Desconexão escrita por Jafs


Capítulo 10
Lágrimas da justiça




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Ela ajeitou os óculos e apontou para um dos alunos, um garoto de cabelos e olhos castanhos claros.

“Nakazawa-kun!”

“S-sim sensei?”

“Qual é a idade ideal para casar?”

Ih começou.

Kyouko já sabia aonde aquela conversa iria chegar. Aturar as aulas da Kazuko Saotome era uma tortura. A mulher devia ser uma quarentona onde a única coisa certa na cabeça era seu corte de cabelo.

Nakazawa pensou e pensou, mas no fim balançou a cabeça negativamente. “Eu não sei.”

“ISSO!” Saotome apontou agressivamente para Nakazawa, depois dirigiu para sala. “Por isso meninas, se sua mãe ligar para você sobre homens, não se sintam pressionadas. Eu tenho 99,99% de certeza que ela não sabe essa resposta.”

“E para vocês meninos...” Ela continuou. “Só porque uma mulher chegou em certa idade, não significa que ela não esteja solteira. Entenderam?”

Nos primeiros dias ela achou graça naquilo, mas Kyouko Sakura não era reconhecida pela sua tolerância.

“Ô você aí.” Kyouko estendeu a mão para Saotome.

Saotome ergueu as sobrancelhas. “Saotome-sensei para você, Sakura-san.”

Sayaka, que sentava na carteira ao lado, ficou surpresa com a atitude da Kyouko.

“Tá bom.” Kyouko revirou os olhos. “Sensei, me diz uma coisa, por que tu não junta com uma mulher?”

“Como disse?!” Saotome se espantou.

Sayaka pegou o livro que estava sobre a carteira dela, o deixou em pé e enfiou a cara dentro dele.

Kyouko abriu os braços. “Sabe, eu ouço essa sua ladainha aí em todas as aulas. Se quer tanto uma companhia e não consegue homem, então tenta a sorte com uma mulher ué.”

Uma comoção começou a se formar na sala.

Madoka começou a se sentir desconfortável com aquele assunto.

Saotome parecia estar em choque. “M-mas isso é...isso é...”

Hitomi levantou da cadeira. “Amor proibido, sensei!”

Saotome apontou. “I-isso, Shizuki-san! Isso!”

“Amor proibido? Heh.” Kyouko fechou os olhos e falou com calma. “Bem... Se tu não gosta da fruta, sempre dá de arranjar um homem pra uma aventura ou outra por fora. ”

Saotome ficou sem palavras e mesmo se falasse seria só mais um som no meio do imenso burburinho instalado entre os alunos.

“Sensei! SAOTOME-SENSEI!” Porém uma menina havia conseguido chamar a atenção.

“S-shizuki-san...” Aquele nome saiu da boca de Saotome quase inaudível.

Hitomi expressou com toda a educação que haviam lhe ensinado. “Desculpe se estiver sendo muito intrometida, mas qual é a fruta que você não gosta?”

Madoka ficou completamente vermelha de vergonha. Ela procurou esconder puxando seus rabos de cavalo para frente do rosto.

“É?...” Saotome tinha acabado de virar uma estátua viva.

“Fufufufu...”

Hitomi e os alunos próximos olharam para Homura.

“O que estão olhando?” Homura respondeu com a sua rotineira expressão neutra.

“Sensei!” Sayaka levantou da carteira.

Aquilo havia quebrado o feitiço em Saotome. Ela ergueu os braços. “Ahhh! Eu não sei de fruta alguma!”

“Não é isso...hehe.” Sayaka coçou a cabeça. “Eu só estou pedindo permissão para ir ao banheiro.”

“Claro Miki-san. Claro.” Saotome ajeitou os óculos, que haviam saído do lugar. “Desde que não volte falando sobre frutas...”

“Obrigada sensei!” Sayaka saiu correndo da sala.

“Sem corr...” Saotome não chegou a terminar, vendo que Sayaka já estava longe.

Kyouko semicerrou os olhos e sorriu.

5

Saotome voltou sua atenção para sala, que agora estava em silêncio. “Bem...”

4

“...a aula já está quase no fim,...”

3

“...vamos mudar de assunto. Sim?...”

2

“...Vamos falar da atividade que vocês vão fazer em casa...”

1

“Sensei.” Homura se levantou da carteira.

“Akemi-san?” Saotome perguntou.

“Eu peço permissão para ir ao banheiro.” Homura folheou o livro sobre a carteira. “A tarefa envolve o livro, estou certa? Depois eu obtenho mais detalhes com os outros estudantes.”

“Sim, está.” Saotome balançou a cabeça, afirmando. “Mas eu não vejo necessidade de me convencer. Você é uma aluna exemplar. Permissão concedida.”

“Obrigada, sensei.” Homura se dirigiu a saída da sala em uma marcha rápida e firme.

“Ok.” Saotome voltou a falar com a sala. “Eu quero que todos visitem a página...”

Mas Kyouko estava com sua atenção voltada para a Homura seguindo pelo corredor, enquanto mordiscava o lábio com o seu dente canino.

“Heh.”

/人 ‿‿ 人\

Gostava mais quando você brincava de esconde-esconde comigo, Sayaka.

Homura estava sorrindo quando chegou ao banheiro. Não importasse aonde Sayaka tivesse ido, naquela distância Homura seria sempre capaz de sentir...

Quando Homura abriu a porta, se deparou com uma garota de cabelos curtos, acima da linha do ombro, olhando para o espelho entediada. Contudo a cor não era azul e sim negro como o carvão, a cor dos olhos era como de uma brasa ardente.

O coração de Homura começou a bater mais forte.

A garota olhou para Homura, que ficou parada enquanto a porta se fechava sozinha. Ela estranhou aquilo. “Oi...”

Homura fitava a garota, exalando uma aura hostil.

A garota virou para o único boxe que estava com a porta fechada e depois para Homura. “Vocês duas estão juntas?”

Homura cerrou os punhos. O silêncio parecia deixar o ar naquele ambiente cada vez mais pesado.

“É muda?” Garota perguntou desconfiada.

Homura respondeu aquela pergunta com outra. “Matando a aula de novo, Kirika Kure?”

Kirika arregalou os olhos. “Como você...”

“SAIA!” Homura demandou.

Kirika hesitou, confusa. Ela nunca havia visto aquela garota antes, mas agia como se fosse uma inimiga de longa data.

“Anda logo!”

A nova ordem estremeceu Kirika por completo. Agora ela abraçou a idéia de Homura ser sua inimiga, assim como ela havia abraçado para tantos outros. Esse mundo é estúpido.

Kirika saiu do banheiro, mas não antes de olhar com ódio para Homura enquanto passava por ela.

O sinal toca.

Homura não perdeu tempo: sua gema violeta em forma de losango surge sobre a sua mão esquerda. Então ela segura a maçaneta com essa mão, fazendo-a brilhar com sua magia. O som característico da tranca é ouvido.

Tenho que terminar logo com isso.

Ela foi até a pia que ficava de frente ao boxe com a porta fechada. Pelo espelho era possível enxergar a fresta por debaixo da porta do boxe, que revelava a sombra de alguém lá dentro.

Foi então que Homura se deu conta de como ela estava horrível. Ainda que ela fosse capaz de suprimir a sensação de sono com magia, suas pálpebras inchadas evidenciavam suas longas noites caçando mundo afora.

Lavou o rosto, mesmo sabendo que não bastaria. Voltou a olhar para o espelho, seus olhos agora brilhavam tanto quanto a gema em seu brinco.

O som da maçaneta girando em vão e da conversa lá fora a chamaram de volta para realidade. Ela tinha um trabalho a cumprir.

Homura então virou e estendeu sua mão esquerda até o boxe fechado. Logo um vapor negro começou sair, atravessando aquela porta, e espiralou em direção a gema sobre a mão dela.

Ela contou cada segundo.

A aflição hoje está maior que a média.

Porém estava segura que o processo terminaria antes que alguém desconfiasse sobre o banheiro. Não que ela não pudesse manipular as memórias no pior...

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Homura, chocada, parou imediatamente o que estava fazendo e rangeu o dentes. Sua respiração acelerou.

O vapor negro que não havia sido absorvido voltara para sua origem.

Homura ficou diante da porta do boxe. “Não esqueça... Lave e seque bem esse rosto antes de voltar para sala.” Depois destrancou e saiu do banheiro, ignorando as testemunhas curiosas. Havia algo mais urgente.

Caminhou de forma rápida e precisa, a passos largos. Ela fazia curvas tão abruptas nas esquinas que seus longos cabelos escuros chicoteavam quem estivesse no caminho.

“Ei! Cuidado!” “Aie...” “Whoa!”

Cerrou os punhos. Nada disso importava, só havia um objetivo a ser alcançado. E lá estava ele, no corredor próximo a sala de aula.

Madoka Kaname, um tanto corada e inibida, estava conversando com Kyouko Sakura, que tinha um pacote de batatas fritas na mão.

Os sentidos, enferrujados porém experientes, de Kyouko foram os primeiros a notarem a recém chegada. “Eiii! Se não é a nossa miss simpatia!”

Homura procurou manter sua compostura. “Sakura-san. Kaname-san.”

Madoka ficara ainda mais inibida com a presença de Homura. Ela só olhava para o chão.

Consciente de que poderia estar assustando com aquela chegada súbita, Homura buscou compensar forçando um sorriso e acalmando o tom da voz. “Olá. Sobre o que vocês estão conversando?”

“Nada demais. Só papo de garotas. Não é?” Kyouko deu uma piscadela para Madoka antes de consumir uma batata.

“Hum...é...” Madoka ficou vermelha e abraçou a si mesma. Depois deu uma risadinha. “Hihi...é...Eu acho que vou voltar para sala...é...vou fazer isso...”

Madoka passou entre Homura e Kyouko.

Kyouko pegou mais uma batata. “Bem... Acho que vou também. Heh.”

Homura segurou a braço da Kyouko.

“Hummm... Você é muito curiosa.” Kyouko sorriu.

Sem trocar olhares, Homura disse. “Venha comigo.”

Kyouko seguiu Homura pelos corredores da escola. Para ela aquilo sempre será um labirinto e as paredes de vidro transparente mais confundiam do que ajudavam. No entanto elas chegaram a um bloco de salas de alvenaria.

Kyouko agora tinha noção para onde Homura a estava levando.

“Entre.” Homura disse enquanto abria uma dessas salas.

Kyouko entrou em uma sala que não havia ninguém, com vários balcões com pias. No meio de cada balcão havia um conjunto de tubos de ensaios vazios. No fundo da sala havia armários contendo potes catalogados segundo a substância química que eles continham. No quadro ainda havia coisas escritas sobre a última aula que teve naquele laboratório.

Homura entrou e fechou a porta.

Kyouko virou-se para ela. “Nem sei pra que tudo isso. Aquela transferida nem havia pedido segredo.”

“Transferida?” Homura ficou confusa a princípio, mas depois percebeu o erro que havia cometido. “Ah sim.”

Kyouko colocou um punhado de batata frita na boca e depois ofereceu o pacote para Homura. “mmmhhh...Quer um pouffo? Esfftá...mmmhhh...bem croffante.”

Por falar com a boca cheia, fiapos de batata foram parar na face de Homura.

“Iifff... foi mal.”

Homura fechou os olhos e passou a mão no rosto para tirar os fiapos. “Apenas me diga o que vocês estavam conversando.”

“É como eu falei, papo de garota.” Notando a recusa da oferta, Kyouko voltou a pegar mais batatas no pacote. “Eu disse pra aquela lá que havia um garoto interessado nela.”

“C-como?! Um garoto?” Homura ficou surpresa. “Eu quero mais detalhes.”

Kyouko amassou o pacote vazio e arremessou em direção a lixeira. Entrou sem bater na borda. ”Heh! Três pontos.”

Homura cerrou os punhos. “Fale! Quem é?”

Kyouko ficou cutucando o queixo. “Sabe aquele que a Saotome fica alugando durante a aula? Putz! Está na ponta da língua, mas não quer sair...”

“Nakazawa??” Homura questionou.

“É! É! Esse mesmo.” Kyouko apontou para Homura.

“Você... está mentindo.” Homura disse enquanto puxava seu cabelo para trás.

“Não acredita?” Kyouko sorriu maliciosamente. “Ou será que é ciúmes?”

“Ciúmes?” Homura virou um pouco seu corpo para esquerda e procurou esconder a mão daquele lado atrás dela. Sua gema em forma de losango apareceu sobre o topo da mão.

Kyouko percebeu um leve trepidar nos tubos de ensaio. “Por que não? Aquele garoto não é de se jogar fora. Hum?”

“Não é nada disso.” A gema desaparecera. “Porém essa história vindo de você...”

Kyouko colocou as mãos atrás da cabeça. “Ó. Certeza, certeza mesmo eu não tenho. Só que sou eu que sento perto dele e vejo o garoto ficar olhando pra transferida. Ela pode confirmar isso.”

Homura ficou pensativa.

Kyouko continuou. “Esses homens de hoje em dia. Só querem saber de meninas inocentes, doces, meiguinhas... Não tem coragem de encarar mulheres duronas e independentes que nem eu e você.”

“Eu?” Homura apontou para si própria.

“Claro.” Kyouko pousou a mão no ombro direito de Homura. ”Dá pra ver na sua cara que cê passou por muita coisa.”

“Talvez.” Homura deu um tapa no braço de Kyouko.

“Ei!”

Homura então olhou nos fundos dos olhos de Kyouko e falou em tom ameaçador. “Sakura-san, fique longe da Kaname-san.”

“Ah é?” Kyouko respondeu em tom de desafio. “E se eu não ficar?”

“Você vai ficar.” Homura afirmou, segura de si. “Nossa conversa terminou.”

“Terminou não.” Kyouko irritou-se. “Cê não acha que tá pegando pesado?”

“Pegando... pesado?” Homura apenas repetiu, sem compreender o significado daquilo.

“Sim. Com a transferida.” Kyouko abriu os braços. “Eu nem devia chamá-la de transferida, ele já tá aqui faz meses.” Então ela apontou para Homura. “Mas cê não deixa ela se misturar com a galera.”

Homura continuou em silêncio.

“Eu só fui trocar umas idéias com ela e cê já vem ameaçando. Parece um cão de guarda.” Kyouko cruzou os braços. “Nos primeiros dias dela aqui até podia ser bom protegê-la, mas agora já é demais. Por que continua com isso? Hein?”

Homura sorriu. “Como você mesmo disse. Ela é inocente, doce e meiga. São qualidades que eu admiro, mas também são qualidades que outros usarão para se aproveitar dela.”

“É isso? Heh.” Kyouko sorriu. “Então vou convidar ela para dar um rolê pela cidade. Eu ensino ela como...”

Kyouko foi interrompida por um soco preciso no seu plexo solar. O movimento fora tão rápido que, mesmo estando de frente para Homura, ela não conseguira esboçar reação.

“Ahhgggnnnnn....ghghg...” Com o ar escapando de seus pulmões, Kyouko se ajoelhou e se abraçou de dor.

“Eu nunca impeço ela de ter amigos.” Homura continuou, com um largo sorriso. “Apenas não quero que ela seja alvo de más influências, sua delinqüente. Fufu.” Depois seguiu em direção a porta.

“Agh...Ah...” Kyouko então levantou a cabeça. “...Ah...cadela...durona...gnnn”

Homura por um instante parou, antes de sair do recinto.

/人 ‿‿ 人\

“ESTÁ LOUCA?!”

Kyouko, no quarto da Sayaka e pronta para dormir, havia acabado de contar para sua ‘prima’ sobre sua conversa com Homura e Madoka.

Kyouko respondeu a reação de Sayaka. “Nem! Ela continua a mesma, banca a sabichona, mas não tem a malandragem...”

Sayaka, que estava sentada na penteadeira, se levantou e arremessou seu prendedor de cabelo contra Kyouko. “Você teve muita sorte de não ferrar com tudo!”

Kyouko se levantou e ficou sentada no colchão. “Sorte? Eu joguei segura. Heh.”

“Jogou segura é?” Sayaka foi irônica. “Está achando que isso é brincadeira é? Está se divertindo muito é?”

“E você não?” Kyouko retrucou.

“Como?”

“Ah é!” Kyouko deu um tapa na testa. “A gente só sai por aí porque temos que manter a rotina e, claro, você é uma excelente atriz. Aham...aham...”

“Eu... estou feliz com os momentos que passamos juntos.” Sayaka baixou a cabeça. “Mas isso não pode continuar assim.”

“Não pode?” Kyouko deu de ombros. “Pra mim pode continuar pra sempre.”

Sayaka começou a gesticular, agitada. “Como pode dizer isso? Não foi você que disse que ela havia pirado?”

“É. Eu achei que ela tinha feito uma merda das grandes.” Kyouko olhou, através da janela, para a lua cortada. “Mas agora coloquei tudo na balança: estou morando contigo e, apesar da aula ser um saco, é melhor que ser fritada por um demônio. Sayaka... Cê viu aquele peste branquelo por aí?”

Sayaka disse emburrada, sabendo aonde Kyouko iria chegar. “Eu não vi...”

“Tá aí ó.” Kyouko apontou para Sayaka. “Mais uma prova que ela fez tudo certinho.”

Sayaka colocou as mãos na cintura. “Aham! E a lobotomização?”

“Esse lobo aí não é legal...” Kyouko respondeu. “...mas Homura nunca foi de confiar em alguém e entendo bem disso. E eu sei também que isso não quer dizer que ela seja má. Não foi você que disse que Mami estaria bem?”

Sayaka estremeceu com aquela pergunta. Kyouko havia atacado pela mesma moeda. “Sim... Ela está bem.” Então seu corpo tencionou. “E a Madoka?”

Kyouko sorriu. “A diva cor de rosa tá numa boa. Ela ainda é a sonsinha que eu conheço. Só achei que ela andava meio isolada, mas Homura deve cuidar disso.”

Sayaka fez uma expressão de nojo. “Francamente Kyouko.” Depois bateu no peito e vociferou. “Eu sOu a amiGa deLa. EU!

Kyouko balançou a cabeça. “Sabendo como tu é, aposto que foi peitar Homura na primeira chance e levou um sacolejo. Cê achou que ela ia deixar tu se aproximar da Madoka depois. Hum?”

Sayaka colocou as mãos no rosto e foi descendo, puxando a pele da face. “Não. Não. Não. Você não tem noção nenhuma...”

Kyouko socou o colchão. “Cabeça dura! Não tá vendo que é uma segunda chance? Uma segunda chance pra nós todos?”

“Segunda chance?” Sayaka nem queria mais olhar para Kyouko.

“É...” Kyouko continuou. “Se eu fosse tu garota, eu dava um chega pra lá naquela cabelo de musgo. De quebra isso já servia como uma declaração de amor pra aquele garoto.”

“Não seja ridícula. Haha.” Sayaka deu riso sem graça com um tom de decepção. “Eu não tenho mais nada com ele. Meu desejo foi cumprido e ele será feliz com a Hitomi.”

“Ah é?” Kyouko questionou.

“Kyouko...” Sayaka voltou a olhar para Kyouko e falou em tom sereno. “Eu não lhe disse que não me arrependo de nada? A única coisa que eu queria era vê-la mais uma vez?”

“Puxa!” Kyouko fechou os olhos. “Acho que acabei esquecendo diante de tanta coisa acontecendo.” Depois ela se levantou do colchão e fitou para Sayaka, sorrindo. “Obrigada por me lembrar disso.”

Kyouko começou a caminhar em direção a Sayaka.

“Kyouko?” Sayaka deu um singelo sorriso com a reação de Kyouko.

A expressão sorridente de Kyouko fora substituída por uma mais séria. Ela avançou contra Sayaka, a empurrando e prensando contra a parede com os braços.

“K-kyouko?!”

“TU É RETARDADA?” Kyouko vociferou, respingos de sua saliva atingindo a face de Sayaka.

Sayaka tentou empurrar contra, mas Kyouko jogou ela de volta contra a parede.

“Não se arrepende de nada? Idiota!” Os lábios de Kyouko tremiam. “Cê sabe o que aconteceu quando tu foi levada?”

Sayaka abaixou a cabeça.

“Cê não deixou nada pra trás. Nem um fio de cabelo!” Kyouko foi baixando seu tom de voz. “Cê foi dada como desaparecida.”

“Eu andava pela rua e me deparava com sua imagem em tudo quanto é lugar. Nos postes, nas vitrines, na televisão...”

Kyouko engoliu seco, procurando segurar sua voz que estava ficando chorosa. “Seu pai apareceu na TV chamando por você. Diziam que tinha sido seqüestrada por traficantes de mulheres que abastecem o leste asiático.”

Lágrimas começaram escorrer pelo rosto de Sayaka.

“Mas como todas as notícias...” Kyouko rangeu os dentes. “...elas só são boas enquanto estão frescas. Aos poucos cê foi esquecida.”

“Mas seus pais não desistiram. Eles haviam contratado investigadores.” Então Kyouko apontou para as paredes. “Eles chegaram a vender esta casa para pagar as dívidas e cê vem me dizer que não se arrepende?”

Kyouko apontou para si própria. “Era pra EU ter sido levada. O mundo não precisa de mim.”

Sayaka estava cabisbaixa e imóvel. As lágrimas já molhavam a camisola azul que ela vestia. Contudo Kyouko continuava pressionando ela contra parede.

“Logo depois que cê foi levada, Homura deixou a gente e mais tarde ela sumiu da cidade. Se não fosse pela Mami eu...”

O rosto de Kyouko se contorceu e os olhos avermelharam.

“Eu teria desistido de tudo. E cê tem a coragem de dizer que não se arrepende de nada?”

Levando em consideração a falta de reação da Sayaka, Kyouko foi se acalmando. “Tudo por causa dessa obsessão idiota por uma pessoa. Tch... sabe, cê parece com a Homura.”

“...haha...hahahaha..hahahahahahahahahahaha...” Sayaka começou a rir.

“Sayaka?”

“...hahahahAhaHahAhAHAhahaHahaHahaHAhaHahaHahahaHa...”

A voz de Sayaka foi distorcendo, era como se sua voz fosse ouvida através de um longo tubo de metal.

“Sayaka!” Kyouko percebeu que camisola da Sayaka estava cada vez mais molhada. Aquilo não era possível somente com lágrimas. A pele dela estava cada vez mais úmida e seu cabelo azulado também estava mais escuro por estar ficando ensopado.

oLhe Para mIM!”

Kyouko ficou de boca aberta diante da face que Sayaka revelara. Não era lágrimas e sim água que vertia de seus poros. Narina, boca, ouvidos eram como torneiras. Seus olhos azuis agora eram um mar revolto, com um grande redemoinho no seu centro. Sua roupa e cabelos gotejavam.

“Eu pAReçO cOm A hOmuRA agORA?”

Kyouko sentiu em seus pés descalços a poça que estava se formando e expandido pelo quarto. A parede onde Sayaka estava encostada era como uma cachoeira. Então ela fora surpreendida por manoplas de ferro que agarraram seus pulsos.

“S-sayaka.”

Que começaram a esmagá-los.

“SayaaaAAAAÁÁÁÁÁÁÁHHHHHH!”

Sayaka contorceu sua face. “aGH... voé Muito dEsaFInaDa!”

Sayaka soltou seus pulsos, mas, antes que pudesse sentir qualquer alívio, Kyouko recebera um forte golpe em seu abdômen. Ela voou e caiu sobre seu colchão que já estava boiando. O som de uma orquestra podia ser ouvido.

Ainda deitada, Kyouko levantou a cabeça e já tinha idéia do que havia a atingido: Uma longa cauda de peixe substituíra as pernas de Sayaka, que agora tinha três metros de altura. Vestia uma armadura de ferro completa com um desenho de um sabre perfurando um coração estilizado em sua cintura e um imenso laço vermelho amarrado na gola. Uma capa azul marinho tremulava em suas costas. Apenas a face e o cabelo ainda eram reconhecíveis.

O reflexo de tudo que havia no quarto apresentava a imagem daquela cavaleira sereia. A luz então se apagou e as paredes e o teto revelaram partituras musicais, escritas com uma tinta fosforescente azulada. Os peixes de pelúcia ganharam vida e se debatiam desesperadamente em busca da água. O sapo foi pulando de encontro à bruxa, para poder coroá-la.

Oktavia Von Seckendorff retirou da água um sabre de um metro e meio de comprimento e apontou-o contra Kyouko, pronta para o julgamento. “QUem oUsA mE coMPAraR COM umA trAidORa?”

Kyouko rolou pelo colchão para a água e então disse enquanto tentava se levantar. “L-larga essa espada Sayaka! Sou eu!”

Mas Oktavia ignorou as palavras e continuou sua performance. “eLA jAmais DEveria tEr siDo ResGAtadA dEpOIs dO quE Fez.”

“Acorda Sayaka!”

mAS a eSPeraa TinHA QuE CumpRIR sUa funÇÃo...”

Oktavia começou a avançar em direção a Kyouko com a lâmina em riste.

Kyouko retrocedeu, balançando a cabeça. “Por favor... não quero lutar contigo.”

“eU dEVia tÊ–La eXECUtaDo qUAndO tIVE a ChanCE! QuaNDo eLAO tiNHa ConsCIêNciA De Sua naTurEZa vIL.”

A água estava alcançando a altura do joelho. A porta do quarto estava fechada.

Se eu abrir a porta, a água vai se espalhar pelo condomínio inteiro rapidamente. Isso vai chamar muita atenção. Droga! Kyouko pensou.

“a EspeRanÇA DissE Que Ela sE eSFoRÇou mUIto, qUe MEreCia O pERDãO.”

Kyouko se encostou contra parede, a lâmina cada vez mais próxima. O anel em seu dedo médio parecia pesar mais e mais.

“qUAntA toLiCe! O cULPado sEMpre seRá cULpAdo. Dessa vez eLaO pODerÁ reCoRRer.”

A face da bruxa, outrora de Sayaka, sorriu triunfante.

“eIS mEu DEcrETo!!!”

As águas se agitaram como se tivessem sido atingidas por uma estrondosa onda sonora.

PaRa O unIveRso vIVer, o diaBo devE MorREr!!!”

Ao final dessa declaração, um elmo surgiu, envolvendo a cabeça de Ocktavia. Sua viseira lembrava uma buzina de um trem. Lâminas saiam do topo e sustentavam uma armação que lembrava uma pauta, mas não haviam notas musicais contidas nela.

Kyouko, notando que estava prestes a perder sua amiga, gritou com todas as suas forças. “IDIOTA! EU NÃO SOU O DIABO! SOU A KYOUKO SAKURAAAAAA!”

A bruxa parou, com a lâmina próxima ao pescoço de Kyouko, e olhou para a palma da sua outra manopla. Ela fechou os punhos dizendo.

kuoKyO SkArUA stIno MitUo.

Seu corpo e armadura começaram a liquefazer, começando pelo sabre. A princípio o líquido tinha aparência metálica, como o mercúrio, porém depois foi ficando transparente. A enorme figura aos poucos foi afundando e desapareceu sob as águas.

A luz voltou a acender.

Das águas emergiu Sayaka, em sua camisola encharcada, boiando em posição fetal. “sintomuitosintomuitosinto...”

“Ei! EI!” Kyouko correu até Sayaka e se agachou para abraçá-la. “Está tudo bem. Está tudo bem...”

Sayaka tremia, enquanto olhava para o seu quarto inundado. Os bichos de pelúcia agora boiavam sem vida. “Eu...quase matei você...”

“Me matar?” Kyouko perguntou incrédula. “Eu sou dura na queda, garota.”

Sayaka passou a mão no pulso da Kyouko que estava manchado de vermelho escuro. Ela sabia que amanhã estaria roxo e inchado.

Kyouko disse. “Ah... Já tive coisa pior.”

“Você entende agora? Eu não tenho uma segunda chance.” Sayaka escondeu seu rosto. “Eu não sou mais quem você conhece.”

“É... Você pode ter mudado, mas ainda é a Sayaka. Levanta!” Kyouko forçou Sayaka a ficar de pé.

A água agora batia na canela.

“Temos que dar um jeito nisso aqui ou o pessoal do condomínio vai saber.” Kyouko foi enfática.

“A água deve estar escorrendo pelo ralo do banheiro. Isso não vai ser problema.” Sayaka ficou observando a porta.

“Ah é. Nem me toquei.” Kyouko respondeu.

“Mas vamos precisar de rodos, panos e baldes.” Sayaka apontou para o colchão. “E de secadores de cabelo.”

“E trocar a roupa também.” Kyouko completou sorrindo.

Sayaka olhou para sua camisola molhada, colada ao seu corpo, revelando sua forma feminina. “É-é isso também...”

Kyouko colocou a mão na cintura e olhou envolta. “Será que vamos conseguir dar uma enganada antes da sua mãe voltar?”

Aquela pergunta foi para Sayaka como uma agulha a perfurando. “Olha Kyouko... Eu não sabia dos meus pais. Madoka não havia me mostrado. Só que quando decidi me tornar garota mágica, eu tinha consciência que estaria me afastando deles. Eu não sabia que seria tanto, mas...é...”

Kyouko baixou um pouco a cabeça e falou em um tom muito baixo. “Será que sempre é assim...”

“Eu não sei...” Sayaka balançou a cabeça.

“E sobre o que disse antes?”

Sayaka ficou confusa com a pergunta da Kyouko. “Antes?”

“É. Quando tu virou a sereia lá, cê começou a falar da traição da Homura.” Kyouko começou a tirar o excesso de água no seu rabo de cavalo. “Só que cê falou como se ela tivesse traído antes. Não foi só quando ela ia ser levada não?”

Amargura agora estava estampada na face de Sayaka. “Isso Madoka me contou. É por isso que a safada deixou vocês. Ela sabia que você e Mami-san iriam lutar contra ela se soubessem.”

“Eita!” Kyouko sentiu o peso daquelas afirmações.

“Se tudo ocorre-se bem, Madoka iria contar para vocês quando fosse buscá-las. Contudo eu terei que contrariá-la.”

A noite seria longa.


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Notas finais do capítulo

Mahou Shoujo Oriko Magica e seus personagens não me pertencem.
Próximo capítulo: Abençoados sejam todos nós