Crônicas do Pesadelo {Interativa} escrita por Dama dos Mundos, Kaline Bogard


Capítulo 31
Recordações de um Condenado 01


Notas iniciais do capítulo

Bem... por estarmos mega-hiper-completamente atrasadas o capítulo está saindo algumas horas adiantado. Para o prazer de alguns e o terror de outros.
A Kali continua com probleminhas e eu não sabia que budegas ia fazer com esse capítulo, então tá ai o motivo da demora (tirando mais algumas coisas). Melhor uma coisa bem feita que demora do que outra mal feita, certo?
Acho que é só isso por hora... boa leitura para vocês, divos/divas de my life :p



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Sangue... luta... briga. Ele havia nascido para isso. Para ser o melhor entre os melhores. Afinal, era um Mocolé. Um caçador, um predador clássico. Seu nome era Kenai.

Ainda hoje, ele podia lembrar-se do seu passado distante... tão longinquo que não poderia mais ser tocado. Se recordava das grandes festas em sua antiga casa em Zaphiria. Da mãe, principalmente, uma mulher de indole extremamente forte. Era ela que levava a casa. Quem mantinha todos sob controle.

Samanta tinha aquela aura de superioridade que impunha respeito, até mesmo para seu marido, Piter. O homem da casa, no entanto, era tão infantil que nem os próprios filhos o levavam a sério. Na realidade, eles tinham de fingir levá-lo a sério, ou a mãe ficava uma fera.

Eram bons tempos, aqueles. Mas hoje, mal significavam algo para ele. Hoje, Kenai era um Seguidor do Pesadelo. Nem sempre foi assim. No entanto, não se arrepende do caminho que escolheu.

Mesmo assim, as coisas poderiam ser diferentes... Caso Piter não fosse assassinado.

Aquilo ocorreu num dos intermináveis e brutais invernos zaphirianos. Onde as nevascas eram frequentes, e mortais. Um ser de sangue frio não se daria muito bem sobrevivendo naquelas condições. Na teoria... na prática, as coisas funcionavam diferente.

Na prática, “pessoas” como os Nimble saiam de baixo da tempestade... para caçar.

– Você viu onde ele foi? - Clarisse, a irmã, fez uma careta profunda de desagrado, enquanto puxava a corda de um arco pesado. Capa e capuz, ambos brancos como a neve, tampavam seu corpo, tornando dificil observar qualquer coisa nela, a não ser algumas mechas dos cabelos escuros e os olhos verdes.

– Como acha que vou saber, era você que estava na frente. - Protestou por sua vez Kenai. Ele não parecia se incomodar com o frio excessivo que fazia, afinal vestia roupas finas. E nem tremia.

– Olha aqui, você é o mais veloz de nós, era sua obrigação...

– Hei, os dois podem parar? -Piter se aproximava pelas costas, trazendo o resto dos equipamentos. Praticamente, servindo de escravo.

– Não se meta, pai. - os dois disseram juntos, antes de se encararem por mais alguns segundos, soltando faíscas, e logo voltarem sua atenção para a trilha que seguiam.

Os três estavam atrás de um cervo. E não era um cervo qualquer, diziam as más línguas que o animal era mágico... todo ano ele retornava, e a família nunca conseguia pegá-lo. Tinha trinta anos que aquela tradição se instalara, e na metade deste tempo Samanta decidiu que era algo tedioso e infrutífero, decidindo abandonar de vez a caçada. Os outros três continuaram firmes. Ano após ano, a criatura saltava pela neve, estendendo ainda mais o fabuloso tapete branco, e ano após ano eles falhavam em capturá-la.

Afinal, o fato de ser um cervo de pelo branco e com brilho incomum deveria ajudar, certo?

Certo?

Errado.

A neve era como seu esconderijo particular, e como estava por toda parte, era quase impossível encontrá-lo. No entanto, havia seres como Kenai. Com um olfato bem apurado. Mesmo assim, o cervo-fantasma era inteligente o suficiente para lubridiá-lo.

Eles continuaram pelo dia adentro, como se daquela vez realmente pudessem colocar suas mãos no prêmio. Mal sabiam que estavam sendo caçados também...

Haviam caçadores de recompensas em todo lugar naqueles dias, e de alguma forma os Nimbles tinham chamado a atenção deles.

Deplorável... foi apenas o tempo para os três se separarem e começarem uma busca isolada. A bala que tirou a vida de Piter atingiu sua nuca, atravessando seu crânio e saindo pela boca. Quando o corpo foi encontrado, não havia nada que pudesse ser feito. Não havia sinal dos caçadores. E nem da cabeça do pai.

Sentindo a aproximação do perigo chegando por todos os lados, Samanta precisou engolir seu desespero e humilhação, se contentar com um funeral nevado e mudar-se para um Reino distante, onde os assassinos não fossem encontrá-los. Afinal, Piter também não fora tão inutil em vida a ponto de morrer de forma tão estúpida. Havia sido surpreendido. Os sons riscados pelo vento e a visão atrapalhada pelo gelo haviam sido sua ruína. E o fato de que se separar dos filhos.

Clarisse estremecia só de pensar que poderia ter sido ela. Apesar do gênio forte que tinha, no fundo era apenas uma garota assustada, órfã de pai. Ela tinha razão para chorar. Por todo o primeiro mês seguinte, e um pouco além deste.

Kenai, naturalmente, não derramou uma lágrima sequer. Ele apenas guardou o sofrimento, engoliu a derrota, socou algumas paredes, e alguns rostos também. Enquanto tanto a mãe quanto a irmã seguiam suas vidas, arrumando parceiros e novos casamentos, o mokolé deu as costas a família, se tornou um encrenqueiro e, consequentemente, teve de inserir-se naquele mundo que antes odiara, mas passara a amar.

Ele tornou-se um caçador de recompensas.

Isso ajudou-o a encontrar os assassinos do pai, um tempo depois. Não tiveram sorte uma segunda vez. Kenai agora era realmente um monstro, um Filho da Guerra. Ele brigava por brigar, e saia dos limites. Entrava nos bares mais para arranjar confusão do que para beber. Aquele que nunca fora um exemplo bom, agora estava ainda pior.

Não era um bom partido, aquelas pessoas para as quais os pais empurravam suas filhas, com a maior gentileza. E também não seria um bom pai para qualquer criança. Mas, durante esse tempo que ficou vagando por ai, ele acabou engravidando uma humana.

Sim. Kenai tem um filho.

Isso se passou a quinze anos. Logico que ele não assumiu a criança, e menos ainda tinha certeza que ela era realmente do seu sangue. Isso apenas ficou para trás. Como todo o resto. E ai, quando ele se tornou um dos maiores caçadores de recompensas da região, quando tanto a ordem quanto o caos já abriam caminho para ele... conheceu Liam.

Esquisito, certinho e pertubado, foi sua primeira impressão dele. Os óculos no rosto do rapaz chamavam muita atenção, afinal quase ninguém utilizava aquele recurso. E como se isso não bastasse, ele simplesmente falava sozinho. Certo. Muito animador.

Quis o destino que Liam andasse em sua direção. Ele parecia perfeitamente decidido, enquanto se esgueirava entre as pessoas da taverna, evitando confusão. E Kenai reparou, também, que as pessoas que levantavam a voz para brigar com ele simplesmente desistiam no meio do ato, e voltavam a seu lugar de antes. O que o desconhecido seria, afinal?

Foi mais a curiosidade mórbida que levou o mokolé a falar normalmente (ou quase) com ele.

– Você é aquele que chamam de Filho da Guerra, certo?

– Acertou, Quatro-olhos. Está olhando para ele. - ele abriu aquele natural sorriso zombeteiro, o qual seu interlocutor ignorou.

– Entendo. Tenho uma proposta a fazer-lhe.

– E quem você pensa que é... - Kenai se aprumou em toda a sua altura e musculos, olhando-o de cima. -... para me propor coisas?

– Eu sou um Seguidor do Pesadelo. E você também será. - foi a resposta, dita em um murmúrio. De alguma forma, ao olhar naqueles olhos, sentiu algo repeli-lo, e então o mokolé pareceu se acalmar por um minuto.

– Não é aquele cara que foi preso nas Terras Abandonadas?

– Sim. Mas com a sua ajuda, ele não estará mais preso...

Aquelas palavras fizeram com que os dois deixassem o local movimentado e procurassem um mais vazio. Liam explicou o que estava acontecendo, de maneira rápida, achando que o cérebro de Kenai conseguia acompanhá-lo. Na realidade, precisou explicar mais duas vezes para que a ideia ficasse clara.

Kenai concordara. E por que não concordaria? Ele teria desastre, caos por toda parte e as pessoas iriam começar a aceitar o que eram... monstros. Todos tinham um monstro em seu interior lutando para sair.

Talvez fosse melhor que ele tivesse recusado...

oOo

O navio ancorou com certa dificuldade na costa da primeira Ilha Rochosa. Ele estava em pedaços, precisando urgentemente de um concerto. Uma lástima que não havia ninguém ali capaz disso. Os quatro Seguidores se entreolharam, fazendo caretas. Alguém ia ter de fazer esse trabalho enquanto os outros buscariam as chaves.

– Vamos votar. - Loke alegou, com um sorriso no rosto, como se fosse a melhor ideia do mundo.

– Você vai trapacear a seu favor. - cortou Lyla.

– Quem você pensa que eu sou, eu luto pela causa!

– Você luta por você mesmo.

– É uma boa ideia. - se interpôs Liam. - Vamos fazer isso. Todos apontem para quem, em sua opinião, deveria ficar para concertar o estrago.

– Três dedos viraram em direção a Kenai. O quarto estava apontando para Lyla.

– Hei! Que porra de decisão é essa?

– Por que está apontando pra mim seu retardado?

– Porque você é uma mulher-macho e esse trabalho braçal é perfeito.

– Ora seu...

– Calem a boca. - Liam levantou a voz, massageando as têmporas. - Já estão começando a me irritar! Vamos logo com isso, não devemos ficar muito tempo por aqui...

Foi ai que Kenai, o grande mokolé, foi forçado a arrumar a embarcação contra a sua vontade. Ele precisou fazer viagens de ida e volta até o antigo vilarejo que ali havia, pegando a madeira das casas e cortando-a para remendar os pedaços, apenas para que o barco tivesse condições de retornar. Se houvesse uma segunda serpente marinha ou uma tempestade violenta como a ultima, aqueles cuidados seriam em vão.

Eles iriam a pique.

– Faça isso, Kenai, faça aquilo, Kenai. Estão achando que eu sou o quê, um escravo? - ele resmungava, enquanto direcionava toda a sua força para cortar a madeira, e não destruir o resto do navio. Um barulho atrás do mesmo fez com que ele levanta-se a cabeça e funga-se. Havia alguém por perto. Com um cheiro característico. Levantou-se num rompante, fazendo as garras crescerem consideravelmente. - Quem diabos está ai?

Apenas dava para ouvir uma risada cristalina, beirando entre a infância e a adolescência. Por mais que ele tentasse captar a origem do som, não conseguia distingui-la muito bem. Uma movimentação atrás de si fez com que ele girasse nos calcanhares com rapidez, mas não o suficiente. O que parecia ser uma calda de tom esverdeado se enroscou nele, jogando-o com brutalidade no chão e prendendo-o ali. Ah, ele certamente iria matar o engraçadinho...

– Nem pense nisso... ou você se arrependeria pelo resto da vida. - disse a voz, ao notar a intenção dele. Kenai ergueu a cabeça minimamente, apenas para conseguir ver o rosto de seu captor. Por algum motivo, um arrepio gelado percorreu sua espinha. Aqueles olhos...

Eram os mesmos que olhavam para ele de volta, quando estava de frente ao espelho.

– Surpresa... pai...

oOo

Loke, Lyla e Liam subiam as encostas com uma dificuldade visivel. O ar era quase irrespirável, e dois deles eram humanos. O terceiro, mesmo com sua linhagem ancestral, estava também tendo sérios problemas em continuar.

– Alguém tem um lenço? - perguntou o de óculos, voltando os olhos para Lyla.

– E você acha realmente que eu teria algo assim?

– Rasgue o seu vestido, já que se diz tão homem, e divida para que consigamos respirar. - retrucou Loke.

– Vou rasgar uma coisa sim, a sua garganta.

– Pois bem, faça isso, ainda é melhor do que morrer sufocado.

– Tenha. Santa. Paciência. - Liam revirou os olhos, e retirou a camisa, ficando nu da cintura para cima. Molhou-a com o pouco de água que trazia em um cantil e colocou no rosto, tapando o nariz e a boca. Não ouviu nenhuma piadinha com relação a isso.

Era bom mesmo que não houvesse, ou ele ia ficar realmente puto. Lyla arrancou uma das mangas do vestido cumprido que usava, repetindo o processo. Loke atirou sem muita cerimônia o blazer que usava no chão, e arrancou uma das mangas de sua blusa alva também.

Os três seguiram, sem poder discutir por causa do ar quase irrespirável. Andaram algum tempo, antes que Liam parasse e fizesse um sinal para que eles cessassem o passo. Se continuassem, iriam adentrar uma abertura, uma caverna possivelmente, com as paredes internas avermelhadas e poderosas estruturas rochosas saindo tanto do teto quanto do chão. Dava a impressão de que estavam adentrando a boca de um demônio.

– Eu acho sugestivo, e vocês? - Loke tirou o pano dos lábios para falar.

– Pode ser que seja o que procuramos. De qualquer forma, temos que entrar pra saber.

– Ótimo. - completou Lyla. - Vamos indo, então...

Ambos adentraram aquilo que parecia a entrada para um reino de fogo. E a caverna pareceu fechar-se atrás deles. Como um monstro capturando sua presa entre os dentes...

continua....


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Notas finais do capítulo

Hei, hei, hei!!
Eu prevejo muitos "what" "que porra é essa" e "como diabos ele tem um filho" nos comentários. Já deixando avisado que isso estava na ficha de kenai quando ela foi entrega, mas Kali não achou nenhum momento apropriado para inserir esses dados antes.
E como não tinhamos ideia do que fazer, o passado do Kenai veio a tona. Fazer o que. O show não deve parar!
Falando nisso... e o chibi do mokolé? Tá fofinho, não?
Próximo capítulo o reencontro dos JB/BH.
Kisses para vocês e até lá