Crônicas do Pesadelo {Interativa} escrita por Dama dos Mundos, Kaline Bogard


Capítulo 55
O fim de toda a ilusão.


Notas iniciais do capítulo

Yo, peoples!
Como prometido, nem demorei muito pra lançar esse, né? -q
Mais um capítulo recheado de ação, lutas e algumas aparições surpresa. Preparem suas mentes, o coração e divirtam-se. :3



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— Até que daria um bom mascote… — Nyx alegou, com sua expressão neutra habitual, enquanto corria para escapar do coelho assassino gigante. Não que ela estivesse em muitas condições de ficar correndo por ai, mas quando tem um bicho daqueles tentando te destruir, dá-se sempre um jeito.

— Definitivamente não. — protestou Frosty de seu lado, sofrendo para manter a velocidade, já que havia perdido muito sangue com o primeiro ataque da guardiã.

— O que tem contra os animais de estimação afinal, nunca me deixou ter um sequer.

— Não importa o que você diga, uma quimera não é um ser domesticável.

— Não era uma quimera, era uma manticora…

— Não faz diferença nenhuma!

— Na realidade… uma coisa é diferente da outra, sim. — Ia dizendo Selene, enquanto saltava por sobre um dos bancos da arquibancada e preparava o arco, logo mirando Samira em seu trono improvisado. A flecha voou pelo ar, mortífera, batendo contra um escudo de energia e caindo lá em baixo, sem fazer estrago algum. — Parece que a tonta não é assim tão tonta…

— Tonta ou não, essa coisa vai nos dar muito trabalho. — Gravor havia conseguido sair da visão do coelho algum tempo atrás, assim como Skylar, e agora ambos se reuniam a Selene passando por trás dos inúmeros bancos. Nyx e Frosty tomaram a direção de uns nichos mais baixos e entraram ali, contornando para que pudessem se unir aos outros três.

— Genial o plano de nós sermos iscas vivas, agora quero saber como fazemos pra sobreviver. — Sky já havia voltado a sua forma humana. Ele passava metodicamente a mão pela nuca, como alguém que tenta se livrar de um torcicolo.

— Se conseguíssemos derrubar o coelho… — Suspirou Frosty, logo sendo cortado por Nyx.

— O Golem não é importante.

— Bem, quando se tem um troço com três metros de altura tentando te devorar, é difícil acreditar que não seja importante. — Gravor alegou por sua vez, passando a mão pela testa para estancar o suor.

— O Golem não é importante. — Selene concordou, repetindo a frase e fazendo um meneio com a cabeça. — Não faz diferença destruirmos ele, Samira pode criar muito mais.

— Ou pode invocar algo ainda pior. — O elfo estreitou os olhos, com amargura. — Ainda assim, não podemos chegar até a Guardiã. Agora ela está usando um escudo… e tem a altura em que está.

— Bom, ninguém aqui voa. — Foi o comentário que Sky fez, dando de ombros. — E se quisermos pegar impulso para chegar lá com um salto…

— … o coelho nos pegaria.

Nyx havia cruzado os braços, escorando-se contra o banco de pedra e fechando os olhos, parecendo pensativa. Logo, seus lábios voltaram a se mover. — Estamos esquecendo do mais importante… mesmo que cheguemos a Samira, ela pode regenerar-se com muita rapidez.

— Além de não podermos recuar, ou ela irá atrás dos outros. — o shifter tigre lembrou, também deixando-se sentar. — Que situaçãozinha desagradável.

— Mas podemos resolver, contanto que trabalhemos juntos. — Selene tomou novamente a palavra. — Eu tenho um plano. Pode não funcionar, mas creio que não custa nada tentar.

Os outros trocaram olharam para ela atentamente, e então a elfa complementou: — Nyx… devolva os sais para o Frosty. Gravor, vou lhe emprestar algo.

— O que você tem em mente? — questionou Nyx, mostrando um sutil desconforto ao retirar de dentro do sobretudo o par de sais amaldiçoados do elfo e entregando-lhe sem muita convicção.

— O de sempre. Cortar a cabeça de alguém…

 

oOo

 

Kenai estava ainda mais zangado do que antes. Ter seu soco parado por uma mera garotinha, daquele tamanho minúsculo ainda por cima, era o suficiente para deixá-lo a ponto de cometer um assassinato. Ryan, que ainda se lembrava dos dentes do mokolé penetrando em sua pele, estremeceu instintivamente. Parecia disposto a continuar mesmo assim, mas com um sinal de Anne, retrocedeu, levando uma Neco toda estropiada consigo.. — Deixe isso comigo. Já faz um tempo que não surro alguém forte de verdade.

— Quem você pensa que vai surrar, pirralha? — Ele rosnou, preparando-se para agarrá-la. A mão não fez mais que segurar o ar, quando a menina deu uma desviada para trás e girou o corpo para lhe dar um chute, tão potente que o fez escorregar para trás. — Quem diabos é você!?

— Acho que é a garota que Loke petrificou na Noite das Máscaras… — alegou Lyla, com descaso. — É bonitinha, mas vai acabar nos dando dor de cabeça. Mate-a logo, seu inútil!

O mokolé, que estava prestes a retrucar com um “quem é o inútil aqui” e mencionar o fato dela ter perdido a esfera para a outra micro-elfa, foi impedido por um novo golpe de Anne, um soco mirado em seu rosto. Sentiu que perdera um dos dentes, e sua ira inflamou ainda mais. — Pegue a porra da esfera! Eu lido com essa vadiazinha desgraçada.

Voltou a estralar os dedos, e desta vez conseguiu capturá-la, agarrando-a pelo braço e jogando-a pra cima, seu corpo fazendo um arco até colidir com o chão no outro lado. Com o rosto coberto de arranhões, Anne jogou uma rajada de vento na direção dele, forte o suficiente para que alguns cortes abrissem em sua pele. Kenai, não soltou-a, entretanto, então ela jogou o corpo frágil para cima e desceu uma chuva de chutes sobre ele. Com a mão livre, tocou a mão que a mantinha presa. O mokolé pôde sentir a diferença drástica de força depois deste gesto, quando os chutes duplicaram seu peso e velocidade. Girou o corpo junto com a mesma, soltando-a e fazendo com que fosse parar longe.

Mas como Anne voava, tal gesto não surtiu o efeito desejado, e logo viu-a parar no ar, depois descer em queda livre e mover-se para acertá-lo com as duas mãos entrelaçadas. Coisa que, também, não fez mais do que afastá-lo um pouco mais, seus pés arrastando sobre o chão, deixando uma trilha profunda. — Eu não sei quem você é, garota… — ele sorriu, o típico sorriso de caçador ao encontrar a melhor presa possível. — Mas você está me deixando empolgado. E vou recompensá-la matando-a da forma mais terrível que eu puder imaginar!

— Ótimo. — Ela pousou no chão, entrando em posição defensiva e fazendo um sinal com a mão que estava mais a frente do corpo, provocativa. — Pode vir!

 

Retirando os olhos da luta que começava a se intensificar, Lyla retornou para abordar Neco, mas a mesma já tinha um Ryan com seu machado, a postos para protegê-la. — Oh, é sério? Já vou avisando, não sou dessas que pega leve com crianças.

O rosto dele ficou da cor do cabelo por um tempo. — Eu não sou uma criança!

— E quem disse que eu ligo? Passe a elfa para cá!

— Quer ela? Venha até aqui buscar! — e moveu o machado na direção de Lyla, visando cortá-la sem dó nem piedade – como era esperado dele, por ser um Beast Hunter – mas tendo a arma capturada pelas mãos potentes dela.

— A foice daquela mestiça não foi capaz de me tocar… por que você acha que o seu machado pode? — Ela abriu aquele sorriso que era um misto de fúria guerreira e sedução, puxando a arma e jogando-a para o lado, esperando que ele largasse-a e fosse jogado para trás com a força. Ryan continuou segurando firme, porém, e o máximo que fez foi ter sido movido para aquela direção.

— E quem foi que disse que tenho “só” um machado? — ele perguntou, descendo o corpo no último momento e mirando uma pisada violenta na canela da adversária. Pega de surpresa, Lyla apenas teve tempo de sentir a explosão de dor vinda do local. Ainda assim, manteve-se firme, mergulhando a mão na direção dele e agarrando-o pelos cabelos, logo após afundando seu rosto no chão.

Mesmo assim o shifter não parou. Ainda que não conseguisse enxergá-la, sabia que ela havia descido o copo por causa do ataque anterior. No segundo seguinte ele já havia movido o braço de forma potente, acertando o estômago dela com a parte externa do membro e forçando a cabeça para cima, aproveitando que ela vergara o corpo e o soltara para acertar seu queixo.

Um pouco mais afastado, Liam observava toda a situação. Uma pontada de raiva e visível descontentamento passou por seu olhar, enquanto ele dava um puxão para manter Cedric, ainda inconsciente, fora do meio da confusão. — Como são inúteis… — Pondo-se de pé, observou meio tarde demais que os dois shifters contra os quais lutava antes não estavam mais a vista. — Maldição…

Os únicos inimigos que conseguia localizar era a menina de cabelos prateados, que lutava no mesmo nível que Kenai, mas que lentamente parecia ganhar vantagem, e o jovem shifter ruivo, que mantinha Lyla ocupada e longe da atualmente ineficaz Neco. Tomou a decisão de ir em direção dessa última enquanto estava desprotegida, mas só conseguiu teorizar. Logo depois, teve que afastar-se e desviar de uma investida dupla: Sean de um lado e Trixia do outro.

— Sabe… esse negócio de entrar na cabeça alheia é muito desagradável. Você vai ter que nos compensar… — Trixia observava-o parecendo estar muito irritada. Os hematomas aos poucos iam sumindo, mas seu humor continuava dos piores. Tirou da aljava algumas flechas, que pôs-se a atirar contra ele, fazendo-o recuar cada vez mais.

Ela viu quando Sean saltou sobre ele, derrubando-o, os dentes perigosamente próximos da sua garganta. Quase pode imaginá-lo dizer algo como “Com seus pedaços, de preferência”, para complementar sua própria frase irritada. Um breve tremeluzir mostrou-a que algo estava errado, e Trix não estava disposta a cair no mesmo truque uma segunda vez. Girou nos calcanhares, notando uma movimentação com o olho direito, e soltou a flecha naquela direção. Conseguiu ouvir até mesmo o som dela roçando na pele do inimigo, deixando um corte profundo em seu rosto.

— Eu não costumo compensar ninguém. — ele retrucou, passando a mão no corte recém-adquirido e olhando para algo atrás dele. — Até quando você pretende ficar se fingindo de morto?

Observou quando o que parecia ser um corpo moveu-se lentamente, logo passando a sentar-se e depois de espreguiçando como se estivesse acabado de acordar de uma soneca da tarde. — Me dê um tempo, tá legal… aquilo doeu pra cacete. Onde está o desgraçado que me acertou?

— Que quase te matou, quer dizer. — Liam correu os olhos, sem poder enxergar muito bem. Lidrin havia sido tirado da batalha por Kenai, e de onde estava não era possível vê-lo. Só esperava que continuasse desacordado, porque não podia nem se dar ao luxo de imaginar se o djiin estaria morto. — Cuide do tigre, eu lido com a garota.

— Olha aqui, você é muito petulante se acha que vou ficar escutando essas suas ordens como se fosse um escravo…

Enquanto ambos discutiam, Sean preparava-se para dar um novo bote e Trixia, que prestava uma mínima atenção na conversa, lembrava-se de Lidrin e consequentemente passava a observar o local tentando encontrá-lo… Algo muito estranho sucedeu, a todos ali. Uma sensação bizarra, como se fosse um despertar, os atingiu com uma força arrebatadora, fazendo com que todos parassem por um tempo: até mesmo aqueles que estavam mais envolvidos com a luta, o que era o caso de Kenai e Anne, e também de Ryan e Lyla. Houve uma pausa geral, onde todos os movimentos cessaram completamente.

E então, rachaduras subiram por toda a extensão do aposento em que estavam… até mesmo naquilo que parecia ser o céu. As ranhuras aumentaram de tamanho consideravelmente, e Trix só teve tempo de correr para o ponto onde havia identificado Lidrin antes que o piso e todo o resto ruísse.

 

oOo

 

Samira observava de cima do seu trono, enquanto o Golem-coelho que criara perseguia aquela dupla de falsos irmãos que ousara além de zombar dela, desafiar Destiny. Na realidade, a guardiã não tinha uma lealdade tão grande quanto deveria. Isso porque seu patrono era Zereff, e se ela devesse satisfação a alguém, com certeza seria a ele.

O grande problema é que o deus, sendo a encarnação do Desespero, acabou se desesperando também. E, diferentemente dos outros deuses do Panteão de Ordem e Caos que ao menos observam Meroé, mesmo que estejam proibidos de pisar nesta terra, Zereff tornou-se recluso e abandonou a própria sorte tudo que havia aqui em baixo.

De maneira que, a única razão pela qual Samira decidira escutar o pedido de Destiny era porque estava com tédio, e queria algum desafio para animá-la. Porém, suas propensas vítimas haviam irritado-a de verdade, tornando aquele assunto algo pessoal. Então, o foco de toda a sua ira – e, consequentemente, do golem – seria sempre aqueles dois. Para ela não importavam os outros, estavam em segundo plano e os mataria mais tarde.

Sua personalidade infantil se agitava de animação vendo os dois correrem pelo extenso salão, às voltas. Talvez devesse ter criado uma arena um pouco menor, mas destruí-los de forma rápida não seria suficiente. Sua intenção era cansá-los até a última gota e então torturá-los. Ela se orgulhava de ser a melhor torturadora mental que existia.

Foi então que algo chamou a sua atenção. Eles estavam circulando muito próximos a sua pilastra. Ainda que estivesse num ponto alto, aquilo incomodou-a profundamente…

 

— Você está preparado? — questionou Nyx, tentando manter sua atenção em três lugares diferentes: sua posição com relação ao coelho, a direção em que a coluna estava e por fim Frosty ao seu lado. Sua força estava realmente se esgotando, e se aquele plano falhasse, tinha certeza total de que não conseguiria fazer mais coisa alguma.

— Sim… e você?

— Idem.

— No três, então…

Ela assentiu, parecendo aumentar um pouco mais a velocidade, mas em vez de simplesmente correr parecia mais estar dando alguns saltos curtos quando o parceiro iniciou a contagem.

Um…

Dois…

Três!

Uma camada de gelo percorreu o chão quando Frosty desceu o pé sobre o mesmo, interrompendo subitamente a corrida e escorregando de propósito para tomar outra direção e sair da rota de colisão do Golem. A mestiça, por sua vez, saltou por cima do gelo para que seus pés não ficassem presos, virando o corpo rapidamente em cento e oitenta graus e fazendo com que grossas correntes de metal surgissem ao seu redor, serpenteando em direção ao monstro e envolvendo seu tronco. Quando tocou o chão novamente deixou-se deslizar, quase perdendo o equilíbrio no processo, sentindo os músculos das pernas e do braço que escolheu para segurar as correntes retesarem dolorosamente.

A criatura não ficou presa no gelo, afinal também estava a meio passo quando o tapete congelado encobriu o chão, mas seu peso, aliado a grande altura e ao corpo desengonçado, tornou impossível que não escorrega-se. Nesse instante tropeçou em algumas linhas que haviam sido colocadas para capturá-lo algum tempo antes. Samira, preocupada em não perder a perseguição de vista, claramente não reparara quando Gravor as esticara ali. E tanto Nyx quanto Frosty mantiveram-se atentos para que não tropeçassem nas mesmas sem querer, ao mesmo tempo que atraiam o Golem para elas.

De um ponto paralelo, Gravor puxava as linhas-letais-degoladoras-de-cabeças de Selene, que agora estavam emboladas nas pernas do monstro. A única razão dele não perder alguns dedos no processo era o fato de estar usando o par extra de luvas que ela tinha, feitas especialmente para esse tipo de ocasião. Mesmo assim, o coelho continuava a escorregar, seguindo o instinto caçador com o qual fora criado e tentando agarrar Nyx.

A questão era que tanto as correntes dela quanto as linhas dele passavam pela pilastra, e quanto mais o Golem deslizava e esforçava-se para voltar a captura, mais pressão fazia na coluna. Em um dado momento, a força foi tanta que ela passou a se fragmentar. Fissuras monstruosas percorreram todo o material que era feita, a um ponto que começou a balançar. Samira, começando a reparar o que aconteceria a seguir, gritou: — Pare! Pare agora, criatura idiota!

A ordem não chegou a tempo, contudo. Num último movimento violento o Golem repuxou as correntes que o prendiam, trazendo consigo pedaços da pilastra e se soltando. Contudo, o Trono de Samira já despencara, e ela só conseguira safar-se da queda por causa do escudo protetor. Que, agora, era alvo do bastão de Skylar e dos sais de Frosty.

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Armas abençoadas ou amaldiçoadas pelos deuses tem proteção contra magia, podendo até mesmo quebrá-la. Era um conceito conhecido pelos estudiosos e antigos anciãos. Haviam limitadas armas deste tipo sobre a face de Meroé, e quem as conseguia era ou muito sortudo, ou bastante azarado.

Os sais de Frosty eram uma herança de família, uma lembrança a muito tempo esquecida, de quando os Janus reivindicaram a arma consagrada a Mordok, o Ódio, na tentativa de evitar que sua linhagem desaparecesse. Eles ficaram guardados a tantos anos pelo líder da família, que aos poucos foram esquecidos. Só voltaram a ser utilizados na guerra entre os Seres das Trevas e o Vale das Estrelas, pelo próprio Frosty.

Suas lâminas eram afiadas e tinham propriedades devastadoras… se alguém fosse ferido por elas, poderia morrer de hemorragia, pois a ferida jamais se fechava. No entanto, seu portador era forçado a sofrer com a dor infligida e, depois de muitos assassinatos, acabaria falecendo por conta dela.

Essa era a razão principal para Frosty não utilizá-los depois do fim da guerra, a mesma que fazia Nyx recolhê-los quando se afastavam muito um do outro, por mera questão de prevenção. O fato dela tê-los devolvido, ainda que desconfiadamente, significava que a intenção não era que fossem cravados em Samira… mas sim, em seu escudo.

 

Quanto ao bastão de Skylar… nem ele sabia que tinha uma relíquia divina em mãos…

— Você tem certeza do que está falando? — questionara ele para Nyx, enquanto eles bolavam o plano de ataque. Ela acabara de afirmar que Sky poderia ajudar o elfo a quebrar a barreira de Samira, pois o bastão dele não era comum.

— Sim.

— E o que faz você pensar que tenho uma relíquia em mãos e não sabia, Boneca Mestiça?

A resposta dela foi apontar para o machado de Gravor, que veio voando automaticamente para a sua mão. Depois de testar o fio algumas vezes, devolveu-o, e fez o mesmo movimento para o bastão de Sky, o qual não saiu do lugar. — Eu reparei isso nas nossas outras lutas. A partir do momento que a arma é feita de metal, eu posso tirá-la de seu dono. No entanto, isso não funciona para armas feitas de magia. Como as que aquele Guarda Real usava. — deu uma pausa, respirando profundamente. — Armas mágicas só podem ser usadas por seus conjuradores. A única exceção para essa regra são as relíquias divinas.

— Sim, mas ele poderia ser de madeira também, o que furaria essa sua teoria.

— Eu sei a diferença quando sou acertada por uma coisa de metal ou uma de madeira, para sua informação. — ela simplesmente revirou os olhos, descendo a mão novamente. — Não irei perguntar onde o conseguiu… mas aviso-lhe que relíquias divinas sempre tem alguma propriedade mágica inerente. Seria melhor que você descobrisse a da sua…

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Obviamente, Sky não revelou onde havia conseguido seu bastão, muito menos teve tempo para pensar na tal habilidade. Mas isso não impediu-o de fazer a barreira de Samira trincar, intercalando ataques com o elfo e logo abrindo-a como se fosse uma noz, antes que se desvanecesse completamente. Irritada, lançando olhares furiosos, a guardiã saltou para trás, seus olhos brilhando ameaçadores, pronta para lançar um novo ataque.

Mas foi abraçada por trás por Selene, com o resto de sua linha absurdamente afiada já passando por seu pescoço. Não teve tempo nem sequer de começar uma frase, quando sua cabeça soltou-se. A elfa largou o corpo, sem muita consideração por este, e agarrou a extremidade, que permanecia boquiaberta, o sangue escorrendo pelo corte que a separara do tronco. Quando esse mesmo sangue começou a remodelar-se para tentar se ligar ao corpo, Selene finalizou-a, percorrendo a cabeça com suas correntes flamejantes e vendo-a transformar-se em cinzas por entre seus dedos. De algum ponto atrás deles, o Golem, temporariamente nocauteado pelo pedaço de coluna que havia acertado-o, soltou um grito pavoroso, que aos poucos foi morrendo.

Parecia que, naqueles últimos segundos, todos estavam prendendo a respiração. Quando as cinzas espalharam-se, contudo, houve um suspiro coletivo, no qual até mesmo Nyx parecia estar mais relaxada. — Francamente… que difícil.

— Acho que já tive a minha cota de bancar a isca viva. — Pela expressão de Frosty, ele não tentaria isso nunca mais.

Skylar havia chegado um pouco mais perto das cinzas, olhando-as atentamente, ainda parecendo ter dúvidas. — Será mesmo que isso vai fazê-la dar uma pausa?

— Ser imortal não é uma coisa muito útil. — dizia Selene. — Você pode se regenerar, mas há várias maneiras para impedi-lo de retornar seu corpo ao normal.

— Como esquartejar e separar os pedaços. — Propôs Gravor.

— Sim, mas não conseguiríamos uma distância suficiente para fazer isso aqui.

— Os estudos mostram que o cérebro controla praticamente tudo em nosso corpo. Considerando isso, a regeneração também é vinculada a ele. Se destruirmos o cérebro, diminuindo-o até a menor partícula possível, parece lógico que a regeneração será consideravelmente atrasada. — Nyx murmurou, usando a mesma teoria que Selene usara para convencê-los antes. Ela havia deitado apaticamente no chão, e não parecia pronta para se levantar tão cedo.

Eu preciso realmente descansar…

— Mas ela ainda irá voltar.

— Agora isso não vai fazer muita diferença. Vejam… — Skylar apontou para o alto. A dimensão a volta deles começou a se dissolver, como se fosse fumaça, dando lugar ao salão central do castelo. Como o fim de um pesadelo, como se eles estivessem sonhando esse tempo todo.

— Ela estava em nossas mentes?

— Parece que sim. — Frosty olhou para a própria mão, que permanecia mutilada. — De alguma forma o dano que causava lá chegou a nossos corpos. Isso parece valer para ela mesma, também. — Seus olhos voltaram para frente e uma enxurrada de emoções acometeu-o. O teto começou a rachar, e depois a ruir, e logo o outro grupo de jovens acaba de cair diante dele, vindo provavelmente de alguma das torres mais altas do imenso castelo. — Pelos Deuses...

Conseguiu observar tanto aliados quanto inimigos naquele momento. Como se tivesse sido combinado previamente, o grupo refez-se do susto e da batalha anterior o mais rápido que podia e correu em direção aos escombros. Até que um barulho ressoou no castelo vazio, um eco muito familiar.

Palmas?

De fato, havia alguém passando pela entrada e batendo uma mão contra a outra com empolgação, seus passos parecendo também ecoar pelo salão, agora em estado deplorável. Ele parou, tanto de andar quanto de bater suas palmas, e cruzou os braços sobre o peito, com um sorriso tipicamente cínico. — Ora, ora, ora… estão dando uma festa e nem me convidaram? Que falta de decoro. — ele piscou uma vez, mirando todos com seus olhos claros e abrindo ainda mais o sorriso. — Parece que eu cheguei bem na hora.

Nyx, que precisou apoiar-se em Frosty para ir em direção aos escombros, afinal não tinha energia quase nenhuma sobrando, estreitou os olhos verdes e fez uma careta de profundo desagrado ao notar a presença daquela pessoa. — Parece que chegou bem na hora… Isso é bem típico de alguém manipulador como você, não é mesmo, Loke?

 

oOo

 

Nyele estava mais uma vez com seu costumeiro convidado. Desta vez, contudo, após as inúmeras acusações de trapaça feitas por ele, a mulher decidiu trocar o habitual xadrez por um baralho. O resultado não mudou muito, mas o rapaz de cabelos escuros não parecia reclamar tanto quanto antes. Na verdade, seus pensamentos pareciam estar em outro lugar, completamente diferente. Enquanto embaralhava as cartas, sua anfitriã observava-o com certa curiosidade. — Em que está pensando?

— Você deve ter notado… que aquela pessoa interferiu.

Aquela pessoa. — ela moveu sua atenção para a janela. Não sabia dizer se tinha inveja ou apreço pela criatura em questão. Muitas coisas aconteceram desde que se conheceram e nenhuma pode ter sido considerada muito boa para qualquer um dos dois. — Sim. Ele estava desaparecido a um bom tempo. Não imaginava que seria tão descarado a ponto de aparecer em Hathea quando as coisas já chegaram a esse ponto.

— É curioso… as pessoas parecem sentir quando algo está aproximando-se de seu fim. Ou quando uma mudança está por vir. Você não acha, minha caríssima amiga? — ele apoiou os cotovelos na mesa, sorrindo animadamente, logo após separar um Rei de Espadas do baralho e colocá-lo sobre a superfície do móvel.

— Nós não somos amigos. — Nyele resmungou, descortês, pegando o baralho para si e puxando as três primeiras cartas. — Aquela pessoa não me interessa, de qualquer forma. Estou mais interessada no que chegará a acontecer.

O rapaz de cabelos negros viu quando a mesma mostrou as três cartas: Uma Rainha, um Valete e uma Dama, ambos de Espadas. Juntou as sobrancelhas, mostrando profundo desapontamento. — Você está roubando outra vez.

— Eu já lhe disse que não roubo nos jogos. Além do mais, isso não é um jogo. — Sua expressão mostrava que estava ofendida, mas não fez mais do que bater com o dedo indicador sobre as três cartas. — Três amaldiçoados num mesmo lugar. Aquela que um dia salvou o mundo, o Filho do herói e a Justiceira.

— Me parece um encontro tocante.

— Não sei quanto ao “tocante”… — ela jogou os cabelos dourados para trás com um movimento suave. — Afirmo, contudo, que será interessante.

— Aposto que sim. — E para ele, apostar era uma diversão a parte. Levantou-se de seu assento com rapidez, pegando o casaco de pelos que estava apoiado no mesmo e vestindo-o. — Se me dá licença, quero assistir isso de camarote. Prevejo que terei trabalho a fazer.

Nyele lhe lançou um olhar apático, vermelho vivo, e suspirou, juntando as cartas novamente e voltando a embaralhá-las. — Não demore muito, ou ficarei entediada.

— Oh, pensei que não gostasse das minhas visitas.

— E não gosto. Mas são boas para matar o tempo. — levantava a mão, acenando para ele. — Conte-me os detalhes mais tarde.

— Como preferir, milady… — O rapaz fez uma mesura divertida, e quando endireitou-se começou a desaparecer, lentamente. Quando sumiu completamente de sua vista, Nyele resmungou, pondo-se a embaralhar as cartas por pura falta do que fazer. Seus olhos retornaram para a janela, para se fecharem logo em seguida. Só voltaram a abrir-se quando ela parou de mover as mãos, tirando mais uma vez a primeira carta do monte. O Rei de Espadas novamente.

O único que conseguiu escapar do compromisso…

Olhou ao redor, capturando os detalhes da sua tão confortável gaiola. Num gesto de fúria, atirou o monte de cartas para trás, espalhando-as pelo chão. — Maldito seja.

Levantou-se, pisando descuidadamente sobre a bagunça que acabara de fazer e atirando o Rei no fogo da lareira, finalmente deixando o recinto em seguida.

 

 


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Notas finais do capítulo

Olha eu de novo aqui!
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Sobre a imagem: apesar da espada e do projeto de cthulhu, aquele ali é o Skylar sim. Achei essa imagem a que mais mostra a essência dele. Tinha outra que era ainda mais parecida, mas faltava o tapa-olho, e o tapa-olho do Skylar é essencial. :v
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Com relação as lutas, optei por não fazê-las tão extensas, porque nesse arco tem luta pra cacete. E vai ter ainda mais, então se eu focar muito nelas, lá vai mais três capítulos. Mas acho que deu pra dar um gostinho, não é mesmo? Acabou que não teve nenhum vencedor – principalmente entre Anne e Kenai – mas sempre haverão outras oportunidades. CdP está longe ainda de acabar (para o meu desespero e minha felicidade ao mesmo tempo).
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A cena da luta contra a Samira foi tão complicada… eu pensei em pelo menos vinte coisas diferentes que poderia acontecer desde que eu decidi que CdP tomaria o rumo que está tomando (e olha que isso tem tempo pra cacete, e a cada semana eu pensava em uma coisa diferente). Mas no final optei por uma formação em que todos ajudassem e fizessem sua parte para derrotá-la juntos. Espero que tenha ficado tão dinâmico quanto eu imaginei.
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Pegadinha do malandro (mais uma para a coleção), eles estavam lutando na própria mente o tempo todo. E agora o circo tá armado, os integrantes dos membros estão todos reunidos no mesmo lugar e… é agora que o bicho pega.
Mas já não pegou, Tia Ame?
Vai pegar ainda mais :v
Chuto que virão mais uns três ou quatro caps até finalizar este arco, e vai acontecer tanta coisa que suas cabeças vão rodar.
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Para finalizar… mais uma ceninha com a Nyele e o homem misterioso (eu acho que alguns de vocês já devem ter sacado quem ele é, mas de boas). E como esperado, as cenas dos dois são bem enigmáticas. Já descobriram sobre quem eles vivem debatendo? Haha.
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Bom, eu fico por aqui, e logo estarei lançando o próximo. Logo mesmo, porque to louca pra escrever o próximo cap faz tempo. o/
Kisses para todos vocês, obrigada por me acompanharem até aqui… e até lá. ♥