Quero que você conheça meu mundo escrita por River Herondale


Capítulo 21
O começo do resto da sua vida


Notas iniciais do capítulo

Nada aperta mais meu coração do que saber que as férias estão acabando. Juro. É como se eu enfrentasse os outros meses apenas para viver as férias, sei lá. E com muita coração deixo esse capítulo para vocês. Espero que gostem.



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E lá estava ela. Definitivamente era ela. O mesmo cabelo bagunçado, o mesmo batom vermelho, o mesmo mocassim, as mesmas tatuagens, a mesma altura, o mesmo quadril marcado pela calça skinny. Lá estava ela, e parecia mentira, uma projeção. O coração de Frederico estava a ponto de fugir pela boca.

– Pensei que não iria se despedir. – Ele disse.

Era fim de festa, e todos já vazavam pela porta em que ele acabara de entrar. Mal notou quando viu que só estavam os dois lá, Tati, Mateus e aquele amigo de Clarice, Heitor sendo os últimos a sair, com aquele olhar cúmplice de que tudo tinha sido armado.

– Quer algo pra beber? – Clarice ofereceu enquanto procurava um copo limpo na mesa.

– Não estou com sede. – Frederico responde, e então ela oferece que ele se sente em um dos pufes espalhados pelo recinto. – Desculpe a demora.

– Eu nem sabia dessa festa. – Clarice respondeu. – Fiquei até surpresa de ter convidados, já que não sou uma pessoa com vários círculos de amizade.

E ele lembrou de quando ela disse que festas não era seu forte. Que preferia uma reunião íntima com apenas poucos e bons amigos.

– Sei bem. – Ele estava tenso. Em outro caso os dois estariam dividindo o mesmo pufe, entrelaçados e rindo. – Está preparada para embarcar?

– Preparada? Não sei. Mas ansiosa eu estou, totalmente, mesmo que o sentimento de estar deixando algo para trás seja persistente.

Seu coração pulou de novo. Seria uma indireta?

– Falou com seus pais?

Clarice mudou de posição no pufe, desconfortável. Claro que ela não tinha falado.

– Não tenho pais.

Ele queria falar que Henrique, seu priminho tinha perguntado dela. Que tio Lucio tinha perguntado dela. Mas toda a liberdade de poder falar o que quisesse com ela tinha sumido, sobrando só confusão.

– Sabe, eu estava ficando meio louco nesses últimos dias. – Ele jogou para fora depois de uns segundos constrangedores de silêncio.

– Como louco?

– Não sabia quem estava certo. Tentei não ser maniqueísta e ver os vários lados, mas tentar conciliar o que tem dentro aqui só piorava.

Clarice olhou no fundo dos olhos dele e depois desviou. Eram os mesmos olhos castanho esverdeados.

– Obrigada por ser sincero. Melhor; acho que devemos ser sinceros para nada ficar pendente. – Clarice decidiu por fim.

– Como?

– A maioria das vezes terminamos sem terminar. Temos medo. E estaríamos mentindo um para o outro. E o que nós tivemos... Bem, foi verdadeiro demais para terminarmos sem uma resolução.

– Quem começa? – Ele não gostava muito dessa ideia.

– Você pode começar.

Ele parou para pensar. Tinha tantas coisas que ele gostaria de dizer.

– Eu te acho louca. Louquinha. E às vezes eu tinha vontade de ser um herói, mesmo que soubesse que na maior parte das vezes você é quem estava me salvando. E te acho a mulher mais mulher que já conheci. E que sempre, sempre haverá um espaço que pertence a você dentro de mim, e que por mim nosso filme terminaria comigo te impedindo de entrar no avião, com uma trilha sonora emocionante enquanto eu corro pelo aeroporto, e então a última cena é nós dois nos beijando e largando tudo por amor. Pelo amor. Nosso amor.

Ele não ligava se estava sendo ridículo. Não ligava que suas mãos estavam tremendo pateticamente, ou que suava frio. Era tudo que ele queria falar naquele momento, e ele nunca desejou tanto viver outra realidade, e viver essa realidade que ele inventou onde Clarice não embarcava no avião.

– Acho que é sua vez de falar. – Ele disse depois que ela demorou tanto para falar. Ela só encarava o chão, como se organizasse os pensamentos.

– Você desperta o que eu mais odeio de mim. Você é minha fraqueza, Frederico, já pensou nisso? Porque em algum lugar dentro de mim essa ideia clichê de parar o aeroporto e ficar parece crível. Porque eu nunca me doei a ninguém a não ser por você. E você faz eu querer viver um amor adolescente – bobo, cheio de esperança e descobertas. E eu não acho isso brega. Pelo contrário, acho isso o suficiente.

E então Frederico sentiu que tinha quinze anos de novo, e que vivia seu primeiro amor. E seu coração encheu de esperança.

– Mas não sou mais adolescente, por mais que só tenha dezenove anos. – Ela riu sem graça. – Só te agradeço por ter sido tudo que foi. Foi mais do que eu exigiria de alguém.

E ele lembrou de quando conheceu Clarice e eram apenas amigos. E como ela tinha um pensamento moderno e frio sobre relacionamentos. Ela não acreditava em amor à primeira vista, que casamentos sejam certificado de felicidade, que monogamia seja regra. E mais questionamentos vieram à tona.

– Só para terminar: quão importante foi nós para você?

Ela não demorou para responder, e isso aliviou o coração apertado de Frederico:

– Foi determinante para toda minha vida.

E pareceu que ela teve uma ideia

– A gente pode imitar que nós nunca aconteceu.

Como?!, ele quis gritar. Que sugestão era essa?

– E tudo que você mudou em mim, como posso imitar que não aconteceu?

– E quem sabe um dia podemos começar de novo, do zero. Fingir que é tudo novo?

Seu estômago deu voltas e seu coração bateu de esperança.

– Terei chances no futuro? – Foi quase um sussurro.

– Você sempre será minha primeira opção.

E então ele não aguentou. Levantou de seu pufe e colocou a mão no rosto dela, olhando em seus olhos, pedindo a confirmação dela.

E então se beijaram pela última vez.

– Você não irá atrás de mim no aeroporto como nos filmes bregas, não é?

– Não gosta da ideia de sua vida se tornar um filme brega?

– Não gosto de ficar confusa.

O último beijo teve o mesmo medo e apreensão de um primeiro. E ele esqueceu de como estava bravo com ela. Voltou para casa com o toque dela em seus lábios ainda presente. Até esqueceu que ficaria anos sem vê-la. E então se permitiu de ser brega como Clarice odiava, e se permitiu de sentir a dor como ela merecia ser sentida. Não se importava se sua vida fosse um filme de romance banal.

¨¨¨

– O que aconteceu? – Tati quis saber enquanto voltavam para casa depois da festa. Clarice estava introspectiva, e Tati conhecia a amiga o suficiente para saber que algo estava errado.

– Acha que vai dar certo?

– Claro que vai. Você é tão determinada que não acontecer seria um absurdo, e eu apelaria aos deuses incas, e daria culpa em algum deus celta, porque Clarice, não seria justo se não desse certo.

Clarice tentou sorrir, mas seu coração pesava tanto. E nem era pelo medo de dar tudo errado em Los Angeles. Era por Frederico. Puramente e inteiramente por Frederico.

– Eu nunca desejei tanto algo na minha vida. É errado desejar tanto algo, não é?

– Não saberia responder, Claricita. – Tati foi sincera.

– Eu podia querer algo mais simples, e está acontecendo. Fico pensando o que a eu de treze anos estaria pensando de mim agora, e como ela estaria feliz.

– E a de dezenove, o que ela pensa?

– Pensa em tudo, na fotografia, nos pôsteres, nos atores, na trilha sonora, na pré-estreia, nas entrevistas, nas críticas publicadas e seu coração aperta, porque nunca desejou tanto algo em toda sua vida.

Os olhos de Clarice brilhavam tão puramente, que era impossível ignorar. Todo mudo merecia ter um sonho grande o suficiente que fizesse seus olhos brilharem e realizar. Devia ser direito humano, ela pensou.

¨¨¨

Aeroporto

– A sensação que eu tenho é que estou te levando para Kings Cross, e que você vai passar pela plataforma nove três quartos e que irá para Hogwarts! – Tati exclamou. Elas estavam na fila de embarque.

Clarice estava nervosa. Mais nervosa do que quando viajou em segredo ano passado. A maior diferença era: ano passado ela não tinha quem deixar para trás.

– Eu já estou querendo chorar, Clarice. Porra! – Tati abraçou a amiga, e começou a derramar as lágrimas.

– Mas você irá me visitar um dia, não vai?

– Já estou guardando meu dinheiro, porque é Los Angeles! É tão outro mundo, e você está indo lá...

Tati fazia o papel de mãe naquele momento, pensou Clarice.

E ela continuava olhando instintivamente para a porta. Sempre para a porta, esperando que a qualquer momento passasse por ali a única pessoa que ela mais queria ver naquele momento.

E então entrou Heitor, e atrás dele, seu pai.

Um choque passou por todo seu corpo.

– Quem está ali do lado do Heitor? – Perguntou Tati, mesmo já imaginando qual seria a resposta.

– O bêbado do meu pai. – Clarice disse, e seu coração quase parou. Ela sentia... saudades dele. E estava feliz e confortada em poder ver o pai. De todos os sentimentos do mundo, ela não pensou que seria isso que sentiria. Saudades.

Seu pai abraçou-a, e Clarice sentiu o pulmão de seu pai subindo e descendo como sobe e desce quando uma pessoa chora. E era o mesmo abraço que ela sentia desde que nasceu. Era um abraço raro, mas era um abraço que estava habituada.

A única diferença naquele momento era que ele não cheirava a bebida.

– Quando Heitor me contou eu não pude acreditar. Que minha filhinha vai virar uma dessas pessoas da televisão. Que vai morar nos Estados Unidos. Que vai ficar toda gringa. E sua mãe não acreditou, mas eu acreditei. E fiquei feliz. E quis ver com meus próprios olhos minha estrela indo.

“Você nunca se importou.”, “Você nunca foi meu pai.”, foram as coisas que Clarice desejou dizer. No fim, ela disse:

– Não sabia que era sua estrela.

– Eu sei que nunca fui presente, e que eu mais errei do que acertei com você, mas tenho orgulho do que se tornou.

A fila do embarque começou a andar, e Clarice não pôde dizer mais nada. Só deu tempo de dar mais abraços.

E quando abraçou Heitor, sussurrou em seu ouvido:

– Obrigada. Por trazer ele, por ser quem é.

– Vai lá, estrela. – Ele brincou, e deu um beijo em sua bochecha.

¨¨¨

“Nesse momento ela já deve ter embarcado.” Frederico mandou a mensagem para Bento.

“Foooooda-se que ela embarcou, quer dizer, te largou.” – Bento respondeu depois de uns segundos.

“Eu te contei o que aconteceu ontem. Foi... especial.”

“Foi nojento. Eu fiquei com enjoo por horas depois, credo! Muita babação de ovo, eu não suporto.”

“Eu não consigo parar de pensar nisso”

“Novidade. Agora se você me dá licença, eu preciso me matar rapidinho...”

“Não! Eu acho que... Eu acho que vou até o aeroporto.”

“Cara, para! Pode ir parando por aí! Ela não te quer lá, entendeu? O que ela disse ontem deixa bem claro isso.”

“Ela disse que não quer, mas na verdade ela quer, eu sei que quer.”

“Vai ter algum modo de eu te impedir? Não, né? Então vai logo, sir Galahad, montado em seu cavalo branco com sua armadura lustrada.”

Frederico pegou o carro e dirigiu até o aeroporto. Não sabia se chegaria a tempo, mas precisava tentar. O transito caótico de São Paulo não iria impedir.

Quando olhou seu reflexo no retrovisor, quase tomou um susto. Aquelas olheiras que contornavam seus olhos estavam mais escuras do que o normal. Seu cabelo estava grudado na testa, e não levantadinho como costumava ser. Sua camiseta amarrotada com uma das estampas divertidinhas que ele gostava. Essa tinha uma ilustração de Martin Scorsese.

Chegou no aeroporto, estacionou o carro de qualquer jeito e seu coração pulou. Não sabia se era o certo a fazer. E é aquele misto de arrependimento sem nem ter feito, aflição da mais pura, mesmo sem saber exatamente do quê. E naquela massa de pessoas, parece um filme, ele pensou. E dos clichês.

Nem precisou andar muito quando viu Tati e Heitor passado ao seu lado.

– Frederico! – Tati se espantou.

– Ela já foi?

Tati fez que sim com a cabeça.

– Quem é ele? – Frederico ouviu um homem baixo e barrigudo perguntar ao Heitor.

– Frederico, um amigo de Clarice. – Heitor sussurrou de volta.

– Na verdade, eu era namorado dela. – Ele respondeu agressivamente. - Faz tempo que ela embarcou?

– Não faz nem cinco minutos. – Tati respondeu. – Desculpa.

Ele não parava quieto, secava suas mãos suadas na calça amarrotada, passava a mão no cabelo sem pentear, olhava ao redor.

– Não, não... só me diga se ela estava feliz.

– Ela não parava de olhar para trás, Frederico. Todo momento. – Tati esboçou um sorriso. – Espero que isso responda sua pergunta.

¨¨¨

Cidade dos Anjos.

E não tinha como negar que ali estava Los Angeles, quente e com todos os estúdios espalhados. Todas as partes do ser de Clarice pareciam querer explodir. Estava acontecendo. Sair daquele avião, e tudo mudaria. Inocentemente ficou torcendo para que algum artista internacional e ela se esbarrassem ali no aeroporto, por mais bobo que fosse o pensamento.

Bastou colocar o pé fora do avião e sentiu que ali era o começo do resto de sua vida.


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Notas finais do capítulo

Sinto informar que uma parte da fanfic se fecha nesse capítulo e no próximo capítulo começa a parte final. Estou muito ansiosa para começar a escrever.
Ah, e preciso contar a vocês! Eu fui convidada para uma entrevista num jornal regional falando sobre livros! Foi tããão legal! E o repórter supersimpático perguntou também se eu escrevia, e mostrei as fanfics! Eles gravaram eu mostrando minhas histórias, nunca me senti tão realizada por algo que eu fiz, que minhas fics tornariam-se algo fora do site. Sempre amei escrever, sempre foi algo que fez pare de mim, mas aparecer na tv? É demais para mim, na boa :')