Quero que você conheça meu mundo escrita por River Herondale


Capítulo 24
Quero que você conheça meu mundo


Notas iniciais do capítulo

Ei, vocês ainda estão aí? Espero que sim!
Estou muito feliz! Férias, séries e livros sendo finalizados finalmente. E então entro no Nyah e recebo uma mensagem maravilhoso: um leitor fez um vídeo falando sobre uma das minhas fanfics! Fiquei tão emocionada que preciso compartilhar com vocês https://youtu.be/MFiJZJziJpU
Enfim, gente. Só peço desculpas pela demora de postar. Estamos no fim, hein? Muitos beijos e a gente conversa nos reviews ♥



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Ao descer do avião, Clarice respirou fundo.

Ela estava no Brasil.

E aquelas ruas de São Paulo que ela tão bem conhecia pareciam diferentes. O cinza da cidade continuava, os grafites e o cheiro característico da cidade. Foi como acordar de um sonho e encarar de novo a realidade.

Memórias vieram em sua mente. Ficou imaginando se os barzinhos da Vila Madalena que ela frequentava continuavam lá, se a Rua Augusta ainda era tão divertida quanto continuava ser.

E um sentimento que ela nunca teve antes brotou em seu coração: o de pertencer.

Clarice tinha uma filosofia de “minha pátria é o universo”, mas estar de volta em São Paulo e ouvir português de novo em todos os lados era estranhamente aconchegante.

¨¨¨

Frederico tinha tudo preparado. Seu livro estava na pré-venda em livrarias online e sua exposição pronta. Agora o que faltava era esperar o grande dia que aconteceria em apenas dois dias.

Estava na casa de seu tio Lúcio. Desde que se mudara da casa de seu pai, tio Lúcio e ele estavam bem mais próximos. Seu primo Henrique desenhava na mesa da sala de jantar quando tio Lúcio se aproximou com seu tablet e sentou-se ao lado do sobrinho na sala.

– O elenco do filme da Clarice já estão no Brasil, você viu?

Frederico olhou para o tio com o canto dos olhos. Sim, é claro que ele tinha visto.

– Difícil acreditar em como as coisas acontecem, não acha?

Tio Lúcio mudou de posição, desconfortável, e então encarou o sobrinho.

– Ela deu uma entrevista. Quer ver?

Frederico pegou o tablet e leu a entrevista.

Entrevistador: Como foi o processo da criação do filme?

Clarice: Diferente da maioria dos filmes. Houve uma dose de destino e sorte mais muita paixão e pessoas especiais em minha volta.

Entrevistador: Qual foi a inspiração para a criação?

Clarice: Minha própria experiência de vida. Meus medos, meus traumas, e menino que conheci que gostava de Machado de Assis. Foi numa época muito reflexiva na minha vida que a ideia nasceu.

Entrevistador: E algo mudou desde que a ideia nasceu?

Clarice: O final mudou. Era muito mais cruel no primeiro rascunho.

Entrevistador: Acompanhamos a personagem principal sempre lutando com seus próprios dilemas. Suas noites em claro, seus encontros de uma só noite, sua intensa cobrança pessoal. Vocês compartilham os mesmos dilemas?

Clarice: O que ela tem de maior medo é de se sentir presa. Ela tem medo de compromisso, mas ao mesmo tempo não quer ficar sozinha. Ela sente que entregar seu amor a alguém é se privar de si mesma. Esse sentimento nós compartilhávamos, mas nesses anos fora do Brasil eu aprendi muitas coisas, revi muitos dos meus pontos de vista.

Entrevistador: E qual foi sua conclusão?

Clarice: A mesma do cara do filme Into The Wild: “A felicidade só é verdadeira quando compartilhada”.

Tio Lúcio ainda estava sentado ao seu lado. Frederico entregou o tablet para o tio e imitou não estar afetado.

– Pode falar o que tem aí dentro, meu filho. – Tio Lúcio disse, pois conhecia muito bem o sobrinho que tinha.

– Sabe, eu ainda lembro bem dela. Engraçado como tem pessoas que passam em nossas vidas mas deixam uma marca eterna, não é?

– Eu vejo essa menina, que tem apenas vinte e cinco anos, e lembro de vocês dois aos dezenove e como se escondiam para beijar como adolescentes bobos. E como as coisas mudaram nesses seis anos, não é?

– Eu estou cansado de ver como as coisas mudaram, tio.

– Mas isso não é bom?

– É e não é. Mas não gosto de ver o impacto que o tempo tem em nossas vidas. Não gosto de admitir que ela se tornou uma existência quase apagada. Parece que a única coisa que sobrou foram as memórias, e isso já não é o suficiente.

– Você nunca deixou de amar ela, não é?

– Isso é ridículo, tio. É tão imaturo e obsessivo pensar que mesmo depois de seis anos a pessoa não consegue partir para outra, conhecer outras pessoas, viver sua própria vida de boa. Eu me sinto um estúpido.

– Talvez seja um mal de família, não é mesmo?

Frederico olhou sem entender para o tio. O que ele queria dizer?

– Dezoito anos que sua mãe se foi e não tem um dia que seu pai não pense nela. Eu posso te garantir isso.

Frederico sentiu um frio na espinha. Seu pai ainda pensava em sua mãe? Nem ele pensava tanto. Tristemente ela estava se tornando uma foto borrada em sua memória. Às vezes ele sentia mais falta do que não tinha vivido com sua mãe do que tinha vivido, e não havia nada que ele pudesse fazer.

– Você fala com seu pai?

– Raramente. Ele me liga uns dias, mas as conversas são curtas.

– Ele quer bem você, só não sabe demonstrar isso. Nunca soube, meu filho.

Frederico estava pensativo nesse momento. Seu pai então ainda pensava em sua mãe? Mesmo depois de dezoito anos? Mas era muito tempo!

– Ele tem um quadro dela no quarto. A foto está sempre virada para ele. – Frederico estava pensando em mil coisas.

– Você se parece com ele. Isso pode não parecer algo bom para você, mas são parecidos sim. Mas por sorte você puxou a bondade da sua mãe. Além disso, seus olhos tem o mesmo formato que os dela. Você lembra demais ela para seu pai, Frederico. E ao mesmo lembra ele. É como se os dois estivessem misturados e materializados em sua frente. Algo muito grande para meu irmão Leonardo lidar.

– Eu não quero ficar dezoito anos amando alguém que não vai voltar.

– Então vá atrás dela. Tenho certeza que ela não esqueceu de você.

– Como pode ter certeza?

– Ela citou um menino que gosta de Machado de Assis na entrevista. E tenho uma leve impressão de que Frederico Escobar tem em sua estante uma coleção com as obras do autor. Pode ser uma leve coincidência, mas...

Frederico abraçou o tio rapidamente, se despediu do primo e foi pegando a chave do carro para ir atrás de Clarice, onde quer que ela estivesse.

¨¨¨

A première aconteceu conforme o esperado. Luzes, flashes, fotos, pessoas, entrevistas. Sua amiga querida, Tati estava lá e toda emocionada. Ao entrar na sala de exibição silêncio. E então risadas. E as lágrimas. E então palmas. Estavam de pé. Clarice se arrepiou. É uma sensação inexplicável. A de ser aplaudida em pé por algo que você lutou, sabe? E então ela subiu no palco escuro. Só quem já subiu num palco entende. A plateia encarava ansiosa.

– Você tem quatorze anos. As pessoas ao seu redor não te entendem. Você se acha muito complexa para esse velho padrão. Você questiona. Arrongatezinha essa menina. Não sei como tem amigos. E então ela acha nos filmes um lugar onde entendia. Bando de gente louca, esses atores. Você pode ser o que quiser. E então você começa a sonhar com o dia em que fará seus próprios filmes. Esses mesmos filmes que te salvaram. Você quer salvar alguém. E então é salva. Salva por um filme, pelas pessoas. Saí do Brasil, mas voltei. Aprendi nos EUA, mas sou daqui. Não tinha outro lugar para eu fazer minha première a não ser aqui. O filme bombeia o psicológico e implora para ser decifrado. Ele quer manter-se vivo, quer sentir. Eu sinto muito. Muito me aflige. Muito sinto muito. Sinto.

Clarice desceu do palco e encontrou Hayden na coxia. Ele a abraçou forte.

– Brasil tem uma energia inexplicável.

– Então o jeito é você ficar, Hayden.

– Aqui é quente, é sedutor. Parece que tudo ao meu redor é um flerte. É lisérgico, Clarice.

Hayden aproximou dela.

– E você é linda. Caramba, você é magnética.

Clarice beijou ele. Mas não da forma sedutora que ele pedia. Beijou porque teve vontade. Beijou porque sentia carinho. Beijou porque o momento pedia, porque sentia a conexão do momento que implorava. Não era um beijo de promessas. Era um beijo de vontade. Beijo de poesia. Beijo de amizade.

Não era a primeira vez que eles se beijavam. Eles já tinham tido essa conversa antes. Sabe quando você está num papo tão bom, e sente que ter conhecido aquela pessoa foi obra dos deuses? Que você sorri de verdade e quer demonstrar? Eles não viam no beijo a responsabilidade que os “românticos” viam. E eles eram românticos. Românticos errantes que não privavam suas vontades e nem escondiam a euforia.

Eram só dois corpos com suas mochilas de vontades no fim das contas.

Clarice voltou para seu quarto de hotel de madrugada depois da festa após a première. Entrou no seu celular para checar seus e-mails. Ela tinha esse costume, já que seu agente mandava notícias da repercussão do filme e notícias. Mas na sua caixa de mensagens tinha um e-mail de um contato diferente. Estava escrito: “Exposição”.

Clarice abriu e com ele cresceu um pressentimento. A imagem baixou e era uma divulgação de uma exposição de fotografia em preto e branco sobre uma viagem pelo interior do Brasil. Ela achou bastante interessante, e as fotos no cartaz eram bonitas, com bastante significado. Tinha também um livro na divulgação. Ela leu que a exposição abriria amanhã e o fotógrafo estaria presente assinando o livro. Clarice sentiu uma grande vontade de ver. Sentia falta dos museus de São Paulo e seria uma ótima oportunidade de se conectar ao Brasil de novo com uma exposição sobre o interior. E então no final do e-mail tinha uma foto do fotógrafo.

Seu estômago gelou. Seu coração parou.

Era Frederico.

Ele estava diferente. Bem diferente. Os seis anos longe um do outro refletiu em sua face mais madura, a barba cheia e o cabelo mais sério. Antes ele parecia um nerd perdido e agora... agora ele parecia um fotógrafo viciado em cafeína com uma sala de estar cheia de livros.

Então foi ver quem tinha mandado o e-mail a ela. Não se surpreendeu quando viu que tinha sido ele mesmo.

Aparentemente amanhã eles se veriam novamente depois de seis anos.

¨¨¨

A exposição começava depois do almoço. Frederico não poderia estar mais ansioso. Sabia que alguns jornalistas viriam para entrevista-lo, e tinha criado a coragem de mandar um e-mail para Clarice avisando do evento. Achar o e-mail dela não foi difícil. No site oficial dela tinha as informações de contato.

Tudo estava conforme planejado. A mesa de autógrafo repleta de livros, as fotos expostas na sala do Museu do jeito imaginado, suspensas em uma placa transparente de vidro. A sala em luz média, para acetuar as lâmpadas iluminando o ambiente de forma intimista. Uma música de fundo calma e instrumental. Frederico vestia uma camisa de botão abotoada até o final. Sua calça jeans preta combinava com o minimalismo da sala. Ele tinha trocado os óculos depois de quase dois anos de viagem. Viu que até seu grau tinha aumentado um pouco. Era um modelo Clubmaster. Bento e seus tios já estavam na exposição com ele, pois naquele momento tudo que ele precisava era do apoio dessas pessoas importantes.

A exposição estava aberta. Antes de começar a assinar os livros, Frederico tinha em sua mão um microfone. Pessoas se acumulavam em sua volta. Ele precisava inaugurar a exposição, apresentar seu trabalho. Ele tremia, mas estava orgulhoso demais de seu trabalho. Quase dois anos trabalhando em cima daquilo. Era hora.

– A vida me fascina. Nenhuma vida é igual, e nós fazemos nossa vida com as escolhas que nos são dada. E durante minhas viagens pelo interior dos estados brasileiros, tive um momento muito importante de minha vida e de autoconhecimento. No Norte do país conheci uma senhora que me disse com um sorriso enrugado pelo sol e pelo tempo que ‘viajar é preciso’. Fotografei a senhora, e quando fui revelar o filme, seus olhos brilhavam como os olhos de uma criança curiosa. O filme em preto e branco ressalta os sentimentos, já que excluímos a cor. O momento é tudo.

“Então no Nordeste fui numa festa do Bumba-Meu-Boi. As pessoas dançavam alegres com suas vestes caprichadas. A cidade era minúscula, todos se conheciam, e o chão era de terra. Não vi um de cara fechada lá. Todos sorriam, e me percebi que tinha muito a que aprender ali. “Uma moça me puxou para dançar e comentou rindo quando viu que eu não sabia dançar: esse povo da cidade grande não sabe o que é bom na vida.

“O ensaio ‘A Poesia Regional e Sua Beleza Ofuscada’ é o trabalho que salvou meu corpo e renovou minha alma. E ver exposto aqui no Museu, e o livro com as fotografias e as crônicas que escrevi durante a viagem é ver meu sentimento despido, e é notar como cresci como pessoa e artista. Espero que desfrutem”

Uma fila se formou na frente de sua mesa e ele começou a assinar os livros. Era engraçado e curioso para ele. Tanta gente interessada em seu trabalho. Uma garota de no máximo vinte anos até tremia enquanto tinha seu livro assinado e ainda disse: “Acompanhei toda sua jornada nas redes sociais e me apaixonei pelo seu trabalho. É uma grande inspiração”.

Bento chegou correndo o sorridente até a mesa de Frederico e sussurrou em seu ouvido:

– Cara, já vi uns quatro críticos aqui na exposição. Parecem estar satisfeitos com seu trabalho.

– Acha que eu devo ir até eles?

– Não agora. A sessão de entrevistas é depois de que você assinar tudo, não é? Aguenta aí, irmão! – Bento bateu no ombro do amigo e saiu apressadamente.

Foi quando viu seu pai se aproximando da mesa. Dr. Leonardo, seu maior crítico. E ali estava ele no seu terno de trabalho. Ele analisava tudo e o estomago de Frederico embrulhou imediatamente.

– É uma ótima exposição. Um bom trabalho.

– Que bom que gostou. – Frederico respondeu enquanto continuava assinando os livros.

– Estou falando sério. Muito artístico e poético.

Frederico olhou para o pai e viu que ele falava a verdade. Era raro ver seu pai elogiando-o.

– Obrigado.

Dr. Leonardo tirou as mãos do bolso da calça e respirou fundo.

– Você puxou a sensibilidade de sua mãe. A capacidade de ver beleza nas coisas. Você lembra muito ela, filho.

Aquilo atingiu Frederico no coração. Ver seu pai falar de sua mãe conseguia desestrutura-lo imediatamente.

– Você nunca devia ter me obrigado a fazer Direito. Ela era uma artista. Uma pintora. Se me acha tão parecido com ela, devia ter me deixado ser um artista também.

– Isso não te impediu. Estou orgulhoso de você, e tenho certeza que ela também.

Frederico se levantou bruscamente da mesa e abraçou o pai. Não se lembrava da última vez que tinha abraçado ele, muito menos se eles já haviam se abraçado com tanta força antes. Era uma sensação nova.

Então ouviu palmas em sua volta. Eles não estavam na sala da casa deles, obviamente. Inúmeras pessoas estavam ali presente. Inúmeras pessoas ouviram tudo.

Quando Frederico afastou as lágrimas dos seus olhos, fixou o olhar naquelas pessoas. E então viu uma em especial que batia palma. Frederico limpou novamente os olhos, mas era claro.

– Você poderia assinar meu livro, por favor?

¨¨¨

Clarice chegara um pouco atrasada, mas conseguira pegar a senha a tempo para entrar na inauguração da exposição.

Enquanto esperava na fila, foi reconhecida algumas vezes. Talvez não fosse conhecida ao grande público, mas o povo estranho dos museus aparentemente sabia bem quem era Clarice Vianna. A noite anterior tinha sido incrível, a première inesquecível. Na noite passada tinha conhecido muitas pessoas interessantes na festa que haviam feito para comemorar o sucesso do filme. As críticas iam muito bem e novas propostas apenas chegavam. Clarice mal podia esperar para começar mais projetos.

Mas naquele momento sua mente estava em outro lugar. Ia rever aquele que ela tinha deixado para trás há seis anos. Aquele que ela ocasionalmente se pegava pensando, que ainda assombrava seus sonhos. Clarice que nunca acreditou nessas coisas de alma gêmea, amor de outras eras, sacrifícios em nome do amor ou qualquer uma dessas baboseiras que a literatura tanto ama.

Mas ali estava ela sendo ridícula. Seu coração batia loucamente contra sua caixa torácica. Parecia que era uma adolescente de novo. Ela não queria admitir o que sentia. Amor não. Não amor. Tudo menos amor. Quantos caras já tinham passado na sua vida? Ela nem mesmo se lembrava. Quantas bocas já tinha beijado? Quantas vezes já tinha tentado?

E por que ela sempre voltava para o cara bem alto e magro de óculos?

Alguns metros os separavam. Ela conseguia ver Frederico de longe, e seu estomago embrulhou. Definitivamente era ele. O jeito de segurar na caneta com delicadeza, os olhos cor de jabuticaba brilhantes. A estrutura estava menos magra e a pele mais bronzeada. Ele costumava ser branco como papel. Viu que agora ele tinha algumas tatuagens no braço. Clarice sorriu.

Ele definitivamente tinha mudado. Sua barba era cheia e moldurava bem o rosto dele. Mesmo assim a barba não ocultava as covinhas que ele tinha e eram adoráveis. Ele sempre sorria com os olhos, contraindo todo o rosto para a alegria. Viu que na sua orelha esquerda tinha dois brincos de argolinhas. Ele tinha muito mais personalidade desse jeito, Clarice pensou. Ele finalmente tivera a coragem de ser ele.

E então Clarice viu Dr. Leonardo se aproximar da mesa de Frederico. Eles estavam conversando. Clarice torceu o nariz. Nunca gostara do pai de Frederico. E então viu que eles estavam se abraçando, e que lágrimas fugiam dos olhos de Frederico. Fazer Frederico chorar não era difícil, mas ela via o desespero ali. E então começaram a bater palmas. E ela começou a bater palma também.

A fila se desfez. Todos queriam enxergar aquele momento o mais perto possível. Ela aproveitou esse momento para se aproximar. Queria mais do que nada ver Frederico em detalhes. Foi quando o olhar dele fixou nela. Foi como se estivesse pegando fogo por dentro. Clarice estendeu seu livro para ele, e disse:

– Você poderia assinar meu livro, por favor?

Frederico pegou o livro sem tirar seus olhos de cima dela. Assinou com a mão trêmula e entregou para ela de volta. Ele não conseguia dizer nada. Estava paralisado.

– Você é talentosíssimo, Frederico. Eu sempre soube.

– Você veio. Não pensei que poderia vir.

– Não poderia perder a inauguração da exposição do fotógrafo que será o próximo Sebastião Salgado. É o que andam dizendo por aí. Que Salgado já tem com quem deixar seu trono.

– Disse a cineasta mais comentada no último ano no Brasil.

– Parece que tudo está acontecendo como sonhado, não é?

A pessoa atrás da fila colocou o livro na mesa e Frederico olhou para Clarice, pedindo ajuda.

– Pode assinar os livros em paz! Eu vou ficar olhando as exposições enquanto você termina.

– Perfeito! Daí a gente pode sair beber um chá depois... – Frederico entregou o livro para a pessoa da fila.

Clarice sorriu com o canto da boca.

– Você lembra ainda do chá...

– Foi assim que nos conhecemos pela segunda vez, se não me engano.

Clarice tirou a franja de cima dos olhos e deu um passo para trás.

– Estarei ansiosa para nos conhecermos pela terceira vez, então. Garanto que será como conhecer uma nova pessoa com o tanto que mudamos, não é?

– Obrigado por vir, Clarice. De verdade.

Um frio subiu pela coluna de Clarice. Ouvir ele falando seu nome era como tomar um banho gelado depois de um mês andando pelo deserto.

Clarice foi ver a exposição. Era um trabalho muito bom mesmo. Ela via a sensibilidade e o cuidado em cada foto. Ficou imaginando a história por trás de cada fotografia, a vida daquelas pessoas. O que deixava tudo mais interessante era saber que aquelas fotos foram tiradas em câmera analógica. Ouvia conversas ao seu redor das pessoas, e todos pareciam gostar tanto do resultado quanto ela. Viu duas amigas adolescentes comentarem algo sobre como achavam Frederico bonito, e Clarice achou graça.

Clarice analisava uma das fotografias quando um cara loiro se aproximou. Era Bento, obviamente.

– E então Clarice Vianna voltou para São Paulo, não é mesmo? E ainda voltou om um filme em cartaz que está quebrando tudo. Provavelmente vou ir ao cinema essa semana conferir seu trabalho.

– Será uma honra, Bento. Seu filho está aqui?

– Você lembra então que eu tenho um filhote? Não, João está com a mãe dele hoje. Você não chegou a conhecer ele, não é?

– Não tive oportunidade.

– É um menino incrível. Um grude com o Frederico, mesmo que ele tenha ficado quase dois anos fora, João lembrava dele.

– Frederico tem esse efeito mesmo nas pessoas.

Bento olhou para Clarice com curiosidade. Clarice nunca sentiu que Bento gostasse dela.

– Você não voltou, não é? Acho que já bagunçou demais aqui.

– Nós não temos mais dezenove anos, Bento. Tenho certeza que mudamos e amadurecemos bastante em seis anos. Eu tenho um filme, Frederico um livro, você um filho.

– Clarice! – Uma voz disse em espanto. Era tio Lúcio que se aproximou com os braços abertos. Clarice abraçou Lúcio com bastante força. Ela sempre adorara o tio de Frederico.

– Quanto tempo! Oh, e como está Henrique? Deve estar tão grande...

– Já está com dez anos, acredita? Um garotão.

– O tempo não para mesmo, não é. Eu estou petrificada.

– E preciso te parabenizar pelo seu filme. Agora que está em cartaz eu com certeza irei com o Paulo. Poxa, só falam desse filme! É maravilhoso ver seu sucesso, garota.

– Frederico também. É maravilhoso o sucesso dele. Melhor do que estar num escritório, não é?

– Não poderia concordar mais.

¨¨¨

Depois de horas assinando livros, dando entrevistas e conversando com os críticos, finalmente Frederico poderia descansar. Estar ali na inauguração da exposição de seu trabalho era incrível, mas ele queria mesmo era fugir, pegar na mão de Clarice e conversar.

Num sofá de couro no canto da sala estavam sentados seus tios, Bento, seu primo Henrique que chegara a pouco tempo e Clarice, que conversava com o menino de dez anos.

– Nem vi meu pai ir embora, ou Cassiana.

– Seu pai foi embora depois de uma hora de exposição e sua prima precisava estudar. Ser violoncelista dedica-se muito estudo. – Tio Lúcio respondeu.

– E então, vamos sair para comemorar? Fiquei sabendo que abriu um bom restaurante de comida mexicana não muito longe daqui.

– Não poderemos ir, filho. – Tio Lúcio se levantou do sofá. – Estamos bastante cansados e Henrique tem tarefa de casa, não é?

– Tenho não, papai. – Henrique disse.

– Tem sim. De matemática ainda. – Paulo pegou na mão do filho. – Já estamos indo, Frederico. Foi um dia incrível.

– Foi sim. Já vai descer também, Bento?

O olhar do tio Lúcio dizia “Desça já e deixe os dois sozinhos ou eu arranco seu pescoço”. Então Bento se levantou com pouco caso e despediu-se:

– Vou passar na casa da Natália ver como o João está. Hoje era dia de levar ele jogar bola e eu furei com o moleque.

– Não tem problema. Mesmo assim, obrigado pelo apoio de vocês. Mesmo.

Todos saíram e quando Bento foi fechar a porta, só olhou para Frederico com aquele olhar cúmplice que só melhores amigos entendem.

Frederico dirigiu seu olhar para Clarice, que estava esparramada no sofá.

– E então, onde vamos?

Frederico se aproximou dela, e sentou na ponta do sofá. Estar tão próximo dela provocava reações estranhas no seu corpo.

– Onde pudermos conversar em paz. Tem tanto que precisamos dizer um ao outro, não é? Quero que você conheça meu mundo.


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Notas finais do capítulo

Finalmente, gente! E aí? O que vocês acham que vai acontecer com o casalzinho? Me digam suas ideias nos reviews



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