mais onde comprar, e o que temos, daria para ele beber em uma hora, mas ele tem que segurar e fazer isso durar ao menos uma semana. Ou duas. Doentes, chicoteados, pessoas morrendo de fome, vivem entrando e saindo da casa de Katniss, para que a mãe dela e Prim possam atuar como médicas, que não são. Nas raras vezes em que vou até a padaria, no caminho as pessoas fogem de mim, se escondem. Katniss disse que acontece o mesmo com ela. Mais uma coisa que nos liga. A única coisa boa que aconteceu no meio desse caos todo, é que agora a floresta está realmente proibida. Katniss não se atreve a entrar lá, assim posso ficar sossegado, pois não verei ela naquela praça sendo castigada. Não por esse motivo.
Está entardecendo, depois de mais um dia como todos os outros, quando percebo a presença de dois pacificadores na vila. Vou me esgueirando até a casa de Haymitch que tenta controlar sua surpresa, sem muito sucesso. Ficamos espiando pela janela, quando eles entram na casa de Katniss, e não saem. Quase meia hora se passa, mas eles ainda estão lá. Precisamos agir. Passo em minha casa, e pego alguns pães que assei de manhã, e Haymitch e eu partimos, preparados para o pior. Quando abrimos a porta, os pacificadores, um homem e uma mulher, nos fitam numa expressão indecifrável. A mãe de Katniss está cozinhando, e Prim, brinca na sala com seu gato feio. Elas estão agindo naturalmente, mas posso sentir a tensão no ar.
– Que bom que vocês chegaram rapazes – a mãe de Katniss grita, demonstrando uma alegria exagerada.
– Katniss disse que estava com você Peeta – Prim comenta, me olhando fixamente.
– Ela estava em casa, mas depois disse que ia visitar uma amiga. Conversar sobre o casamento, essas coisas – invento.
Coloco os pães sobre a mesa, e o par de pacificadores continuam imóveis no corredor. Quando passo por eles, o homem informa:
– Temos uma mensagem para sra Everdeen. Ela demora?
– Acredito que não – respondo e vou para sala com Haymitch.
Passa-se horam até que Katniss chegue. O jantar já está frio. Haymitch e eu jogamos dama ao lado da lareira para disfarçar o nervosismo. Quando a porta se abre, a mãe de Katniss dispara pelo corredor, e seu suspiro de alívio confirma que ela está bem. Tenho vontade de correr daqui e vê-la, mas o olhar de Haymitch me censura, como se dissesse, seja cauteloso.
A mulher pacificadora, começa um interrogatório, e Katniss responde evasivamente. Quando chega a sala, arqueia uma sobrancelha ao encontrar eu e Haymitch ali.
— Então onde você não esteve? — diz Haymitch numa voz entediada.
— Bem, eu não estive conversando com o Homem da Cabra sobre engravidar a cabra de Prim, porque alguém me deu uma informação errada de onde ele morava — ela diz para Prim enfaticamente.
— Não, não dei — diz Prim. — Eu te disse corretamente.
— Você disse que ele vivia ao lado da entrada oeste da mina.
— A entrada leste — Prim corrige.
E então elas começam uma encenação muito convincente sobre quem errou sobre o endereço do tal homem da cabra.
— Era definitivamente leste — digo, encerrando a discussão.
Olho para Haymitch, e nós rimos. Ela me olha séria, e eu paro de rir, fingindo estar sério também.
— Desculpe-me, mas é o que eu digo. Você não escuta quando as pessoas falam com você.
— Aposto que as pessoas disseram a você que ele não vivia ali hoje e você não escutou outra vez — diz Haymitch.
— Calado, Haymitch — ela responde tentando ficar séria.
Todos começamos a rir, menos os pacificadores, que assistem a cena com muita desconfiança.
— Ótimo. Outra pessoa pode saber o que fazer com aquela cabra estúpida — ela diz, fazendo-nos rir ainda mais.
Quando a mulher pede para ver o que tem na bolsa de Katniss, eu estremeço, mas ela vai tranquilamente até a mesa, e a despeja. Nada comprometedor cai. Avisto um pacote de balas e as pego.
— Aah, menta — exclamo, colocando uma na boca.
— Elas são minhas – ela responde enquanto tenta pegar o pacote de volta. Eu jogo para Haymitch, que pega um punhado, e depois joga para Prim.
— Nenhum de vocês merecem doces! — ela repreende.
— O quê, porque estamos certos? — me aproximo dela, e a envolvo em meus braços. Ela solta um pequeno gemido, e eu logo entendo que tem algo errado, e que ela está machucada. Trocamos mais algumas alfinetadas, e para ser mais convincente, nós nos beijamos. Isso parece satisfazer os pacificadores que ainda estão aqui.
Quando eles finalmente vão embora, pensamos que poderíamos relaxar, mas o que eles disseram deixaram todos atônitos. A cerca do distrito 12 está com eletricidade.
Eu vou juntando uma peça a outra e começo a entender o que pode ter acontecido. Eu apoio Katniss até uma cadeira onde a sento. Sua mãe a examina e logo detecta problemas com seu pé, e seu cóccix. Prim faz algumas compressas para colocar nos lugares machucados, e depois a ajuda a colocar um pijama. Todos vamos jantar na cozinha enquanto Katniss come na sala. Quando ela termina de comer seu terceiro prato de sopa, toma uma xícara de chá, com um pouco de sonífero, para conseguir dormir apesar das dores, e eu a tomo em meus braços e a levo a sua cama. Ela fica sonolenta imediatamente, e quando a deito, e a cubro, está quase dormindo. Dou um beijo em sua testa, e desejo boa noite. Me demoro um pouco olhando seu rosto, quando sinto sua mão agarrar a minha.
— Não vá ainda. Não até que eu durma – ela pede.
Isso me pega de surpresa. Eu sento ao lado de sua cama, ainda sem entender se ela realmente quer isso, ou se é um efeito colateral do sonífero. Prefiro acreditar na primeira hipótese enquanto acaricio suas mãos, me sentindo leve, sentindo o amor que sinto por ela transbordar dentro de mim.
— Quase pensei que você tivesse mudado de ideia hoje. Quando você se atrasou para o jantar – digo, querendo saber o que aconteceu de verdade.
— Não, eu teria te contado.
Será? Seria tão mais fácil ela fugir com Gale, já que os dois estão acostumados a vida na floresta.
Sou interrompido de meus pensamentos, quando Katniss pega minha mão e roça sobre sua bochecha. Seus olhos estão se fechando, e ela parece se deliciar com meu toque em seu rosto. Ela solta minha mão, mas eu continuo, afagando seus cabelos agora. Eu gostaria tanto de ficar aqui. De poder ficar ao seu lado, sentir o calor de seu corpo. E como se tivesse lido meus pensamentos, duas pequenas palavras saem de sua boca.
— Fique comigo.
Num estado de choque, e plena felicidade, me deito ao seu lado. E espontaneamente, a respondo.
– Sempre.
Ela já adormeceu, e eu a puxo para mais perto de mim. Sei que não poderei passar a noite aqui. Mas preciso absorver cada segundo desse momento. Com um sorriso bobo no rosto, beijo sua testa e repito a única e incontestável verdade.
– Sempre estarei com você. Sempre.
Gostaria que este momento durasse a eternidade, mas escuto a mãe dela me chamar, e com relutância, me afasto de seu corpo. Enquanto caminho pesaroso até a porta, dou uma última olhada em Katniss. Uma lágrima escorre até meus lábios, que ainda estão sorrindo. Eu a enxugo, e saio fechando a porta atrás de mim.
– Sempre – sussurro mais uma vez, antes de descer as escadas.


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