Conselheiro Amoroso escrita por Ellen Freitas


Capítulo 26
Família || Peeta


Notas iniciais do capítulo

Olá!!! É isso mesmo produção, Ellen voltou depois de quatro dias? Sim!!!

Partindo direto para um dos meus capítulos preferidos da fic toda!!!
Tá acabando, que dó no coração...

Até as notas finais... Boa leitura!!! Bjs*



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Dobrei o boné recolocando no bolso de trás da minha calça e prendi os óculos escuros no primeiro botão fechado da minha camisa. Katniss suspeitava mais a cada dia que tinha algo errado comigo. Talvez eu fazê-la esperar no carro com Prim dormindo em seu colo durante cinco minutos, enquanto eu conferia a rua, ou mesmo pegar caminhos mais longos, tenha dado alguma dica, mas eu não importava, segurança em primeiro lugar.

Mike tinha capangas em todo lugar e não deixaria as duas expostas antes que eu mesmo me certificasse que era seguro entrar no prédio.

Dar algumas voltas extras na cidade, usar o boné e os óculos para vir visitá-las parecia estúpido, mas eu preferia não arriscar que alguém me visse entrando aqui e descobrisse que eu tinha uma filha de apenas cinco anos.

― Leva essa sua namorada de volta! ― Johanna esbravejou para mim quando abriu a porta e me deu passagem. ― Ninguém aguenta mais essa puta! ― foi quando notei as vozes alteradas vindas do quarto de Katniss. Dei um suspiro de pesar, deixei as sacolas no balcão da cozinha e segui naquela direção.

― ...porque quis, eu estaria muito bem na casa do Peeta.

― Prefiro arrancar meus olhos que te deixar ficar para lá. Aliás, prefiro arrancar os seus mesmo.

― O que foi dessa vez? ― perguntei já sem paciência para aquelas brigas.

Como não tínhamos muita escolha, eu preferiria que Katherine estivesse no meu apartamento. Assim, eu pagaria Grease Sae para cuidar dela em alguns momentos, fazer comida, e me alojaria com Finnick quando não estivesse de plantão.

Mas a cabeça dura da Katniss não largava a firme ideia que se ela estivesse lá, eu “cairia nas garras da cobra novamente”. Quando tentei amenizar o clima fazendo uma piada sobre cobras não terem pernas, muito menos garras, ela me olhou furiosa e saiu murmurando algo tipo “idiota que merece ser enganado”, me deixando parado sozinho no corredor. Minha mente me mandava ficar feliz e lisonjeado com as ceninhas de super proteção e ciúmes, mas acima de tudo, eu não queria vê-la chateada.

― Manda a sua namoradinha relaxar Peeta. Garota mais tensa.

― Manda a sua namoradinha deixar de ser uma lesma preguiçosa! Meu quarto está virando uma zona de guerra porque ela não quer nem arrumar a própria cama. ― passei os dedos pelo cabelo em um gesto impaciente.

― Katniss só está chateadinha porque, como estou aqui, ela não pode continuar com as orgias com aquele namorado gato. Ou com você, quem sabe. ― Katherine destilou mais veneno e eu fiquei pensando em o que dava na cabeça dela para achar que eu a amaria de novo sabendo exatamente como ela era.

― Vai. Se. Foder. ― Katniss sibilou raivosamente, seus olhos enchendo-se de lágrimas de ódio.

― Ei, fica calma. ― tentei me aproximar.

― Não me manda ficar calma. Eu te odeio Peeta Mellark! ― ela me empurrou com força e saiu em direção ao corredor. Katherine já ia começar a rir quando a olhei com repreensão, fazendo-a transformar o deboche em um sorriso de falsa inocência. Fui atrás de Katniss.

― Me desculpe por tudo isso, é minha culpa.

― Eu nunca, nunca trouxe um cara com essas intenções pro meu quarto, por causa de Prim, você sabe! E ela quer me fazer de empregada, eu já tenho muita coisa na minha cabeça agora, muita coisa. Eu não atendo meu namorado desde ontem, porque se eu fizer isso vou acabar descontando tudo no coitado que não tem nada a ver. ― nesse ponto, Katniss já chorava muito. ― E ainda tem o inferno dessa TPM que me fez chorar na sua frente e na dela!

― Vai tudo ficar bem. ― a abracei. Eu não sabia se tudo ia ficar bem, mas era a única coisa que eu poderia falar no momento.

― Você acha? ― ela perguntou coçando o nariz vermelho do choro.

― Acho. ― menti simplesmente. Por essa e outras razões que eu mantinha as ameaças de Mike apenas para mim mesmo. Ela já tinha coisas demais na cabeça. ― Você não me deixa ajudar com Katherine, e também não sou a pessoa mais indicada a te fazer ficar bem com seu namorado, mas pelo menos acho que tenho algo para sua TPM. ― abracei seus ombros a conduzindo até a sala. ― Sorvete de chocolate. ― falei confidente ao seu ouvido.

― Sério?! ― seus olhos brilharam como os de uma criança na manhã de Natal.

― Com pedacinhos de bombom, seu preferido. Era para a Prim, mas acho que ela vai ficar feliz em dividir com você.

― Eu te amo Peeta Mellark. ― Katniss beijou meu rosto e saiu saltitante em direção à cozinha, mudando completamente seu humor, enquanto eu, o idiota apaixonado, fiquei fitando o vazio à minha frente sem mexer um músculo sequer.

Peeta, me ajuda aqui! ― a voz irritante de Katherine me tirou dos meus devaneios sobre uma vida ao lado da minha melhor amiga. Bufei antes de voltar ao quarto.

― O que é dessa vez? ― questionei impaciente.

― Quero sentar naquela cadeira, mas não consigo por causa da minha perna.

― Porra Katherine, custa fazer um esforço?

― Mas dói... ― ela fez beicinho e falou manhosa. Rolei olhos e a peguei no colo, mas sem aviso ela apoiou as mãos em meus ombros e já se inclinou para me beijar. A larguei na poltrona sem cerimônia antes que ela conseguisse o objetivo.

― Ai Peeta, quer quebrar minha coluna dessa vez? ― a morena reclamou acariciando as próprias costas.

― Mantenha suas garras de cobra longe de mim e da Katniss!

― Cobra nem tem...

― Tio Peeta, tio Peeta! ― Prim entrou animada no quarto. ― Olha o que eu fiz. ― me agachei à sua altura e ela me estendeu uma folha de papel com várias imagens desenhadas.

― Que lindo Prim, quem são?

― Essa sou eu e minha mãe, o senhor e tia Kat, tia Madge e tio Gale e meu futuro cachorro Bruce. ― sorri para o desenho que me mostrava de mãos dadas com Katniss e Prim. ― E tem esse aqui de presente. ― ela me deu outra folha. Nela, apenas estávamos eu e ela.

― Pra mim?

― Sim! ― ela bateu palminhas animada.

― Obrigado princesinha. ― ela me abraçou e me deu um beijinho no rosto. ― Tem sorvete na cozinha, porque não pergunta pra sua mãe se você pode comer um pouco?

― Sim sim. ― quando já me virei para acompanhá-la, percebi que Katherine me olhava com um misto de curiosidade e desconfiança.

― O que foi?

― Não sabia que você era bom com crianças Peeta.

― Você não sabe de 1% da pessoa que me tornei Katherine.

― Quantos anos Prim tem?

― Não é da sua conta. ― desviei o olhar do dela já sabendo o rumo que aquela conversa estava tomando.

― Ela me lembra muito o Matt, sabia?! Madge uma vez comentou que quando você chegou aqui em Denver era muito diferente de hoje e Katniss vive dizendo que eu te deixei quebrado, inconsequente e meio doido. Quando perguntei a Johanna sobre o pai de Prim, ela apenas desconversou.

― Onde você está querendo chegar com isso criatura?

― Você é o pai. Caralho, você é o pai da Prim! ― ela falou mais alto e batendo com o punho fechado no braço da cadeira como uma atestação da recente descoberta. Tentei rir já saindo do quarto.

― Você perdeu o juízo.

― E você não sabe mentir!

Era só o que me faltava. Enquanto Prim era apenas a afilhada de Katniss, Katherine não teria o mínimo interesse nela, mas ela tendo a certeza da loirinha ser minha filha, tinha até medo do que ela podia fazer para conseguir o que queria comigo. Mas uma certeza eu tinha: nem ela, nem Mike iriam encostar um dedo na minha pequena.

― Podemos ter um problema. ― sussurrei para Katniss quando sentei-me ao seu lado no sofá e a via colocar uma colher enorme de sorvete na boca. O meu objetivo de deixa-la fora dos meus problemas ganhou uma nova perspectiva quando ela teria que afastar Prim de Katherine, já que eu não estaria sempre presente.

― Não. Nada de problemas. Daqui pra frente, só soluções. ― ela falou resoluta.

― Katherine sabe sobre Prim... ― Katniss me olhou em expectativa. ― ...e eu.

― Que droga Peeta, você já foi dar com a língua nos dentes?

― Eu? ― a segurei pelo braço e levei para o corredor para não sermos ouvidos. ― Na verdade foi você, Johanna, Madge e muito provavelmente Finnick.

― Como assim?

― Do mesmo jeito que ela descobriu sobre Mike Willis. Ouviu uma conversa aqui e outra ali e juntou as peças. Katherine é um monstro da perspicácia e dedução.

― Não pareça tão impressionado. ― ela cruzou os braços emburrada.

― Não estou impressionado, estou malditamente preocupado. Você tem que manter ela longe da minha filha. ― pedi. ― A ideia de mudá-la pro meu apartamento não é tão má agora.

― Mas nem fodendo! Ela fica e eu cuido de Prim, relaxe.

Meu celular começou a apitar e logo que Katniss tirou o próprio do bolso do jeans, pois também estava sendo chamada na folga.

― É do hospital. ― falei.

― Mais especificamente da Dra Coin. ― completou. ― O que ela ia querer comigo?

― Imagino que tem relação com a única paciente que nos liga. Annie Cresta. ― falei já sentindo que viria mais um problema por aí.

~

― O que eles estão fazendo aqui? ― Finnick ergueu-se da cadeira preocupado. ― Peeta e Katniss não tem nada a ver com isso.

― Então o senhor está tentando me convencer que seu melhor amigo, que também foi médico da paciente em questão, e a psicóloga dela não estavam cientes do que acontecia entre vocês dois? ― Dra. Coin falou ríspida.

― O que está acontecendo aqui?

― O hospital vai enfrentar um processo por parte da família Cresta, graças ao conquistador aqui. Os pais dela viram os dois juntos e agora estão alegando abuso de incapaz.

― Ela não é incapaz! ― Finn falou revoltado.

― Não mesmo. ― Katniss interveio. ― E eu posso comprovar isso.

― Então vocês confessam que estão ajudando o Romeu e a Julieta do Exempla?

― Eles não confessam nada! Peeta e Katniss não sabiam e não pode provar o envolvimento deles. Podem ir...

― Somente eu chamo e dispenso as pessoas aqui doutor Odair. ― ela deu a volta na mesa para ficar em frente a nós dois. ― Os dois tem algo a me falar ou vão deixar o amigo de vocês se ferrar sozinho?

― A Dra. Paylor sabe que você está ameaçando os residentes?

― Fica quieta Katniss. ― pedi entredentes disfarçando um sorriso nervoso.

― Estou de TPM, me deixa. ― ela cochichou de volta.

― Vão falar comigo ou continuar a cochilar entre si? ― Finnick balançou fortemente a cabeça em negativa, um gesto mudo que nos calássemos.

Katniss finalmente tinha se rendido ao charme do casal Finnie (como ela passou a chamá-los) poucos dias atrás. Ela, assim como eu, entendeu a veracidade dos sentimentos de ambos e estava disposta a apoiá-los e tentar achar um modo de resolver essa complicada questão.

Mas não importa quão ferrada já estava minha vida, eu não iria deixar um amigo passar por isso sozinho, e julgando pela determinação nas íris cinzentas de Katniss, ela também não.

― O que está acontecendo aqui Alma? ― suspirei de alívio ao ouvir a voz da Dra. Paylor.

― O julgamento de Finnick Odair, meu residente. ― a bruxa do cabelo cinza ressaltou bem o pronome “meu”.

― Estou ciente da situação, mas o que esses dois estão fazendo aqui? ― ela apontou para nós dois.

― São testemunhas.

― Você está persuadindo-os e ameaçando para falar o que você quer, não é?

― Exatamente!

― Katniss... ― a alertei de novo. Ela franziu o cenho e me olhou como se não tivesse feito nada de errado.

― Estão liberados. ― Dra. Paylor nos dispensou. ― Depois falo com vocês.

― Não podemos deixar Finnick lá. ― Katniss falou depois que saímos da sala.

― Eu sei, mas também não podemos ficar no meio de uma briga entre nossas preceptoras. Vou pensar em algo.

― Esse Odair é muito burro mesmo! ― ela falou inconformada. ― Parece que o amor deixou ele doido.

― Vindo de você, isso é realmente uma ofensa. ― brinquei.

― Calado. ― ela brigou com o dedo em riste na minha direção, mas então riu. ― Estou indo ver o Haymitch, você quer vir?

― Vou aproveitar que estou aqui e resolver umas coisas que fiquei pensando durante a noite. Te vejo lá em alguns minutos e depois te dou carona para casa, pode ser?

― Perfeito.

Quando ela se afastou, coloquei meu plano em prática. Noite passada mal dormi pensando em um jeito de conseguir a autorização para o transplante de Haymitch, mas a única conclusão que eu cheguei me levava a uma coisa que eu não queria fazer: usar o poder do dinheiro. Mas como dizem, situações desesperadoras exigem medidas desesperadas, e eu já tinha meu itinerário: laboratório, jurídico e sala do poderoso chefão.

~

― Você está brincando comigo moleque.

― Não, eu não estou. ― coloquei um por um os blocos de papeis na mesa dele, que ainda me encarava meio incrédulo por tê-lo desafiado. ― Esses são meus exames mostrando a minha capacidade e compatibilidade para ser um doador. Esses são os do Haymitch, que também mostram que ele, apesar do certo risco, pode receber o transplante. E esse é uma cópia do testamento dele, que me coloca como único herdeiro de tudo.

― E o que eu tenho a ver com isso?

― Se a cirurgia não for autorizada e Haymitch morrer, eu vou usar todo o poder que tiver para que nenhuma única moeda entre no caixa desse hospital. O processo pode durar anos, você já vai ter morrido quando alguma verba chegar. ― ele abriu a boca para falar, mas continuei antes que ele o fizesse. ― Mas se tudo for autorizado e feito o mais rápido possível, Haymitch sobrevivendo ou não, eu multiplico por dez o valor que está destinado a esse hospital em testamento. ― ele me analisou atentamente por alguns minutos, o que já estava sendo bem constrangedor, até que sorriu.

― Coin já tinha me falado de você antes dessa confusão toda começar, Dr. Mellark. ― franzi o cenho sem saber onde ele estava indo com aquela afirmativa. ― Cirurgião prodígio, dedicado a salvar vidas, muito amado pelos pacientes.

― Estamos sem tempo Dr. Snow... ― falei sem paciência. Ele me ignorou e continuou falando.

― O que ela não me disse é do que você é capaz por capricho. ― o encarei cético. Como assim capricho? ― Está vendo esses gráficos? ― ele tirou uma pasta da primeira gaveta da mesa. ― Esse é o índice de mortes de crianças entre 0 e 12 anos aqui no hospital por falta de uma ajuda mais especializada. Esse aqui é o orçamento da construção de uma nova UTI Pediátrica, e esse é o balanço financeiro básico desse hospital, mostrando que não temos condições econômicas para isso. ― eu entendia cada vez menos às medida que me eram mostrados os quadros. ― O dinheiro do testamento de Haymitch seria destinado à construção de mais duas UTIs.

― Por que tá me dizendo isso?

― Agora imagine que você tem um único filho ou filha a quem ama mais que tudo na vida, e essa criança está mal. ― afastei a imagem de Prim doente da minha mente. Era muito ruim só de pensar. ― Ela acaba morrendo porque não tem um único lugar disponível que possa tratá-la com toda a atenção que precisa. Tudo isso para salvar a vida de alguém que tem 80% de chances de morrer na mesa de cirurgia. Mas se você veio aqui com tanta garra e ameaças, quem sou eu para discutir. ― ele estendeu a mão pedindo o último bloco de papeis em minhas mãos. Os da autorização.

Eu estava sendo manipulado. Mas não pude deixar de refletir até que ponto eu estava disposto a chegar para não perder outra pessoa que eu amava. Haymitch não tinha mais família e nem amigos, e se ele se fosse apenas eu seria o mais quebrado com isso. Mas sacrificar a vida de crianças pelo meu sofrimento? Eu não queria que alguém fizesse essa escolha se eu fosse o pai desesperado com Prim entre a vida e a morte.

― Mudou de ideia Dr. Mellark? ― respirei fundo antes de responder.

― Não. ― o sorrisinho vitorioso dele desmanchou-se com minha resposta. ― O transplante vai acontecer e meus termos continuam. ― finalizei mais firme.

Me permiti ser egoísta essa única vez. Se desse tudo certo, eu conversaria com Haymitch para autorizar a liberação do capital ainda em vida. Se desse errado, bem... O dinheiro era meu e eu poderia doá-lo todo e construir outro hospital se fosse preciso.

― Espero que consiga viver com as consequências das suas escolhas, doutor. ― ele assinou os termos e pelo último olhar fulminante que me lançou, eu sabia que tinha acabado de ferrar com minha carreira ali mesmo.

Fui direto ao setor cirúrgico e agendei o procedimento para daqui a três dias. Não tínhamos mais tempo para ficar enrolando.

― Aí ela ficou fazendo bagunça de propósito, quer dizer, não pode caminhar para ir buscar uma água em cima da mesinha, mas pode ir até minha cama e sujar tudo de molho de churrasco? Eu vou matar aquela vadia! Eu nem comecei a falar das ofensas e indiretas que ela fica me mandando o tempo todo! E ainda tem a Prim... ― Katniss parou no meio da frase ao me ver entrando.

― Peeta, você tem algum chama pra vadia, porque vou te falar... ― Haymitch começou zombeteiro. ― Você precisa dar um pé nessa vaca!

― Ele queria levar ela pro próprio apartamento, acredita?!

― Tá pedindo para ser enganado de novo...

― Foi o que eu disse para ele!

― Ok. Primeiro, eu estou bem aqui ao lado de vocês. Segundo, Katherine não é nada para mim, Katniss dá mais importância para ela do que eu mesmo. ― Kat ia começar a falar, mas continuei sem que ela tivesse a chance. ― E terceiro... tenho ótimas notícias. Alguém aqui vai para a sala de cirurgia, não para operar, mas para ser operado!

― Vai tirar seu dedo podre cirurgicamente Peeta? ― Haymitch zombou. ― Não estou falando de você docinho, que foi a única escolha certa que ele já fez na vida. ― ele falou para Katniss, que abaixou a cabeça corando um pouco.

― Consegui a autorização! ― voltei para o assunto. ― Nossa cirurgia é em três dias, logo hoje mesmo começa a sua preparação Hay.

― Sério Peeta? ― Kat levantou animada da poltrona. ― Como você conseguiu?

― Um pouco de persuasão e charme Mellark deram conta do diretor. Você vai ficar bom, meu amigo! ― a morena saltou em meu pescoço me abraçando em comemoração. Sustentei as mãos em suas costas, mas por cima do ombro dela, vi que a expressão de Haymitch não era nada boa.

― Katniss, querida, pode nos dar licença alguns minutos? Preciso falar com Peeta a sós.

― Claro. ― ela ainda gesticulou com os lábios um “o que foi?”, mas apenas neguei com a cabeça dando de ombros.

― Eu não vou fazer essa cirurgia. ― ele falou quando ficamos a sós no quarto.

― Claro que vai, que piada sem graça Haymitch. ― dei pouca importância ao caso, já pegando os papeis e uma caneta.

― Não vou assinar isso, é sério.

― Você vai sim.

― Você não manda em mim garoto. E além do mais, para que todo esse esforço? Não tem mais nada para mim nesse mundo, tudo e todos já se foram, restando apenas um velho rabugento muito doente e com uma montanha de dinheiro. Você vai fazer melhor uso desses bilhões.

― Eu não quero isso, já te disse. E que história é essa de que não tem mais ninguém no mundo? E eu? Katniss?

― Vocês são jovens e vão sobreviver sem mim.

― Mas eu não quero, que merda, entende isso! Eu preciso de você, minha filha precisa desse pseudo avô rabugento, todo mundo aqui precisa!

― Vocês vão sobreviver. ― ele repetiu. ― Eu sobrevivi. ― como o olhei sem entender, ele continuou. ― Maysilee Donner.

― Quem?

― Eu já amei alguém Peeta. Já amei alguém como você ama Katniss, e essa pessoa foi tirada de mim por um acidente horrível. Eu achei que não conseguiria ir em frente depois disso, mas eu fui. Você também irá.

― E você vem falar de perdas justo pra mim? Eu sei qual é a sensação de pensar que tudo não tem mais solução, então achar um caminho para seguir em frente, já fiz isso algumas vezes na vida. Mas eu não quero fazer de novo, não quando puder lutar contra isso. ― apertei forte na mão dele. ― Luta comigo Haymitch, não posso perder outro pai! ― meus olhos estavam marejados e os dele também, então ele riu.

― Você é um puta insistente garoto. Me dá esses papeis aqui. ― ele pegou a caneta. ― E saiba que se eu morrer daqui a três dias, a culpa vai ser sua.

~

― Nervoso?

― Katniss, sai daqui, já mandei! ― Clove falou irritada. ― Está atrapalhando minha avaliação.

Como procedimento padrão de transplante, eu e Haymitch precisávamos passar por uma avalição psicológica que atestasse que estávamos cientes dos riscos e aptos a tomar essa decisão. Por isso eu estava ali com Clove, e Katniss com a mão no queixo nos analisando.

― Eu queria fazer a avaliação, mas a Dra. Paylor diz que é conflito de interesse porque eu e Peeta somos bem... próximos. ― as bochechas dela estavam um tom acima de rosa quando sentou-se na poltrona do lado.

― Sai daqui Katniss, você está até de folga hoje!

― Sim, mas vou acompanhar Peeta durante todo o processo da cirurgia.

― Por mim ela pode ficar. ― dei de ombros.

― Mas por mim não, então vaza! ― quando ela levantou-se contrariada e abriu a porta do consultório de psicologia, quase esbarrou em um loiro alto de terno que entrava na sala.

― Com licença, doutor Mellark? Me disseram que estaria aqui. Trouxe laguns documentos para serem assinados.

― Ai meu Deus, eu conheço você! ― Katniss falou quase gritando. ― Você é o colega de trabalho do Gale que me deu um fora naquela noite que conheci Peeta na boate! Eu sou a garota que se jogou do balcão! Cara, que mundo pequeno. ― Clove fechou os olhos e comprimiu os lábios impacientemente.

― Então você é o babaca que vê uma garota machucada e não faz nada? ― usei meu tom brincalhão quando o cara parecia reconhecer Katniss.

― Me desculpe por aquilo. Eu lembro que tive que sair às pressas porque o namorado da minha irmã teve problemas com a polícia e eu precisei resolver a coisas.

― Você podia ter me dito.

― Eu tentei, mas você não parava de falar... Depois não tinha seu contato pra me desculpar.

― Você me disse que ele tinha te dado um fora sem razão Katniss. ― falei lembrando de uma das nossas primeiras conversas ainda a caminho do hospital naquela noite.

― Lembrando bem, acho que foi isso mesmo que ele disse. Cato, não é?! Esses são Peeta e Clove. ― dei um aceno rápido. ― Você trabalha aqui?

― Não, só estou substituindo um colega que trabalha no jurídico daqui.

― Peeta, imagina que se o namorado da irmã dele nunca tivesse tido problemas, nós nunca teríamos nos conhecido, você nunca saberia de Prim, eu nunca teria vindo trabalhar aqui... Não teria Katherine também, mas essa é a parte boa.

― Podemos retornar a conversa de onde deixamos, quase um ano atrás Katniss. ― o cara sorriu galanteador para ela, o que me fez apertar as mãos em punho, de repente ficando irritado.

― Obrigada, mas...

― Mas a fila dela não somente andou, como cresceu quilômetros. Você vai ter que passar pelo namorado e por esse aqui, então boa sorte. Agora vocês podem, por favor, me deixarem trabalhar e ir bater papo em outro lugar? ― Clove despejou tudo de uma vez cortando o assunto. Katniss a olhou irritada e Cato ergueu as sobrancelhas em surpresa, deixando escapar um risinho de lado antes de sair da sala.

― Duas frases e já impressionou o cara, muito bem.

― Do que você está falando?

― O advogado, ele gostou de você.

― Guarde suas opiniões e seus conselhos amorosos para quem quer ouvir Peeta. ― ela rebateu em uma mistura de timidez e irritação. ― Podemos terminar logo isso?

Assenti e continuamos.

Depois da sala da psicologia, resolvi passar para ver Haymitch antes de ir para o preparo propriamente dito da cirurgia. Conversamos alguns minutos e ele tentou me fazer prometer que, se ele morresse, eu ficaria pelo menos com parte do dinheiro e cuidaria da empresa para ele. O máximo que consegui prometer foi que faria o melhor uso possível, mesmo rejeitando veementemente a ideia de qualquer coisa sair fora do planejado.

― Tem certeza que está pronto para isso? ― Madge perguntou quando ajudava a posicionar monitores em mim, já no centro cirúrgico. ― Você vai ter muitas limitações, pode atrapalhar sua profissão daqui em diante. Você é brilhante Peet, quer mesmo arriscar? ― ela não olhou em meus olhos enquanto falava.

― Você sabe que eu faria isso por você também, não sabe?

― Esse é o problema Peeta, você faria isso por todo mundo. Mas e se não...

― Você e suas mãos minúsculas estarão aqui comigo. ― a interrompi. ― Confio em você baixinha. ― sentei-me lhe dando um beijo na testa. ― E fica de olho no idiota do Odair, certo?!

Eu sei, é só um segundo. ― ouvi a voz de Katniss do lado de fora. Estranhei o sumiço dela depois daquele momento com Clove, e já estava quase pedindo a alguém que fosse procurá-la.

― Você pode... ― pedi a Madge, enquanto olhava para Katniss através do vidro.

― Claro. Você tem um minuto Katniss. ― por algum motivo, os olhos e nariz da morena estavam vermelhos, como se estivesse chorando. Será que até ela era mais uma das pessoas que achava que eu estava arruinando minha carreira sem motivo?

― Eu não vou precisar de um minuto.

Eu já ia começar a dizer a Katniss como nas últimas 24 horas, meio mundo tem me tentado fazer desistir, principalmente Haymitch e Katherine, e perguntar porque ela estava chorando, quando senti seus lábios sobre os meus.

Meus olhos se arregalaram com o choque inicial, mas logo em seguida os fechei, usando uma mão para levantar meu peso e poder me aproximar mais dela, e outra ao lado do seu rosto mantendo-a mais perto. Suas mãos firmaram-se em meu pescoço e nuca, e senti a ponta de sua língua em meu lábio superior, quando ouvi um pigarro atrás de nós. Katniss se afastou apenas alguns centímetros me olhando fundo dos olhos.

― Ok, isso foi empolgante. ― Mad brincou, mas ainda não quebramos o olhar. Eu estava confuso e curioso.

― Te vejo daqui a pouco. ― Katniss me deu um selinho antes de sair e sala de cirurgia, me fazendo despencar na cama encarando o foco de luz branca acima de mim com um sorriso bobo nos lábios.

― Acho que podemos começar. Vamos só esperar a pulsação do Dr. Mellark ficar a menos de 120 batimentos por minuto. ― algumas pessoas riram.

Minutos depois e eu já estava fazendo a tradicional contagem regressiva proposta pelo anestesista até senti meus olhos pesarem e cair em sono profundo.

A primeira coisa que voltei a sentir foi o cheiro e o frio da sala de recuperação, onde tantas vezes já tinha ido visitar pacientes. Logo em seguida o barulho distante dos monitores e das pessoas que circularam por lá. Então o calor de um toque em minha mão.

Abri os olhos lentamente me acostumando com a luz, quando vi Katniss sentada ao meu lado. Ela me olhava apreensiva, então esbocei algo parecido com um sorriso.

― Ei você.

― Ei você. ― ela repetiu soltando minha mão, levantando-se e começando a fazer carinho em meus cabelos. ― Como está se sentindo?

― Estranho?

― Dói? Você sabe, aí... ― Kat indicou com a cabeça para o local da cirurgia.

― Ainda não, o efeito na anestesia não passou totalmente.

― Ah. Madge disse que você fez a sua parte, abre aspas, “com brilhantismo, como tudo que ele faz”, fecha aspas.

― Você ficou lá o tempo todo Katniss? ― ela suspirou, mas não negou. ― Ficou? ― o cansaço estava estampado em seu rosto.

― Eu tinha que me certificar que eles estavam fazendo as coisas certas. ― a morena riu timidamente olhando para as próprias mãos e depois no fundo dos meus olhos. Eu sentia aos poucos meu corpo se recuperando e já ia perguntar sobre o porquê do beijo e do choro, quando ela desviou o olhar do meu.

― A cirurgia de Haymitch começou há algumas horas.

― Você precisa descansar, mas antes pode me fazer um favor?

― Claro. O que você quer, mais travesseiros fofos, um cobertor? Gelatina?

― Me leva pra ver Haymitch?

― Não posso Peeta, Mad deu ordens expressas que você ficasse aqui por um bom tempo. Não posso simplesmente te levar onde quiser, você só acordou a alguns minutos!

― Eu preciso vê-lo, por favor.

― Não, já disse!

― A sala que iam operá-lo é aqui do lado. Eu vou nessa cadeira de rodas, olho através do vidro por alguns minutos e volto, prometo. ― Katniss bufou rendida.

― Eu vou lá fora, tomo um café e vejo como estão as coisas. Se der, te levo lá, ok?!

― Você é a melhor.

Olhei ao meu redor e como estava sozinho no quarto, comecei a desligar todos os aparelhos que estavam me monitorando, terminando por tirar o soro.

Quando Katniss voltou minutos depois, eu já estava pronto a ir para uma cadeira de rodas e ver meu amigo. Depois de tanto esforço, eu queria estar presente vendo cada detalhe do desenrolar da história.

― E você vai assumir toda a culpa se formos pegos.

― Não se preocupe, eu assumo.

― Ótimo. Você está bem mesmo?

― Sim. ― falei ignorando uma tontura repentina.

Através do enorme vidro, eu mal via Haymitch, já que uma dezena de profissionais cuidava dele. Madge, que liderou a minha cirurgia, agora estava lá auxiliando a Dra. Coin. Tudo parecia correr tranquilo e eu já estava quase pedindo para ser levado de volta, quando um dos monitores começou a apitar.

― A pressão está caindo doutora.

― Mais uma bolsa de sangue O negativo aqui. Estamos quase terminando.

― Batimentos subindo, saturação de oxigênio em baixa.

― Cadê a droga da bolsa de sangue? Aquele garoto não fez esse circo todo para perdemos o paciente aqui! ― alguém trouxe o sangue que foi infundido rapidamente, mas sem melhora.

― Peeta, vamos sair daqui.

― Não Katniss!

― Ele está parando.

― Alguém me traga o desfibrilador! Dra. Undersee. ― Madge se aproximou da janela para pegar o aparelho quando me viu na janela.

― “Sai daqui”. ― ela murmurou apenas com os lábios e voltou para a mesa. ― Qual é Hay, reage! ― Madge pediu quando começou as massagens cardíacas.

― Eu vou entrar lá...

― Ficou doido Peeta, claro que não!

― Ele está morrendo Kat, eu preciso entrar lá!

― Afastem-se. ― Dra. Coin ordenou quando o monitor cardíaco exibia uma linha reta e um barulho contínuo. ― Continuem as massagens.

― Ele está morrendo Katniss. ― não contive mais lágrimas e ela me abraçou. ― Ele está morrendo e eu não estou fazendo nada, de novo.

― Calma Peeta, estou aqui com você.

― Eu não posso perdê-lo.

― Peeta... ― o abraço dela estava mais forte em torno de mim.

― Não posso perder outro pai, Kat... Não posso perder mais ninguém! ― escondi meu rosto em sua blusa quando sentia as lágrimas dela pingarem sobre minha testa. Senti o local começar a rodar, e a última coisa que lembro antes de tudo escurecer novamente foi o mesmo barulho horripilante da máquina que me dizia que o coração dele tinha parado.


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Notas finais do capítulo

OMG, e agora?! Antes que me atirem facas ou outros objetos pontiagudos, lembrem que estou postando cada vez mais frequentemente certo? E comentem sobre o que mais gostaram do capítulo, estou ansiosa para saber e conversar com vocês pelos reviews...

Ah, e quem quiser entrar no nosso grupo do wpp, não hesite em deixar seu número!!!

Sobre CMDPOM...
*Madge Mellark: ou como Oliver considera: “a filha perfeita”, a morena tem parte da personalidade calma do pai e da tia, de quem ela herdou o nome. É justa, dedicada à família, faculdade e ao noivo, não abusa de nenhum dos privilégios de sua condição econômica favorável e tem talento especiais para a música, sendo o piano seu instrumento preferido. Tolera e aconselha Oliver a cada erro, sendo a melhor e mais sincera amiga do irmão caçula.
Será Merritt Patterson: http://www.eonline.com/eol_images/Entire_Site/201455/rs_634x1024-140605111600-634.merritt.cm.6514.jpg

Então é isso pessoal... Favoritem, recomendem e tals... Até os comentários!!! Bjs*