Crônicas do Pesadelo {Interativa} escrita por Dama dos Mundos, Kaline Bogard


Capítulo 20
Túmulos sob a terra...


Notas iniciais do capítulo

Hei, hei, hei galerinha... já deixando avisado logo de começo, esse aqui está grande... e eu quero dizer realmente grande.
Para aqueles que estão esperando o sangue jorrar da tela do computador, talvez gostem desse capítulo... será que sim? Será que não? Será que meu instinto de massacre ainda não aflorou o suficiente?

Cahan... eu vou deixando avisado aqui desde o início que não sou especialista em lutas (pessoalmente acho que minhas cenas de luta deixam a desejar), eu to fazendo um pequeno esforço ultimamente para tentar sanar esse problema.

Kaline me mandou uma mensagem lá das colinas (ainda bem que tem wifi!)dizendo que está muito bem por lá... eu disse que era melhor pegar um foguete e ir logo até a lua, mas fazer o que... vai que o Homem na Lua conseguiu internet?

Boa leitura! Ahn, e mais um aviso, passaremos a postar 12:05, assim facilitamos a vida de alguns leitores.



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O único que saiu do esconderijo para ver Anne foi Frosty. Enquanto os outros descansavam em um dos labirinticos túneis subterrâneos de Hathea, Lidrin de guarda, caso alguém resolvesse aparecer, o elfo cobriu-se com uma capa grossa e quente, com um capuz que tapava completamente sua fisionomia, e se dirigiu a taverna, para onde o corpo petrificado tinha sido removido. Afinal, Anne não tinha casa, desde sempre. Não havia um lugar para voltar, ou uma família para chorar por ela. Havia apenas eles. E mesmo eles não podiam chegar perto demais. Agora a JusticeBlade era a presa favorita das Terras de Meroé, e simplesmente não podia nem ao menos colocar o nariz pra fora de seu esconderijo improvisado sem correr o risco de perder o membro.

Frosty não quis correr o risco de envolver o antigo senhor de Anne em seus problemas, e foi rápido. Entrou e saiu sem ser especialmente notado... Apenas havia aquela a certeza de que iria fazer qualquer coisa para resolver aquela situação. Deveria haver algum antídoto. As coisas não podiam ficar daquele jeito.

Quando retornou aos túneis, tirando seu disfarce pesado e agora encharcado, pois uma chuva fina e insistente havia começado a cair a meio caminho, ele notou que Nyx estava de pé. Ela parecia mais pálida que o normal, ou era apenas impressão. Na confusão toda, até mesmo a líder havia sido machucada, e um de seus braços jazia imobilizado por talas, impedindo-a de mover-se livremente. Estava conversando algo com Lidrin, pelo visto, no entanto ambos calaram-se com a chegada de Frosty.

– Lidrin... poderia nos dar licença por um minuto?

O djin olhou de um para o outro algumas vezes, e notando a expressão nada agradável no rosto de Frosty, encolheu os ombros e levou uma mão a testa. - Sim, senhor... er... acho que vou lá ver como Neco está...

– Apenas vá... - o loiro segurou a ponte do nariz entre o polegar e o indicador, e ao ver que o outro rapaz havia saído, voltou-se para Nyx. Suas mãos pararam na cintura, e ficou claro o que ele estava sentindo naquele momento. Sua irmã de consideração o conhecia perfeitamente para saber quando ele perdia a paciência. O que era raro, mas não impossível.

– O que, pelos deuses, você estava pensando em fazer? Hã? Por que simplesmente não nos reuniu do lado de fora do baile, por que não raciocinou um pouquinho antes de armar um escândalo!?

O tom de voz dele foi aumentando a cada palavra, e ele tinha consciência disso, mas não foi capaz de parar. Viu quando Nyx, que ainda mantinha a cabeça baixa, deu um passo para trás, desviando os olhos para um ponto na parede.

– Desculpe... não pensei...

– Mas é óbvio que você não pensou, Nyx! Você não só colocou todo mundo em perigo como fez com que nós fossemos considerados criminosos. - ele estendeu um cartaz que achara e praticamente desdobrou-o a milímetros de seu rosto. - Estão caçando a gente! Possivelmente não haverá mais nenhum lugar seguro para nos escondermos, com uma recompensa desse tamanho!

Nyx moveu sua atenção para o cartaz, arrancando-o da mão dele e correndo seus olhos rapidamente por todo o pergaminho. Um grunhido baixo dela fez com que uma certa inquietação transparecesse. - Quinhentas moedas de ouro... isso é piada?

– Quem nos dera, se fosse piada. Nossas cabeças estão a prêmio.

– Já passamos por situações difíceis antes.

Ela sentiu-a ser segurada pelos ombros e viu o rosto dele descer a seu nível. - Não, Nyx, não passamos... nós já brigamos com equipes de caçadores por uma presa, mas em nenhum momento fomos a presa. Você tem sequer noção do que isso significa?

– Mas que droga, Frosty, você também cometeu um erro, poderia ter acertado a Neco com aquela lança, sabia? - ela se desvencilhou do aperto, com um sacudir de ombros. - Quer que eu admita que errei, eu já fiz isso, tá? Não me trate como se eu fosse uma criança, estou ciente das consequências. E você deveria estar também, afinal não fez nada pra impedir!

– Como você ousa...

A gritaria pelo visto tinha despertado a atenção de Selene, já vestida com suas roupas normais (as quais Lidrin trouxera em um primeiro momento, quando todos acabaram de chegar aos túneis), e sofrendo ainda os efeitos da ressaca. As vozes exaltadas do outro lado do espaço que tomara como seu “aposento” não ajudavam em nada sua dor de cabeça. De maneira que, após alguns segundos, levantou-se completamente, virando a esquina e atirando seu vestido em frangalhos na cabeça dos outros dois.

– Hei... se vocês dois não calarem a boca vou incinerar ambos, estão ouvindo!?

Ela esperou que ambos se desvencilhassem da peça de roupa e tentassem agredi-la verbalmente antes de continuar.

– Mas que inferno, Selene!

– O que você está...

– Já disse para calarem a boca! Estão parecendo duas crianças de birra, batendo os pés... TODOS NÓS erramos. Nós nos envolvemos em uma bola de neve onde um não está mais certo que o outro. E outra coisa, os dois sequer tem noção do que estão fazendo? Se estressarem Neco vamos morrer soterrados aqui em baixo, vocês sabem muito bem que o poder dela está fora de controle depois de toda essa confusão.

Nyx piscou algumas vezes, voltando ao seu tom de voz habitual, para poder argumentar.

– Você também não deveria estar falando mais baixo, Rainha de Copas...?

Selene levou uma das mãos a cabeça, respirando profundamente. - Isso porque vocês dois me irritam a ponto de querer degolá-los. Em vez de ficarem debatendo de quem foi a culpa, que tal pensarmos em uma solução inteligente? Vamos, Frosty, essa é a sua especialidade.

O elfo por sua vez também precisou suspirar, contar mentalmente até vinte (porque dez já não era o bastante) e respirar profundamente antes de poder alegar algo sem que sua voz subisse. -Isso é verdade, estamos agindo como desesperados...

– Deve ser porque estamos desesperados.

– Falem por vocês dois. - Nyx disse, sentando-se em um banquinho criado a partir de chapas de metal que haviam por ali. - De qualquer forma, eu assumo toda a responsabilidade. Acredito que foi minha atitude impensada que levou todos ao pânico. - ela desceu seus olhos em direção ao próprio colo por alguns instantes. - Vocês tem o direito de julgar-me. Estarei em debito eterno por causa desses últimos dias. Eu mesma farei algo para compensá-los.

– Não há uma compensação válida, Nyx... vamos ter que suar para limpar o nosso nome. Imagino, no entanto, que ninguém está pensando em se entregar. - Frosty abriu seus olhos azuis, fitando uma e depois a outra. Parou por último o olhar na líder, e colocou uma de suas mãos em seu ombro. -Perdoe-me por gritar contigo, está bem? Podemos dividir essa culpa.

– Sim, podemos.

– Continuando... - Selene cortou, cruzando os braços. - Se vamos nos resguardar, não podemos ficar aqui para sempre. Logo vão começar a procurar. Os túneis tão pouco são seguros, nós mesmos podemos nos perder aqui dentro.

– E sabe bem o que dizem, uma vez perdidos, não é possível que voltemos a superfície.

– Chamam isso de superstição, Frosty. Existem formas para não se perder aqui dentro. Mesmo assim, é melhor sairmos, não dá pra ficar aqui para sempre. E precisamos encontrar um antídoto para Anne. - Nyx cruzou as pernas, inclinando a cabeça. - Isso é o principal.

Frosty sabia bem que Nyx se importava, da maneira distorcida dela... então assentiu com a cabeça, mesmo sabendo que aquela missão seria quase impossível. - Se houver uma forma de trazê-la de volta...

– Nós vamos encontrar. - Selene assentiu com a cabeça. - Agora temos que pensar para onde vamos assim que sairmos dos túneis.

– Mesmo com toda essa confusão o pessoal de Vale vai estar do nosso lado. - Frosty lembrou, ao passo que Nyx negou com a cabeça.

– Não iremos para o Vale das Estrelas. Eles já sofreram o bastante. Não vou colocar o seu povo em risco por causa da minha falta de responsabilidade.

– Nosso povo... você é metade elfo, Nyx.

– Metade. - ela repetiu, e sabia que seria inútil argumentar contra Frosty naquele instante, de maneira que apenas jogou os cabelos para trás, deixando a vista suas orelhas pontudas. - Mas isso não vem ao caso. O Vale não é uma opção.

– Então vamos fazer o que, fugir e ficar mudando de um lugar para o outro, como se fossemos nômades? - Selene franziu o cenho, mastigando uma mecha de seu cabelo desfiado.

– Sim. - foi a resposta uníssona dos outros dois.

– Por enquanto, ao menos. - Nyx acrescentou, mudando de posição. - E quanto a Neco? Ela é uma criança ainda... não podemos arrastá-la conosco, pode não aguentar a pressão.

– Não podemos simplesmente deixá-la para trás, a cabeça dela está a prêmio...

– Se eu lhe doasse meus chifres, talvez...

– Uma hora alguém haveria de descobrir não é?

– Ninguém aqui é capaz de chegar a um consenso, pelo visto.

– Eu não vou a lugar nenhum sem vocês.

A voz da garota mais nova chegou simultaneamente aos ouvidos dos três, vindo por trás de Selene. Ela se virou, olhando por cima dos ombros, assim como Frosty e Nyx moveram suas cabeças de forma que pudessem enxergar a recém-chegada.

– Neco...

– Vocês não vão me deixar para trás, estão ouvindo? - ela parecia cansada, exausta, olheiras profundas cobriam a parte inferior de seus olhos. As estruturas acima deles tremeram por alguns instantes, fazendo cair poeira sobre suas cabeças. Selene olhou com certa apreensão para o teto, como se ele fosse desabar a qualquer minuto.

– Neco, uma vida de fugitivos não é para você.

– Assim como a vida de uma caçadora nunca foi. Mas eu não quero ficar aqui enquanto vocês arriscam suas vidas sabe-se lá onde... - ela engoliu em seco, e o tremor parou. - Eu vou com vocês, e ajudarei a achar uma cura para Anne.

Nyx ergueu-se de seu banco improvisado, e Frosty se ajeitou. Os quatro formaram um quadrado, o que restara da força principal dos JusticeBlades, se encarando por algum tempo.

– Nós entramos nessa juntos. E é assim que vamos sair.

– Sim... é uma promessa.

Eles voltaram a se entreolhar, e lançaram mínimos sorrisos um para o outro. Podiam ser a equipe mais esquisita, seus integrantes podiam brigar entre si a cada cinco minutos, e mesmo assim todos ali eram suficientemente unidos para nunca deixar ninguém para trás.

– Eu odeio estragar o clima família feliz, pessoal, mas acho que nos encontraram. - Lidrin apareceu por uma abertura, apoiando o peso do corpo em uma parede. - Pessoal, acho que é hora de correr. -com a mão livre, deixou cair quatro mochilas no chão. Estas também estavam ali desde o primeiro dia, ele as conseguira em meio a confusão que se instalou depois do baile, logo após deixá-los em segurança. Fazia pelo menos dois dias que estavam no subterrâneo, sem aquelas provisões, no estado em que todos conseguiram fugir, era possível que não tivessem sobrevivido. Eles eram elfos, mas não imortais, afinal.

Enquanto cada um pegava sua respectiva bolsa e a colocava, assim como as capas e toda a paramentação para sairem sem ser notados, vozes chegavam a seus ouvidos. Parecia uma tropa inteira.

– Caçadores?

– Soldados, posso ouvir o ranger das armaduras. Mas não ficaria surpreso de ter outros caçadores no meio destes. Ninguém quer perder a chance de levar quinhentas moedas pra casa. - o djin respondeu, aprontando-se também.

– Deveriam saber que vamos vender nossa pele bem caro. - Selene, já pronta, tinha uma chama bruxuleante subindo de sua mão direita.

– Sim, mas lutar aqui em baixo não é lá muito inteligente... -Frosty puxou-a pelo braço, já começando a correr. - Não vamos ficar para ver no que isso vai dar... Lidrin, o que acha que está fazendo?

Ele havia parado, também, e tocou com suavidade os próprios cabelos verdes, com um sorriso de canto. - Eu seguro eles. Não se preocupem, não vou estar sozinho.

E de fato, assim que acabou de falar, seu olho direito foi lentamente tomando uma coloração avermelhada... ele pareceu sentir uma dor de cabeça muito forte, pois levou uma das mãos a ela e pressionou com mais força a que segurava a parede. Agachou... sua respiração foi ficando mais pesada. Parecia que estavam mexendo dentro de seu cérebro, como se uma coisa emergisse de lá... todos ali sabiam o que estava acontecendo.

– Ótimo, como se a situação não estivesse muito ruim, aquele cara ainda vai tomar o controle... -protestou Selene, que praticamente quase caiu quando Frosty também freara sua corrida.

– Não temos tempo para isso... - Nyx chegou pelas costas de ambos, trazendo Neco pela mão. -Vamos... ele vai ficar bem. - ela olhou uma ultima vez para trás, sabendo que Lidrin de fato ia sobreviver aquilo com extrema facilidade, sendo quem era. - Tente não morrer!

– Cale a boca, sua mestiça miserável, com quem achas que está falando? - ele voltou a erguer seu corpo, e agora seu olho direito estava com a íris completamente vermelha, sanguínea. Seu rosto, normalmente calmo, agora mostrava traços de malicia... quem sabe, talvez, loucura.

Nyx desistiu de argumentar... não era o Lidrin subordinado a ela que estava no comando no momento. Discutir não ia levá-los a lugar nenhum. Deu mais um empurrão para que os outros seguissem e deixou-o para trás.

Afinal, Lidrin sabia muito bem o que estava fazendo. Ele sorriu, um sorriso insano, e com um toque no ar foi se materializando uma foice enorme. Seu cabo era de madeira trançada, subindo até chegar a uma caveira humana, envolvendo-a completamente e só então ligando-se a lâmina, tão grande quanto ameaçadora. A foice do Pierrot, como era chamada... ela estava em sussurros a meia voz por toda parte. Desde que Lidrin chegara a Hathea, as lendas das tavernas nunca mais foram as mesmas...

Quando os primeiros soldados apareceram, virando uma curva, pararam de imediato. O comandante, um homem de aparência dura e desgastada, foi passando em meio a eles, querendo saber o porque de interromperem a marcha. Seus olhos cravaram-se em Lidrin. Eles congelaram. - V-você? Eu vi os cartazes, mas não acreditei que estaria junto àquela corja...

– Ahn, eu estou... - ele passou os dedos pelos cabelos, tirando-os da face, aprumando sua postura. -Não que eu goste daqueles vermes-com-super-poderes, mas sabe como é... nós temos um acordo. Então, se não derem meia volta, eu não me responsabilizo pelas suas vidas... ou a falta delas.

– Você está indo contra a lei, Marquês Mombel.

– Ah, mas isso de lei é muito relativo... já ouviram falar de... - e ele preparou a foice, cortando o ar com extrema facilidade. Só esse deslocamento já fez alguns soldados, mais próximos, serem atirados violentamente para trás. - Olho por olho, dente por dente?

– Os soldados do imperador são a alma do exército, meu senhor... nós não recuaremos. - o homem ajeitou sua espada, brandindo-a contra Lidrin.

–É uma pena que isso não mude nada, comandante... - a foice moveu-se uma segunda vez, e a espada se partiu em duas, o corpo que a brandia também se separou, uma metade para cada lado. O cheiro forte de sangue preencheu o ar, enquanto o comandante dava seu ultimo suspiro, sem nem ao menos ter a oportunidade de acertar um único golpe. O sangue se espalhou, lentamente. A tropa, vendo tal cena, se agitou, e desta vez foi em direção a ele... espadas, maças, clavas, várias armas diferentes passavam perto de seu corpo, causando, no máximo, arranhões. Mas a foice era imparável. Ela girava, rodava e repartia, arrancando membros, depedaçando corpos, fazendo o sangue jorrar. Não demorou muito para que aquela extensão do labirinto estivesse amontoada de restos, de armaduras, armas e homens. Lidrin parou, finalmente, vendo aquela chacina que ele mesmo perpretara. Seu corpo se vergou numa profunda reverência.

– Que suas almas encontrem paz, valorosos soldados... pois a minha nunca a terá.

Voltou a endireitar-se, seu olho voltando de maneira lenta ao normal. O outro Lidrin, aquele que tinha uma personalidade boa, preferiu não olhar muito para aquele lado e virou-se. Mas ergueu a cabeça de imediato, sem ter tempo de lamentar. Podia sentir presenças distantes no corredor... como passaram por ele sem que notasse? Mesmo que isso fosse completamente contra seu hábito começou a correr, na direção que os outros haviam tomado. De fato, havia caçadores entre a tropa... e tinham conseguido burla-lo com extrema facilidade, enquanto seu lado Dark fazia o sangue dos soldados correr...

E isso não era nada bom...

oOo

– Eu não gosto dessa ideia... - ia dizendo Nyx, enquanto driblava um amontoado de entulho, em meio a corrida. - Ele vai matar gente inocente...

–Mais do que a Neco já matou sem querer no decorrer da sua vida? -alfinetou Selene, recebendo um olhar enviesado da outra garota. - Quero dizer, as vezes mortes são necessárias.

– Isso porque você não costuma ligar para a vida das pessoas.

– Não posso negar... - ela saltou também, retomando a corrida. - Para onde?

– Direita. - disse Neco, parando de olhá-la para prestar atenção no mapa que carregava. Geralmente conseguia sentir o solo com extrema facilidade, para ela seria fácil percorrer aquele caminho, normalmente. Mas desde o baile, seus poderes estavam completamente loucos. Então tinha que fazer tudo pelo modo mais difícil... e não poderia usar seus poderes em hipótese nenhuma, ainda mais lá em baixo. Se acontecesse o pior, teria de apelar para a sua lâmina oculta, uma adaga que carregava sempre consigo, mas que de fato quase nunca usava.

Frosty ia comentar algo quando sentiu algo passar bem perto dele... aquilo era uma faca?

– Puta merda... - ouviu Selene xingar, e então parou de correr de vez, abaixando o corpo, sentindo mais meia dúzia de lâminas passarem pelo lugar onde antes estava seu tronco.

– Era só o que faltava... eu tenho lá cara de alvo?

– Seu cabelo loiro chama muito a atenção. - alegou Selene.

– Haha... engraçadinha, você. - Ele rolou o corpo para o lado, conseguindo se levantar, passando os dedos pela roupa, agora suja de poeira. Os outros continuaram encostados à parede, olhando com curiosidade e certa preocupação para o local de onde as lâminas tinham vindo.

– Onde vocês pensam que vão? Nunca disseram que é falta de educação sair de casa quando se tem hóspedes? - era uma mulher que falava, ela usava sobretudo, e uma roupa toda de couro preto, assim como as botas. Podia se ver uma fileira de facas presas por todo o sobretudo, fazendo um arco na altura de sua cintura, e ela brincava com uma lâmina, cuja qual atirava para o ar e segurava segundos depois, nunca se ferindo no processo. Seu rosto era um amontoado de cicatrizes, na vertical, horizontal, diagonal... era como se tivesse caído por cima de inúmeros cacos de vidro.

– A Artesã das Lâminas. - Neco gemeu, automaticamente dando um passo para trás. Nyx deu outro para o lado quando a faca que estava na mão da mulher foi arremessada contra a mesma. Os fios de seu cabelo do lado direito flutuaram no ar, descendo até chegar ao chão.

– Francamente, isso não é da sua conta, Marie.

– Não é da minha conta? Sério? Quinhentas moedas de ouro? Querida Demon Lady, ou melhor, Nyx... eu mataria por uma recompensa dessas...

O duplo sentido faria qualquer um gelar, mas Nyx manteve-se firme. Ela estava com um braço ruim, e não poderia manejar com desenvoltura sua foice. Teria que usar apenas do seu manejo de metal para se defender, e bem, a Artesã das Lâminas não era conhecida por ser um oponente fácil. Muito pelo contrário.

– Ao menos ela não está com o guarda-costas... - segredou Selene para Frosty, ajudando-o a se recompôr. Não teve lá muita sorte com isso. Viu quando uma mão enorme atravessou a parede atrás de si, fechando-se ao redor de seu corpo. Selene era alta, de fato, mas aquela coisa que fez a parede explodir e algumas partes do túnel desmoronarem era colossal. Não dava para ter certeza se era humano. Aquilo era apenas armadura, uma grande armadura. Era aquele que chamavam de Triturador, ou o guarda-costas da Artesã. Ela era a agilidade, enquanto ele era pura força bruta. Os dedos que se fechavam em volta do corpo de Selene a esmagavam, de maneira que ela sentia as forças faltarem, e uma dor violenta percorrer a sua cintura, onde a pressão era maior. Ela sacudiu os pés, berrou e golpeou a mão, em vão. A coisa não a soltava.

Neco ameaçou interferir, mas Nyx fez que não para ela... um terremoto não seria uma boa opção ali. Ela ainda tinha a sua lâmina, sabia bem, mas o aço não iria ultrapassar aquela armadura. Até mesmo as fendas dos olhos do gigante eram difíceis de se atingir. E então ambas viram, a pele de Selene começar a ficar vermelha, chamas começando a cobrir o seu corpo inteiro, tornando-a um ser de fogo por alguns segundos. Foi tempo o suficiente para fazer o Triturador soltá-la, e Frosty precisou se adiantar para segurá-la, ou então iria cair no chão. Converter o próprio corpo em seu elemento era cansativo ao extremo. Não era o tipo de poder que podia se usar levianamente.

Ainda assim, a recuperação de Selene foi um pouco mais rápida que o previsto, porque no minuto seguinte ela já girava o corpo, ficando por cima de Frosty e interceptando uma lâmina atirada na direção deste.

Agora ambos estavam numa posição claramente constrangedora, e ou não percebiam, ou fingiam que não estavam vendo. Uma chuva de lâminas fez com que ela saísse de cima de Frosty, enquanto este fazia uma barreira de gelo subir entre a equipe e os perseguidores. - Vamos, acho que eles não vão passar daq...

– Oh, que esperto da parte de vocês, no entanto eu tenho um troll do meu lado... é ou não é, garotão?

O Triturador rugiu em resposta, pondo-se a bombardear a parede gélida com os punhos. Os Justice Blade se preparam para correr de novo.

– Estão todos bem? - Nyx perguntou, já sentindo as forças pra continuar a correr começando a falharem.

– Acho que sim... mas isso não vai durar muito. - Selene por sua vez mais se encostava em Frosty do que corria. Por ela mesma, não aguentaria nem andar. - Se continuar assim vamos morrer.

Frosty parou, e olhou para trás. Fez um esforço extra. Não poderia usar seu par de sais... tinha que ser tudo na base da magia, e rápido. Quando o Triturador e a Artesã viraram a esquina, correndo em sua direção, ele fez...

Ele não era a favor de matar pessoas, a menos que a situação fosse critica. Ele defenderia a sua equipe até a morte, se fosse preciso.

Ele criou uma nevasca debaixo da terra. Tão intensa e direcionada que fez a Artesã congelar, dos pés a cabeça. O ultimo grito dela avisou o Triturador, que já começava a ser preso pelo gelo. A camada branca também subiu por ele, mas muito lentamente. A mão dele ainda conseguiu estender-se, quase agarrando o Mestre de Gelo. Uma garra curva e letal roçou em seu rosto, antes de se despedaçar.

O gelo perdurou... agora que começara, Frosty sabia o erro que tinha cometido... era isso que Neco sentira no fatídico dia do Baile? Ele não conseguia parar... a força do gelo atravessava o túnel, tampando-o, transformando-o numa cripta, num túmulo congelado. Ele fechou os olhos, pediu, implorou. Ele sabia que as outras estavam tremendo, não precisava olhar em seus olhos para saber o que aconteceria se aquilo continuasse.

Por favor... por favor... eu só tenho elas, por favor...

O vento pareceu amainar. Ele sentiu como se toda a sua energia tivesse sido retirada de seu corpo, mas não deu importância. Caiu de joelhos. Dentro dos túneis nevava... uma neve branca e fofa, que descia do teto, cobrindo-os... tinham que sair dali antes que ela os soterrasse. Em seguida, pode ver a chama, e o calor que ela continha se espalhou pelo lugar, fazendo todo aquele gelo derreter aos poucos. Selene tossiu, pondo-se de pé, o frio percorrendo sua espinha. Ela quase virara uma estatueta também.

–Pensei que você ia nos transformar em picolés, Senhor Certinho... - usou a mão livre para bagunçar os cabelos loiros dele, que já estavam completamente espigados.

Ele arfou por algum tempo, deixando a cabeça descansar na barriga dela. Nuvenzinhas de vapor saiam de sua boca toda vez que ele expirava. Com a ajuda dela, conseguiu finalmente levantar-se, e virou-se de imediato, a procura das outras duas integrantes da equipe. Nyx havia caído, pois o chão se congelara em meio a sua corrida, e quando seu corpo arriou, a tentativa de proteger o braço ruim acabou fazendo com que deixasse o bom dormente. Mas fora isso, parecia bem. Ela ainda tremia, observando-o de esguelha, perguntando-se se ele havia ficado maluco. Neco estava ao lado, abraçando suas próprias pernas numa tentativa vã de se aquecer, e em um dado momento acabou espirrando, o que já significava que pegaria um resfriado.

Frosty foi até elas, abraçando as duas ao mesmo tempo, apertando-as contra seu corpo, como se fossem as ultimas pessoas do mundo. - Me desculpem... me desculpem, tá? Eu não queria...

– Deixe disso... você salvou a gente. - Nyx apenas descansou seu queixo no ombro dele, afinal mexer seus braços no momento era algo doloroso. Neco deu palmadinhas em suas costas.

– Tudo bem... hei... já passou...

– Está todo mundo bem!? - era a voz de Lidrin, chegando do outro lado das estatuas, restos daqueles que foram a dupla mais bem-sucedida de Hathea. O Triturador jazia sem um dos braços. Sua parceira perdera a cabeça quando o gelo começou a trincar... o djin não perdeu tempo olhando para eles, apenas passou direto, reunindo-se aos outros. - Perdoem-me, não reparei que estes tinham atravessado.

– Sem problemas... nosso Dominador da Água deu um jeitinho neles. - Selene fez um sinal com os dedos, como se fosse uma arma, e “atirou” na direção de Frosty. Esse suspirou. O que podia fazer além de concordar com a cabeça?

Quando todos já estavam de pé, Lidrin pegou o mapa e o examinou, antes de perguntar. -Há uma saída mais a frente, vamos estar no território de Shion se a usarmos.

–Melhor irmos antes que comecem a procurar pelo lado de lá também, então...

–Não imagino, devem achar que estamos no labirinto ainda... mas isso não vai durar, ainda mais quando outros grupos virem o que aconteceu aqui.

– Certo... apenas vamos em frente, não tem opção melhor mesmo. -Nyx ajeitou o cabelo do jeito que pode, Marie havia deixado claramente uma marca, um dos lados de suas madeixas negras estava nitidamente mas curto que o normal. Bom, ela podia resolver isso depois...

Mais uma vez paramentados, os JusticeBlades se preparam para deixar o labirinto. Mas esse não seria o único problema que haveriam de encontrar.

Daqui para frente, as coisas só iriam ficar piores...

Continua...


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Notas finais do capítulo

Ufa... esse foi puxado. Temos discussões, brigas, desmoronamentos, mortes... o que ainda deixa meu coração em frangalhos, acho que ando muito emotiva ultimamente (e ainda bem que verifiquei essa bagaça antes de postar, porque de alguma forma o nyah comeu todas as notas finais).

Sra Cookie, nossa amada Neco, mais uma vez eu tento não usar a imagem original, estou com certo receio que as orelhas estejam artificiais, mas preferi esta em especial por causa do penteado (que você deixou bem claro na ficha). Se não gostar, me avise que edito e posto a original mesma no lugar, sim?

Eu não me lembro o que foi que escrevi aqui, realmente odeio quando isso acontece, vou passar a escrever as notas antes de passá-las para cá também u.u

Kisses e até a próxima, lembrando que próximo capítulo é dos Pessy