Sobreviver escrita por Nadii


Capítulo 4
Capítulo 4


Notas iniciais do capítulo

Olá!

Bom, quero primeiro agradecer as pessoas que estão acompanhando a fic! Muito obrigada, o capítulo é pra vocês!!
Da outra vez que postei a fic, tive mais acompanhamentos e comentários, agora com 3 capítulos, nem mesmo um "Tá horrível, pode parar!"!
Apenas é muito importante a opinião de vocês, se estão gostando ou não, aceito críticas também! =)
O capítulo de hoje é muito especial, gosto muito dele e ficou maior também.
Talvez vocês vão achar algumas mudanças muito rápidas, mas essa é a minha visão, acho que algumas situações podem mudar bastante uma pessoa!

Boa leitura!! ;)



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/556939/chapter/4

Esse é apenas mais um dia em que acordo suando e assustada, mas sem gritos, com a sensação de que estava sufocando, como se toneladas de entulho tivessem sido jogadas sobre mim. Analiso a minha volta, ainda estou no meu sofá. Olho para fora, o dia ainda não amanheceu. Aos meus pés está Buttercup dormindo tranquilamente. “Como queria ter um sono assim. O que estou pensando? Tendo inveja de um gato? Logo esse gato?”.

Me conheço o suficiente para saber que não vou mais conseguir dormir. Levanto e subo as escadas em direção ao meu quarto. Ao chegar no final dos degraus, observo a porta no fim do corredor. Nunca mais entrei alí, seu cheiro ainda deve estar em todos aqueles cantos. As vezes até ouço a sua voz, sua risada ao sair e descer correndo para a cozinha. Ainda dói tanto. Não sei dizer se ao certo, um dia, essa dor irá embora. Não sei se, realmente, quero que ela vá, porque tenho medo de que a dor leve também minhas lembranças e eu não quero esquecer dela.

Perdida em meus pensamentos, não sei dizer exatamente quando cheguei ao meu quarto. Observo tudo ao redor. A cômoda, a cama colocada entre dois criados-mudo, o guarda-roupa, a poltrona acomodada em um canto combinando com a decoração. Tudo perfeitamente em ordem. Greasy Sae mantém tudo limpo e organizado mesmo sabendo que pouco o uso. As cortinhas brancas, que durante o dia deixaram passar toda a luz vinda de fora, agora permite que a pouca claridade vinda da lua cheia ilumine o quarto. Mas conheço muito bem esse lugar da casa, ainda que estivesse na penumbra, andaria tranquilamente por aqui.

Respiro fundo e adentro o cômodo. Vou correndo os dedos pela parede, o mesmo tom gelo de sempre, e passo para a cama. Novas lembranças inundam minha mente, de um tempo que parece ser eras atrás: no dia em que torci o pé ao pular a cerca por uma árvore. Quando cheguei em casa, dois pacificadores me esperavam, ou melhor, acho que eles não me esperavam. Depois que foram embora, percebi que estava machucada. Peeta me trouxe até o quarto e passou os dias seguintes cuidando de mim, me carregando no colo e trazendo comida na cama. Nesse tempo também, fizemos o livro de eravas da família, onde ele acrescentou seus desenhos ás descrições que eu escrevia. Por mais estranha que fosse a nossa relação e por mais confusa que eu fosse, nós estávamos ali, cuidando um do outro, sempre.

A simples menção do nome dele já provoca em meu corpo sensações muito estranhas. Um frio na barriga, algumas batidas a mais no coração. Mas isso não é ruim. Imediatamente corro os olhos para a gaveta onde guardo meus pertences mais importantes. Automaticamente, meus pés deslizam para aquele lugar, como numa dança desesperada para me agarrar ao meu ponto de equilíbrio. Abro a gaveta e pego a pérola. Perco minutos, horas olhando para ela, tocando-a com meus lábios como se dela eu pudesse beber do mais doce mel, ou como se dela saísse o remédio que eu preciso.

Lentamente encosto as contas na parede e vou descendo, até estar sentada no chão agarrada à pérola como se dela dependesse a minha vida. E, talvez, dependa. Ela é a âncora que me mantém presa à realidade, ela não deixa eu me perder completamente em minha loucura. Ela me segura no pouco que resta da minha sanidade. Essa pérola é a única beleza que ainda enxergo perto de mim. Ela é real. A prova de que tudo foi real.

Essa é minha rotina todos os dias: me fechar em meu quarto e ficar com minha pérola, meu pequeno e mais precioso presente. Já não choro mais. Sim, muitas das vezes que passei aqui foi pra me derramar em lágrimas. Mas agora não, não mais. Agora esse é meu passa-tempo, uma terapia, um mantra que eu murmuro pra mim mesma e que me garante alguns momentos de paz. Uma paz que tem prazo pra acabar, por isso tento me prolongar ao máximo aqui. E assim, tomada pela calma, adormeço agarrada à pérola.

O barulho de algo sendo revirado, do metal sendo arrastado e o cheiro de terra molhada me despertam. Estou deitada no chão do quarto, com os joelhos encolhidos, cabeça apoiada sobre o braço e não tive pesadelos. Percebo que o som continua, sento-me por impulso e tento assimilar de onde ele vem. “O que está acontecendo lá fora?”, é o que penso quando chego a conclusão de onde está o barulho.

Levanto em um pulo e corro para fora do quarto. Desço as escadas, passo por Greasy na cozinha e saio porta fora. Paro e fecho os olhos por puro instinto. O Sol já percorreu um bom caminho pelo céu e forço meus olhos a acostumarem com aquela claridade toda. Passado isso, ando até o lado da casa seguindo o som que fica mais forte a cada instante.

Quase não acredito no que meus olhos veem. “Não pode ser!”. Ali na minha frente, abaixado plantando alguns centímetros maiores, parece mais magro, vestindo uma camiseta branca, calça escura e sapato. Estico a mão para tocá-lo mas recolho antes de encostar nele.

– Peeta... - é tão baixo o tom da minha voz que quase não sai, que mais parece um sussurro. Tantas semanas sem falar e não imaginei que a primeira palavra seria seu nome chamado ele próprio. Ele se vira e levanta rapidamente me encarando com aqueles olhos azuis que eu pensei que nunca mais veria. Aquele azul me hipnotiza está tão claro quanto consigo lembrar.

– Katniss! - ele finalmente quebra o silêncio e parece surpreso em me ver.

– Peeta.. você voltou – agora estou confusa. Ele estava na Capital, não era para estar aqui. Não que eu não quisesse. Espera! - Por que você voltou? - minha voz faz a pergunta que martela em minha mente.

– Porque aqui é a minha casa. Esse é o meu lugar e não tem nenhum outro pra eu estar – ele fala com tanta calma e convicção.

Só então desvio o olhar de seus olhos, seu rosto está mais fino, seus cílios continuam tão claros quando bate um raio de sol, sua boca forma um pequeno sorriso, sem mostrar os dentes. Mas aquele simples gesto me faz querer sorrir também, mas não o faço. Reparo em seus braços, mesmo mais magro, continua forte, suas mãos carregam uma pequena pá e estão sujas de terra. Atrás dele há um carrinho e neles algumas flores.

– O que está fazendo? - pergunto tentando relacionar as coisas.

– Desculpa, cheguei ontem e queria te fazer uma surpresa. Achei que ela merecia ser lembrada. - diz e aponta para as flores. Aí percebo que não são quaisquer flores, são as flores dela. São Prímulas Noturnas, as flores que deram nome à minha irmã. Aquilo foi um choque de realidade pra mim. Apertei a pérola entre meus dedos e a palma da minha mão. Olhei para as flores, tão lindas, mas doía tanto olhar para elas. Olhei nos olhos de Peeta, procurando um sinal de que isso não passava de uma brincadeira de mau gosto, mas não tinha. Ele mantinha a mesma expressão inocente de sempre.

Aquilo era demais pra mim.

Saio de lá correndo, voltando para dentro de casa. Pude ouvir Peeta chamando meu nome, mas não paro, nem olho para trás. Entro rápido na sala, passando pela cozinha, ouço também os chamados de Greasy Sae, mas continuo. Subo as escadas, entro no meu quarto e tranco a porta. Olho para a pérola em minhas mãos, não sei o que sentir, se isso é bom ou não, se me alegra ou não. Guardo a pérola em seu lugar e vou para o banheiro. Ligo a água para encher a banheira enquanto tiro as roupas olhando pelo espelho minhas queimaduras, estavam piores do que nunca. Quando a banheira já está cheia, entro e me apóio em uma das extremidades. “Como é bom”, penso. Fico ali sem pensar muito, apenas aproveito aquele momento. Ao notar que meus dedos já estão enrugados por ficar tanto tempo na água saio da banheira, me enrolo na toalha e vou até o meu guarda-roupa. “O que vestir? Preciso pensar e só tem um lugar para isso”. Visto minha calça, uma camiseta e a jaqueta que era do meu pai. Calço minhas botas de caçar, pego a bolsa, faço a minha trança e saio do quarto.

Ao chegar na sala, Greasy me analisa e tem um brilho diferente no olhar.

– Vai sair, menina? - pergunta, mesmo já sabendo a resposta.

– Não me espere tão cedo – aviso e saio.

Em passos exitantes rumo para fora da Vila dos Vitoriosos. Logo alcanço o centro do Distrito. Não há mais tantos entulhos quanto antes, tem construções novas, casas novas, comércio novo. Fico muito surpresa ao ver tudo aquilo, mesmo Haymitch tendo me contado, é diferente quando vê por si própria. A praça está bonita, agora conta com um gramado muito bonito e bem cuidado, também tem um espaço onde vejo algumas crianças brincando, já tinha visto isso na Capital, mas nunca pensei em ter um aqui no Doze. Continuo caminhando em direção à Costura, a curiosidade é maior pra saber como estão as coisas por lá. Há casas simples, não são muitas, mas bem feitas e parecem ser melhores que as de antes. Algumas pessoas me reconhecem e vem falar comigo. Perguntam como estou, outros dizem que souberam sobre a volta de Peeta, algumas crianças me olham como se eu fosse a coisa mais maravilhosa. Isso me incomoda. Sorrio forçado, pra não parecer mal-educada e me apresso em sair dali.

Rumo direto para a floresta. Não posso deixar de reparar na Campina. Estamos entrando na primavera e posso perceber algumas flores renascendo. Chego rapidamente a cerca que separa o distrito, por puro instinto aproximo o ouvido apenas para ter certeza que não está eletrificada. E não está. Acho que a cerca é mantida somente para deixar os animais selvagens afastados.

Entro na floresta atenta aos ruídos ao meu redor. Parece que mesmo todo esse tempo longe não me fez perder o jeito de caçadora. Procuro um tronco oco onde guardava meu arco e flecha. No primeiro não tem nada, mas eu tinha alguns escondidos, logo vou em busca de outro e encosto alguns metros dentro da mata. Ando sem pressa por entre as árvores. Não estou aqui exatamente para caçar, mas sim para pensar e o arco é apenas para minha segurança. “Mas porque quero estar segura?”. Pronto. Agora começaram minhas dúvidas de novo.

Chego até a pedra onde encontrava com Gale. Sempre gostei de ficar ali. Sentada no meu antigo ponto de referência, me permito pensar sobre a vida. Gale, aquele lugar me lembra tanto meu velho amigo. Amigo. Como sinto falta de tê-lo por perto, de caçar e dividir esses momentos com ele. Mas não posso ter ele aqui pois é inevitável não associar ele a morte de Prim.

– Ah, Prim! Seria tão mais fácil com você aqui comigo. Você é a pessoa que mais amei. Preciso de você, patinha!

Impossível conter as lágrimas agora. Lembro de tudo o que passamos. De quando era apenas um bebê tentando andar dentro da nossa velha casana Costura. Depois, quando nosso pai morreu e minha mãe ficou inerte a tudo, como dormia comigo e eu cantava para embalar seu sono. Teve a vez em que lhe dei uma cabra de presente, a Lady, e ela cuidou tão bem do animal, com toda certeza seria uma grande médica. E, apesar de difícil a vida que levávamos, eu tinha um motivo para fazer meu melhor a cada dia. Prim era esse motivo. Mas aí veio aquela maldita Colheita e eu me voluntariei em seu lugar. Ela não podia morrer, eu não podia deixar. Apesar de ganhar os Jogos, entrar na arena pela segunda vez e ajudar em uma guerra, apesar de todo esse esforço, de nada valeu. Prim morreu de qualquer forma e eu sei que a bomba que Gale projetou, juntamente com Beete, fez isso.

Não suportando mais ficar naquele lugar, volto a andar floresta a dentro. Avisto muitos pássaros entre os galhos das árvores, até pensei em subir em algumas delas, mas não sei se tenho força o suficiente. Andando ainda mais, avisto algumas frutas, colho umas ameixas e como. É tão bom sentir esse gosto novamente, tem sabor de saudade. Mas não aquela saudade que dói. Lembra meu pai e os momentos que passamos juntos aqui. “Meu pai”.

– Pai, você também me faz tanta falta. Você e Prim eram meu mundo. Não sobrou mais nada dele agora. É tudo tão escuro e confuso! Eu não aguento mais!

Não permito que as lágrimas caiam novamente. Respiro fundo e sigo vasculhando a floresta. Há alguns tordos próximos a mim, um sorriso tenta se formar em meus lábios e eu emito um assobio de quarto notas. Repito mais duas ou três vezes e eles começam a imitar. Esse som ecoando me faz olhar o topo das árvores. É como se ela estivesse ali, pulando entre os galhos, leve como uma pena, minha pequena aliada. Rue. Minha amiga. Mais uma vítima de Snow e seu desejo por poder.

Um barulho me tira desses devaneios, atento para o que possa ser. Estreito os olhos analisando os arbustos próximos. Um pouco mais a frente avisto uma família de coelhos. Poderia caça-los, mas não vou comer, então deixo-os partir.

Ando mais um pouco e finalmente decido onde quero chegar. O lago. Sem mais demorar me ponho a caminhar naquela direção. Olho a posição do sol e sei que já faz um par de horas que estou na floresta. Em cerca de trinta minutos chego ao meu paraíso. O lago continua incrivelmente lindo. Suas águas transparentes, ao final um rochedo que abre em uma caverna que engole parte da água. Meu pai chamava aquele lugar de gruta, mas nunca me aventurei lá, ele dizia não ser seguro. Nunca trouxe ninguém aqui, exceto na vez em que fiz o pronto-prop no Treze, mas não é como se tivesse sido por vontade própria.

Tiro minhas roupas, ficando apenas com as peças íntimas e mergulho no lago. A sensação é tão reconfortante, como se o meu próprio pai estivesse a me abraçar. Fico alguns minutos ali aproveitando essa tranquilidade. Visto minhas roupas e sento-me ao sol para secar. Apanho na bolsa mais algumas ameixas e como. É a primeira vez em meses que repito esse gesto duas vezes no mesmo dia. Isso realmente quer dizer alguma coisa. Observo a paisagem a minha frente tentando gravar cada detalhe. “Isso daria um belo desenho”. Esse pensamento me leva ao loiro de olhos azuis como o céu que apareceu ao lado da minha casa hoje cedo.

– Ah, Peeta, por que você voltou? Você não me odeia?

Essas palavras são exatamente o que me deixou confusa e perdida o dia todo. A última vez que o vi, ele não me deixou morrer e agora vem dizer que aqui é a sua casa. “Mas como se não restou nada? Além de estar no Doze, ainda vai plantar flores pra ela?” Confesso que em algum momento senti raiva pela sua atitude, mas agora pensando melhor, foi muito bonito de sua parte.

“... queria te fazer uma surpresa. Ela merecia ser lembrada”.

Pensando melhor em suas palavras: ele quis fazer uma surpresa, “mas por quê?”. Só se faz isso quando se quer agradar alguém. E eram as flores dela. “Ele quer me agradar?”. Sim, ele quer, ficou claro na frase dele. Mesmo eu sendo tão burra pra entender as pessoas, consigo notar isso. Essa conclusão é suficiente para fazer meu peito palpitar e cem borboletas fazerem festa em meu estômago.

– O que está acontecendo comigo?

São reações e sensações que somente Peeta provoca em mim. Quando me agarro à pérola nas manhãs é como se estivesse abraçada a ele, a simples menção de ter uma parte sua por perto é capaz de me acalmar. Esse é um efeito que apenas Peeta tem sobre mim.

– Mas então ele lembra de mim? Ele gosta de mim?

As perguntas vem aos montes em minha mente. “Isso não pode? Pode?”, é tanta confusão. “O que eu vou fazer?”, isso eu realmente não sei. Porque eu não tinha um objetivo de vida, apenas esperava o dia em que iria sucumbir ao torpor e morrer finalmente. Nunca pensei na possibilidade de Peeta voltar. Isso muda tudo.

Muda? Com certeza muda! Mas o que eu vou fazer? Eu simplesmente fugi apavorada. Talvez fosse medo de ser uma visão, talvez fosse medo de ser verdade. E se ele achar que eu o odeio? Não, isso eu não posso permitir!

Agora sei que preciso fazer alguma coisa. Se Peeta, com tudo o que sofreu, pode tentar melhrar, eu também posso. Mas não sei o que fazer e como fazer.

– Na verdade eu sei como descobrir!

Levanto-me de onde estou, ciente de que não posso me prolongar ali, logo estará entardecendo e realmente será perigoso. Adentro novamente a floresta, mas dessa vez em busca de uma boa caça. Ando um bom pedaço e avisto um esquilo, me concentro, preparo a flecha e atiro. No olho. “Parece que não perdi totalmente o jeito”. Esse pensamento me conforta. “Acho que não estou tão perdida, afinal”. Colho algumas ervas e mais algumas frutas, pego mais um esquilo e rumo para casa, decidida a fazer algumas mudanças na minha vida.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Então, pessoas fofas?
O que acharam?
Por favor, deixem suas opiniões, críticas, sugestões... enfim!

Até o próximo!

Beijão! ;)