A Menina da Bicicleta Vermelha escrita por Madchen


Capítulo 3
Yohanna




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Enquanto ia para a escola, ele passou por alguns cartazes e decidiu que ia arrancar todos. Sempre que passava por um cartaz, arrancava-o sem olhar para ele e jogava na lixeira mais próxima. O único porém é quando tinham outras pessoas olhando, porque o reconheciam e apontavam indiscretamente... mas aí ele arrancava o cartaz, fazia cara de bravo e seguia seu caminho.

Chegou na escola no horário habitual, sentou-se na carteira habitual e encontrou seu amigo de cabelo grande. Ele disse:

-- E aí, viu os cartazes hoje?

-- Passei por uns cinco -- Matt falava quase sussurrando, inconscientemente sem querer chamar atenção. -- Arranquei todos. Que maluquice é essa!

O amigo riu quando outro menino, de cabelo curto e espetado, apoiou-se na carteira de Matt e olhou fundo nos olhos dele, com uma expressão de curiosidade.

-- Tem uns cartazes que parecem muito com você por aí!

Logo, chegou uma menina loira e começou a falar também:

-- É, eu vi quando estava vindo pra escola. Matt, é você naqueles cartazes?

Vários colegas entraram na conversa e muitos deles tinham visto os cartazes. Perguntas como "o que você vai fazer?" e "por que você está num cartaz?" eram as mais frequentes, mas Matt não respondeu nenhuma. Até que disse:

-- Eu não vou fazer nada! Vou deixar como está até essa loucura acabar. Não tenho nada a ver com isso, quem sabe o cara do cartaz nem sou eu!

-- Matt, tem que ser você -- a menina loira disse. -- Você é reconhecível de longe, e o desenho está perfeito!

A propósito, essa menina loira se chamava Yohanna e era uma das meninas mais disputadas da turma. Era realmente bonita, alta, com longos cabelos naturalmente loiros e olhos naturalmente azuis, sem falar em sua personalidade gentil e atraente. Acontece que ela dava o fora em todo mundo, pois só tinha olhos para o Matt. Ela sabia que era ele no cartaz porque reconheceria-o até mesmo maltrapilho, barbudo, numa tv a 500m de distância.

-- Devia responder -- o menino de cabelo espetado disse. -- Vai ser divertido.

-- Não mesmo -- Yohanna respondeu por Matt. -- Já pensou? Pode ser um louco que prega esses cartazes por aí e quer matar o Matt!

-- Que imaginação fértil -- o garoto respondeu.

-- Quer saber -- disse o cabeludo -- se a pessoa não sabe quem ele é e fez um desenho, é porque o viu na rua, gostou do que viu e quer encontrar. Uma garota! Não tem outra lógica. Porque um assassino ia olhar pro Matt e dizer: "hm, é aquele que eu quero matar"?

-- Responda -- o menino de cabelo espetado continuou dizendo. -- É como um jogo, vai ser divertido. 

-- Mas você tem que descobrir quem é a garota antes de ela descobrir quem é você -- o cabeludo alertou. 

-- Como é que eu vou responder esses cartazes? Não quero sair pregando meu nome por aí. -- Matt estava apavorado com essa história. 

-- Já disse pra não falar quem você é, você está surdo? -- o cabeludo continuou dizendo. -- Bole um cartaz para mostrar apenas que você leu o anúncio.

-- E aí, quando ela der mais uma resposta, a gente fica de olho pra ver se pega alguem colando os cartazes por aí -- o de cabelo espetado completou.

Naquela tarde, Matt não conseguiu parar de pensar nos cartazes. Responder ou não, eis a questão, e ele estava sentado em sua escrivaninha com um papel e uma caneta à mão. Sim, ele responderia, já era conhecido por grande parte da cidade agora graças a esses malditos cartazes. Ah, a pessoa que armou isso ia ver só.

E se fosse um dos seus amigos? E se tivesse alguém caçoando dele?

Agora não adianta tentar descobrir. Ele pegou a caneta, pegou o papel e desenhou um grande boneco palito. Ao contrário da menina, ele não tinha o menor dom artístico (além de não saber a aparência dela). Depois de desenhar seu boneco torto, ele escreveu na parte superior do papel:

"Eu sou eu. E você?"

Olhou para o cartaz, olhou, olhou e por fim, disse:

-- Que coisa ridícula.

E foi tirar cópias.

***

-- Ele não respondeu, né?

Já havia passado uma semana desde que a menina havia espalhado os cartazes, e nem sinal de resposta.

-- Não... -- ela disse, em tom melancólico. Sua amiga de cabelo azul sentou-se ao lado dela (estavam na escada em frente ao pátio da escola) e apoiou a mão em seu ombro.

-- Eu imaginei. Sabe, se eu visse cartazes com a minha imagem por aí, acho que ficaria apavorada! -- ela sorriu. -- Ele deve ter achado que não é com ele e ignorou, só isso. Fique tranquila...

A menina almoçou fora novamente esse dia. Dessa vez sua mãe estava firmando o acordo com o gerente do Mc Donald's e havia deixado sanduíches no forno, sanduíches que a menina pôs dentro da mochila e levou consigo de bicicleta até a cafeteria da esquina. Comeu sentada no meio-fio oposto, como de costume, observando a clientela. Muitos ricos frequentavam essa cafeteria, mas de vez em quanto pintava um pobre e todos ficavam olhando para ele como se fosse um animal.

Foi aí que a menina resolveu olhar pro lado e viu um papel colado em cima do cartaz que ela havia deixado ali (colado "em cima", pois estava torto e dava pra ver claramente que havia algo por baixo). Levantou-se, caminhou até lá, recobrando as esperanças e qual não foi sua surpresa quando viu que o cartaz era uma resposta. "Eu sou eu. E você?"

Ela quase pulou de alegria, só não fez isso porque estava em público. Contentou-se em sorrir, sussurrar "yes", subir na bicicleta e pedalar a toda velocidade para o parque.

Sim! Havia cartazes por lá também! Ele respondeu, respondeu! Que felicidade!

No meio da euforia, a menina viu um menino de cabelo comprido colando os cartazes e sentiu o coração acelerar. O que devia fazer? Falar com ele? Não, soaria suspeito. Ela podia se fingir de inocente e perguntar "amigo, o que são esses cartazes que eu não entendo?", mas decidiu apenas olhar. E se não tivesse sido o menino certo que respondera ao anúncio? E se tivesse sido esse cabeludo, só de brincadeira?

Melhor voltar pra casa.

No dia seguinte, na escola, a menina não pôde deixar de escutar alguns comentários sobre os cartazes, coisa do tipo "você sabe o que são esses cartazes? Parece uma conversa de msn", ou então "é propaganda de quê?". Afinal, estava sendo divertido acompanhar aquilo tudo, e a menina não se arrependeu de ter espalhado os cartazes.

Durante a tarde, pensou em uma resposta para a resposta dele, mas não imaginou o que poderia escrever. "Eu também sou eu, que coicidência!" não, não mesmo. Talvez "Eu sou uma menina que te viu um dia na rua", mas aí o menino ia achar que ela era uma daquelas loucas stalker. Daí a menina olhou para sua bicicleta, amarrada na cerca do jardim, e foi formulando uma ideia. Sim, ela faria isso.

Pegou sua máquina fotográfica, tirou uma foto da bicicleta e passou para o computador, depois mandou para si mesma por e-mail e foi para a casa da amiga para imprimir. Sabe, na casa dela a impressora era um pouco temperamental e não estava afim de imprimir nada hoje.

Quando a campainha tocou com tanto entusiasmo, a amiga já sabia que a menina havia chegado e abriu a porta depressa:

-- E aí?

-- Oi -- a menina disse, exibindo a máquina fotográfica com a foto da bicicleta. -- Notou algo?

-- Notei um sorriso que não cabe no seu rosto -- a amiga respondeu. -- e uma foto da sua bicicleta. O que tem isso?

-- Eu quero imprimir -- a menina entrou apressada na casa da amiga e foi subindo as escadas sem pedir licença nem nada, escancarou a porta do quarto da amiga e congelou. Tinha uma desconhecida ali dentro. Ops.

-- Er -- a menina ficou sem palavras. Era realmente tímida. -- Oi, eu sou amiga da Blue, eu...

-- Oi -- a outra menina se levantou da cadeira e estendeu a mão. -- Eu sou a Yohanna.

Logo depois, a Blue chegou no quarto, parou na porta:

-- Ah, vocês já se conhecem?

-- A gente se apresentou -- Yohanna disse, e a menina sorriu.

-- Posso... imprimir as fotos?

A menina acabou imprimindo só uma foto e ficou de tirar xerox na escola.

-- Droga, hoje a tia da xerox está lá -- Yohanna disse. -- Ela vai acusar a gente de estar matando aula pela segunda vez.

-- Não, não vai -- a menina retrucou. -- Porque a gente vem tirar as xerox no recreio. Agora vamos pra sala, vamos.

No recreio, elas voltaram para tirar as xerox. Como a moça da xerox estava lá, elas tiveram que pagar pelas cópias, que acabaram sendo só 40 porque a menina só tinha 10 euros no bolso. Essas 40 cópias ela mesma pregou pelo parque mais tarde e também nos arredores do Big Bang. 

***

-- Será que isso é uma resposta? -- perguntou o menino cabeludo, quando ele e Matt pararam em frente a um dos cartazes com a bicicleta vermelha estampada.

-- Se for, eu não entendi -- Matt respondeu.

-- Bicicleta tem alguma conotação? Algo do tipo... "garota bonita", ou coisa assim?

Matt balançou a cabeça.

-- Bicicleta é uma bicicleta. Talvez a pessoa tenha uma bicicleta assim.

O cabeludo aproximou o rosto da foto. Parecia analisar minuciosamente a bicicleta e ficou assim por vários segundos, até que disse:

-- Dá pra ver o jardim.

-- Hein?

-- Dá pra ver o jardim da casa. A cerca. E também dá pra ver um pedaço da casa da frente -- ele concluiu.

Matt também se aproximou das fotos para conferir, e abriu os olhos, surpreso.

-- Isso é aqui?

-- Claro que não, estamos no relógio, não tem quintais aqui.

-- Quis dizer aqui em Londres.

-- Oh. Não sei, a gente pode ficar de olho. -- ele fez uma pausa, olhou de novo para a foto. -- Se for aqui... vai ser lá pro lado do parque, que tem umas casinhas. Mas são tantas, vai ser difícil achar só pela foto.

Mais segundos de silêncio. Matt já não encarava a foto; agora estava concentrado em olhar o vapor que fazia com a sua respiração, o céu nublado, mãos nos bolsos... então disse:

-- Você tem algo pra hoje a tarde?

-- Não está pensando em procurar a casa, está? -- o amigo pareceu perplexo. Matt deu de ombros. -- Você tá maluco -- you're crazy -- Vai mesmo?

-- Isso tudo já é maluquice -- Matt enfim respondeu. -- E eu sou grandinho. Sei me virar.

Silêncio.

-- Eu vou com você -- o amigo disse. -- Que se dane, eu vou com você.


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Notas finais do capítulo

No próximo capítulo: Matt e o amigo vão procurar a casa, enquanto a menina se aproxima de Yohanna.



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