Chamem os Bombeiros escrita por Juliana Rizzutinho


Capítulo 8
Segundo round


Notas iniciais do capítulo

Opa, aqui estamos com o 8º capítulo de Chamem os Bombeiros^^ Enjoy ;)



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“Vejo a porta bater na minha cara e ela nem disse: ‘Tchau, meu amor! Mamãe vai trabalhar!’. Isso é mau sinal... Muito mau sinal! Às vezes, fico preocupado com ela. Mas sabe como que é... Humanos! Por que simplesmente complicam as coisas?! Será que ela pensa que sou oligofrênico assim? Eu escutei tim-tim por tim--tim da sua conversa com tal jornalista barbudo... Francamente, o jeito que esses humanos demonstram que gostam de outra pessoa, me impressiona! Qual é o problema? Me diz! Não é mais fácil, rodear, como não quisesse nada? Sabe, quando morava na rua, não que sinta saudades disso, muito pelo contrário, mas era bem mais fácil! Rodeava a garota, fazia graça e... ela estava no papo. Tudo bem, agora vivendo com a humana, não me falta nada! Nem água, nem comida, mas... diversão que é bom. Sem contar que aquele veterinário filha da mãe tirou os meus... Você sabe! Não preciso explicar! ‘Vai ficar tudo bem, bichano’. Tudo bem? TUDO BEM, UMA OVA! Percebi até que minha voz mudou! Desgraçado, viu?

Perai... O que aquilo? Chego mais perto e fico petrificado. É algo tão surreal quanto à humana. Como algo tão pequeno vai e volta pendurado num treco... O que aquilo? É fio? E quanta perna? Ah, aí está a minha diversão de hoje! Vou me ajeitar, dar uma esticada e observa-la atentamente... Até apanha-la!”.

********

Chego à redação dez minutos atrasada. É hoje! E é bom que ninguém venha reclamar! Porque, né? Tenha dó! Dar aquele chabu com aquela periguete é uma coisa... Teu paque... Ops, teu colega fotógrafo telefonar para tirar satisfação é outra! Vejo o Felipe vindo em minha direção com um olhar arregalado e virando para os lados, como achasse que estivesse sendo vigiado.

— Bee!!! Você não sabe o que aconteceu! – fala enquanto dá seus costumeiros três beijinhos no rosto.

— Ah não, Fê! É algo relacionado a ontem?

Ele pisca tão lentamente quanto o sim que faz a cabeça.

“Estamos fodidos”, penso, “aquela periguete metida à rica nos jogou no rodamoinho!” e minha indignação cresce!

Lilian chega toda afobada para nosso lado e solta:

— Gi, Fê, o chefe quer falar com vocês!

A Lilian é a secretária do meu chefe, e pelo jeitinho dela, está visualmente constrangida e preocupada. Ela é muito gente boa, lembra até a Garcia de Criminal Minds. Gordinha, com os cabelos louros em profusão, todos em cachinhos. Usa óculos com a armação cor-de-rosa, sempre se veste de modo espalhafatoso e suas canetas com flu-flu denunciam o seu jeito girlie de ser.

— Li, você sabe do que se trata?

Ela mexe os ombros, tipo: “não sei”. E aí completa:

— Aí, Gi, está aquela garota insuportável que tem nome de sapato metido a moderno...

Ah, não! Não, não, não! É hoje!

— E só ela que está lá? – indaga Felipe esperançoso.

— Hum... Não!

Por favor, Senhor, não me diga que...

— O Sardinha também está lá!

Puta que pariu! Vou repetir, puta que pariu!!! Sabia que aquilo que aconteceu em campo iria abafar, mas ela estava toda, toda. Se achando a rainha da bateria à frente de uma escola de samba de quinta categoria!

Felipe respira resignado e me convida:

— Vai, Bee! Quanto mais rápido, nos livramos disso, mas rápido começa nosso dia!

E que dia, hein? Aliás, vai ser um dia daqueles! Já estou sentindo que amanhã estarei dando entrada naquelas papeladas: receber FGTS, pedir seguro-desemprego e por aí vai...

E lá vamos nós! Entramos na sala e damos de cara com meu chefe, o Edgar. Ele é um senhor adorável, não posso negar. Foi professor de Matemática, mas conforme se passou o tempo, escrevia para os jornais das escolas onde trabalhou, publicou artigos nos jornais de bairro que ele circulava e morava. E aí, foi estudar jornalismo. O cara é fera, tem uma visão matemática das coisas. Não, ele não é bonito como Edgar Ashenbert do anime Hakushaku to Yousei, ou charmoso como o personagem do Thiago Fragoso na novela Lado a Lado. Ele beira os seus sessenta anos, tem os cabelos grisalhos, lisos e jogados para trás. Usa óculos de aros fininhos e muito caros, afinal, ele se tornou editor-chefe, o que equivale ao um salário bem mais alto do que meu.

Entramos na sala particular, ele nos encara com um olhar cansado e enfastiado. Ao lado dele, a Melissa está em pé, com as mãos na cintura, arrogante como sempre. Nem parece que está cansada, que vaca! Isso porque fez uma megacobertura como eu ontem e parece que ela ficou tomando sorvete naquele bistrô metido a chique na Rua Itapura, lá no Tatuapé! Aquele bairro mesmo... O tal que ela mora! Que ódio dela!

Sentado na cadeira giratória, com jeito despachado de ser, está o Júlio. Ele parece que está em casa: a perna direita quase toda apoiada na esquerda, com braços relaxados e ... não, não! Ele está enrolando a barba com aqueles malditos dedos finos.

— Bom-dia! – nos cumprimenta o chefe. – Por favor, Felipe, feche a porta. – solicita para o fotógrafo que entra comigo, mas atrás de mim.

— Por favor, sentem-se! Você também, Melissa!

Viu, só? Bem-feito, vaca! Eu e o Felipe conseguimos pegar as outras duas cadeiras restantes, e ela teve que ir até a sala ao lado em que acontecem nossas reuniões de pauta para pegar uma cadeira.

Quando o assunto é sério, bem, o Edgar nos chama nessa sala. E está na cara, que aquele projeto de periguete deve ter chegado cedo (ou ligou no celular do chefe) e meteu bronca no que aconteceu em campo. Mas ela é da turma do Nelson Rubens: “eu aumento, mas não invento”. Apesar de que ela é bem capaz de inventar horrores!

— Bem, acho que vocês sabem o porquê estão aqui hoje, não?

Prendo a respiração, o Felipe entorta levemente a boca, e duvido e faço o dó que tem revirado os olhos internamente. A Melissa nos encara com ar: “vocês estão fodidos!” e o Júlio... Bem, o Júlio tem o olhar perdido para janela. Como se a conversa não tivesse nada a ver com ele. Às vezes penso que ele é autista! Vivendo no próprio mundinho dele, porque, né?

Silêncio na sala, o Edgar retoma a conversa.

— Pois bem, escutei a versão da Melissa, preciso saber a de vocês. Porque vocês me conhecem, preciso saber todos os lados da questão.

Quase perguntei: “E senhor solicitou a versão do Sardinha?”. Mas me contive porque o momento não era nada apropriado para provocações.

— Quem come...

— Pera, chefinho! Antes de começarmos, fico realmente curioso em saber qual é a versão de nossa colega Melissa. – dispara o Felipe, com ênfase na palavra realmente.

Ela fica em silêncio e procura o olhar de aprovação do Júlio que continua mexendo na barba, com olhar perdido na janela. Meu, ele é autista! Agora não tenho mais dúvida!

Aquele clima de metrô apertado e você precisando descer porque chegou a sua estação, mas ninguém se mexe, sabe como que é? Pois assim que está o momento.

E aí, o chefe respira fundo e retorna:

— A Melissa alega que sofreu bullying de vocês! Não pôde fazer o serviço de campo. Sei que erramos, já dei uma bronca do Adamastor, que está mais empolgado com aqueles aplicativos do Corinthians do que as eleições. Mas, vocês poderiam ter facilitado a vida, né, cacete? Por que em vez de brigar, não ligaram para cá?

— Mas eles me deram chance? – indaga uma voz chorosa.

Não, cara! Isso, não! Quer dizer que a Melissa vai atacar com a maldita arma dela? A vitimização?

Todo mundo vira-se para a repórter periguete, até o Júlio saiu do seu estado letárgico.

— A Giovanna foi tão rude comigo, falando impropérios... – para por um instante e saca um lencinho de papel não sei da onde para enxugar as lágrimas de crocodilo dela.

Isso é tão surreal, quando acordar e se tocar que está na ilha de Lost e falar com aquele japa do Projeto Dharma como fosse um velho conhecido.

— Ela disse... Disse...

— O que ela disse? – indaga o chefe.

— Bem, ela disse coisas horrorosas! Que eu queria pegar o lugar dela, que fiz isso de propósito e usei o Sardinha como aliado para subir de cargo. Mas gente, sou uma repórter! Sou uma simples e humilde repórter!

Não, ela não é uma simples repórter, porque fiquei sabendo que ela conseguiu receber um salário maior do que meu. Agora não me pergunte como! Vai ver que usou o meio das pernas! Apesar de que tenho mais jogo de cintura e tarimba do que essa escrota.

Escuto tudo isso, exasperada! Mas me contenho porque estou na frente do meu chefe.

— Para piorar, o Felipe incentivou mais a briga, me chamando de puta...

— Como que é, Bee?

Pronto, o tempo fechou! Mexeu com a bicha revoltada, agora o tempo realmente fechou!

— Felipe, quieto! Deixe-a falar! Todos terão seu momento para explicar. – retruca o Edgar.

O meu fotógrafo afetado que estava mais inclinado do que normal, teve que voltar para posição de relaxado. Sério mesmo que ela está inventando tudo? Não quisemos bater nela! Ou xingá-la. Só a peitamos, só isso! Qual é? Quem nunca teve vontade de fazer isso com aquele colega de trabalho horroroso?

— E para piorar a Giovanna... A Giovanna me empurrou e o Felipe tirou o meu smartphone da minha mão e jogou no chão! Gente! É um Iphone 7!

Na palavra smartphone, sinto que os olhos do Júlio recaem em mim! Cara, ainda esse papo que o celular substitui perfeitamente o gravador digital?

— Eu joguei o quê, amapô? E a Gi não te empurrou, não! Mas, deveria ter te arrastado para o inferno! – o Felipe fica tão exaltado que fica em pé. Minhas mãos se fecham nos braços da cadeira para não encontrar o rosto da Melissa.

Perai! Só a peitamos! E ela retorna a falar:

— Mas aí, não é só isso! A Giovanna me cuspiu na cara! E...

— Quando isso? Em que horas que não vi?

A voz é do Júlio e toda a sala o torna foco da sua atenção.

— Desculpe aí, Me, mas na boa? O que você ganha com isso, querer foder os dois?

Ops, escutei isso mesmo?

— E outra, estamos no mesmo barco! Tudo bem, que eles exageraram um pouco, mas porque você também bem que os provocou! Ou você acha que sendo arrogante vai chegar a algum lugar?

Caramba, até o meu chefe ficou com uma cara de “Ãhm? Hein?”.

— Mas Juju! Estou falando a mais pura verdade, como você pode desmentir!?

Perai, escutei Juju? E desde quando eles ficaram tão íntimos!? Desgraçado de barbudo hipster! Você tem comido ela, não é?

— Não, não estou desmentindo, estou falando o que aconteceu mesmo! Por que você não incentivou o diálogo? Me fala! Pensa que não vi você indo até o banheiro com sorriso cínico no rosto? Logo, você que é nojenta e não vai em qualquer banheiro! Imagine de uma escola!

“Nojenta com qualquer banheiro”? É, definitivamente, eles estão transando!

— E tem mais! – mais? E não é que o meu chefe o deixa falar? Não interfere. – Tenho certeza que foi você mesma que jogou o seu celular no chão! Só para despedaça-lo e culpar a Gi!

Ãhm? Hein?

— O Felipe adora uma treta, eu sei! Mas ele defendeu a Gi porque sabia que você poderia muito bem aprontar em...

— Aprontar o quê? Estava fazendo o meu trabalho, não precisa...

— Não precisa o quê? Me fala! Você acredita que puxando o tapete tanto da Gi como o Felipe, poderá subir de cargo! Acorda, mulher! Somos os operários de rua. O nosso piso nem cobre de longe, o quanto trabalhamos e enfrentamos perigo para pegar informações! E quer saber? Quem está nessa área, está por amor! Se quiser status, dona Melissa, já está na hora de procurar uma vaga para assessora de imprensa de moda!

Ele... ele... Ele me defendeu? Foi isso mesmo! Só vi o Felipe sorrir emocionado e bater palminhas! O Edgar boquiaberto e surpreso.

— Agora, se vocês dão licença, preciso ir atender a um frila, já que hoje é minha folga. Porque minhas contas vão chegar e é preciso dinheiro para paga-las e não status, dona Melissa.

Ele se levanta e diz:

— Senhores – mirando para o Felipe, visivelmente emocionado, com a mão no peito e depois para o chefe.

— Senhoritas – olhando para a Melissa que o fuzilava pelo olhar. E depois para mim, um olhar... carinhoso! Meu, carinhoso! Desde quando, ele é carinhoso comigo?

— Se me deram licença, o assunto termina aqui!

E se retira da sala, antes mesmo que meu chefe pudesse expressar alguma palavra ou reação.


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Notas finais do capítulo

Garotada! Até eu fiquei passada quando terminei de escrever o capítulo! Como já expliquei anteriormente, os personagens tomam vida e acabam decidindo o que fazer o/
Bora, primeiro aos agradecimentos: obrigada à Erica Gonçalves que chegou para nos acompanhar^^ Seja bem-vinda ;)
E agora, o glossário de Chamem os bombeiros:
Oligofrênico – uma gama de enfermidade que acomete déficit de inteligência em humanos.
a Garcia de Criminal Minds – Penelope Garcia (particularmente uma das minhas personagens preferidas) é especialista em computação na equipe de (o bonitão) Aaron Hotchner, chefe do grupo de elite do FBI
girlie- Os americanos utilizam essa palavra para mulheres que se vestem ou se comportam como garotas^^
“(... ) garota insuportável que tem nome de sapato metido a moderno...” – adivinha qual sapato estou falando? Aquele mesmo que tem cheirinho de chiclete (como diz a minha mãe^^).
“(...) turma do Nelson Rubens: ‘eu aumento, mas não invento’” – fofoqueiro profissional muito conhecido na mídia. Seu mote é: “eu aumento, mas não invento”.
Edgar Ashenbert - personagem principal do anime (mangá e light novel) Hakushaku to Yousei. Ele é louro e de olhos violetas-acinzentados *___*
Edgar - o 2º personagem citado foi interpretado pelo (delicioso) Thiago Fragoso na novela Lado a Lado. O personagem era um advogado abandonado pela esposa Laura (Marjorie Estiano) depois de saber que o marido tinha um filho fora do casamento. o/
Impropérios – palavrões.
Tarimba – jogo de cintura.
Garotada... o próximo capítulo é todo fofo e será postado entre sexta ou sábado! Beijos e até lá!



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