Sangue e Alma escrita por FireboltVioleta


Capítulo 8
Nada Mais Que Isso




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/557612/chapter/8

HERMIONE

Pulei como um gato na cama, sibilando tão violentamente quanto uma chaleira fervendo.

Onde Rony estava com a cabeça? Eu... beber o sangue... dele?

Eu só não estava retaliando sua sugestão por que estava paralisada demais de choque para sequer poder reagir.

Ao mesmo tempo, aquela fera bestial no fundo da minha mente se empertigava toda, um tanto maliciosa e enternecida com a ideia do sangue dele entrando em meu corpo.

Pensar no como ele estava disposto á fazer aquilo - á fazer tudo para me ajudar naquela semana - fez as lágrimas voltarem aos meus olhos ressecados.

Balancei a cabeça. Isso era uma loucura completa.

– Você não é exatamente desacostumada á loucuras, Hermione - Rony murmurou, parecendo ler minha mente outra vez.

Sua mão, que fazia uma trilha circular em minha bochecha, me impedia de pensar claramente, tanto quanto o leve latejar das veias dele em contato com minha pele.

Engoli em seco. Estava sem me alimentar á quase dois dias.

Mas ao mesmo tempo, a minha imagem bebendo o sangue dele era repulsiva demais.

Foi como quando Rony me beijou naquele momento bizarro á minutos atrás. Eu estava violentamente dividida entre retribuir seu abraço até não ter mais forças e matar minha sede em seu ombro quente e latejante.

Era errado, caramba. Mas era tentador também.

Rony segurou minhas mãos, me impedindo de levantar. Ele franzia as sobrancelhas, parecendo agoniado e preocupado... mas não consigo mesmo.

– Vamos, Hermione... não tem que ser difícil como você pensa.

Olhei para o bisturi em cima da mesa, e senti um arrepio que nada tinha a ver com dor ou sede.

Rony riu com minha insegurança. Nossa, quanto tempo que eu não o via rir tão despreocupadamente...

– Olha... - Rony levantou minha cabeça cabisbaixa com a mão, até que eu olhasse para ele - se não der certo... se parecer que você vai me machucar, eu impeço você. Prometo.

Suspirei. Bom, para evitar maiores brigas, acho que eu podia fazer uma forcinha para tentar a sugestão dele. Se não desse certo, paciência... aí ou eu ficaria em coma pela Poção do Sono até o fim da semana ou então deixaria de ser manhosa e aceitaria doações estranhas.

Assenti de leve, ainda preocupada.

Minha determinação caiu em algum lugar embaixo da cama quando Rony apanhou o bisturi. Foi fazer companhia para o meu estômago, que também se encolheu em algum lugar no colchão.

Reagi por instinto e puxei o instrumento da mão dele, atônita.

Ele me olhou, dividido entre o desafio e o humor.

– Você quer fazer?

Eu, hein... balancei a cabeça de novo.

Rony bufou quando tirou o bisturi das minhas mãos trêmulas.

– Então sossegue aí...

Arfei, quase entrando em pânico. Caramba, quando eu sentisse o cheiro, a sede ia atacar, e aí eu estaria definitivamente ferrada.

Fechei os olhos, respirando pela boca.

Rony me cutucou. Abri os olhos de novo, e dei de cara com sua expressão risonha.

– Relaxe, Hermione.

Sua voz estava procurando ser tranquilizante, mas não ajudou muito.

Ele ergueu a mão esquerda e passou o bisturi levemente na palma.

Quase caí da cama quando as primeiras gotinhas de sangue brotaram em sua mão aberta.

E quando o cheiro de sal e ferrugem chegou até mim, minha primeira reação foi tentar recuar.

Mas então, aquele bicho dentro da minha cabeça me empurrou para frente, perto dele. Minhas mãos aninharam a de Rony. Olhei para ele, temendo ver alguma reação de medo ou dor.

Ele só me observava, sorrindo. A perfeita cara de jogador de pôquer. Ele era muito bom nisso.

Ele assentiu, me encorajando.

Aproximei a boca do ferimento, e sorvi devagar algumas gotinhas. Passei a língua nos lábios, ainda observando as reações de Rony.

Quando engoli, enquanto minha parte humana revirava de repulsa, minha parte vampirizada dançava uma conga. Minha garganta pareceu tomar água pela primeira vez na vida. Desde que caíra doente, me senti melhor e menos dolorida, apenas com um pouquinho de sangue. Olhei do ferimento para a expressão curiosa de Rony.

OK... acho que dava para fazer isso.

Me inclinei de novo e prensei um pouquinho a mão de Rony com os lábios, tentando fazer o sangue sair outra vez.

Dei três longos goles antes de recuar o corpo e avaliar seu estado.

Ele inclinou a cabeça, me observando com cuidado.

– Tudo bem?

Santa Mãe. Ele que estava sendo esvaziado como uma garrafinha de suco de abóbora e era eu que o preocupava? Rony bobão...

Ri baixinho; a risadinha virou uma bufada estranha.

– Acho que sim - ele sorriu, balançando a cabeça para o teto.

Aproximei novamente sua mão em minha boca, mas apenas para beijar o corte na palma.

Rony finalmente arregalou os olhos, parecendo surpreso. Se eu tivesse mais sangue no corpo, tinha certeza que teria corado com sua expressão enternecida e satisfeita.

– Quer mais?

Balancei a cabeça em negação. Ainda estava com sede, mas podia aguentar até que estivesse mais adaptada á nova "rotina" na Sala Precisa. Eu podia esperar um pouco até ter certeza que não ia me descontrolar totalmente ao beber mais sangue do que a quantidade que eu tomara naquele momento.

Ele recolheu a mão, acenando com a varinha para o corte fechar.

Tentei dizer obrigada, mas a palavra ficou presa em algum lugar em minha garganta. Abaixei a cabeça, sem saber como agradecer. Era um saco não poder falar. Meus olhos ameaçavam lacrimejar outra vez, só que de raiva.

Mas Rony pareceu captar o que eu queria dizer.

– De nada.

Sorri, um pouco envergonhada. Eu ainda achava errado não poder retribuir aquele favor insano que ele fizera, mas o que eu podia lhe dar na situação que eu estava?

Minha parte humana sabia. Já a vampirizada revirou os olhos e sentou no canto do meu cérebro, emburrada.

Rony pareceu agradavelmente surpreso quando eu o abracei, beijando sua bochecha. Ele retribuiu, apertando-me contra seu corpo.

– Não, Hermione - ele murmurou quando recuei a cabeça, sem me soltar - realmente não fiz mais do que minha obrigação... - ele sorriu, enlaçando uma mecha dos meus cabelos em sua mão recém-curada - eu cuido do que é meu.

Sua última expressão me surpreendeu. Uma onda involuntária e arrasadora de carinho passou por mim. Algo que minha parte vampirizada não conhecia mesmo.

Definitivamente eu não tinha tanto sangue no corpo para me dar o luxo de corar; se continuasse naquele ritmo, ia ficar doente outra vez com o excesso dele em minhas bochechas.

– Só vou pedir que tente ser menos cabeça-dura essa semana, tá? - disse Rony, ao me soltar - menos pessimista, pelo bem da Humanidade, garota. Nada mais que isso... pode ser?

Por que não? Concordei com a cabeça. Ainda dava para ser eu mesma, não é? Não ficar no meio de vampirizados irracionais e nem implicar com os humanos. Ficar comportada ali, me alimentando do jeito mais civilizado possível para uma vampirizada e sem arrumar confusão. Não era impossível. Eu podia fazer isso.

Mas o destino definitivamente é um batedor com um balaço. Ele o joga para onde bem entender...

E o balaço, naquela semana funesta, fui eu.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Sangue e Alma" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.